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Na área de moda, o styling é considerado a maneira de comunicação do conceito de uma marca, editorial ou indivíduo. Ferramenta de comunicação simbólica, é a criação do conceito da imagem de moda: o como a imagem é elaborada envolve a seleção do suporte (casting vivo ou inanimado), ambientação cenográfica, edição dos looks (roupas, acessórios, cabelo, maquiagem), atitude (coreografia) e, inclusive, trilha sonora inseridas num determinado contexto e seus elementos compõem o conceito da imagem, que, na moda, tende a ser valorizado.
Nos desfiles, representa o conceito da marca; nos editoriais das revistas, a interpretação daquele título sobre determinado assunto; já na esfera pessoal, representa a forma de comunicação do indivíduo.
Enquanto o estilo é associado às características e valores de uma determinado produto ou marca, à assinatura delas, o styling permite maior fluidez e efemeridade como conceito imagético para aquela estação ou ocasião. É construído de acordo com o contexto daquele instante.
Nas marcas de moda, como a Dior, é interessante modificar o styling a cada estação, sim, para também auxiliar o consumo, mas também para renovar a imagem da marca. Neste processo, é imprescindível manter a assinatura da marca (fig. 62 e 63). O consumidor procura pelos valores de status, glamour, sofisticação e ousadia que a marca Dior sempre ofereceu.
Relembramos que, na pós-modernidade[70]a comunicação pessoal não está necessariamente relacionada a um único estilo: podemos querer ser um determinado personagem num dia, e vestir outro personagem noutra ocasião. Ted Polhemus já apontava para estas possibilidades. Representamos diversos personagens durante nossas vidas, não pertencemos a um único grupo social, ou a um único estilo de representação visual. Neste sentido, o styling, forma de comunicação imagética, representa nossas imagens variáveis de acordo com diferentes contextos em diferentes situações.
Nelly, outra de nossas entrevistadas, inicia nossa conversa comentando: "Nós somos um sem roupa nenhuma, sem sapato nenhum, mas nós somos outro, um ser social que quer acertar sua própria imagem." Acertar sua própria imagem, comunicar através do look aquilo que o indivíduo gostaria de comunicar é entendido na área de moda como styling.
O calçado faz parte da composição do conceito do look. Solicitar que nossas usuárias usassem botas ortopédicas no baile de formatura, ou durante seu próprio casamento, ou até mesmo numa reunião de negócios é não permitir que elas possam assumir os personagens que queiram. É admitir que os portadores de restrições físicas não podem construir imagens lúdicas e poéticas de si mesmos. É negar-lhes o poder de construir suas próprias representações simbólicas de acordo com seus valores estéticos, sociais, políticos e morais e, portanto, de acertar sua própria imagem social. Neste sentido, a moda por intermédio do styling pessoal, pode ser positiva, proporcionando prazer social, psicológico e ideológico/intelectual de construir personagens.
Seria possível imaginar um look skinhead calçando chinelos hippies? Ele teria o mesmo impacto que teve? Será que a imagem de um hippie da década de 1970 com coturnos transmitiria a mensagem de paz? Os coturnos (fig. 65), botas resistentes de uniformes militares, foram utilizados por skinheads, simbolizando força e agressividade. Os chinelos artesanais de couro utilizados durante o movimento hippie (fig. 66 e 67) simbolizavam paz.
O discurso dos looks, através da seleção dos artefatos que os constituem em determinado contexto constroem o styling. Os hippies ou skinheads são reconhecidos por suas características formais, acrescidas de valores sociais de seus movimentos culturais.
Não reconhecemos skinheads de chinelos. A construção imagética do skinhead utiliza os componentes formais-estéticos (cor, material, forma, etc.).
Camisas brancas abotoadas até o colarinho ou camisetas brancas com mensagens (fig. 64), suspensórios, calça jeans ou de alfaiataria e coturnos são características na edição do look. Acrescidos pela atitude carrancuda (do movimento original localizado por Polhemus no final dos anos 1960), olhares enfezados e cabeça raspada compõem a agressividade. O racismo é atribuído ao movimento cultural dos skinheads, ainda segundo Polhemus. Quando pensamos em skinheads, pensamos em racismo.
Nossas entrevistadas não querem e não desejam ser "skinheads de chinelos", isso não faz sentido em suas vidas, não corresponde aos seus desejos.
Julgamentos morais à parte, a falta de artigos que as satisfaçam as obrigam a representar imagens pessoais que não condizem com seus estilos de vida. Como uma garota romântica como Jacqueline, outra jovem entrevistada, poderia sentir-se uma princesa de botinha ortopédica na sua noite de formatura? Ela prefere antes passar por outra cirurgia do que usar botas ortopédicas: "são vergonhosas", diz, indignada.
A possibilidade de possuir alguns pares de calçados para se harmonizarem com suas roupas e com as ocasiões nas quais se encontram colocam o styling num patamar de significativa importância. Não é qualquer sapato, mas um sapato de festa, não é uma preocupação estética, mas uma preocupação com a comunicação de seus looks relacionados à ocasião que se encontram e seus estilos de vida e personalidades. Oferecer uma gama de produtos ao usuário que possa ser utilizada para comunicar seus desejos da forma que lhes convier nos parece, sim, fazer design de moda com responsabilidade. O próximo tópico procura investigar suas necessidades e desejos por intermédio dos relatos de nossas entrevistadas.
4.3 Desejos subjetivos das usuárias
Os aspectos do conforto e prazer físico e fisiológicos podem ser mensurados através do uso dos calçados, discutidos no capítulo anterior. Para considerarmos as funções estéticas e simbólicas, foram realizadas entrevistas com as possíveis usuárias na tentativa de identificar seus valores, desejos e anseios.
Solicitamos que os entrevistados assinassem o "Termo de Consentimento Informado", conforme a Resolução 196/96 do Conselho de Ética, que nos permite utilizar seus nomes, publicar os depoimentos com fotos de seus pertences e elementos audiovisuais. Alguns detalhes das entrevistas foram omitidos por solicitação dos sujeitos.
Os depoimentos foram gravados[71]em formato mov., editados no DVD em anexo. As entrevistas com audiovisual permitem observar expressões e entonações que se perderiam em questionários escritos.
Utilizamos questionários semi-estruturados para nortear a pesquisa com foco nos calçados. Esta metodologia nos permitiu abordar diferentes temáticas e registrar alguns valores ético-morais relacionados diretamente às questões culturais levantadas por Whiteley e aos aspectos de prazer intelectual apontadas por Jordan.
Observamos que muitos aspectos do cotidiano de nossos usuários encontram-se em diferentes esferas que não se relacionam diretamente com esta pesquisa, mas que permeiam questões a serem discutidas em outras escalas. São elas: inserção sociocultural, inclusão no mercado de trabalho, preconceito, mobilidade, possibilidade de educação, acesso e falta de informação.
A pesquisa estruturou-se de maneira a permitir que o usuário fizesse seus comentários com relação às dificuldades e benefícios encontrados nos calçados, requisitos físicos, comentasse seus desejos e vontades, demonstrasse seus calçados e soluções de adaptações devidamente registrados e apresentados. Falassem sobre marcas, formas, cores, ou ainda atributos estéticos que lhes fossem desejáveis. Por último permitiu que opinassem livremente sobre os calçados transformáveis da fig. 68, e sobre as experiências da autora das fig. 51 e 52, pág. 86 e fig. 69, nesta pág.
Com o auxílio destas imagens, verificamos alguns aspectos relacionados aos quesitos estéticos do objeto, como cores, formas e materiais de confecção. A adaptação do calçado Mercadal (fig. 51 e 52), utilizada como objeto tridimensional em conjunto com o protótipo (fig. 69), construído por mim durante o curso de extensão de design de calçados da FASM, são indispensáveis para percepções táteis de materiais, construções de formas e análise de composição cromática, além dos requisitos de estruturação ergonômicos discutidos no capítulo anterior. Estes objetos permitem também observações relacionadas às questões de prazer social.
Vale ressaltar que, devido às diferenças de tamanho nas numerações de pés e de membros inferiores, as entrevistadas não puderam usar os calçados: esta é uma limitação metodológica de nossas entrevistas. Os aspectos levantados nesta pesquisa com relação às funções de uso do objeto vieram de depoimentos relacionados às suas próprias experiências com calçados anteriores. Alguns aspectos subjetivos também foram levantados através destas experiências.
Optamos por apresentar o depoimento por indivíduo e não por tópicos, devido às questões subjetivas que permeiam esta pesquisa, como vontades, desejos e anseios de cunho pessoal. Seus desejos são diretamente relacionados ao contexto de suas vidas, e às histórias que nos contaram. No final do capítulo, resumiremos alguns tópicos em comum. As entrevistas são apresentadas em ordem de realização, sem pretender privilegiar nenhum depoimento em detrimento do outro.
Vanessa Vasques, entrevista realizada em 23 de outubro de 2008.
Foram retiradas algumas partes da entrevista por solicitação da usuária. A entrevista com foco nos calçados diversas vezes afastou-se do foco sapatos, mas este próprio afastamento nos revelou valores indispensáveis no desenvolvimento do objeto calçado.
Vanessa atualmente é vegana, isto é, ela não usa e nem se alimenta de nenhum tipo de recursos que tenha origem animal. Esta postura nos remete diretamente aos seus valores ideológicos, que são relacionados por Jordan aos prazeres ideológicos/intelectuais. Para Vanessa, um sapato de couro, material de procedência animal, é inconcebível.
Com relação aos desejos e prazeres sociais, Vanessa revela a vontade de usar e sentir uma bota. Devido às pernas arqueadas, nunca conseguiu calçá-las.
Desejamos aquilo que nunca tivemos, ou o que nos traz boas recordações. Após o alongamento e alinhamento de seus membros inferiores através do uso do Ilizarov, sua primeira providência com relação aos calçados foi adquirir uma bota de canos altos, sem saltos. Com relação aos sapatos, especificamente, sua maior preocupação é a sensação de segurança, que podemos relacionar ao conforto físico do calçado, à modelagem firme, tiras de ajuste e sola anti-derrapante.
Vanessa ainda disse que, depois de suas cirurgias, a preocupação com chão, com as calçadas de maneira geral, cresceram exponencialmente, isto é, como ainda não terminou seu tratamento fisioterapêutico, que, acrescentamos é extenso, são anos de recuperação, e provavelmente envolve ainda mais uma cirurgia em seus pés, ela literalmente tem medo de caminhar, cair e se machucar. Nas suas palavras: "tenho medo de ter que colocar pino de novo [Ilizarov]."
Ela aponta não só uma preocupação com os calçados, mas com o piso onde caminhamos, e ainda acrescenta: "Você só sente que você é um deficiente a partir do momento que você encontra obstáculos para exercer o seu deslocamento. Eu só percebi que eu era deficiente depois que coloquei pinos... eu não furava filas, coisa que eu faço hoje. Hoje eu não aguento ficar em pé, coisa que antes [com as pernas arqueadas] não tinha problema. Hoje eu brigo pelos meus direitos como deficiente, naquela época eu não sabia que era deficiente, e nem que tinha direitos... minha mãe não me criou como deficiente. Lógico, existe preconceito, todo mundo te olha, todo mundo te pergunta, mas isso nunca foi um obstáculo para mim. O meu complexo era ser baixinha, eu tinha 1,40 m, e hoje tenho 1,54 m... Eu sempre me senti linda."
Os preconceitos sociais e culturais para Vanessa podem ser vencidos principalmente pela conquista de seus direitos como cidadã, pelo direito de ir e vir.
Margolin salienta que algumas das mudanças de hábitos originam-se por meio dos usuários, não necessariamente dos empresários. Ela é defensora de sua causa.
Vanessa só é vista como portadora de restrições físicas pelo movimento de seu corpo. Durante sua marcha, ela manca um pouco e seu corpo se projeta para os lados; outras marcas reconhecíveis pelo outro seriam através de suas cicatrizes. Não existe mais uma aparência física que possa denunciá-la como portadora de restrição, conforme a fig. 70. Suas limitações encontram-se no movimento de seu corpo, e talvez seja por isso que estas questões são fundamentais para ela.
Com relação aos aspectos estéticos, podemos observar o cuidado com as cores selecionadas pela usuária ao adaptar sua Havaiana em tons de verde e branco que se harmonizam com seu vestido de festa na fig. 71. A composição do styling do look para esta ocasião especial demonstra o cuidado da usuária com sua aparência: maquiagem, vestido e chinelos estão cuidadosamente elaborados para simbolizar harmonia e vaidade, para comunicar o cuidado com sua aparência independente do aparelho Ilizarov.
Aos aspectos socioculturais, podemos acrescentar ainda o ambiente em que vive atualmente. Vanessa é formada em biomédicas com TCC que discute a acessibilidade em trilhas para portadores de restrições físicas. Em seu ambiente de estudo, "professores doutores e alunos são largados [se refere à preocupação com a aparência deles] usam bermuda e Havaianas", ainda acrescenta que o melhor calçado pra ela são as Havaianas, que permitem movimento e ainda são leves, o peso dos sapatos também é uma grande preocupação.
Quando mostramos as imagens de Aimee no desfile de McQueen, primeiro observamos uma reação de espanto: "Ela não tem as pernas? Muito bacana... mas e o salto, como ela usa esse salto enorme?" Em seguida, mostramos as imagens dos saltos escalonáveis (fig. 68). Ela demonstra interesse, mas, logo em seguida, preocupação: "Nossa, isso é lá fora, né! Muito bacana... Eu pensava que a curvatura já era estabilizada no sapato para o salto dar equilíbrio", refere-se preocupada com a alma dos sapatos.
Seu critério de escolha é muito claro: o calçado precisa proporcionar segurança e equilíbrio, em primeiro lugar. As experiências de seu próprio corpo remontam às suas preocupações com os aspectos de funcionalidade e usabilidade de qualquer produto associados ao prazer físico e ao conforto.
Quando lhe mostramos a adaptação e, posteriormente, a construção do protótipo, ela achou interessante, porém, acrescentou: "Você anda de salto, não é? Eu não... que bacana." Nossa conversa sai do foco calçado e vai para o vestuário, e relembramos nossas dificuldades com roupas durante o uso do Ilizarov. Pelo rumo do depoimento percebemos o desinteresse de Vanessa pela aparência específica dos calçados: seus questionamentos são em torno do custo do sapato para pessoas que não têm condições financeiras como ela teve. Relembra que a bota dela (fig. 70) lhe custou aproximadamente R$ 500,00.
Seu depoimento relata os critérios e ordem de seleção dos produtos: em primeiro lugar, segurança e equilíbrio, no segundo momento, custo, e somente em terceiro a aparência estética. Podemos, assim, perceber que as questões que pontuam suas escolhas atuais estão relacionadas ao seu estilo de vida "desencanado", inserida no ambiente de formada em biologia e acrescidas de suas investigações sobre a origem das coisas[72]
Para pensarmos em um produto que satisfaça as necessidades físicas como melhoria de qualidade de vida relacionada à saúde e às necessidades estéticas como prazer sócio-cultural para Vanessa, temos que considerar alguns aspectos fundamentais só identificados por meio de seu testemunho. Se tivéssemos optado por uma análise de requisitos com relação ao objeto, sem considerar o contexto de sua vida, sem simplesmente ouvir seu desabafo, não chegaríamos aos conceitos subjetivos listados a seguir:
a) Prazer físico, encontrado através do produto que proporcione segurança e conforto. Prazer ideológico, trabalhar com materiais de origem sintética.
b) Prazer social e psicológico com calçados que lhe permitam dançar, logo, relacionados também à mobilidade. Ela declarou que dançar é do que ela mais sente falta. "Ter resistência física e me sentir segura para dançar a noite toda, é meu desejo." Poderíamos ainda projetar uma bota, objeto de fetiche para ela.
A essência do projeto de calçados para Vanessa é proporcionar segurança com objetos de origem sintética em primeiro lugar. Proporcionar um calçado na forma de bota para que ela possa dançar a noite toda seria nosso objetivo secundário, mas relevante. Estes são os aspectos que despertam o interesse de Vanessa, suas necessidades e desejos. Lembramos que a realização de seu sonho não depende dos calçados, mas, principalmente, da melhoria de suas condições musculares.
Karin Camargo, realizada em 23 de outubro de 2008.
Karin, 47 anos, mãe de dois filhos, é vítima da talidomida, um componente químico que sua mãe ingeriu antes da gravidez. Segundo nossa entrevistada, a droga dura 24 meses no organismo feminino, e quanto mais próximo da gravidez, maior o grau de deformidade medido: de 1 a 8, sendo 8 o grau de pior deformidade. Karin é grau 6.
Ela fez várias cirurgias na perna esquerda, nasceu sem um dos ossos do calcanhar que lhe dificultava o caminhar, e tinha também encurtamento de tíbia de 5 cm. Quanto aos braços, comenta que foi muito mais uma questão de adaptação: "não havia muito o que fazer", ressalta.
Durante nossa entrevista, Karin aborda diversas questões em relação ao portador de restrições físicas. Dentre elas: a) discriminação social recorrente, quando cita casos em shoppings da cidade de São Paulo e na empresa para qual trabalha; b) vantagens com relação ao mercado de trabalho atual, do qual pôde se beneficiar; c) lamenta indignada a cobertura da mídia no caso do nadador paraolímpico Daniel Dias:
"Se aparecesse mais gente de cadeira de rodas, mais gente de muletas...mais gente, meus Deus... isso um dia ia deixar de ser horrível... já mandei emails até para a Dove... se começaram a falar da gordinha agora, em que lugar do ranking eu tô?" É defensora de sua causa e "batalhadora" por seus direitos como cidadã.
Acrescenta que fez um esforço muito grande para vencer, para não ser tão diferente e ser aceita pelos seus próprios méritos, nas suas palavras: "Tudo é um processo na vida. Se me falassem há dez anos atrás que eu não ficaria bem 100% [depois de sua última cirurgia], eu diria: você está totalmente louca, tudo é possível, eu consigo fazer absolutamente tudo... mas hoje eu vejo... Imagine você fazer tudo, absolutamente tudo com seus 2 cotovelos o tempo todo. Eu tenho dor nas costas, meus músculos saem do lugar... Agora eu aceito mais as coisas como elas vêm, não como uma perda, mas como as coisas são. Têm flores com mais pétalas, têm flores com mais cheiro, têm flores com... não deixa de ser uma flor..."
O depoimento de Karin reflete questões discutidas durante esta dissertação: cada ser humano é único, provido de suas próprias experiências. Seus valores são mutáveis, assim como a vida: seus desejos e vontades, também. Apropriamo-nos da metáfora de Karin: somos todos flores com suas diferenças. Pensar no design que possa compreender as especificidades das diferenças integrando-se ao todo é nosso desafio. Relembramos a dificuldade de Karin em adaptar roupas que possam ser reutilizadas por outros. Para ela, o reaproveitamento sempre foi um princípio básico.
Sobre calçados adaptados, comenta que usou compensação em plataformas e anabelas no final dos anos 1970, início dos 1980. "Foi horrível, mas menos horrível durante o período da novela Dance-Days, porque na época a moda era de sapatos horríveis (gargalha)... mas foi terrível, usei as compensações na época da minha adolescência, uma época que eu tinha que estar tão linda."
Os tempos de Dance-Days ou as propostas consideradas por muitos estranhas como as de Rei Kawakubo podem proporcionar um se sentir menos horrível. A estética da moda pós-moderna pode parecer estranha, nas palavras de Karin era horrível, mas era exatamente esta feiura que a fazia se sentir mais incluída.
Com relação aos desfiles de moda, acrescenta: "se a moda gosta tanto de chocar, ok, se esse é o conceito... por que não introduzir a gordinha, a mulher de muletas, a moça da prótese. Introduz isso no mundo dos normais... a gente faz parte[73]
A percepção estética e ética são experiências ensinadas, acrescentamos, somos educados a experimentar estéticas diversas, composição de cores, formas e materiais de outras maneiras, aliás são estas novas propostas que se tornam inclusive tendências de moda. Usar um traje de alfaiataria com tênis esportivo era inconcebível no início do século XX e, atualmente, em determinados extratos sociais é cool[74]
Concordamos com Karin: a moda pode proporcionar inclusão social[75]Alguns designers esbarram nestas questões, como os mencionados durante esta dissertação.
A ética para Jordan está associada ao prazer intelectual/ideológico. Considera que o conjunto de valores referentes à conduta humana também pode ser modificado de tempos em tempos nas esferas sociais, políticas e culturais. A própria conscientização de um mundo mais sustentável e a disseminação do consumo consciente são valores de referência para diversas empresas e extratos sociais inimagináveis no momento de consumismo desenfreado dos anos 1980.
Quando às dores, seu pé esquerdo é muito sensível, mas não é o pior: ombro e costas são terríveis: "Mas com as dores tenho que conviver, é um grande problema... mas as coisas normais de uma mulher... (quais, lhe pergunto). Ah, o salto. A mulher não vive sem." Karin sorri. Estas informações revelam o fascínio que ela possui por saltos altos, relacionados à sensualidade, poder e elegância. Podemos acrescentar ao conforto e prazeres sociais e psicológicos. Eu a questiono: você não consegue usá-los ou está proibida? "Eu nunca perguntei, porque se eu não pergunto, eu não sou proibida. Estou usando a técnica de adolescente, de quando minha mãe brigava comigo. (gargalhadas). Depois que tirei toda parafernália [Ilizarov], você sabe, queria um sapato, fui atrás de um bem básico. Comprei um mocassim, mas não consigo usar.
Tudo dói no meu pé esquerdo, a ponto de lembrar: eu tô de sapato, eu tô de sapato, preciso tirar, preciso tirar... aquilo vai tomando conta do meu corpo, do meu pensamento, que não consigo fazer mais nada."
Ela se preocupa com o conforto físico dos calçados, esse é um fator essencial. "Eu vou falar uma coisa pra você, eu não parto mais do princípio normal: ai que sapato lindo!... Até tênis é complicado... tênis, eu morro de vontade de ter um tênis de mocinha, um tênis Nike ou Adidas. Eu brinco que tenho tênis Bibi, de criança. Tenho vontade de usar um tênis normal, muito difícil".
Karin se refere à numeração do calçado feminino, além da sensibilidade nos pés, ela possui um pé menor que o outro, números 33 e 34. "Eu tenho todas essas coisas, e ainda preciso comprar 2 pares.. por isso que eu digo que você vai passando por fazes da vida. No momento, estou na fase de abdicar de tudo, eu virei a pessoa mais simplista... Imagina, você vai com o marido, roda e ele lhe pergunta, não é possível que você não achou um par de sapatos? Como você tem que comprar 2 pares? Aquilo vira o drama e você perde toda vontade, já é duro achar um que não seja duro, não tenha abinha atrás, que não me aperte, que segure... então vira um drama. O drama do sapato."
Os aspectos do conforto físico são mencionados como fator essencial, porém, podemos perceber que o discurso de Karin difere do de Vanessa nos aspectos subjetivos. Para Karin, a sensualidade dos calçados é um fator tão importante quanto o conforto físico representado pelo tênis de mocinha e pelo scarpin de salto alto, que é fundamental como realização de seus desejos. São símbolos de feminilidade, que a mulher não vive sem. São mencionados também o valor das marcas, como Adidas e Nike, relacionadas ao prazer social, e ainda o drama do calçado, uma dificuldade de executar tarefas, de adquirir objetos e utilizá-los de maneira prazerosa. O ato de escolher, comprar e usar calçados são negativos para Karin, sob a perspectiva do prazer psicológico, que afetam não somente a usuária mas também sua família.
O modelo de calçado escolhido por Karin foi o Camileon. Quando questionada sobre o que gostaria de encontrar no calçado, ela já havia revelado seus desejos: "Eu adoraria usar um salto, não precisa ser muito alto...aqueles sapatos bem bicudos. Aquele que eu ia falar humm, ai que lindo! É o clássico, o preto. Eu tenho um guardado só pra me lembrar...é o meu conceito de sapato lindo".
Com relação ao modelo Mercadal (fig. 51/52) e ao protótipo apresentado (fig. 69), Karin, apesar de ser apaixonada por saltos finos, elogia a estabilidade do salto grosso. Com relação ao protótipo apresentado, ela sorri e diz: "Não acredito, estou tão orgulhosa de você... eu gosto mais deste do que o adaptado... Nossa muito legal, e olha o salto... não sei se no meu pé daria certo, ele é muito raso [no cabedal frontal, fig. 30 , pág. 64]."
O projeto para Karin deve levar em consideração suas restrições físicas: a extrema sensibilidade nos pés exige materiais muito macios, como couro de carneiro; a diferença de tamanhos entre os pés solicita a possibilidade da numeração ½ ponto para evitarmos o custo de 2 pares; o formato de seus pés pedem formas com bico de cabedal não muito cavado, até o término de seus dedos, e tiras ajustáveis no peito do pé ou tornozelos proporcionam segurança e conforto físico.
O calçado deve possuir um equilíbrio entre as funções práticas, estéticas e simbólicas. O modelo ideal seria um clássico scarpin preto associado à sensualidade, elegância e feminilidade proporcionada pela composição estético-simbólica entre as curvas de salto e bico finos pretos. Seus critérios de escolha contemplam mais os aspectos subjetivos do que Vanessa, mas vale ressaltar que não consegue executálos.
Podemos confirmar, através do depoimento de Karin, que percebemos o objeto como um todo, só que suas necessidades físicas e práticas antes deixadas em segundo plano, hoje não se encontram mais assim. Encontrar um produto que satisfaça suas necessidades relacionadas à saúde por meio do conforto e ao prazer como deleite estético social e psicológico tornou-se uma tarefa quase impossível culminando em frustrações: o drama do sapato.
Keith Andrade, realizada em 24 de outubro de 2008.
Keith, 20 anos, candidata a uma vaga de Administração de Empresas, descobriu por volta dos 10 anos de idade, graças a um tombo, um tumor benigno em sua tíbia. Depois de raspagem e enxerto excessivo também fez alongamento ósseo de 2 a 3 cm utilizando o Ilizarov, que ela chama de gaiola.
Quanto aos sapatos, ela nunca utilizou compensações de solado e diz ser apaixonada por All Star, só compra e usa All Star: "quando está muito quente uso chinelo de dedo".
"Adoro All Star, não machucam, são confortáveis. E agora que a perna endireitou posso comprar um de cano longo [se refere à bota ¾ ]. O único problema é o aroma desagradável...", e sorri.
Quando mostramos as imagens dos saltos escalonáveis, ela apesar de gostar do contraste entre pink e preto da Sheila"s Heels, também prefere o scarpin todo preto da Camileon e diz ter medo do saltos altos, que os usou apenas uma vez, um tamanco emprestado da irmã.
O styling pessoal é muito importante para ela. Diversas vezes, durante nossa conversa, ela disse não gostar de mostrar sua perna: "é por isso que eu só uso saias e calças compridas." Fator também reforçado em seu depoimento com relação aos calçados: "O que você fez é da hora, tão bonitinho... não dá nem para perceber que um salto é maior do que o outro... este outro [fig. 69] é muito bonitinho, estilo antigo... se eu soubesse que existiam sapatos assim não tinha nem colocado a gaiola", complementa.
Podemos perceber que esconder seu corpo diferente é importante para a entrevistada. Para obter prazer social, Keith necessita do calçado seguro e que ao mesmo tempo, camufle suas restrições físicas, um pé não pode parecer diferente do outro, esse é seu primeiro critério de escolha em conjunto com o custo. Várias vezes ela se mostrou preocupada com o valor financeiro dos artefatos. O conforto físico e segurança encontram-se em segundo plano.
Jacqueline Ramos, realizada em 25 de outubro de 2008.
Garota de 18 anos, gostaria de ser química, está em fase de vestibular.
Nasceu com má formação óssea de quadril que causou algumas sequelas, como fêmur encurtado e pouco apoio de quadril. Algumas cirurgias depois para melhorar o suporte do fêmur no quadril e alongamento ósseo em duas etapas totalizando 12 cm, nos encontramos. Atualmente apesar da diferença entre membros inferiores de 2 a 3 cm, Jacque ainda está em fase de crescimento. Ela se recusa a adaptar seus calçados.
Sua mãe, Elaine, participou de nossa conversa para complementar alguns detalhes. Acrescenta que quando Jacque era criança, elas iam numa loja especial recomendada pelo médico para adaptar uma botinha. Adquiriam um número maior para colocar uma palmilha interna e faziam compensação de solado. Jacque indignada opina: "Ninguém vai querer usar botinha, pela estética, pela vergonha... Tá, é pro meu bem, mas é feio... Se tiver que fazer outra cirurgia eu faço, mas não vou mais usar botinha não... Não vejo ninguém usando..."
As palavras de Jacqueline reforçam as questões da aparência do produto com relação ao prazer social relatado por Jordan. Um objeto de design não pode envergonhar o seu usuário. Perguntamos o que ela gostaria de encontrar num sapato, quando está na loja. Quais são seus critérios de escolha? "O sapato não pode ser muito aberto, meu pé é muito fino, e ai eu penso que ele vai escorregar... Ai, eu tenho vontade de usar um sapato, assim... olha [sorri intimidada], que chame a atenção para o pé... com detalhes delicados. Eu gostaria, assim, de um salto fino. Tudo aquilo que uma moça gostaria de usar, mas não dá, por causa da firmeza do pé... ele vira."
Ela revela, assim como nossas outras usuárias, a preocupação muito grande com a segurança do calçado. Todas nós, devido a grandes cirurgias e a uma certa fragilidade óssea, momentânea em muitos casos, acrescido de falta de confiança muscular, morremos de medo de cair novamente, porque esta condição poderia nos levar a outra cirurgia. Por estes motivos, andamos olhando muitas vezes para o chão, onde se encontram nossos obstáculos, e nos preocupamos tanto com os aspectos ergonômicos do calçado, mas também sabemos que a ergonomia não nos basta, se fosse assim, usaríamos as tais botinhas. Desejamos objetos que nos tragam prazer e satisfaçam nossas necessidades sociais, que, no caso de Jacque, é se sentir inclusa, como toda moça de salto fino.
O problema maior aparece em ocasiões sociais, caso de sua formatura: "Encontrar uma sandália de salto foi um desafio... bati tanta perna, afinal, eu ia usar vestido e ainda tive que colocar um antiderrapante na sola. Eu queria, precisava usar salto alto."
Não podemos ser hipócritas, temos que assumir a nossa parcela de culpa dentre aqueles que fazem moda e propõem para garotas como Jacque que só se sintam bem em ocasiões especiais, nas alturas do salto alto e fino. A indústria cultural do modismo é cruel. Nós culturalmente impulsionamos este desejo, principalmente em ocasiões especiais. Relembramos que, para Semmelhack o salto alto é um dos representantes na moda do poder de sedução feminina, assim como foram e ainda o são os corselets.
As manifestações de moda fora dos padrões estéticos entendidos como modelos são poucas e raras, tão poucas e tão raras que apenas os pesquisadores de moda conhecem os casos citados[76]no decorrer desta dissertação. Quando mostramos a imagem de Aimee para Jacque ela demonstra claramente surpresa: "Modelo é tão perfeita...eu nunca ouvi falar de modelo assim, que interessante: ela é linda."
Comentamos sobre a bota, e Jacque acrescenta: "Adoro bota, acho lindo". Vale ressaltar que as botas, de maneira geral, despertam grande interesse nas mulheres entrevistadas, na maioria dos casos por representarem produtos que não conseguiram usar em algum momento de duas vidas.
"No dia-a-dia uso tênis, só de marcas conhecidas que tenham amortecedor: All Star, nem pensar, acho legal, bonito, queria usar, mas me machuca... Nos últimos tempos não compro mais sapato, só tênis. Não adianta, não consigo usar mesmo...você acredita que nem sapatilha dá certo?, não me conformo com isso", acrescenta. Adquirir sapatos é frustrante, "quero mas não dá certo".
Praticamente desistiu, nem as sapatilhas, que para ela não têm salto, são macias, deveriam ser confortáveis, mas não são. Confessa que, no calor, o melhor são suas Havaianas, de várias cores. Percebemos, por estas declarações, a importância da marca como griffe social. Investigar o poder das Havaianas ou do All Star, seria outra dissertação Confessa, ao mostrarmos nossas imagens dos calçados, que ela compartilha as mesmas opiniões que as demais entrevistadas: preocupação com a segurança, encaixe da curvatura do pé e custo. Quanto à estética prefere o Camileon. Sua mãe acrescenta que "se você vai se vestir para ficar parecida e bonita com as outras mulheres que estão presentes no local, não pode parecer esse pedaço do salto [com relação à parte sobressalente dos saltos]". Jacque comenta: "Quem tem assim um visual mais exótico como o seu [referindo-se a mim] usa verde-limão. Eu adoro, acho lindo, mas não combina comigo."
Os depoimentos de Jacque, acompanhada de sua mãe, revelam mais uma vez a preocupação com a segurança e conforto físico. A vontade e o desejo de se sentir inclusa estão relacionados à projeção de sua imagem pessoal em sociedade.
"Não é isso que a mulherada quer? Ficar elegante, de bico fino e salto alto...o difícil é encontrar...". Acrescenta sua mãe, com relação à plasticidade: dizem adorar preto.
A sensação de elegância e segurança são os conceitos chave para desenvolvermos um produto para Jacqueline, que possa proporcionar prazer social.
Se sentir inclusa, como uma mulher normal: elegante, sedutora e feminina são requisitos básicos para ela, principalmente em ocasiões especiais, como de sua formatura. Sim, uma imposição simbólica da indústria cultural! Jacque certamente é a jovem que se atrai mais pela beleza de Monroe do que de Maison.
Nelly Nahum, entrevista realizada em 27 de outubro de 2008.
"O calçado é importante na apresentação da pessoa. Nós somos um sem roupa nenhuma, sem sapato nenhum, mas nós somos outro, um ser social que quer acertar sua própria imagem." Estas são suas primeiras palavras. Nelly, aos 45 anos, sofreu um acidente de trânsito em 1995 que destruiu seu fêmur esquerdo, causando um encurtamento de membro inferior de 3,5 cm. É arquiteta e docente da PUCCampinas.
Sua formação, reconhece, não permitiu se conformar com os sapatos ortopédicos. "Não só por ser arquiteta, mas eu sempre cuidei do meu corpo, fiz esporte e sou vaidosa." No final da entrevista revela ainda seu apego pessoal por sapatos desde a infância: Nelly é judia e foi expulsa do Egito aos 7 anos de idade. Ela conta que sua família não podia retirar muitas coisas, e seu pai se preveniu para que todos os filhos tivessem sapatos por muito tempo. "Meu pai mandou fazer 2 pares: um vermelho, para passear, e um marrom, para ir para a escola... o sapateiro fez uma botina, um coturno de exército com fivela lateral que ia durar 3 gerações: somos em 3 meninas.
Eu os usei por muito tempo... não suportava mais aquilo... na época, as minhas colegas já usavam sapatinho de boneca, de verniz... era lindo. Eu era apaixonada por aqueles sapatos tão femininos. Eu tentava acabar com os meus mais rápido, os arrastava no chão, e eles não gastavam nunca: eu os molhava para estragar. Meu pai comentava: não se preocupe, minha filha. Vou secá-lo no forno. Até que um dia molhei os dois, e fui de Alpargatas para a escola; meu pai os esqueceu no forno e os 2 pares torraram. Ele chorava, e eu ria, e ria... Então, meu amor pelos sapatos começou aí,... Economizei o dinheiro do sorvete para comprar meu primeiro sapatinho vermelho de alcinha e botão. Era macio, tinha um cheiro delicioso, e eu dormia tão feliz do lado do sapato."
Podemos observar que os sapatos têm um valor especial na vida de Nelly; ela necessitava buscar solucioná-los depois da fatalidade de seu acidente. Este processo iniciou-se com o raio-x panorâmico com e sem sapato solicitado por Nivaldo Baldo constatando que a diferença entre membros inferiores era de 3,5 cm.
Dirigiu-se à casa ortopédica para fazer a palmilha: "A compensação deveria ser feita com 1,5 cm na frente e 3,5 cm atrás: foi feita uma palmilha que ficou muito cara, não entrava em sapato nenhum... então, eu pensei a questão não é a palmilha é o sapato." São os 2 cm de diferença sugeridos pela ergonomia, sendo que estas medidas são relacionadas à base do triângulo de propulsão e ao ponto C da modelagem, e ao vértice do triângulo de Apolo próximo ao ponto L da modelagem (fig. 46 pág. 79), sucessivamente.
Suas primeiras experiências foram com tênis de cano alto; por serem mais fechados, davam suporte à nova movimentação de seu corpo, protegendo tornozelo e diminuindo a probabilidade de virar o pé para o lado. "As medidas eram compensadas metade na palmilha interna, e metade no solado externo realizado em casa ortopédica e cobrado por centímetro... Fiquei indignada com o tal [preço] por centímetro...quanto pior o problema da pessoa, mais ela tem que pagar?... Isso é indigno da raça humana, sabe!"
Ela comenta que teve de reaprender a andar de novo, fortalecer muito seus músculos, perder os vícios das muletas e, atualmente, tem dores apenas quando exagera nas atividades físicas. É incômodo, ressalta. "Nada que me faça fazer cirurgias novamente. Aliás, quando eu estava terminando meu tratamento me propuseram alongar minha perna [fêmur], e eu respondi: Estão malucos?"
Ela já tinha resolvido as questões físicas com o tênis de cano alto, mas sua paixão por calçados, associada a diversas situações sociais, como festas, casamentos, ou até mesmo caminhadas, exigiam outras soluções: "Não poder ter o sapato bonito, charmoso, foi uma das coisas que mais me deprimiu... Então, comecei a estudar os sapatos das vitrines, comecei com as plataformas, e pensei... ao invés de aumentar os sapatos eu vou diminuir... pegava na mão, olhava o material. O fato de ser professora, dar aula na arquitetura de desenho de objetos... [ela tem intimidade com atividades projetuais]... A gente mexe com materiais, não foi difícil de ver o sapato que seria possível [transformar], tanto nas questões estruturais como materiais.... outra coisa, a cor. Aos pouquinhos eu fui vendo que dependia da cor, do material, da estrutura..."
Nelly inicia uma parceria com o Seu Beirinha, sapateiro do bairro de Barão Geraldo, da cidade de Campinas – SP. Juntos, adaptam vários sapatos, escolhendo-os de acordo com as cores e materiais disponíveis no mercado. O primeiro foi uma Havaianas preta, única cor e material disponível até então para fazer a compensação, segundo Beirinha. "Foram dois anos de luta para usar uma Havaianas... você pode imaginar isso (gargalha inconformada e aliviada), amo chinelos de dedo... saí de lá tão feliz, mas tão feliz... só tenho que tomar cuidado para não virar o pé... Ainda não fiz a com tira atrás que agora tem. Quanto maior firmeza, melhor para evitar acidentes, não é?"
Não poder usar uma variedade de calçados alterava seu humor, chegando inclusive a deprimi-la. A possibilidade de tirar o tênis de cano alto e utilizar uma simples Havaianas era mais importante para Nelly do que as questões de segurança e conforto físico. Devemos acrescentar que, depois de anos de tratamento, ela possui segurança e firmeza em seu próprio corpo, reconhece quando abusa de seus músculos, conhece seus limites físicos, e talvez por isso, atualmente suas preocupações primordiais encontram-se nas esferas das funções estética e simbólica do artefato.
Também não podemos deixar de comentar que as experiências de calçados na infância, sua formação como arquiteta, seu trabalho como docente permitiram-lhe uma maior afinidade com resoluções projetuais do que nossas outras entrevistadas.
Estas questões influenciaram suas decisões, tanto quanto seu desempenho corporal.
Todo o seu depoimento é relatado por vontade e desejo de ter diversos pares de calçados: às vezes, sandálias de salto alto ou tênis para caminhar, ou ainda um determinado modelo para ir a uma festa, ou aquele desejo por plataformas, ou a vontade por determinadas cores - preto e vermelho são suas preferidas. Ainda acrescenta que alguns modelos são apropriados para serem usados com jeans, como as anabelas, e outros, como as sandálias da fig. 83, são elegantes para combinar com vestidos em ocasiões formais, e, excelentes para dançar.
A importância de seus sapatos condiz com a importância que Nelly dá ao construir seu look. O styling é sua imagem pessoal, e ainda acrescenta: "Sobre a necessidade de botas no inverno, das necessidades do dia-a-dia, e das botas mais arrumadinhas (fig. 84). Neste, por exemplo, também tive que mexer nos dois pés, aumentar num e diminuir no outro... cada um [calçado] tem uma peculiaridade... Aí vem uma vontade de usar um sapato alto sem alcinha [tira no tornozelo]". A busca dela é por calçados que possam ser adaptados, e assim satisfazer seus desejos.
Encontrar estas resoluções tornaram-se parte agradável de sua vida relacionada com o prazer psicológico e social.
Ela relata detalhadamente todas as suas transformações: desde o cuidado com a estrutura (a alma de aço) do calçado que não deve ser destruída para não alterar o equilíbrio (fig. 83); ou a seleção de materiais para sapatos esportivos e chinelos, fabricados de EVA ou PU, como as Havaianas marrons (fig. 80).
O caso de sua primeira sandália plataforma (fig. 81), ela acrescenta que o seu Beirinha separou e cortou a plataforma, lixou e depois colou a outra parte da mesma para manter a aparência estética do salto. Comenta que não gosta muito das tiras da sandália mas, como foi a primeira experiência, não joga fora por nada.
"Estou apegada a ela... a experiência foi fundamental, mas agora [que já tinha conseguido] eu não ia parar aí, né!" Ela ressalta que devemos ter cuidado para manter a sola original dos tênis de trilha. Existem vários estudos para desenvolvimento de solas que não derrapem, ou para diversos pisos, acrescentamos. Não se deve usar uma bota de trilha no cimento urbano, pode causar lesões nas articulações, relembramos que os tênis foram desenvolvidos tecnologicamente para diferentes tarefas.
Nelly fala sobre diversas marcas: Mr. Cat, Mark Bennett e Tribo dos Pés são as marcas que normalmente consegue adaptar, destaca em especial a Birkenstock (fig. 82). Quando foi à Europa, uma das condições das férias era passar pela Alemanha para conhecer pessoalmente a marca. Comprou logo 10 pares, por sua palmilha anatômica e também pela opção de numeração. A empresa alemã, acrescentamos, possui numeração ½ ponto com relação ao comprimento, numeração de largura e ainda diversas palmilhas anatômicas para pé chato, alto ou normal.
Ela acrescenta: "quando encontro um sapato, levo para adaptá-lo; se deu tudo certo, volto para loja pra tentar comprar o mesmo modelo em outra cor. Não é tão fácil fazer as adaptações". Nos modelos anabelas, perguntamos sobre os movimentos biomecânicos do corpo, e Nelly comenta que as anabelas abertas atrás permitem o movimento dos pés (fig. 85), o que não acontece nos modelos fechados (fig. 86).
Ao mostrar nossas imagens, Nelly nos questiona como eles funcionam com relação ao escalonamento dos saltos, e as especificidades de estrutura e materiais utilizados. Ela acrescenta: "Estas coisas têm que ser passadas adiante, têm pessoas que provavelmente adquirem uma certa tristeza na vida porque perderam alguma coisa, a gente encontra outra... Mas, ultimamente, não tenho feito nada, porque estou até com vergonha, tenho muito sapato".
O depoimento de Nelly reforça os aspectos subjetivos relacionados ao prazer como premissas básicas do desenvolvimento projetual. Para ela, um sapato é uma maneira de se expressar, um vínculo emocional que lhe traz satisfação, bem estar, apreciação, dentre outros valores atribuídos pela entrevistada. Nelly está preocupada com segurança e usabilidade, mas não são estes aspectos que a fazem procurar um calçado e, sim, a elegância das formas, a fluidez das linhas, o desejo por diversas cores de alguns para determinadas ocasiões, ou ainda vontade de ter um determinada forma, ou a necessidade de possuir uma bota apropriada, seja ela para inverno ou para caminhada. Seu fetiche por calçados é evidente, e suas aquisições são baseadas no desejo.
4.4 Sapatos poéticos: um novo conceito ao realizar design de calçados
Nossas entrevistas apontam para necessidades e desejos completamente distintos, com relação aos sapatos. O único ponto em comum é a necessidade de conforto físico proporcionado pelos calçados seguros que não as machuquem. Estes conceitos envolvem as diversas variáveis apresentadas no capítulo anterior.
Em relação às necessidades corporais, os requisitos levantados são muito díspares: diferentes tamanhos de pé (largura e comprimento) das próprias entrevistadas e entre elas; diferenças de membros inferiores distintas, ou em pernas distintas, grau de sensibilidade, etc. São corpos únicos, percebidos de maneiras diferentes, o que nos faz pensar que o desenvolvimento projetual pode ter diretrizes básicas, mas que o projeto deveria ser finalizado com a participação de cada indivíduo, para que o mesmo possa ser essencial e ao mesmo tempo poético, lúdico.
Depois de realizarmos um brainstorming, chegamos às seguintes palavras-chaves do conceito geral: Segurança, Sensualidade, Diversificação e Feminilidade.
As questões relacionadas à segurança e à diversificação corporal que foram trabalhadas no decorrer da dissertação já eram requisitos essenciais previsto por nós.
As características de sensual e feminino atribuídas aos calçados, foram extraídas dos depoimentos de nossas entrevistadas. A sensualidade se encontra no poder de seduzir o outro e de nos auto seduzir através da excitação dos sentidos. O visual e o tátil são os mais utilizados na área do design de moda. Materiais macios e suaves, como o couro de ovelha, literalmente acariciam a sensibilidade tátil de nossos corpos.
O objeto, ou melhor, o calçado com características sensuais e femininas é aquele que faz com que a usuária se sinta confiante, incluída em relação ao meio social, isto é, que nos proporcione benefícios emocionais, prazer social e psicológico, conforme o contexto da situação. No dia-a-dia, nossas usuárias estão satisfeitas com os modelos de tênis, sapatilhas e anabelas, se os mesmos permitirem a construção do styling pessoal. Já em ocasiões especiais, pressionadas, muitas vezes pela indústria cultural, os calçados tipo scarpin ou sandália de salto alto ou médio, foram apontados por nossas usuárias como modelos capazes de transmitir esta confiança, relacionada diretamente ao poder de sedução feminino. São nestes momentos especiais que elas querem encantar e fascinar o outro. São estes instantes de estrelas da passarela da vida que as preocupam.
Satisfazer nossas necessidades básicas não basta; se fosse assim, ficaríamos com as botas ortopédicas. O calçado é um objeto de design de moda que precisa ser variável conforme os sonhos, vontades e desejos do indivíduo que o utiliza em situações diversificadas.
O sapato é objeto de interação social. Os saltos altos empinam as nádegas e obrigam a mulher a dar passos pequenos e rebolar mais. O movimento dos quadris empinados sugere sedução e poder femininos associados aos prazeres sociais e psicológicos. Os saltos, visto pela maioria dos profissionais da saúde como vilões, podem proporcionar melhoria de qualidade de vida social, e não precisam ser muito altos: entre 4 cm foi considerado pelas usuárias ideal, desconsiderando as diferenças entre membros inferiores.
Poder, sedução e feminilidade são valores simbólicos atribuídos por nossas entrevistadas aos calçados desejáveis. Os sapatos fazem com que as mulheres se sintam bem socialmente, proporcionando melhor qualidade de vida neste quesito.
Encontrar um equilíbrio entre sedução, como melhoria de qualidade de vida, social e recomendações ergonômicas, como melhoria de qualidade de vida através da saúde, é projetar calçados seguros e sensuais baseado no prazer físico, social, psicológico e intelectual.
Iniciamos esta pesquisa em nossos corpos, encontramos o corpo do outro, ouvimos suas dificuldades, experiências, satisfações e desejos. Observamos a mudança do olhar, dos valores ideológicos nos casos de Vanessa, Nelly, e aqui também me encontro.
Ouvimos suas dificuldades com calçados, com questões relacionadas à mobilidade. Calçadas, ruas, transporte público são constantes reclamações das usuárias, relacionadas diretamente com a sensação de segurança, que vão muito além de nossos sapatos.
Verificamos que o universo do portador de restrições físicas está muito aquém dos universos do design ou da moda. Encontramos ainda muito preconceito social. Confesso que, durante as entrevistas, me perguntei: em que mundo vivemos?
Um sentimento de indignação me estremeceu. Reforço meu desejo de participar de uma equipe interdisciplinar para tentar discutir alguns destes aspectos, um projeto de vida.
Alguns podem questionar a importância do nosso objeto de estudo, o calçado, mas reforçamos o conceito lúdico e poético deste projeto. Recordamos que nosso objeto não é o calçado, mas as relações entre usuárias e seus sapatos, isto é, como as mulheres se relacionam com o objeto sapato e por que eles são tão importantes em suas vidas.
Concluímos que as funções estético-simbólicas dos calçados podem aprimorar a qualidade de vida de nossas usuárias. Qualidade de vida significa mais do que ser saudável no sentido biológico, mas, também, no sentido de "se sentir bem". Para Nelly, não poder variar de calçados para acompanhar suas próprias roupas e, assim, escolher o personagem do dia-a-dia, era inconcebível. O bem estar está relacionado com a possibilidade de se construir imagens pessoais de acordo com nossas vontades, influenciadas também pela indústria cultural.
Nossas entrevistadas reforçam a vontade de "se sentir bem no meio social", o que, para elas, significa poder construir o styling pessoal, valorizado principalmente em ocasiões especiais, como as festas, formaturas e casamentos. Elas desejam e necessitam de sonhos em suas vidas, elas querem se sentir sensuais e femininas nestes momentos de destaque.
O design de moda, representado aqui pelo design de calçados, é uma das ferramentas que permite construir imagens sociais. A composição de nossos looks podem nos transformar na princesa romântica, essencial para Jacque, ou na rainha do baile, indispensável para Nelly, ou ainda na empresária poderosa, ressaltada por Karin. Os calçados fazem parte destas transições de personagens dos quais vivemos.
A falta de artigos, combinada com a dificuldade de encontrá-los ou adaptá-los, é a negação desta possibilidade de se construir personagens; é abrir portas para a depressão, como Nelly relatou.
Observamos, também, que uma das maiores dificuldades é o acesso às informações. Cada usuária teve de achar suas próprias soluções de adaptação de calçados, vestimenta, procurar por leis, conhecer seus direitos, etc. As informações ainda são muito escassas, e, por isso, montaremos um portal na web (A moda é?, disponível através do link: http://www.roncoletta.com) dedicado à troca de informações, que, em princípio, coloca no ambiente da web o check-list do capítulo três para ser discutido.
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Anexo 1: Questionários semi-estruturados das entrevistas com as usuárias
Questionários semi-estruturados:
Nome Idade |
Descrição dos problemas físicos: |
1. Sente dor? Onde?
2. Usa compensação ou já usou ? Se sim de quantos centímetros?
3. Teve ou tem dificuldades em encontrar sapatos? Quais?
4. Possui necessidades especiais para calçados?
a. Físicas:
b. Necessidades estéticas?
O que você gostaria?
Cor:
Materiais:
Salto:
Possibilidade de camuflar-se
Diferenciar-se, mostrar suas diferenças
Estilo Moda
Tendência
c. Emocionais ? O calçado é importante para você? Porque? Em algum momento específico?
5. Alguma marca de sapato lhe agrada?
6. Quais suas principais dificuldades com relação ao sapato?
7.Opinião sobre os protótipos existentes (imagens):
8.Opinião sobre as adaptações (sapatos tridimensionais).
Anexo 1A: Entrevista com Dr. Túlio Diniz, ortopedista, especialista em pés do Hospital das Clinicas – SP, realizada em junho de 2008.
1. Quais são os principais problemas nos pés causados por sapatos?
São inúmeros, depende da sensibilidade da pessoa. Além dos problemas nos pés, o uso do calçado inapropriado provavelmente afetará a coluna, causando lombargia e muitas dores.
Nos pés, os problemas mais conhecidos são: esporão, bolhas, escaras, calos, joanetes inflamação e rompimento de tendões, unhas encravadas, e proliferação de fungos e bactérias.
2. Existe algum tipo de fôrma apropriada para o pés das brasileiras?
As fôrmas de bicos redondos ou quadrados, encontrados nos calçados boneca. A papete é o calçado ideal porque o indivíduo pode alargar as tiras durante o período desperto. O bico fino deveria ser abolido.
3. Quanto à marcha, que estruturas são consideradas ideais? Algum tipo de sustentação, com relação à palmilha, por exemplo?
O sapato deve permitir a marcha, não pode prender a movimentação biomecânica do corpo. Os calçados americanos masculinos, em sua grande maioria, possuem estrutura na palmilha ou no solado que dá maior sustentação, e principalmente proteção na coluna.
4. Quais são as preocupações com relação ao salto? Seria possível dimensionar com relação ao tempo de uso?
A mulher não deve usar salto. É extremamente prejudicial.
5. Quanto aos materiais, quais são considerados os mais apropriados, para o solado e calado dos calçados?
Os que permitam a transpiração dos pés. Existem muitos tênis com problemas. O solado tem que ser antiderrapante.
6. Temperatura dos pés?
Aproximadamente 27ºC.
7. Com relação aos cuidados especiais para mulheres com diferença de membros, quais seriam as possíveis implicações de não utilizar uma compensação apropriada?
A mulher tem que usar compensação. Se possível resolver de maneira cirúrgica. Os desgastes das articulações do quadril e joelho, e até mesmo tornozelo são irreversíveis.
8. Quais seriam suas necessidades físicas e fisiológicas específicas?
Depende se a mulher não tem outros problemas nos pés. A maior preocupação são com as articulações e coluna. Existem casos de pacientes com encefalite, por exemplo.
9. O salto, considerado um vilão, poderia auxiliar na compensação?
O salto é um perigo.
10. Existe alguma marca de calçados que trabalhe com estas diferenças corporais? As mais conhecidas são de sapatos para diabéticos. Quais o senhor(a) recomendariam?
Não conheço marcas para este público específico. O melhor sapato para diabéticos que já vi (o Dr. Túlio mostrou-me um exemplar) faliu.
11. Existe algum estudo com relação ao conforto físico dos calçados para as mulheres em questão?
Não que eu saiba.
12. E estudos com relação aos fatores sociais, culturais, psicológicos e até mesmo com relação aos desejos e vontades das usuárias?
De meu conhecimento, não.
13. Quais são as principais reclamações das usuárias?
Quanto à estética. Todas as pacientes reclamam dos sapatos ortopédicos.
14. Do ponto de vista médico, estes calçados (fig. 68, pág. 100) são considerados apropriados, no quesito saúde, ou seja, satisfazem às necessidades biomecânicas da usuária? E os aspectos estéticos?
Todos têm salto, o que é inapropriado para saúde se o mesmo for maior que 3 cm. O primeiro além do salto tem bico fino. O terceiro parece não permitir a ventilação, e o elástico deve machucar.
Acho o verde (38degrees) horroroso, questão de gosto. Depois que terminarmos a pesquisa vou mudar seus exemplos.
15. Depoimento sobre adaptações realizadas no calçado (fig. 51, pág. 86 e fig. 69, pág. 101) inspirado no look la garçonne: O salto é péssimo. O importante deste calçado é manter-se com a forma de bico redondo durante a marcha. Muitos tênis, (o Dr. Túlio mostrou diversas imagens) ao caminhar simulam o bico fino, por ser muito moles, ou seja, não ter uma estrutura rígida no solado ou na palmilha, ao caminhar apertam os dedos. Este sapato manteve sua forma arredonda durante a simulação da marcha.
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