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5.2.3 Princípio do juiz natural
Está previsto na Constituição Federal, artigo 5º, inciso LIII, que "ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente."
Tal princípio prima pela imparcialidade do Judiciário, assim como, pela segurança dos cidadãos contra o abuso estatal.
Para Alexandre de Moraes, "o juiz natural é somente aquele integrado no Poder Judiciário, com todas as garantias institucionais e pessoais previstas na Constituição Federal."
Completa seu entendimento, utilizando-se dos dizeres de Celso de Mello que afirma:
somente os juízes, tribunais e órgãos jurisdicionais previstos na Constituição se identificam ao juiz natural, princípio que se estende ao poder de julgar também previsto em outros órgãos, como o Senado nos casos de impedimento de agentes do Poder Executivo.
O referido princípio deve ser entendido como o órgão da jurisdição cuja competência deverá ser estabelecida antes do cometimento do fato e será aplicado igualmente ao processo administrativo porque a Constituição não fez distinção entre processo judicial ou administrativo.
Assim, para produzir seus efeitos, seja qual for a matéria submetida a julgamento, o julgador administrativo deverá ter sido pré-constituído na forma da lei, para o caso abstratamente previsto.
Partindo por esta interpretação, tem-se que o anteprojeto não fere a Constituição, haja vista que a figura do Juiz Natural resta plenamente garantida nas linhas da referida proposta.
A proposta não altera o processo administrativo, consequentemente, o devedor continuará tendo o processo administrativo que ensejará na inscrição em dívida e indicação de bens à penhora na petição inicial por autoridade competente e já fixada em lei anterior.
Quando este encontrar-se lesado e se dirigir ao Judiciário, também encontrará um julgador imparcial que foi designado anteriormente à ocorrência dos fatos levados a julgamento.
No tocante a este princípio, a proposta não fere a Constituição.
5.2.4 Princípio do contraditório e da ampla defesa
Estabelece a Constituição Federal, em seu artigo 5º, inciso LV, que "aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes."
De acordo com o professor Hugo de Brito:
Por contraditório entende-se o procedimento no qual tudo o que de relevante é praticado no processo por uma das partes deve ser do conhecimento da parte contrária. Sobre o que diz o autor deve ser ouvido o réu, e vice versa. Sobre as provas produzidas por uma das partes deve a outra ser ouvida, e na própria produção de certas provas, como a ouvida da testemunha e a realização de perícias, as partes devem ter oportunidade de atuar, contraditando uma as afirmações da outra.
Em relação ao princípio do contraditório, Enrico Tullio Liebman citado por Júlio Ricardo de Paula Amaral, tece o seguinte comentário:
A garantia fundamental da Justiça e regra essencial do processo é o princípio do contraditório, segundo este princípio, todas as partes devem ser postas em posição de expor ao juiz as suas razões antes que ele profira a decisão. As partes devem poder desenvolver suas defesas de maneira plena e sem limitações arbitrárias, qualquer disposição legal que contraste com essa regra deve ser considerada inconstitucional e por isso inválida.
Em consonância com tal definição, Cintra, Grinover e Dinamarco afirmam que:
é imprescindível que se conheça os atos praticados pela parte contrária e pelo juiz, para que se possa estabelecer o contraditório. O contraditório é constituído por dois elementos: a) informação à parte contrária; b) a possibilidade da reação à pretensão deduzida.
No tocante ao princípio da ampla defesa, Hugo de Brito afirma que "ampla defesa quer dizer que as partes tudo podem alegar que seja útil na defesa de sua pretensão. Ao fazê-lo, todavia, não pode fixar limites tão estreitos que tal exercício inviável."
Com base nos conceitos acima, a uma primeira vista, tem-se que o anteprojeto estudado encontra-se pautado nestes, não os ferindo porque não modifica as regras do processo administrativo, onde o devedor tem a possibilidade de exercer sua defesa, fazendo o contraditório, bem como alegando o que for útil para sua defesa.
Ressalte-se, ainda, que o artigo 4º da referida proposta tornou obrigatória a notificação do devedor após a inscrição da dívida, possibilitando que este pague o montante devido no prazo de cinco dias.
Tal notificação ratifica o princípio do contraditório porque informa ao devedor a decisão do processo administrativo que resultou na inscrição da CDA, bem como possibilita que este reaja, ajuizando sua pretensão, opondo embargos, caso entenda que a dívida é excessiva ou inexistente.
Em nenhum dispositivo o presente anteprojeto proíbe que o devedor alegue ou prove fatos constitutivos ou modificativos de seu direito e, muito menos, limita as matérias que podem ser alegadas na defesa do devedor.
A proposta não faz tal limitação porque sabe que a inobservância deste dispositivo constitucional caracterizaria a nulidade dos atos subseqüentes praticados.
Por outro lado, a proposta foi descuidada quando redigiu o § 3º do artigo 9º porque impôs ao contribuinte que ao ingressar com ação judicial, renuncie ao poder de recorrer na esfera administrativa e desista do recurso que interpôs naquela instância.
A jurisprudência atual já entende que o devedor não precisa esperar o desfecho da questão administrativa para ajuizar ação autônoma. Porém, é uma possibilidade que o devedor possui, bem como não há entendimento que ao ajuizar ação o contribuinte deverá renunciar a esfera administrativa.
Desta forma, o dispositivo previu a supressão de instâncias, levantando questões sobre a possibilidade do contribuinte ter o direito de ação condicionado a um fator. Teria, assim, um direito limitado.
Importante frisar que o anteprojeto está trazendo a figura apenas do contribuinte. No entanto, sabe-se que esta norma irá abrangir, também, aquelas dívidas de origem não tributária.
Desta forma, os autores do anteprojeto foram omissos, não dispondo nada a respeito daqueles que não são contribuintes. Deixou uma lacuna que será preenchida pela jurisprudência.
O anteprojeto deveria ter se utilizado da palavra devedor, como faz em outros artigos.
Concluindo, se o contribuinte, como o anteprojeto reza, deverá renunciar o recurso administrativo ao ajuizar sua defesa judicial, estará claramente ferindo a garantia do livre acesso a Justiça e, conseqüentemente, a ampla defesa do devedor que não poderá realizá-la administrativamente.
Será inconstitucional o referido dispositivo porque nossa Carta Magna prever que este princípio deverá ser observado também na esfera administrativa. Logo, se o anteprojeto impõe ao contribuinte a escolha, estará limitando a defesa deste e ferindo a Constituição.
5.3 Da reserva de jurisdição em matéria de penhora
O que mais se discute neste anteprojeto e divide opiniões entre os juristas é a constitucionalidade ou não da indicação de bens do devedor à penhora ser transformada em pré-requisito para a petição inicial da execução fiscal.
Aqueles juristas que são contra esta transformação, não apresentam embasamento jurídico para sustentar a tese de que a referida mudança é inconstitucional, ficam apegados à tradição, alegando que poderá haver excesso de penhora ou abuso da Fazenda Pública, prejudicando demasiadamente o devedor.
Já os que aprovam a transformação e que entendem que o ato de penhora não configura atividade jurisdicional, não necessitando ser realizada sob as vistas do Juiz, trazem a baila que se a penhora for excessiva ou não obedecer à gradação legal, o devedor poderá impugná-la, opondo embargos.
No sentido de que não há inconstitucionalidade no fato da penhora ser deslocada para a Fazenda Pública defende o professor Kiyoshi Harada:
Ironicamente, exatamente agora que temos o pleno domínio dos princípios de direito público, como os da legalidade, da moralidade, da eficiência no serviço público, da impessoalidade, da razoabilidade etc., bem como dos poderes da Administração Pública, como os da exigibilidade (meios de coerção indireta) e da executoriedade em algumas hipóteses (meios coercitivos diretos) a justificar até a inclusão de cláusulas exorbitantes em contratos administrativos, vozes se levantam contra a penhora administrativa como mero pré-requisito para ajuizamento da execução fiscal, Mas nenhuma objeção fazem contra a inscrição na dívida ativa, que municia a Fazenda com um título líquido, certo, passível do controle judicial apenas a posteriori, a exemplo da penhora que se pretende instituir na fase administrativa da cobrança do crédito tributário.
Desta forma, o importante é assegurar que a indicação de bens à penhora esteja coadunada com os princípios constitucionais do devido processo legal, do contraditório, ampla defesa e acesso ao Judiciário.
Salutar frisar que a penhora efetivada por ordem da autoridade administrativa competente não traz mais dificuldades para o devedor se defender do que a penhora ordenada pelo juiz competente.
Desta forma, concordando com Kiyoshi Harada, "o legislador é livre para instituir a penhora administrativa como pré-requisito da execução fiscal porque não é, nem deve ser, função do juiz ficar investigando o paradeiro do devedor."
Concluindo, por não ver inconstitucionalidade no dispositivo, a penhora como pré-requisito da execução fiscal servirá para a Fazenda Pública levar ao Judiciário somente ações com possibilidades reais de serem concluídas com sucesso, diminuindo o número de execuções ajuizadas.
Com tal mudança, a Fazenda Pública seria obrigada a realizar uma apuração qualitativa para ajuizar a cobrança de seus créditos porque somente quando tivesse bem aparelhada, ou seja, com a localização dos devedores e com os bens destes é que poderia ajuizar as execuções fiscais.
5.4 Conclusões do anteprojeto
O anteprojeto em estudo, que prever a indicação de bens à penhora como pré-requisito da execução fiscal, não se afigura juridicamente possível porque possui um dispositivo inconstitucional, qual seja, o parágrafo 3º do art. 9º que trata sobre a supressão de instâncias.
Se for retirado o dispositivo em comento ou substituída a obrigação por permissão, sanado ficará o vício.
No restante da proposta todos os direitos e garantias constitucionais que garantem o contraditório, a ampla defesa do executado, o juiz natural, bem como acesso à Justiça estão assegurados, tornado-a juridicamente viável.
Por outro lado, sabe-se que este anteprojeto, caso seja aprovado, não trará tanta agilidade quanto se espera, assim como transferir a execução fiscal para o âmbito da Administração não irá resolver o problema da morosidade, uma vez que segundo Kiyoshi Harada:
Se a Administração Tributária leva 4 anos em média para ultimar o processo administrativo, como afirmado na exposição de motivos (na verdade leva 56 meses em média), dos quais o contribuinte é responsável por apenas 75 dias (30 dias para impugnar, 30 dias para interpor recurso ordinário e 15 dias para eventual recurso especial), não se vê como possa a Administração agilizar a cobrança coativa da dívida ativa chamando para si tal atribuição.
Partindo dos dados atuais, tem-se que a proposta do anteprojeto é salutar porque desafogará o Judiciário, mas não trará mais agilidade para a Fazenda Pública rever seus créditos, uma vez que esta se encontra mal aparelhada, seja de infra-estrutura, seja de pessoal.
No entanto, por outro lado, tem-se que "a racionalização da ação fiscal e do processo de cobrança favorece um combate mais efetivo à prática da sonegação, ponto de partida decisivo para a redução da carga tributária."
O que acontecerá, na prática, é que a Fazenda Pública terá que fazer uma pesquisa prévia para descobrir se o devedor tem bens que possam garantir o pagamento da dívida e indicá-los na petição inicial da execução fiscal.
Se não houver bens ou estes não forem localizados, a ação executiva não poderá ser proposta, consequentemente, desafogando o Judiciário daquelas ações fadadas ao insucesso e que lotam as prateleiras, bem como tornará a execução fiscal efetiva.
Por fim, enfatizam os juízes federais José Carlos Garcia e Fernando Duarte que:
Se realmente se quer desafogar o Judiciário, dar mais rapidez aos processos e aumentar arrecadação sem comprometer as garantias constitucionais e legais dos devedores e sem criar novas oportunidades de corrupção, talvez o melhor caminho não seja a execução fiscal administrativa, mas a unificação do procedimento de execução de títulos executivos extrajudiciais públicos e privados, o que simplificaria o processo e a adoção dos autos virtuais na execução fiscal - como já vem sendo feito pela Justiça Federal do Rio de Janeiro em uma experiência inédita no país.
Conclui-se pelo estudo apresentado, que o anteprojeto de lei não trará tanta inovação quanto se especulava. Na verdade, se aprovado, trará atualizações ao procedimento da Lei de Execuções Fiscais, uma vez que a maioria das mudanças propostas já está sendo aplicada em decorrências das alterações trazidas pelo Código de Processo Civil.
Diante o escrito, tem-se que o Judiciário está congestionado devido às inúmeras execuções fiscais fadadas ao insucesso, bem como a atual sistemática para cobrança da dívida ativa da Fazenda Pública não mais é eficaz.
Atualmente, a Fazenda não consegue recolher nem dez por cento do valor que se encontra em dívida ativa, obrigando a sociedade jurídica repensar a efetividade do procedimento atual adotado.
Diante da preocupação, lança-se anteprojetos para alterar a LEF e, observa-se, ao analisar a proposta original emanada do Conselho da Justiça Federal que nesta há vícios formais e inobservância da Constituição, acarretando em dispositivo inconstitucional, uma vez que fere ao princípio do direito de ação.
Percebe-se que a proposta tem seus pontos positivos quando prever a informatização das execuções fiscais, mas tal medida é insuficiente para acelerar estas, bem como não desafogará o Judiciário que sofrerá, em um segundo momento, com uma enxurrada de ações questionando a legitimidade da penhora administrativa, entre outros pontos que alguns doutrinadores entendem serem inconstitucionais.
Com o exposto neste trabalho científico, observa-se que a matéria da cobrança da dívida ativa deverá ser mais estudada para trazer resultados práticos e, conseqüentemente, desafogar o Judiciário e aumentar a arrecadação da Fazenda Pública.
Não adianta apenas transferir o ônus de encontrar os devedores e bens penhoráveis do Judiciário para a Fazenda porque tal medida não acarretará em efetividade da cobrança da dívida ativa dos entes públicos.
Até mesmo porque as procuradorias da Fazenda estão mal aparelhadas e com deficiência de profissionais. Desta forma, tal mudança tornará a execução fiscal igual ou mais lenta do que a que atualmente temos.
Fazendo reflexão genérica do anteprojeto estudado, pode-se perceber, juntamente com o entendimento de ilustres doutrinadores, que a proposta de mudança além de inconstitucional, trará várias complicações para as pequenas autarquias porque não há previsão no texto atual para a cobrança dos devedores que não possuem bens penhoráveis, mas possuem real condição de pagamento.
Desta forma, conclui-se que o referido tema deverá ser mais debatido e estudado no seio da sociedade jurídica, sendo reformulada a atual proposta ou lançada uma outra que pense em todos os casos menores e com mais detalhes a execução fiscal.
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ANEXO A
ANTEPROJETO ORIGINAL ENCAMINHADO MINISTÉRIO DA JUSTIÇA
ANTEPROJETO DE LEI SOBRE A COBRANÇA DA DÍVIDA ATIVA
Elaborado por comissão formada no âmbito do Conselho da Justiça Federal, coordenada pelo Ministro Teori Zavascki, composta de representantes do Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal (Juízes Federais Ricardo Perlingeiro e Maria Helena Rau de Souza), da Procuradoria da Fazenda Nacional (Dr. Vandré Augusto Búrigo), do Instituto Brasileiro de Direito Processual (Dr. Petrônio Calmon Filho) e da Universidade Federal Fluminense (Professores Leonardo Greco e Agostinho Netto)
EXPOSIÇÃO DE MOTIVOS
1. Apresentamos anteprojeto de lei destinada a regular a cobrança da dívida ativa da Fazenda Pública, em substituição à atual Lei 6.830, de 22.09.80. A situação hoje verificada nos órgãos judiciais e fazendários envolvidos na matéria demonstra ser inadiável a tomada de providências no sentido de racionalizar e agilizar a cobrança judicial dos créditos públicos.
Atualmente, há um número enorme de processos de execução fiscal em andamento no Poder Judiciário, sendo muito pouco significativo, em relação ao volume dos débitos, o valor efetivamente cobrado. É que os órgãos de defesa judicial da Fazenda Pública, ainda quando cientes da improbabilidade de sucesso na cobrança, vêm-se compelidos, por dever legal, a promover a ação executiva tão-somente para interromper a prescrição. Assim, a atividade, meramente burocrática e sem natureza jurisdicional, de localizar o devedor ou os seus bens penhoráveis, é simplesmente transferida aos cartórios judiciais, com inevitável congestionamento e escassa probabilidade de êxito, o que torna injustificável, sob todos os aspectos, a manutenção do atual sistema.
2. A reforma da execução fiscal encontra, agora, um ambiente oportuno, no momento em que está também em curso uma ampla revisão das regras atinentes à execução civil, com o encaminhamento ao Congresso Nacional, pelo Presidente da República, de projeto de lei sobre a execução por quantia certa (PL 3.253/2004) e a conclusão de anteprojeto sobre normas gerais da execução e da execução de título extrajudicial.
3. A proposta ora apresentada orientou-se pela construção de um procedimento que propicie a integração da fase administrativa de cobrança do crédito público com a subseqüente fase judicial, evitando a duplicidade de atos e reservando ao exame e atuação do Poder Judiciário apenas as demandas que, sem êxito extrajudicial, tenham alguma base patrimonial para a execução forçada.
4. Uma segunda linha de orientação foi a de aproximar, tanto quanto possível, o rito da execução fiscal com o da execução civil comum. Com isso, além de simplificar a atividade judicial e cartorária, promove-se a incorporação, em benefício do crédito fiscal, das inovações que estão sendo propostas ao processo executivo no âmbito do Código de Processo Civil. A adoção de regras próprias para a execução fiscal ficou reservada apenas para os aspectos relevantes ou peculiares da cobrança do crédito público.
5. Assim, foram mantidas, sem alterações substanciais em relação à lei vigente, as disposições que estabelecem o âmbito de incidência do diploma legal e definem a dívida ativa da Fazenda Pública (artigos 1º a 3º e respectivos parágrafos), procedendo-se, apenas, alguns ajustes na redação, como, por exemplo, a inclusão expressa das fundações de direito público no conceito de Fazenda Pública. Nessa mesma linha, conferiu-se à dívida ativa não tributária, além das garantias e privilégios do crédito tributário dos artigos 184 e 187 do Código Tributário Nacional (conforme atualmente prevê a Lei nº 6.830/80, artigos 30 e 29, respectivamente), também as do art. 185 daquele Código. Com isso, a tipificação da fraude à cobrança do crédito tributário ali prevista passa a abranger o crédito não tributário inscrito em dívida ativa.
6. Com a disposição do artigo 4º inaugura-se, propriamente, o novo rito, mediante previsão, na fase administrativa, de notificação ao devedor da inscrição da dívida, ato esse com efeito interruptivo da prescrição. Intenta-se, com tal disposição, um duplo objetivo: a) desobrigar o Fisco do ajuizamento de execuções fiscais destinadas apenas a obstar a consumação da prescrição, como atualmente ocorre; e b) interrompida a prescrição a partir da notificação administrativa, propiciar aos órgãos fazendários o tempo necessário à identificação do patrimônio penhorável do devedor, de forma a viabilizar, se for o caso, a execução forçada. Retira-se tal atividade da esfera judicial, que, portanto, somente será chamada a atuar se houver indicação, pela Fazenda credora, dos bens a serem penhorados.
7. Tendo em conta, todavia, que a matéria prescricional, no que concerne ao crédito tributário, é própria de normas gerais, reservada à alçada de lei complementar (artigo 146, II, letra b, da Constituição Federal), propõe-se alteração do parágrafo único, do artigo 174 do Código Tributário Nacional, para que seja incluída, entre as causas de interrupção da prescrição, a notificação ao devedor da inscrição do débito em dívida ativa.
8. No que tange à competência, o artigo 6º contempla duas inovações. Além de transferir para o texto da lei especial a disposição atualmente constante do artigo 578 do Código de Processo Civil, a proposta concentra na Justiça Federal todas as execuções fiscais da Fazenda Pública Federal. Entende-se que, com a crescente interiorização da Justiça Federal, não mais se justifica a regra geral de delegação de competência à Justiça Estadual, prevista no artigo 15, inciso I, da Lei nº 5.010, de 1966. Eventuais devedores domiciliados ou que tenham seus bens penhoráveis em comarcas onde não funcionem Varas Federais, poderão ser alcançados, se for o caso, mediante execução por carta, nos termos do art. 1213 do Código de Processo Civil.
9. Ainda quanto à competência, sugere-se no parágrafo único do art. 6º, um alargamento da norma hoje prevista no artigo 29 da Lei nº 6.830/80, a fim de considerar como conexas as execuções fiscais entre as mesmas partes e propostas na mesma comarca ou subseção judiciária. Assim, ficará prevento para todas as demais o juiz que for competente para a primeira execução. Busca-se, com isso, evitar a injustificável repetição, em juízos diversos, de laboriosas e dispendiosas diligências cartorárias.
10. A petição inicial da execução fiscal será instruída com a certidão de dívida ativa, que dispensará, como hoje também ocorre, a juntada de cálculo demonstrativo do débito atualizado. Todavia, será indispensável a indicação dos bens a serem penhorados. Realça-se, com isso, um ponto importante da proposta: o de que a utilização da via judicial somente será admitida se houver efetiva chance de êxito na execução forçada. O despacho que deferir a inicial importará em ordem para penhora, avaliação e intimação, bem como em citação para opor embargos. A citação, a seu turno, será outro marco interruptivo da prescrição, preservando-se, no particular, o sistema atualmente adotado na legislação civil, processual e tributária.
11. Para a defesa do executado adota-se o mesmo regime proposto na execução comum de título extrajudicial, onde os embargos podem ser deduzidos independentemente de garantia do juízo, não suspendendo, como regra geral, a execução. Prestigia-se, assim, o princípio da ampla defesa, que fica viabilizado também ao executado que não disponha de bens penhoráveis. Desaparece, por conseguinte, a disciplina da prévia garantia do juízo como requisito indispensável à oposição da ação incidental. Em contrapartida, a concessão de efeitos suspensivos aos embargos, bem como a qualquer ação autônoma proposta pelo devedor com relação ao débito inscrito em dívida ativa, ficará condicionada ao concurso dos seguintes requisitos:
Intenta-se com estas restrições corrigir a atual situação, em que se constata a propositura, em larga escala, de embargos meramente protelatórios ou infundados, retardando injustificadamente a satisfação do crédito.
12. O devedor poderá questionar a legitimidade da dívida também por ação autônoma, que será distribuída ao juiz da execução ou, se for o caso, ao que para ela seja competente. Há, neste ponto, reconhecimento da conexão entre a ação executiva e a ação de conhecimento que se refira ao crédito exeqüendo, o que determina a reunião de ambas. Afasta-se, com tal disposição, o risco de prestações jurisdicionais contraditórias e prestigia-se o princípio da economia processual pelo agrupamento de ações conexas.
13. Propõe-se a aplicação do regime comum do Código de Processo Civil para disciplinar, na execução fiscal, os atos executivos de constrição (penhora, ordem preferencial de bens, avaliação, intimação e substituição do bem constrito). Ficam mantidas, todavia, nos artigos 10, 11 e 12 da proposta, algumas disposições específicas. Assim, as providências para registro da penhora continuarão a cargo do oficial de justiça, ainda quando se trate de imóvel. O depósito do bem penhorado se fará, como regra, em mãos do executado, que não poderá recusar o encargo, salvo mediante autorização judicial. A penhora em dinheiro observará as regras próprias para o depósito em moeda corrente, racionalizando-se sua administração pelos órgãos fazendários com a unificação do procedimento.
14. Propõe-se, no que tange aos atos de expropriação, seja também adotado o regime comum da execução dos títulos extrajudiciais, o que importa incorporar à execução fiscal os avanços que estão sendo propostos àquele regime, onde a realização do leilão público é a última opção, dando-se prioridade à adjudicação e à alienação particular.
15. Aspecto importante da proposta é o do seu artigo 15, que contempla a possibilidade de ser decretada a prescrição pelo juiz, independentemente de requerimento do devedor. A vedação que hoje se apresenta ao julgador para extinguir, de ofício, os processos executivos prescritos, tem como conseqüência prática a da acumulação em cartório, por prazo indefinido, de um enorme volume de processos, sem a mais mínima perspectiva de resultado, alimentando estatísticas artificiosas e acarretando injustificáveis custos ao erário, tudo à espera de uma futura – e improvável – localização de bens ou do devedor, que, mesmo que ocorrer, em nada contribuirá para a cobrança. Simplesmente permitirá que o devedor invoque a prescrição, ensejando, assim, a extinção do processo. Visando a solucionar o problema, cujas conseqüências danosas atingem, não o devedor, mas apenas a própria Fazenda credora e a máquina judiciária, propõe-se a possibilidade de reconhecimento de ofício da prescrição. Em benefício dos interesses do crédito público, a medida será, todavia, antecedida da oitiva da Fazenda exeqüente, que poderá opor eventuais causas suspensivas ou interruptivas do prazo prescricional, desconhecidas do julgador.
16. Por fim, ao prever a possibilidade da prática e comunicação dos atos processuais por meios eletrônicos, a proposta incorpora, à execução fiscal, a utilização de recursos tecnológicos, com promissores reflexos em celeridade e economia processual. Atribui-se aos Tribunais, no âmbito de sua jurisdição, a disciplina da adoção destes meios, que, por certo, atentará para a capacidade operacional e as demais circunstâncias da comunidade jurisdicionada.
É o que propomos, com nossas atenciosas saudações.
ANTEPROJETO DE LEI DE COBRANÇA DA DÍVIDA ATIVA
Art. 1º A cobrança da dívida ativa da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e das respectivas autarquias e fundações de direito público será regida por esta lei e, subsidiariamente, pelo Código de Processo Civil.
Art. 2º Constitui dívida ativa da Fazenda Pública aquela definida em lei como tributária ou não tributária e abrange atualização monetária, juros e multa de mora e demais encargos previstos em lei ou contrato.
§ 1º Qualquer valor, cuja cobrança seja atribuída por lei às entidades de que trata o artigo 1º, será considerado dívida ativa da Fazenda Pública.
§ 2º À dívida ativa da Fazenda Pública, de qualquer natureza, aplicam-se as normas relativas à responsabilidade prevista na legislação tributária e civil.
§ 3º À dívida ativa da Fazenda Pública, de natureza não tributária, aplica-se o disposto nos artigos 184 a 192 do Código Tributário Nacional.
Art. 3º A inscrição, que se constitui no ato de controle administrativo da legalidade, será feita pelo órgão competente para apurar a liquidez e certeza do crédito.
§ 1º O termo de inscrição da dívida ativa deverá conter:
I - o nome do devedor, dos co-responsáveis e, sempre que conhecido, o seu domicílio ou a sua residência;
II - o valor originário da dívida, bem como o termo inicial e a forma de calcular os juros de mora e demais encargos previstos em lei ou contrato;
III - a origem, a natureza e o fundamento legal ou contratual da dívida;
IV - a indicação, se for o caso, de estar a dívida sujeita à atualização monetária, bem como o respectivo fundamento legal e o termo inicial para o cálculo;
V - a data e o número da inscrição no registro da dívida ativa;
VI - o número do processo administrativo ou do auto de infração, se neles estiver apurado o valor da dívida.
§ 2º A certidão de dívida ativa conterá os mesmos elementos do termo de inscrição e será autenticada pela autoridade competente.
§ 3º O termo de Inscrição e a certidão de dívida ativa poderão ser preparados e numerados por processo manual, mecânico ou eletrônico.
§ 4º Até a decisão de primeira instância, a certidão de dívida ativa poderá ser emendada ou substituída, assegurada ao executado a devolução do prazo para embargos, que somente poderá versar sobre a parte modificada.
§ 5º A dívida ativa da União será apurada e inscrita pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional.
Art. 4º Inscrita a dívida, o devedor será notificado do inteiro teor da respectiva certidão para, em 5 (cinco) dias, efetuar o pagamento, com juros, multa e demais encargos nela indicados.
§ 1º A notificação será feita no endereço do devedor, por carta com aviso de recepção, ou por outro meio, inclusive eletrônico, com comprovação do recebimento.
§ 2º Não encontrado o devedor, a notificação será feita por edital publicado em órgão de imprensa oficial local.
§ 3º A notificação da inscrição da dívida interrompe a prescrição.
Art. 5º Não efetuado o pagamento integral da dívida, poderá ser promovida a sua execução judicial contra:
I - o devedor;
II - o fiador;
III - o espólio;
IV - a massa;
V - o responsável, nos termos da lei, por dívidas, tributárias ou não, de pessoas físicas
ou pessoas jurídicas de direito privado;
VI - os sucessores a qualquer título.
§ 1º Ressalvado o disposto no artigo 14, o síndico, o comissário, o liquidante, o inventariante e o administrador, nos casos de falência, concordata, liquidação, inventário, insolvência ou concurso de credores, se, antes de garantidos os créditos da Fazenda Pública, alienarem ou derem em garantia quaisquer dos bens administrados, respondem, solidariamente, pelo valor desses bens.
§ 2º Os responsáveis, inclusive as pessoas indicadas no § 1º deste artigo, poderão indicar bens livres e desembaraçados do devedor, tantos quantos bastem para pagar a dívida. Os bens dos responsáveis ficarão, porém, sujeitos à execução, se os do devedor forem insuficientes à satisfação da dívida.
Art. 6º Observada a competência da Justiça Federal, a execução fiscal será proposta, a critério da exeqüente, no foro:
I - de qualquer um dos executados, quando houver mais de um;
II - do domicílio do executado ou, se não conhecido, no do lugar onde for encontrado;
III - do lugar em que se praticou o ato ou ocorreu o fato que deu origem à dívida,
embora nele não mais resida o executado;
IV - do local onde se encontrem bens sujeitos à expropriação.
Parágrafo único. O juiz competente para a primeira execução fiscal estará prevento
para as demais entre as mesmas partes propostas na mesma comarca ou subseção judiciária, aplicando-se, no que couber, as regras relativas à conexão.
Art. 7º A petição inicial indicará o juiz a quem é dirigida e os bens a serem penhorados e será instruída com a certidão da dívida ativa, que dela fará parte integrante, podendo ambas constituir um único documento, preparado inclusive por processo eletrônico.
Parágrafo único. O valor da causa será o da dívida constante da certidão, com os encargos legais.
Art. 8º O despacho do juiz que deferir a inicial importa em ordem para:
I - a penhora e avaliação de bens;
II - a intimação da penhora ao executado e a sua citação para opor embargos.
Parágrafo único. A citação do executado interrompe a prescrição, retroagindo os seus efeitos à data da propositura da execução.
Art. 9º O devedor poderá se opor à cobrança da dívida também por ação autônoma, que será distribuída ao juiz da execução ou àquele que para esta seja competente.
§ 1º A propositura de qualquer ação relativa ao débito inscrito na dívida ativa não inibe a Fazenda Pública de promover-lhe execução; todavia, se relevantes os fundamentos e diante de manifesto risco de dano de difícil e incerta reparação, ficará suspensa a execução, mediante garantia consistente em:
I - depósito em dinheiro;
II - fiança bancária;
III - caução real de bens próprios ou de terceiros, observados na sua constituição os requisitos para a realização da penhora e considerado o interesse do credor.
§ 2º Somente o depósito em dinheiro faz cessar a responsabilidade pela atualização monetária e juros de mora.
§ 3º A propositura, pelo contribuinte, de ação judicial importa em renúncia ao poder de recorrer na esfera administrativa e desistência do recurso acaso interposto.
Art. 10 Os depósitos judiciais em dinheiro serão obrigatoriamente feitos:I - na Caixa Econômica Federal, quando relacionados com a execução fiscal proposta pela União, suas autarquias ou fundações de direito público;
II - na instituição financeira indicada pela unidade federativa para recebimento dos seus créditos ou, à sua falta, na Caixa Econômica Federal, quando relacionados com execução fiscal proposta pelo Estado, Distrito Federal, Municípios e suas autarquias ou fundações de direito público.
§ 1º Os depósitos de que trata este artigo estão sujeitos à atualização monetária, segundo os índices estabelecidos para os débitos tributários federais.
§ 2º Após o trânsito em julgado da decisão, o depósito, monetariamente atualizado, será devolvido ao depositante ou entregue à Fazenda Pública, mediante ordem do juízo competente.
§ 3º A penhora em dinheiro será efetuada mediante depósito na forma deste artigo.
Art. 11 O oficial de justiça, independentemente de mandado judicial, providenciará, mediante apresentação de certidão de inteiro teor do ato de constrição ou de constituição da garantia, a sua averbação no ofício imobiliário ou anotação na instituição própria.
Art. 12 O executado não poderá recusar o encargo de depositário, salvo autorização judicial.
§ 1º O juiz, a requerimento da exeqüente, poderá ordenar a remoção do bem penhorado para depósito judicial, particular ou da Fazenda Pública.
§ 2º O bem penhorado poderá ser substituído por dinheiro a qualquer tempo.
Art. 13 Na execução fiscal, qualquer intimação ao representante judicial da Fazenda Pública será feita pessoalmente.
Parágrafo único. A intimação de que trata este artigo poderá ser feita mediante vista dos autos, com imediata remessa ao representante judicial da Fazenda Pública, pelo cartório ou secretaria.
Art. 14 Nos processos de falência, concordata, liquidação, inventário, arrolamento ou concurso de credores, nenhuma alienação será judicialmente autorizada sem a audiência da Fazenda Pública.
Art. 15 Ouvida a Fazenda Pública, o juiz, na execução fiscal, poderá decretar a prescrição independentemente de requerimento do devedor.
Art 16 Os tribunais , no âmbito da respectiva jurisdição, poderão disciplinar a prática e a comunicação dos atos processuais por meios eletrônicos.
Art. 17 Revogam-se a Lei nº 6.830, de 22 de setembro de 1980, o artigo 15, inciso I, da Lei nº 5.010, de 30 de maio de 1966 e o artigo 578 da Lei 5.869, de 11 de janeiro de 1973 (Código de Processo Civil).
Art. 18 Esta lei entrará em vigor 6 (seis) meses após a data de sua publicação, aplicando-se, no que couber, às execuções fiscais em curso.
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