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Sucintamente, o processo executivo poderá ser suspenso, no todo ou em parte, quando:
Quando as partes convirem, o juiz declarará suspensa a execução durante o prazo concedido pelo credor, para que o devedor cumpra voluntariamente a obrigação.
No caso da execução fiscal, além dos casos acima elencados que serão regidos pelo próprio CPC, há previsão na LEF de suspender o processo nos casos em que o exeqüente não consiga localizar o executado ou os bens sobre os quais possa recair a penhora.
3.3.1 Suspensão provocada por embargos
O processo executivo fiscal será suspenso sempre que o devedor oferecer embargos à execução no prazo de trinta dias contados:
Por mais que o código de processo civil tenha sido alterado recentemente em relação a garantia da execução para opor embargos, a lei de execução fiscal afirma taxativamente que tais embargos só serão admitidos quando a execução fiscal for garantida.
Desta forma, a referida alteração no código processual civil não será aplicada nas execuções fiscais.
Há, porém, a possibilidade de os embargos oferecidos serem parciais, ou seja, versarem apenas sobre parte do crédito que está sendo executado.
Assim, o efeito suspensivo abrangerá somente a parte impugnada e a execução prosseguirá normalmente quanto ao restante.
Ressalte-se que havendo pluralidade de devedores, os embargos opostos por um deles só suspendem a execução em relação aos demais se os fundamentos nele aduzidos servirem para aqueles, conforme dispõe o artigo 739A, § 4º do CPC.
3.3.2 Suspensão prevista no artigo 265, incisos I a III
Os casos previstos no artigo 265, incisos I a III do CPC, são suspensões obrigatórias, uma vez que estão estipuladas em lei.
Desta forma, caso venha acontecer a morte ou a perda da capacidade processual de qualquer das partes, de seu representante legal ou de seu procurador, a execução fiscal ficará suspensa obrigatoriamente, pelo prazo máximo de um ano.
Ocorrerá, também, a suspensão da execução fiscal pelo prazo máximo de seis meses quando houver convenção das partes.
No entanto, o prazo de seis meses poderá ser dilatado, conforme possibilita o artigo 792 do Código de Processo Civil, quando as partes firmarem acordo por prazo maior, mas que vise o cumprimento voluntário da obrigação pelo devedor.
Após o prazo de suspensão no caso acima, se o devedor adimplir a dívida, a execução fiscal será extinta definitivamente.
Importante frisar que se a execução for suspensa por convenção das partes, o prazo para oferecer embargos do executado não fluirá.
No caso de exceção de incompetência, suspeição ou impedimento do Juiz, a execução ficará suspensa até ulterior decisão que sane tal incidente processual.
De acordo com Renato Vieira:
Havendo decisão deferitória da suspensão relativa a prazo já iniciado, este continua a correr de modo peremptório e fatal. A parte que, confiada nessa suspensão proibida pelo art. 182 do CPC, não embarga desde logo, perde pela preclusão a faculdade de se opor à execução.
3.3.3 Suspensão por inexistência de bens penhoráveis
O processo de execução fiscal tem como objetivo extrair dos bens do devedor o valor da dívida que aquele possui com o exeqüente, uma vez que neste processo, não há provas a examinar e sem penhora, não há que se falar em oposição de embargos.
Desta forma, caso não haja bens do devedor penhoráveis, a execução regida pelo código de processo civil ficará suspensa sine die, ou até ocorrer a prescrição do título.
Neste caso, o juiz irá decretá-la ex officio e o processo será extinto e arquivado sem ter satisfeito a pretensão do exeqüente.
Entretanto, na execução fiscal, a paralisação devido à falta de bens penhoráveis será pelo prazo de um ano, onde não correrá a prescrição. Depois de decorrido este prazo, sem que seja localizado o devedor ou bens penhoráveis, o juiz ordenará o arquivamento dos autos.
Este arquivamento será provisório e deverá ficar na secretaria do juízo, uma vez que o exeqüente poderá ingressar com petição, a qualquer tempo, se conseguir encontrar os bens penhoráveis ou o executado, onde acarretará no desarquivamento do processo executivo com o regular prosseguimento da execução fiscal.
Importante ressaltar que se os autos da execução fiscal forem arquivados e tiver decorrido o prazo prescricional da decisão que ordenar o arquivamento, o juiz poderá reconhecer de ofício a prescrição intercorrente e decretá-la de imediato.
Porém, o mesmo somente reconhecerá de ofício a prescrição intercorrente, bem como determinará o arquivamento definitivo dos autos após intimar pessoalmente a Fazenda Pública, assegurando o princípio do contraditório.
Neste sentido, o professor Leonardo Cunha afirma:
Não havendo prévia audiência da Fazenda Pública, exsurgirá manifesto error in procedendo, ou seja, um vício no procedimento ou um equívoco na aplicação de regras procedimentais pelo juízo de primeira instância, cabendo apelação para que se anule a sentença que extinguir a execução fiscal.
Já há precedentes do STJ neste sentido:
EMENTA TRIBUTÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO FISCAL. PRESCRIÇÃO. DECRETAÇÃO DE OFÍCIO. DIREITO PATRIMONIAL. POSSIBILIDADE, A PARTIR DA LEI 11.051/2004.
1. A jurisprudência do STJ sempre foi no sentido de que "o reconhecimento da prescrição nos processos executivos fiscais, por envolver direito patrimonial, não pode ser feita de ofício pelo juiz, ante a vedação prevista no art. 219, § 5º, do Código de Processo Civil" (RESP 655.174/PE, 2ª Turma, Rel. Min. Castro Meira, DJ de 09.05.2005).
2. Ocorre que o atual parágrafo 4º do art. 40 da LEF (Lei 6.830/80), acrescentado pela Lei 11.051, de 30.12.2004 (art. 6º), viabiliza a decretação da prescrição intercorrente por iniciativa judicial, com a única condição de ser previamente ouvida a Fazenda Pública, permitindo-lhe argüir eventuais causas suspensivas ou interruptivas do prazo prescricional. Tratando-se de norma de natureza processual, tem aplicação imediata, alcançando inclusive os processos em curso, cabendo ao juiz da execução decidir a respeito da sua incidência, por analogia, à hipótese dos autos.
3. Recurso especial a que se dá provimento.
O Superior Tribunal de Justiça quando lançou a súmula n.º 314, proferiu seu entendimento de quando começa a contar o prazo prescricional da seguinte forma: "em execução fiscal, não localizados bens penhoráveis, suspende-se o processo por um ano, findo o qual se inicia o prazo da prescrição qüinqüenal intercorrente."
3.4 Efeitos da suspensão
A suspensão, como vimos, gera uma paralisação na relação processual, não podendo ser praticado nenhum ato processual.
No entanto, poderá o juiz determinar a realização de atos a fim de evitar dano irreparável, bem como ordenar providências cautelares urgentes, ou seja, o juiz poderá, em caráter excepcional, determinar medidas como a alienação de bens avariados, ou perecíveis, a remoção de bens, a prestação de caução, entre outros.
Durante a suspensão do processo executivo, o executado não terá nenhum bem penhorado, bem como o que tiver sido dado em garantia da execução não será levado ao leilão, uma vez que o processo se encontrará totalmente paralisado, esperando o final da causa que gerou a suspensão.
Ressalte-se que o exeqüente não poderá realizar nenhuma restrição no crédito do devedor enquanto perdurar a suspensão.
Porém, se o exeqüente, ao tomar conhecimento que o executado está tentando dilapidar seu patrimônio, poderá requerer uma medida de urgência ao Juiz solicitando que o processo executivo retome o seu andamento regular, bem como pleitear que seja penhorado quantos bens forem necessários para garantir o juízo, além de eventuais condenações por tentar fraudar a execução.
Os atos executivos que forem praticados durante a suspensão serão nulos, contudo, subsistem os efeitos do processo no que diz respeito à relação processual pendente e aos atos processuais já praticados.
A suspensão do processo executivo tem efeito ex nunc, atingindo o processo na fase em que se encontra e projetando seus efeitos deste momento para frente.
Desta forma, depois de decretada a suspensão do processo, a marcha processual será inibida, mas os atos já realizados se preservarão intactos.
Uma conseqüência que temos com as suspensões dos processos executivos é a quantidade de processos que estão se avolumando nas secretarias das varas devido às paralisações, que está se tornando um problema real na Justiça.
O que ocorre é que os processos executivos fiscais, cada vez mais, estão ficando suspensos por motivo de não localizar o bem sobre o qual possa recair a penhora, bem como os executados não oferecem bens para garantir a execução ou ingressam com defesas que paralisam o processo.
Tais atos estão trazendo um grande problema para a Justiça, que passam a ter um volume cada vez maior de processos suspensos, transformando o trâmite judicial mais lento e acarretando em uma execução infrutífera.
Um grande efeito desta paralisação é que passado o tempo, muitas vezes os bens que foram dados em garantia, perdem o valor.
3.5 Extinção da execução fiscal
De acordo com Humberto Theodoro, temos que "a execução termina com a exaustão de seus atos e com a satisfação do seu objeto, que é o pagamento ao credor."
Porém, a execução poderá finalizar de forma distinta, como ocorre nos casos em que há prescrição, novação, entre outros.
Na execução fiscal, regida pela Lei nº 6.830/80, que nada mais é do que um rito processual para penhora, expropriação e venda judicial de bens do devedor para satisfação do credor, temos que após esta última fase, o processo executivo fiscal se extingue.
De acordo com o CPC, extingue-se a execução quando:
Este rol, entretanto, não é taxativo, podendo haver outras causas extintivas da execução.
No primeiro caso, o devedor poderá efetuar o pagamento, voluntário ou coativo. Se o pagamento se der no curso da ação, compreenderá o valor principal, juros, custas processuais, honorários advocatícios, bem como a correção monetária prevista pela Lei n.º 6.899/81.
É possível, também, que a execução finalize quando ocorrer transação ou remissão da dívida.
A transação "é meio liberatório que consiste em prevenir ou terminar o litígio mediante concessões mútuas dos interessados. Remissão é forma de perdão ou de liberação gratuita do devedor, ou seja, renúncia de direito."
Também desaparecerá o processo executivo quando o exeqüente renunciar o crédito da execução, ocorrendo extinção do direito material, ou seja, do direito à prestação obrigacional.
Ocorrerá, por conseguinte, as extinções impróprias que são:
Seguindo a ordem acima, ocorrerá a extinção por reflexos de embargos, quando o devedor, no prazo oportuno, ofertar embargos e estes forem julgados procedentes, desconstituindo, assim, o título em que se funda a execução.
Desta forma, o juiz da execução, após o trânsito em julgado da ação de embargos, proferirá sentença na execução com base naqueles.
Quanto ao caso da extinção da dívida, é concebido ao devedor que consiga, por ação autônoma, declaração de que a dívida constante da certidão de dívida ativa, objeto da execução fiscal, não é líquida, certa ou exigível, extinguindo-a, por conseguinte.
No que se refere à desistência da execução, esta também acarretará em extinção da ação executiva e somente surtirá seus efeitos após a homologação por sentença. Neste caso, haverá o fim da relação processual sem atingir o direito substancial da parte.
A desistência não depende de anuência do devedor.
É importante verificar se este pedido de desistência foi formulado após a oposição de embargos à execução, pois neste caso a matéria suscitada naquela ação deverá ser examinada com o intuito de se averiguar se é indispensável a anuência do devedor para que seja extinto o processo executivo, bem como se a extinção da ação executiva afetará os embargos, causando-lhes a extinção.
Na ação executiva fiscal embargada, o pedido de desistência na execução não acarretará o fim e desistência dos embargos, que poderá prosseguir para obter, através de sentença, o direito frente ao título executivo.
Ressalte-se que o exeqüente que desistiu da ação executiva deverá arcar com os honorários advocatícios gastos pelo executado, além das despesas processuais que aquele teve ao ajuizar ação incidental.
O credor poderá desistir de toda a execução ou de apenas algumas medidas executivas, uma vez que esta existe em proveito do exeqüente e para a satisfação de seu crédito.
No entanto, mesmo após a desistência, o credor poderá ajuizar nova execução, uma vez que a desistência constitui causa de extinção do processo sem julgamento do mérito e por se tratar de um ato meramente formal.
Haverá, também, a extinção da execução quando esta for infrutífera, ou seja, quando a inexistência de bens penhoráveis ou a não localização do devedor provocar a suspensão do processo e, findo o prazo prescricional, não for oferecido à penhora os bens do devedor.
Neste caso, haverá a prescrição intercorrente que está prevista no § 4º do artigo 40 da Lei n.º 6830/80 que fora introduzido em 2004 pela Lei n.º 11.051.
De acordo com esta norma, o crédito tributário encontra-se extinto pela prescrição e o processo será finalizado após o arquivamento provisório dos autos e transcorrido o prazo legal de cinco anos.
No entanto, há entendimentos diversos no sentido de que a interpretação literal do referido dispositivo contraria o instituto da prescrição.
Tal é o entendimento da Procuradora do Município de Fortaleza, Natércia Sampaio Siqueira, que afirma:
Em suma: não se configura os elementos e os fundamentos da prescrição, não ocorrendo o aporte principiológico necessário a justificá-la, a situação em que não se perfaz a negligência do sujeito ativo. Desta forma, não se pode pretender que o mero transcurso do prazo legal, após o arquivamento, leve à prescrição. Ë fato que, não raro o insucesso da execução após cinco anos de arquivamento dá-se por manobras ardilosas do executado, que não se mostra disponível a participar do feito e esconde seus bens, esvaindo-se da penhora e do arresto.Em outros termos, a execução, na maioria das vezes, frusta-se por conduta inaceitável por parte da executada e não por negligência ou inércia por parte da exeqüente, que mesmo utilizando-se de todos os meios disponíveis, não consegue localizar o sujeito passivo ou bens de sua titularidade. E em tais casos, se aceita a caracterização da prescrição intercorrente pelo decurso de cinco anos, tem-se o instituto da prescrição sem a ocorrência da inércia do credor, o que se mostra inadmissível.
Por fim, restará a extinção da execução nos casos de ordem processual que serão aqueles de inépcia da inicial, ou quando faltar qualquer pressuposto processual.
Importante lembrar que a extinção da execução fiscal, qualquer que seja o motivo, só produzirá efeito quando declarada por sentença, ou seja, após uma das causas acima, deverá o exeqüente informar ao juízo e requerer que aquele processo seja extinto gerando todos os seus efeitos legais.
Tendo em vista que o juiz extinguirá o processo executivo fiscal através de sentença, o recurso cabível será a apelação ou embargos infringentes, dependendo do valor da causa, cabendo também embargos de declaração no caso de omissão, obscuridade ou inexatidão.
Partindo da premissa que há necessidade de mudança no quadro atual das execuções fiscais, bem como sabemos que "quando todos pagam, todos pagam menos", conclui-se que é urgente o aumento da efetividade da LEF para resultar na tão esperada redução tributária.
É sabido que este diploma legal não está mais correspondendo à realidade, uma vez que sua efetividade "está em cheque" tendo em vista que, na prática, não consegue forçar o contribuinte a pagar os créditos do Poder Público, bem como leva anos no Judiciário.
Preocupados com a situação atual, desde janeiro de 2005, a Secretaria de Reforma do Judiciário do Ministério da Justiça tem realizado consultas públicas, como a consulta pública 01/2005, realizada em 28 de fevereiro de 2005 para estudar e propor a substituição da LEF.
Baseado em estudos estatísticos acerca da dívida da União e com o intuito de evitar um colapso total do Judiciário no âmbito das execuções fiscais, a comissão formada no âmbito do Conselho da Justiça Federal, coordenada pelo Ministro Teori Zavascki, composta de representantes do Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal (Juízes Federais Ricardo Perlingeiro e Maria Helena Rau de Souza), da Procuradoria da Fazenda Nacional (Dr. Vandré Augusto Búrigo), do Instituto Brasileiro de Direito Processual (Dr. Petrônio Calmon Filho) e da Universidade Federal Fluminense (Professores Leonardo Greco e Agostinho Netto), apresentou um anteprojeto de lei sobre a cobrança da dívida ativa em janeiro de 2005 que ainda não foi aprovado e que já sofreu alterações em março de 2006.
A versão original do anteprojeto sob análise cria um sistema híbrido onde há atuação tanto da administração, quanto do judiciário no processo de execução fiscal, tendo como finalidade acabar o triste e inadmissível quadro do Judiciário, onde se vislumbra uma constante e progressiva acumulação de processos de execução fiscal fadados ao insucesso.
4.1 Exposições de motivos do anteprojeto
Diante do caos que se encontra a cobrança da dívida ativa da Fazenda Pública e calcada em dezesseis tópicos como fundamentos e motivos para alterar e substituir a Lei n.º 6830/80, uma comissão do Conselho da Justiça Federal lançou o anteprojeto que pretende, entre outras inovações, propor a informatização do processo executivo com o intuito de acelerar o andamento processual e, conseqüentemente, a Fazenda Pública poder reaver seus créditos, desafogando o Judiciário.
Segundo notícia extraída do SINTAF/RS veiculada no jornal Valor Econômico, informou que o anteprojeto de lei tem as diretrizes em dois princípios, quais sejam:
Em primeiro lugar, cria uma execução fiscal administrativa, restringindo drasticamente as circunstâncias em que os processos são levados à Justiça. Outro princípio, que deve trazer mais dor de cabeça aos contribuintes, é a agilização do bloqueio dos bens dos devedores.
Um grande motivo que fez a comissão se reunir, estudar o modelo atual e elaborar o anteprojeto que propõe a alteração da cobrança da dívida ativa da Fazenda Pública está no fato de que a situação atual das execuções fiscais nos órgãos judiciais, bem como nos fazendários envolvidos encontrar-se bastante lenta e, em muitos casos, infrutífera.
De acordo com pesquisa estatística dos próprios órgãos fazendários e da Justiça (já mostrada nos capítulos anteriores), atualmente, há um número enorme de processos de execução fiscal em andamento no Poder Judiciário, muito deles, paralisados nas prateleiras do cartório judicial.
No entanto, sabe-se que o que colabora, e muito, para a lentidão e congestionamento da demanda judicial nas execuções fiscais é que os órgãos de defesa judicial da Fazenda Pública, mesmo quando sabem da improbabilidade de sucesso na cobrança judicial dos créditos, vêm-se compelidos, por dever legal, a promover a ação executiva tão-somente para interromper a prescrição.
Desta forma, visando acabar a atividade meramente burocrática e sem natureza jurisdicional de encontrar os devedores e seus bens passíveis de penhora que é, atualmente, transferida ao juiz, a proposta do anteprojeto orientou-se pela construção de um procedimento que possa integrar a fase administrativa de cobrança do crédito público com a fase judicial.
Para o ministro Guido Mantega, em artigo publicado na revista Consultor Jurídico, este anteprojeto irá beneficiar tanto o devedor quanto o credor porque:
Para o devedor, ter uma pendência é um problema, que o impede de obter crédito, de se tornar um cidadão comum e usufruir de todas as vantagens que tem um cidadão com ficha limpa. Já a União irá viabilizar o recebimento de suas dívidas. O Estado irá receber alguma coisa porque não adianta ter R$ 600 bilhões de dívida e receber 1% ao ano.
O ministro acrescentou que esta proposta "elimina superposição de instâncias, retira a atividade burocrática do Judiciário, assegura a ampla defesa, além de abreviar o procedimento de cobrança com menos custos para o Estado e o contribuinte."
Logo mais, ressaltou que:
os novos métodos não deixarão o contribuinte desprotegido. Ele terá a chance de regularizar a sua situação, que hoje ele não tem. Com a possibilidade de conciliação ele poderá se tornar novamente cidadão de primeira classe. No Brasil quem tem dívida não tem acesos a crédito.
Diante do momento oportuno, ou seja, aproveitando as mudanças no Código Processual Civil e ampla revisão das regras atinentes à execução civil, bem como objetivado em racionalizar, agilizar a cobrança judicial dos créditos públicos, reduzir o número de execuções levadas à Justiça e aumentar a eficiência dos processos de cobrança, foi lançado o anteprojeto de lei (anexo I) que está sob análise no Ministério da Justiça.
4.2 As principais mudanças do anteprojeto
O anteprojeto, aqui estudado e analisado, mantém as mesmas diretrizes da atual Lei de Execuções Fiscais, trazendo, inclusive, redação idêntica em vários artigos, resultando em pouca inovação e com pouco aspecto relevante.
De acordo com a proposta em estudo, uma das grandes inovações é a proposta para somente ser levado ao Poder Judiciário as demandas que, sem êxito extrajudicial, tenham alguma base patrimonial para a execução forçada, para se tornarem realmente efetivas e frutíferas.
Uma outra orientação da referida proposta foi a de aproximar o rito da execução fiscal com o da execução civil comum, simplificando a atividade judicial e cartorária, promovendo-se a incorporação, em benefício do crédito fiscal, das inovações que estão sendo propostas ao processo executivo no âmbito do Código de Processo Civil.
Em linhas gerais, as principais alterações que trarão impactos são:
4.2.1 Legitimidade ativa – Fundações de direito público
A primeira inovação trazida pelo anteprojeto aparece no seu artigo primeiro, pois altera a legitimidade ativa para propor execução fiscal.
Os autores do anteprojeto incluíram expressamente as fundações de direito público no conceito de Fazenda Pública, bem como conferiu à dívida ativa não tributária privilégios do crédito tributário, como por exemplo, a tipificação da fraude à cobrança de crédito tributário.
Tal dispositivo não é completamente novo porque a doutrina já havia afirmado que quando as fundações públicas tivessem a natureza jurídica de uma autarquia, seriam enquadradas como espécie deste gênero, podendo compor o pólo ativo da execução fiscal.
O anteprojeto apenas ratificou este entendimento, colocando expressamente que esta pessoa jurídica de direito público é legitimada para utilizar-se desta norma e ir ao Judiciário buscar seus créditos, acabando uma pseudo discussão sobre o tema.
4.2.2 Notificação administrativa obrigatória
Uma boa inovação contemplada pela proposta do anteprojeto em questão seria a disposição do artigo 4º, uma vez que se torna obrigatória a notificação do inteiro teor da Certidão da Inscrição da Dívida ao devedor.
Tal notificação será realizada na esfera administrativa, após o encerramento do procedimento administrativo que apura a certeza e liquidez do título.
Esta inovação irá trazer a execução fiscal para dentro dos entes fazendários, desafogando o Judiciário que deixará de ter inúmeros processos de execução fiscal onde o devedor não é localizado.
No entanto, mesmo na esfera administrativa, não será alterado o prazo para pagamento do débito, pois o devedor continuará tendo cinco (5) dias para efetuar o pagamento com juros, multa e demais encargos que foram indicados na CDA.
Esta notificação deverá ser feita no endereço do devedor com aviso de recebimento ou outro meio, podendo ser eletrônico, mas que possa comprovar o recebimento.
O anteprojeto não deixa expresso que a notificação deverá ser entregue somente nas mãos do devedor, permanecendo, desta forma, inalterado o fato de que qualquer pessoa está apta a recebê-la, bem como o prazo passará a contar do recebimento desta.
No caso do devedor não ser encontrado, a notificação deverá ser realizada por edital publicado em imprensa oficial local.
Importante ressaltar que o parágrafo 3º do artigo 4º deixou claro que este ato (notificação administrativa) terá efeito interruptivo da prescrição.
Desta forma, a prescrição da CDA será interrompida no recebimento da notificação e não mais na data do despacho do juiz que manda citar o devedor para efetuar o pagamento ou indicar bens a penhora, que retroagirá à data da propositura da ação.
Com esta modificação, a Fazendo somente poderá promover a execução judicial após o não pagamento da dívida na administração pública.
Ao elaborar tal dispositivo, a comissão tenta:
Porém, sabe-se que a prescrição, em créditos tributários é própria de normas gerais, reservada à alçada de lei complementar (artigo 146, II, letra b, da Constituição Federal).
Logo, para poder realizar tal alteração, o anteprojeto de lei propõe também alteração do parágrafo único, do artigo 174 do Código Tributário Nacional, para que seja incluída, entre as causas de interrupção da prescrição, a notificação ao devedor da inscrição do débito em dívida ativa.
Ressalte-se, por fim, que a notificação administrativa para pagamento da dívida já é utilizada na prática, porém tem pouca ou nenhuma efetividade, pois não coíbe o devedor ao pagamento do débito.
4.2.3 Prescrição "ex officio"
Uma alteração importante é a constante no artigo 15 do anteprojeto, uma vez que prever a possibilidade de ser decretada, de ofício, a prescrição pelo juiz.
Porém, este dispositivo não trará grandes inovações, pois o artigo 219, parágrafo 5º do Código de Processo Civil, pode ser utilizado subsidiariamente à LEF e já prever, após a alteração trazida pela Lei n.º 11.280/2006, que o juiz pode decretar de ofício a prescrição.
Tal dispositivo, inclusive, já fora corroborado por nossa jurisprudência.
Prescrição e poder público. Tendo em vista a nova regra de reconhecimento judicial de prescrição transformando essa matéria, nessa parte, em questão de ordem pública, o juiz deve proclamar a prescrição ainda que contra o poder público em todas as suas manifestações (União, Estados, Municípios, Distrito Federal, autarquias, empresas públicas fundações públicas e sociedades de economia mista federais, estaduais, distritais e municipais).
Execução fiscal. Prescrição. É inadmissível o conhecimento, de ofício, da prescrição da ação de execução fiscal, que tem como objeto direitos patrimoniais (CPC 219 § 5.0) (STJ-RT 706/184). Esse entendimento encontra-se superado pela superveniência da L 11280/2006 que, ao dar nova redação ao CPC 219 § 5.0, determina ao juiz o conhecimento ex officio da prescrição, providência que deve ser tomada inclusive contra o poder público.
Desta forma, pode-se perceber que os autores do anteprojeto não inovaram com tal dispositivo. No entanto, vale lembrar que o anteprojeto foi elaborado em 2005, quando o dispositivo do código de processo civil ainda não existia.
Porém, em benefício dos interesses do crédito público, os autores da proposta previram que tal ato deverá ser antecedido da oitiva da Fazenda exeqüente, que poderá opor eventuais causas suspensivas ou interruptivas do prazo prescricional, desconhecidas do julgador.
4.2.4 Foro da execução fiscal
No que se refere a competência para ajuizar a execução fiscal, o anteprojeto de lei traz inovação, declarando que esta deverá ser concentrada somente na Justiça Federal, não mais se utilizando do previsto no artigo 15, inciso I da Lei n.º 5010/66 , delegando a competência para a Justiça Estadual, uma vez que está havendo a interiorização da Justiça Federal.
Hoje, as execuções fiscais movidas contra devedores que residem no interior das capitais onde não há sede da Justiça Federal, muitas vezes são propostas na Justiça Estadual, pois os juízes federais declinam de sua competência.
No entanto, os autores do anteprojeto entendem que não deverá mais ser assim, bem como acreditam que não há prejuízo quanto aos devedores domiciliados ou que tenham seus bens em comarcas em que não atuem a Justiça Federal, pois nestes casos, poderão ser alcançados mediante execução por carta.
Sabe-se, no entanto, que as cartas precatórias tornam o procedimento mais longo e são bastante lentas. Desta forma, o anteprojeto estaria agilizando apenas parte das execuções fiscais, apesar de ser muito mais cômodo para a Fazenda Pública que concentrará suas causas em determinadas varas federais.
No mesmo sentido é o posicionamento do Bruno Mattos:
A perda da competência da Justiça Estadual para o processamento das execuções movidas por entidades federais é o pior aspecto do anteprojeto original. Parte de um pressuposto errado: a existência de "interiorização" da Justiça Federal. Embora já exista um grande número de varas federais no interior do Brasil, a esmagadora maioria das cidades do Brasil não conta ainda com varas federais nem as terão no curto ou médio espaço de tempo.
O anteprojeto também traz alteração no parágrafo único do artigo 6º, pois prever que ficará prevento para todas as demais execuções fiscais o juiz que for competente para a primeira.
A intenção desta norma foi de considerar como conexas as execuções fiscais entre as mesmas partes e propostas na mesma comarca ou subseção judiciária para evitar as dispendiosas diligências cartorárias.
4.2.5 Da penhora administrativa
A maior e mais discutida inovação trazida pelo anteprojeto é a que altera a petição inicial da execução fiscal afirmando que esta deverá ser instruída com a indicação dos bens a serem penhorados.
É a polêmica penhora administrativa, prevista no artigo 7º do anteprojeto que tanto traz discussão no meio acadêmico jurídico sobre sua constitucionalidade, bem como se pode ou não ser aplicada.
Quanto a esta alteração, a sociedade jurídica se divide, muitos juristas sendo contra por entenderem que a mesma viola princípios e garantias constitucionais, bem como por entenderem que trará mais corrupção ao procedimento e afirmar que não é a via correta porque o órgão que estipula o valor do crédito, não pode cobrá-lo e fazer a restrição do bem.
Outros juristas, mais inovadores, entendem que a mesma é juridicamente possível porque observa a todos os princípios fundamentais da Constituição Federal, vislumbrando apenas vantagens, caso venha a ser aplicada, bem como enfatizam que não é dever do Judiciário, mas sim, da Fazenda Pública localizar os bens de seus devedores, assim como acontece nos créditos dos particulares.
A proposta prevê, também neste artigo, que não haverá necessidade de memorial de cálculo demonstrativo da dívida ativa atualizada, como também ocorre hoje, mas afirma que as ações de execução fiscal só poderão ser impetradas quando houver indicação dos bens disponíveis para penhora.
Tal iniciativa foi proposta para forçar que os entes fazendários só utilizem a via judicial quando houver chance de êxito, solucionando o problema dos processos que ficam suspensos por anos nos cartórios judiciais.
O anteprojeto prevê que a indicação de bens a serem penhorados como garantia para o pagamento de dívidas seja feito pelas procuradorias, em caráter administrativo, antes de a questão ser levada à Justiça.
Desta forma, também teremos alterado o despacho inicial do juiz que deferirá a inicial proferindo ordem para penhora, avaliação e intimação, bem como em citação para opor embargos.
Apoiando a modificação do anteprojeto está o Kiyoshi Harada que afirma que a penhora administrativa deve ser implantada como mero pré-requisito para ajuizamento da execução fiscal, bem como entende que desafogará o Judiciário, indagando ainda aos opositores por que a penhora tem que permanecer sob os olhos do juiz. Neste sentido, questiona e conclui:
Aos opositores da penhora administrativa eu pergunto: a penhora de um imóvel X ordenada pelo juiz competente causa constrangimento menor ao devedor do que a penhora do mesmo imóvel X ordenada pela autoridade administrativa competente? Claro que não! A penhora efetivada por ordem da autoridade administrativa competente oferece maior dificuldade de defesa do que aquela ordenada pelo juiz competente? A resposta negativa se impõe! Então, pergunto, por que a resistência? Por que o juiz deveria ficar vigiando o ato de penhora?
O importante, o relevante juridicamente, é assegurar os princípios do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa. Se a penhora for excessiva ou se ela não obedecer a gradação prevista na lei sempre restará ao devedor impugnar essa penhora por ocasião dos embargos, regidos pelo princípio da eventualidade.
No mesmo sentido, encontra-se o presidente da Associação dos juízes federais do Brasil - AJUFE, que acredita que o número de casos na Justiça Federal poderá diminuir se parte da execução fiscal for feita administrativamente, acrescentando que é favorável a penhora administrativa dos bens do devedor. Vejamos:
ConJur — A execução fiscal poderia ser administrativa? Walter Nunes — Hoje, o Fisco apura administrativamente o débito fiscal, faz o lançamento, inscreve na dívida ativa e entra com uma ação na Justiça para cobrar a dívida. O juiz manda citar o cidadão. Se ele não pagar, o juiz manda penhorar os bens. O juiz é quem faz a execução. Na minha opinião, a administração deveria fazer o lançamento fiscal, a quantificação do valor e a identificação de quem é o responsável tributário, além de fazer a execução.
Percebe-se, entretanto, que o anteprojeto transfere parte do encargo do processamento da execução do Poder Judiciário para o Executivo, uma vez que possibilita que a Fazenda Pública escolha um de seus servidores para atuar como oficial de justiça, realizando atos processuais para a penhora administrativa.
Porém, há uma grande falha neste anteprojeto, pois não traz nenhuma regra para aqueles devedores que tem capacidade real de pagamento, mas não possuem bens passíveis de recair a penhora e que não pagam o débito enquanto procedimento administrativo, bem como após a notificação administrativa.
De acordo com o atual anteprojeto, tais devedores ficarão sem ser alcançados pela execução fiscal, pois se não efetuarem o pagamento a Fazenda não poderá acioná-los judicialmente para tentar conseguir, por exemplo, o bloqueio dos valores depositados em sua conta corrente.
Tal procedimento já é permitido atualmente pelo artigo 1º da Resolução n.º 524/2006 do Conselho da Justiça Federal.
4.2.6 Defesa do executado
Quanto à defesa do executado, não há novidade no anteprojeto, pois os autores deste adotaram o mesmo regime proposto na execução comum de título extrajudicial, onde os embargos podem ser deduzidos independentemente de garantia do juízo, não suspendendo, como regra geral, a execução.
Tal modificação foi proposta para garantir o princípio da ampla defesa, que fica viabilizado também ao executado que não disponha de bens penhoráveis ir ao Judiciário e se defender de eventuais excessos da Fazenda Pública.
O objetivo maior de tal modificação é alterar o atual sistema que contempla, em larga escala, embargos meramente protelatórios ou infundados, retardando injustificadamente a satisfação do crédito, pois de acordo com a proposta, os embargos não suspenderão obrigatoriamente a execução fiscal.
Esta alteração vem acompanhando a recente alteração trazida à execução civil, que prever no artigo 736 do Código de Processo Civil, alterado pela Lei n.º 11.382/06 que o executado poderá opor embargos à execução independente de penhora.
Para os autores do anteprojeto, a concessão de efeitos suspensivos aos embargos, bem como das demais ações autônomas ajuizadas pelo devedor e que se refere ao débito da CDA ficará condicionada ao concurso dos requisitos:
Uma inovação que a proposta traz se refere a possibilidade que o executado terá de se opor à dívida que está sendo executada por ação autônoma, onde será distribuída ao juiz da execução ou àquele que seja competente.
4.2.7 Informatização da execução fiscal
Tendo em vista a tendência e a real possibilidade da prática de comunicação dos atos processuais por meios eletrônicos, os autores do anteprojeto previram a possibilidade da utilização de recursos tecnológicos na execução fiscal, com o intuito de ter celeridade e economia processual.
Tal dispositivo previsto no artigo 4º, § 1º do anteprojeto também não inova, mas possibilitará, inclusive, que a execução fiscal seja realizada por processo virtual.
Porém, para que isto ocorra, o Tribunal, no âmbito de sua jurisdição, deverá disciplinar a adoção deste meio.
Tal norma não é inovadora porque a Lei n.º 11.280/2006 acrescentou o parágrafo único ao artigo 154 do Código de Processo Civil, onde prever a mesma norma do anteprojeto. Desta forma, se o Tribunal disciplinar, já poderá ser informatizado o processo de execução fiscal.
Tanto é possível, que no estado de São Paulo, já há tramitação da execução fiscal em processos virtuais, o qual está reduzindo bastante o nível dos processos, uma vez que está mais célere.
4.3 O reflexo no Judiciário e na sociedade
Sucintamente, o anteprojeto ora em análise, irá reduzir o número de execuções fiscais que estão tramitando no Judiciário, mas poderá não tornar mais efetiva a cobrança da dívida ativa do poder público em relação ao atual sistema.
Poderá ser menos efetiva porque há uma lacuna enorme no anteprojeto que deixará de apreciar as execuções fiscais daqueles devedores que não possuem bens passíveis de recair a penhora, mas que possuem capacidade real para pagamento.
Há casos de executados que não possuem bens livres para serem indicados como pré-requisito da petição inicial da execução fiscal, mas que se chamados ao Judiciário, firmam parcelamento e pagam o débito, pois possuem condições de quitar o débito, mas que não o fazem na esfera administrativa.
Desta forma, haverá um prejuízo para os cofres públicos incalculável, pois estes devedores não serão compelidos a efetuar o pagamento, muito menos, sofrerão restrições em seu crédito.
A intenção da proposta ao redigir tais mudanças foi positiva porque pensou em acelerar a ação executiva, diminuindo o tempo de trâmite no Judiciário, mas pecou quando não analisou os pormenores da realidade hoje enfrentada.
Em uma primeira visão, o Judiciário irá desafogar porque o número de execuções fiscais irá diminuir drasticamente, uma vez que a Fazenda Pública proceder de forma qualitativa, devendo nomear os bens à penhora no ajuizamento da inicial, bem como se sabe que uma boa parte da morosidade do Judiciário é atribuída à Fazenda exeqüente que demora a indicar a localização do executado ou os bens penhoráveis.
Ao analisar esta questão, Kiyoshi Harada é favorável ao projeto, pois afirma que:
Positivamente, a penhora administrativa é a medida que se impõe neste momento até mesmo para forçar a Administração a reestruturar as Procuradorias, tanto para localização dos contribuintes devedores, como também para encontrar os bens penhoráveis. Não é, nem deve ser, função do juiz ficar investigando o paradeiro do devedor. Sabe-se que a maior responsável pela paralisação dos autos em cartório é a espera de providências da exeqüente para localização do executado ou para indicar os bens penhoráveis.
No entanto, em um segundo momento, não muito distante, provavelmente o Judiciário irá receber inúmeras e diversas ações judiciais contestando a constitucionalidade e legitimidade do procedimento da execução administrativa, pois, temos o exemplo do Decreto-Lei n.º 70/66 que prevê um processo de execução administrativa para certas hipóteses, bem como sua constitucionalidade já foi firmada pelo STF e que, até o momento, é objeto de ações judiciais, obtendo, algumas, provimento favorável.
Neste sentido, Bruno Mattos Silva entende que:
os anteprojetos original e atual discutidos no âmbito do Ministério da Justiça dificilmente terão o condão de aumentar significativamente o grau de efetividade da cobrança dos créditos do Poder Público, pois estão assentados, tal como a Lei nº 6.830, de 1980, na penhora e venda forçada de bens, algo de efetividade bastante reduzida.
Desta forma, é importante ressaltar quais impactos tal projeto irá ter na sociedade, pois é fácil vislumbrar que o referido dispositivo irá prejudicar enormemente as autarquias públicas de pequeno porte, como exemplo dos conselhos profissionais, que sobrevivem de anuidades dos profissionais que nestes são inscritos.
Como muitos desses profissionais, às vezes, não possuem bens penhoráveis e a legislação em estudo não se preocupou em prever uma exceção para estes casos, pode-se ter um impacto enorme nos Conselhos Profissionais, pois o fato de não poder acioná-los judicialmente poderá desencadear em um incentivo para não mais pagar as anuidades destes.
Importante ressaltar, que os conselhos profissionais não recebem verba da União e são responsáveis pela fiscalização da profissão de uma determinada categoria profissional.
Conseqüentemente, se o anteprojeto não for modificado, prevendo uma imposição para o caso dos devedores que não possuem bens penhoráveis, poderá acarretar, em um médio prazo, no fechamento destas pequenas autarquias, trazendo, também prejuízo a sociedade como um todo que não terá um órgão que regularize e fiscalize as profissões.
Ressalte-se que a maioria das alterações trazidas pelo anteprojeto original já estão sendo aplicadas atualmente, sem grandes questionamentos, devido às alterações trazidas pelo Código Processual Civil que deve ser aplicado subsidiariamente.
Por fim, a proposta para modificar a LEF deverá ser mais estudada e discutida para poder verificar as possíveis conseqüências desta alteração e ser transformada em uma modificação positiva e que traga mais celeridade ao Judiciário.
Até há pouco tempo, era comum os juristas esquecerem da Constituição e aplicarem e interpretarem os ramos do direito exclusivamente com base na norma que regulamentava aquele assunto.
A Carta Magna era colocada de lado. Logo, um penalista teria a interpretação do caso concreto com base exclusivamente no código penal, assim como o civilista no Código Civil e os processualistas com os códigos processuais, sejam de penal ou trabalho ou outra área.
No entanto, a sociedade jurídica vem mudando, buscando a aplicação do direito ao caso concreto com base em exame da Constituição Federal juntamente com a legislação infraconstitucional referente ao tema abordado.
Desta forma, tendo em vista a análise retro do anteprojeto de lei para modificar a execução fiscal, importante levantarmos um breve estudo para concluirmos se esta proposta, que tanto vem levantando polêmicas no meio jurídico, é ou não constitucional.
Sabe-se que este anteprojeto de lei é uma proposta legislativa que parte de exame da realidade existente, bem como está sendo proposto por ente legítimo para acelerar as ações executivas e aumentar a arrecadação da Fazenda Pública.
O referido anteprojeto, que está tramitando a lado do anteprojeto proposto pela Fazenda Nacional, bem mais radical, conhecido no meio tributário como execução fiscal na administração - EFA, ainda está sob análise da câmara, não sendo afirmado se o mesmo é ou não constitucional.
No entanto, já há vários juristas que são contra ao anteprojeto afirmando que este não irá se transformar em lei por ferir diretamente aos princípios constitucionais como o do contraditório e da ampla defesa, bem como se virar lei, trará insegurança jurídica porque será objeto de ações diretas de inconstitucionalidade (Adins).
Já do outro lado, os que são favoráveis à mudança, entendem que a proposta não ofende à Carta Magna em seus princípios e enfatiza apenas que deverá averiguar que o mesmo está obedecendo aos princípios do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa quando passa a penhora para a esfera administrativa.
5.1 Da constitucionalidade das leis
O Brasil é um estado democrático de direito, um estado constitucional, onde "assume o texto constitucional a posição de delimitador do horizonte de possibilidades para elaboração de todo o arcabouço legislativo de uma nação e de condição de validade de todos os atos administrativos e legislativos."
Tal árdua tarefa é realizada de forma preventiva ou repressiva através do controle de constitucionalidade, segundo recorda Paulo Lopo que é:
a aferição da observância de um ato normativo (sobretudo a lei) com relação à Constituição. Nessa aferição, terão de ser examinados os elementos formais, por exemplo, a competência do órgão que editou o ato jurídico e os elementos materiais, ou seja, o respeito aos direitos e garantias constitucionais.
Portanto, a análise da constitucionalidade das espécies normativas previstas no art. 59 da Constituição Federal compreende em compará-las com determinados requisitos formais e materiais para verificar a compatibilidade destas com as normas constitucionais.
Há, no ordenamento jurídico brasileiro, dois sistemas de controle de constitucionalidade: político e jurisdicional.
Ressalte-se que eles podem coexistir porque uma forma não exclui a outra.
Partindo do conceito supra, bem como da previsão legal que no direito brasileiro há o controle de constitucionalidade exercido pelos três poderes: Legislativo, Executivo e Judiciário, onde no primeiro, o controle de constitucionalidade aparece através das Comissões de Constituição e Justiça, analisando os projetos de lei sob a Constituição; no segundo, o Chefe do Executivo confere o poder-dever aos projetos de lei em descompasso com a Constituição Federal e no terceiro, Poder Judiciário, o controle será repressivo, retirando do ordenamento lei contrária à Constituição, concluímos juntamente com Alexandre de Moraes que "ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de espécie normativa devidamente elaborada de acordo com as regras de processo legislativo constitucional."
Observa-se que tanto no Legislativo (comissões de Constituição e justiça) quanto no Executivo (veto jurídico), o controle de constitucionalidade é preventivo e acontece antes da espécie normativa inconstitucional integrar o sistema jurídico brasileiro e passar a ter vigência e eficácia no ordenamento jurídico.
Já o controle repressivo exercido pelo Poder Judiciário pode ser: reservado ou concentrado (via de ação) e difuso ou aberto (via de exceção ou defesa).
O doutrinador Nelson Nery Júnior ensina que:
Caso a lei infraconstitucional esteja em desacordo com o texto constitucional, não deve, por óbvio, ser aplicada. Comprovada a divergência: a) se a norma legal tiver sido editada antes da Constituição Federal terá ocorrido o fenômeno da não recepção, pela nova ordem constitucional, da lei com ela incompatível; b) se a norma legal tiver sido editada depois do advento da Constituição Federal, será inconstitucional e não poderá ser aplicada para a solução do caso em concreto: estará sujeita a declaração in concreto ou in abstracto dessa referida inconstitucionalidade.
Por sua vez, se a lei ou o ato normativo forem declarados pelo Supremo Tribunal Federal inconstitucional, serão estes nulos, destituídos de eficácia jurídica, onde o ato declarado inconstitucional irá alcançar, inclusive, os atos pretéritos com base nela, pois retroagirá até a decretação de sua nulidade, possuindo, desta forma efeito ex tunc.
Analisando este tema, especificamente os efeitos de declaração de inconstitucionalidade, Alexandre de Moraes expõe que "tais efeitos ex tunc (retroativos) somente tem aplicação para as partes e no processo em que houve a citada declaração."
Porém, se o ato normativo for anulável, esta decretação terá efeito ex nunc, ou seja, seus efeitos serão a partir da publicação da citada resolução do Senado Federal que suspenderá a execução no todo ou em parte da lei ou ato normativo.
Salienta-se, então, que o operador de direito deverá ser um conhecedor do controle de constitucionalidade, uma vez que é certo que se deparará, em suas causas jurídicas, com o questionamento da constitucionalidade de leis ou atos normativos.
Tal fato, ou seja, a tendência à constitucionalização do direito, é estudada por Nelson Nery Júnior, que salienta que:
é cada vez maior o número de trabalhos e estudos científicos envolvendo interpretação e aplicação da Constituição Federal, o que demonstra a tendência brasileira de colocar o Direito Constitucional em seu verdadeiro e meritório lugar: o de base fundamental para o direito do País.
Assim, conclui-se concordando com o professor Alexandre de Moraes quando afirma que no Brasil:
O controle de constitucionalidade configura-se, portanto, como garantia de supremacia dos direitos e garantias fundamentais previstos na Constituição que, além, de configurarem limites ao poder do Estado, são também uma parte da legitimação do próprio Estado, determinando seus deveres e tornando possível o processo democrático em um estado de Direito.
5.2 Da constitucionalidade do anteprojeto de lei de cobrança da dívida ativa
A referida proposta, que ainda está sob análise no Ministério da Justiça, já desperta interesse na sociedade jurídica que questiona se é ou não constitucional, uma vez que, dentre outros pontos, a Certidão de Dívida Ativa – CDA terá a eficácia quase judicial de um título executivo, como a sentença, assim como trará a mudança nos requisitos da inicial que será acrescida de mais um tópico, a indicação de bens à penhora.
O anteprojeto de lei em estudo foi proposto por uma comissão do Conselho da Justiça Federal que tentou observar os princípios constitucionais, bem como tem legitimidade para propor alterações na legislação brasileira.
5.2.1 Princípio da legalidade e da reserva legal
Este princípio, previsto no art. 5º, inciso II da Carta Magna, existe para proteger o cidadão e tem como objetivo impedir que o Estado haja com arbitrariedade e crie obrigações para os indivíduos.
Este princípio é um dos mais importantes do ordenamento jurídico pátrio, pois é um dos sustentáculos do Estado de Direito, impedindo que toda e qualquer divergência, conflitos, lides se resolvam pelo primado da força, mas, sim, pelo império da lei.
De acordo com Celso Bastos e Ives Gandra Martins, citados por Alexandre de Moraes,
o princípio da legalidade mais se aproxima de uma garantia constitucional do que de um direito individual, já que ele não tutela, especificamente, um bem da vida, mas assegura ao particular a prerrogativa de repelir as injunções que lhe sejam impostas por uma outra via que não seja a da lei, pois como afirmava Aristóteles, ‘a paixão perverte os Magistrados e os melhores homens: a inteligência sem paixão – eis a lei.’
Entretanto, o princípio da reserva legal, não menos importante, é decorrente do princípio da legalidade, porém, é menos amplo que este, mas é concreto e incide sobre os campos materiais especificados pela Constituição.
Este princípio tem o objetivo de preservar as garantias individuais e limitar o poder do Estado sobre o cidadão, tendo assim, grande importância no direito Penal e Tributário.
É de grande importância nestes ramos do direito porque afeta a vida dos particulares, ou por intervir no direito de liberdade, ou por avançar sobre a propriedade ou por atacar o patrimônio.
Através do princípio da reserva legal, também conhecido de reserva de lei, temos que no Brasil, determinadas matérias somente podem ser tratadas mediante lei, sendo vedado o uso de qualquer outra espécie normativa.
O doutrinador André Ramos Tavares, citado por Adriano dos Santos Iurconvite ensina que:
A reserva de lei reporta-se a divisão de competências no seio do Documento Constitucional. Assim, quando, v. g., no artigo 175, parágrafo único, IV, prescreve-se que compete à lei dispor sobre a ‘obrigação de manter serviço adequado’, fica claro que, embora já existindo essa obrigação, vale dizer, já sendo uma realidade jurídica (constitucional), ainda assim pretendeu o legislador constituinte que ela fosse explicitada por lei.
Seguindo o mesmo entendimento, o doutrinador José Afonso da Silva leciona que "quando a Constituição reserva conteúdo específico, caso a caso, à lei, encontramo-nos diante do princípio da reserva legal".
Analisando o anteprojeto de lei que altera a cobrança da dívida ativa da Fazenda Pública, pode-se dizer que está pautado nos referidos princípios, não os ferindo nem os confrontado.
Não há vício neste anteprojeto no que se refere aos princípios em tela porque está sendo criado por ente competente através do dispositivo legal que a Constituição exige, ou seja, está sendo proposta a criação de uma lei dentro dos trâmites constitucionais previsto na subseção III da Carta Magna.
5.2.2 Princípio do direito de ação
Este princípio é um direito público subjetivo do cidadão, previsto no art. 5º, inciso XXXV da Constituição federal. Através deste, o Poder Judiciário deverá aplicar o direito ao caso concreto, não podendo o legislador nem ninguém impedir que o jurisdicionado vá à juízo deduzir sua pretensão.
Assim, conforme explana Nelson Nery, "podemos verificar que o direito de ação é um direito cívico e abstrato, vale dizer, é um direito subjetivo à sentença tout court, seja essa de acolhimento ou de rejeição da pretensão, desde que preenchidas as condições da ação."
Acrescenta Alexandre de Moraes que "o Poder Judiciário, desde que haja plausibilidade da ameaça ao direito, é obrigado a efetivar o pedido de prestação judicial requerido pela parte de forma regular, pois a indeclinabilidade da prestação judicial é princípio básico que rege a jurisdição."
No mesmo sentido doutrina o professor Hugo de Brito Machado, afirmando que "qualquer lei que, direta ou indiretamente, exclua a apreciação do Poder Judiciário relativamente a qualquer lesão, ou ameaça a direito, será inconstitucional."
Por tanto, sobre o prisma deste princípio, o anteprojeto em análise, aparentemente, é constitucional porque não impede que aqueles que se sentirem lesados recorram ao Judiciário para solucionar a lide.
Há esta previsão até mesmo quando a Fazenda indique bens do devedor para penhora, que será pré-requisito da inicial.
Em consonância com a proposta, se o executado entender que houve excesso de penhora ou que o débito é indevido, é previsto no artigo 9º do referido anteprojeto que o mesmo ajuíze ação autônoma para questionar a cobrança da dívida pela Fazenda.
O anteprojeto não proíbe o devedor de ir ao Judiciário e se opor a cobrança da dívida, mas comete excesso e fere a Constituição quando tenta suprimir instâncias e estabelecer condições para este demandar.
Não é permitido estabelecer limites para o ajuizamento de ações.
No entanto, tentando evitar que o contribuinte questione a mesma dívida em esferas distintas, administrativa e judicial, possibilitando decisões diferentes, os autores da proposta foram infelizes e inobservaram o dispositivo constitucional, criando uma condição para o contribuinte questionar a dívida judicialmente, obrigando-o a renunciar a esfera administrativa.
Ao estipular tal condição, o dispositivo deste artigo se transforma em inconstitucional. Porém, se retirado ou transformado em opção do contribuinte, sanado estará o vício.
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