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KEYWORDS: family contribution, school management, school democratization, process of teaching and learning
O presente trabalho, subordinado ao tema "Contribuição da Família na Gestão da Escola", é o resultado duma pesquisa realizada na Escola Primária Completa 1º de Maio da cidade de Inhambane, no intuito de analisar os modos e as formas da contribuição da família na gestão da escola. A pesquisa pretende apresentar os diferentes modelos e formas de participação que nos auxiliem a perceber melhor o enquadramento teórico da contribuição da família na gestão da escola; demostrar, através da pesquisa do campo, a importância da contribuição da família na gestão da escola; conhecer as estratégias para incentivar a família a contribuir na gestão da escola e propor outras estratégias ou práticas que dinamizem a contribuição da família na gestão da escola.
A investigação que vem dar corpo ao tema fundamenta-se numa pesquisa de campo, cuja metodologia é mista, baseada em questionário destinado a um grupo de professores e ao órgão administrativo e uma entrevista destinada às famílias. Esta metodologia possibilitou obter resultados concretos e fiáveis que levaram o estudo a conclusões práticas.
O processo de ensino e aprendizagem enfrenta vários problemas, entre os quais, constatamos as dificuldades da família em contribuir na gestão da escola, enquanto protagonista da educação dos filhos. Muitas vezes, a família relega as suas responsabilidades à escola, ou seja, preocupa-se pouco, aliás dá pouco tempo em acompanhar a vida educativa dos filhos envolvendo-se noutras actividades (pessoais, profissionais, económicas, financeiras) que lhe faz perder a atenção à educação dos próprios filhos. Basta matricular os filhos, a família acha que já terminou a sua missão ou responsabilidade. Assim, encontramo-nos numa situação de demissão ou de desinteresse da família em relação a educação dos filhos. A escola, por seu lado, basta acolher o educando, não se preocupa em associar a sua família nas diversas actividades ou na sua gestão, a não ser convocá-la quando houver uma situação preocupante com o educando.
A ausência da família na gestão da escola tem repercussões negativas no processo de ensino e aprendizagem em termos da dedicação nos estudos da parte dos educandos, do desempenho de professores e de resultados escolares, dado que é a família que pode ajudar à escola a descobrir as dificuldades dos educandos, a planificar juntos com a escola as actividades em prol da educação dos alunos, decidir sobre os aspectos relevantes da educação e perspectivar o futuro educativo dos mesmos.
Em função de todas as informações supra anunciadas, deseja-se desenvolver uma pesquisa com a qual se anseie responder à pergunta "De que forma a família pode contribuir na gestão da escola?".
Para responder a esta pergunta, avançámos os seguintes hipóteses: a família pode tomar parte nos diferentes órgãos da gestão da escola e em tudo que envolve o processo de ensino e aprendizagem; a família pode colaborar na elaboração do projecto educativo, no regulamento e participar nas reuniões e outros encontros organizados pela escola, a família pode desempenhar algumas tarefas ou responsabilidades na escola.
No que tange à estrutura do trabalho, a nossa abordagem consta de quatro capítulos. No primeiro capítulo, procuramos apresentar as definições e termos essenciais usados no trabalho para facilitar a compreensão do tema da pesquisa e os modelos teóricos que sustentam o tema em estudo. No segundo capítulo, tratamos da construção duma escola democrática aberta à comunidade educativa, que tem fundamento na Lei moçambicana. No terceiro capítulo, tratamos da metodologia que usamos ao longo do trabalho para tornar possível a pesquisa realizada. No quarto capítulo, apresentamos os resultados obtidos no campo de pesquisa através do questionário e entrevista dirigidos a um grupo de informante da EPC 1º de Maio e às famílias. Apresentamos os resultados referentes aos órgãos de gestão da escola, as formas em que as famílias contribuem na gestão da escola, a importância da contribuição da família na gestão da escola e as estratégias para incentivar as famílias a contribuírem na gestão da escola.
A escolha deste tema resulta de dois aspectos fundamentais da nossa vida pessoal e profissional. O primeiro tem que ver com a consciência do nosso percurso profissional como educadores, percurso que exigiu a colaboração entre a família e a escola no acto de educar. O segundo surge como consequência da nossa acção pastoral que consiste em caminhar com as famílias ajudando-as e mostrando-lhes o melhor caminho para educar os filhos. A escolha do tema relaciona-se também com o facto de vermos nestas últimas décadas as transformações que se fazem sentir na estrutura das famílias, transformações estas que afectam a estrutura escolar e, consequentemente, modifica o processo de ensino e aprendizagem. Achamos que a contribuição da família na gestão da escola poderá ajudar a melhorar a qualidade do processo de ensino e aprendizagem e dar um impacto positivo na educação dos filhos. Assim, a indispensabilidade da contribuição da família na gestão da escola incitou-nos a reflectir com profundidade na temática abordada nesta investigação, de modo a encontrar os pontos que unem a família e a escola para que juntos se envolvam na gestão da mesma. Escolhemos este tema para apoiar a ideia de que é com a família, coadjuvada pela escola, que a criança cresce, desperta a sua curiosidade de conhecer o mundo e desenvolve o desejo de aprender ainda mais. A escola por si só, não pode conseguir educar os filhos por ter um conhecimento parcial destes. Optamos em fazer o estudo numa escola primária, porque achamos que é neste nível de ensino que se precisa mais a presença permanente da família para apoiar a criança que ainda não tem nenhuma experiência escolar.
CAPÍTULO I
Neste capítulo, pretendemos fundamentar o tema da nossa pesquisa, partindo da definição dos termos família, escola, gestão da escola e processo de ensino e aprendizagem. Com base nas diversas abordagens ou modelos, iremos tratar de alguns temas que mostrem as diferentes visões de vários autores relativos ao tema desta pesquisa, que é a contribuição da família na gestão da escola. Tendo em conta o objecto do nosso trabalho, serão desenvolvidos os pontos seguintes: a complementaridade escola-família, as formas e níveis de participação e a necessidade de promover a cultura da contribuição na gestão da escola.
Família: conceito e função
O uso do termo família é ambíguo. Isto significa que, pode ter significados muito diferentes dependendo de como está sendo usado. Para percebermos o seu verdadeiro sentido achamos melhor defini-lo etimologicamente, dar um breve percurso evolutivo e defini-lo no contexto africano.
Etimologia e o uso do termo "família"
A palavra família procede do latim famulus, que significa conjunto de escravos e servidores que viviam sob o mesmo tecto, os domésticos (AAVV, 2001:280); esta palavra famulus, por sua vez, provém do sânscrito faama-dháman, (radical "dha") que significa pôr, pousar, assentar, estabelecer (MARTINEZ, 2007: 122). Nesta etimologia há ideia de fixação e estabilidade. Esta ideia ligou-se a certos bens que, por isto mesmo, chamam-se imóveis, sobressaindo dentre eles, o solo, a terra e a casa. Assim, podemos definir a família como
Grupo social duradouro com base no casamento e relacionamentos de sangue, exercendo influências hereditárias e ambientais das principais dimensões sobre o recém-nascido. Via de regras, os pais e seus filhos dependentes constituem a família. Como grupo primário, a família com filhos é mantida em conjunto pelo parentesco e relações íntimas marcadas por carinho, afeição e apoio, bem como pela partilha mútua em várias actividades e interesses (PIKUNAS, 2009:68).
Na sua definição, Pikunas sublinha o aspecto da descendência e da união do sangue como elementos essenciais para conceitualizar a família, e mostra que é nela que a criança, desde o nascimento, recebe dos pais, afeição, carinho e uma educação apropriada para a integração na vida social. Neste sentido, podemos afirmar que a família é a primeira e mais básica escola de socialidade dado que nela se aprende a convivência com os outros e apresenta-se como lugar adequado para o crescimento e a educação das novas gerações.
No sentido jurídico, a família, é constituída pelas pessoas que se encontram ligadas pelo casamento, pelo parentesco, pela afinidade e pela adopção (CAMPOS, 1997:27). Na mesma ordem de pensamento, a Lei da Família aprovada pela Assembleia da República de Moçambique, em 25 de Agosto de 2004, nos artigos 1 e 2, diz que a família compreende todas as pessoas ligadas por vínculos de parentesco, casamento, afinidade e adopção, e acrescenta, no Art. 5, que as características das relações familiares são duradouras e permanentes e os direitos familiares são pessoais, indispensáveis e irrenunciáveis.
Em todas as definições, há sempre um elemento comum, que é a ideia de parentesco por filiação e linhagem. Por isso, quando se pensa na família, pensa-se no casamento, no parentesco, na afinidade e na adopção.
A família não é, em si, uma pessoa jurídica, como a é uma empresa, porque não tem interesses próprios. Quando a lei fala de bem da família, refere-se aos bens ou aos interesses de todos membros. Nesse sentido, a família é um espaço para a realização pessoal dos membros.
O antropólogo STRAUSS apud MARTINEZ (2007:122), sem negar a grande difusão do conceito de família, critica a sua naturalidade e universalismo nestes termos:
podem existir, de facto, sociedades que conformam as próprias estruturas familiares de forma diferente. A família garante a protecção da actividade reprodutiva, a formação de um centro gerador de afectos e o espaço da autoridade. O núcleo que nos oferece a natureza, isto é, a mãe e os filhos, junto com a função de protegê-lo, recebe expressões concretas diversificadas, segundo cada uma das culturas e dos contextos históricos. Daí nascem os diversos tipos de família que encontramos nas diversas áreas culturais e através dos tempos.
O autor mostra que a família é a asseguradora da vida dos membros no concernente à sua protecção, educação, afeição, etc. É ela que oferece o essencial para a sobrevivência e faz do indivíduo um homem. Como asseguradora, a família é a garante da educação dos seus membros, tendo em conta as exigências culturais da determinada sociedade. Portanto, "a família é a primeira e mais básica das instituições sociais, sobretudo porque assegura a renovação das gerações (o que, como é evidente, só pode ser assegurado por união entre um homem e uma mulher)" (PATTO, 2013: 64).
Culturalmente, a família é um grupo tão importante cuja ausência significa o desamparo da criança. Isto determina que, na ausência da família, deva constituir-se um obrigo, que sirva de "família substituta". Como avança BOCK (2006:249), "a criança ou o adolescente precisa de uma família substituta ou devem ser abrigados em uma instituição que cumpra suas funções materna e paterna". Deste modo, ter família é um direito para a criança; é a família que responde a todas as solicitações que tem que ver com a educação da criança. Na ausência dos progenitores biológicos, outros membros da família (restrita ou alargada) ou outras instituições devem desempenhar esta função da família. Assim, privar a criança deste direito é privá-la de todos os contactos existenciais para a construção da sua própria identidade como ser humano.
Breve percurso evolutivo do termo "família"
Ao longo do tempo, o termo "família" conheceu muitas transformações antes de ter o significado que temos hoje. Segundo MARTINEZ (2007), este termo foi criado na Roma Antiga para designar um novo grupo social que surgiu entre as tribos latinas, ao serem introduzidas à agricultura e também à escravidão legalizada.
Com o tempo, a palavra família passa a referir-se, exclusivamente, às pessoas, e entre estas, as que se unem por um laço de parentesco. A ideia de família, portanto, remonta ao aparecimento do homem sobre a terra, constituindo-se num facto natural, numa imposição da natureza. Assim, MURDOCK apud MARTINEZ (2007:122) considera fundamental o grupo composto por pai, mãe e filho (nuclear, ou como se fosse um átomo), e mais outros agrupamentos maiores, da mesma índole (como se fossem moléculas) para falar da família. Esta maneira de considerar a família coincide com a concepção romana clássica que fala da "família natural".
A família é baseada no casamento e no vínculo de sangue. Deste modo, a família natural tem que ver com o grupo restrito constituído apenas pelos cônjuges e pelos seus filhos, e que tem o casamento como base fundamental.
A família no contexto africano
Na concepção africana, não existe uma família isolada. Todas as famílias são dependentes umas das outras. ALFANE (1996:17) mostra que "a família é o primeiro grupo que o indivíduo conhece logo que nasce, no qual começa a integrar-se na vida comunitária. Segundo a tradição, a família nuclear, constituída por mãe, pai e filhos, não forma um grupo independente; é, sim, um entre vários membros da família alargada".
Alfane faz-nos ver que a família é a primeira estrutura que o indivíduo conhece e onde recebe a primeira educação. Os membros que a constitui são ligados por laços que fazem com que todos permaneçam unidos e sejam dependentes uns aos outros. Assim, os laços familiares vão da família restrita até à família alargada. Neste sistema familiar, todos concorrem para o bem da comunidade, e por isso, uma situação que afecta um dos membros, envolve todos, e todos são responsáveis pela educação dos filhos. Por esta razão, MARUJO et al (1998:10) defendem que a família deve ser compreendida numa acepção alargada porque, cada vez que refere a mães e pais, estaremos não só a pensar em progenitores biológicos, mas também em pais e mães adoptivos, em padrastos e madrastas, em avós e avôs, em encarregados de educação, em educadores em geral.
A família é uma realidade muito complexa, olhando para os membros que a constitui e os laços criados para as relações que os unem. Limitar a família ao aspecto biológico seria diminuir a sua abrangência.
Na nossa opinião, considera-se família o ambiente que cuida dos filhos assim como de todos os membros que vivem no mesmo seio, unidos ou não por laços de afinidade ou de sangue. Em outras palavras, a família define-se fundamentalmente pela relação interpessoal, e é constituída por um conjunto de relações interpessoais pelas quais toda a pessoa fica inserida na família. As relações interpessoais na família fazem dela uma comunidade de pessoas (VIDAL, 1991:266).
Um outro aspecto a considerar, no entendimento que os africanos têm de família é a ligação mulher-casa e/ou mulher-família. A mulher é, sempre, a casa e/ou família. Disso, resulta que hoje as famílias se desagreguem pelo distanciamento da mulher em relação a elas, na potenciação do poder económico. Aqui, há um apelo aos que conduzem a sociedade, no sentido de se voltarem à solidificação das famílias.
O conceito de família, tal como definido pelos autores referenciados, apresenta uma certa semelhança e divergência. Converge no facto de considerar a família como lugar de socialização ou educação dos filhos e diverge quanto à sua abrangência, dado que alguns autores consideram a família no seu aspecto restrito, isto é, considerando o aspecto hereditário, biológico ou da união de sangue; e outros, consideram a família como sendo mais abrangente, isto é, não considerando apenas o seu aspecto biológico. Mas como tal, não há uma contradição se consideramos o termo no contexto em que se aplica. No contexto europeu por exemplo, quando se trata de família, já se pensa em pai, mãe e filhos nascidos do mesmo pai e mãe. Pelo contrário, falando do mesmo termo família na África, em geral, ou em Moçambique, de forma particular, já não se pensa em pais e filhos, mas sim, em todos, incluído, tios, primos, etc. Portanto, o paralelismo forçado entre as línguas contribui em grande medida para a equivocidade do termo família. Aqui o termo família é compreendido no contexto em que está sendo usado.
Escola: origem, institucionalização e função
A escola, tal como se apresenta hoje, é o resultado de um longo processo. Para a compreensão disto, ocupar-nos-emos com a sua origem e institucionalização.
A origem do conceito
O vocábulo "escola" vem do grego "schola" que significa ócio, dedicado ao estudo, ocupação literária ou lição. No sentido concreto, a mesma palavra "schola" ou "ludus", em latim, significa lugar onde se ensina (AAVV, 2001: 604). Portanto, escola é a instituição onde se recebe ensinamento. Como instituição, a escola apareceu de forma progressiva. Assim, com o aparecimento da linguagem escrita como forma de comunicação sem fronteira, aprender a ler e escrever necessitou da presença dum mestre (PIMENTA at al, 1999: 89) para a transmissão dessa linguagem e preparação dos jovens para desempenhar certas responsabilidades nos trabalhos. Assim formados, os jovens tinham facilidade de compreender e interpretar o que se devia fazer como tarefa.
Breve percurso evolutivo e institucionalização da escola
A escola foi o resultado da divisão social do trabalho dado que necessitava de formar especialistas e desenvolver novas competências sociais básicas, que a família não podia assegurar por si própria (IBIDEM: 90). É desta maneira que as escolas, no princípio, educavam unicamente as minorias que recebiam e precisavam de uma educação especializada. Os outros, a massa do povo, não necessitavam dessa preparação especial (PIMENTA at al, 1999: 90). A escola apareceu para satisfazer as demandas da sociedade e para a transmissão da cultura de maneira formal, dado que esta acontece informalmente na família e em outros ambientes.
Durante longos milénios, a educação como processo de interacção social e socialização, sempre existiu. Realizou-se quase sempre fora da escola. A família, a tribo ou o clã, as Igrejas, a profissão e o meio social em geral assumiram a função de educar os jovens para a vida social. Todavia, desde muito cedo na história também se encontram escolas destinadas a preparar os jovens para objectivos específicos (PIRES, 2001:passim).
A escola nasceu para atender a uma certa classe da sociedade e responder às necessidades de assegurar o trabalho. À medida que aumentavam as demandas nos diversos sectores da vida da sociedade, aumentava também a necessidade de formar pessoas para cobrir essas demandas. Assim, a ideia da escola começou a se desenhar, mas organizadas ao lado das igrejas e conventos. Só depois é que se expandiu a escola começando pela Europa e, depois, avançou-se para o resto do mundo.
Até século XX, só nos países mais desenvolvidos do mundo foram abertas as portas para todo o tipo de criança, embora já nos finais do século XIX, por exemplo, quase todo o grupo etário correspondente ao ensino primário estava escolarizado nos países europeus mais desenvolvidos [...]. Na Idade Média, as escolas foram propriedades da Igreja católica. Esta organizou, nos conventos, mosteiros e catedrais, a escola. Através destes, contribuiu bastante para que a instituição escolar fosse um lugar para uma educação estruturada e transmissora dos valores. A notar que a educação escolar só recentemente atingiu a dimensão universal que hoje lhe é reconhecida (PIMENTA at al,1999: 90).
A função da escola
Segundo PIMENTA et al (1999:89), a escola como instituição, responde à necessidade social de transmitir cultura, socializar o indivíduo e prepará-lo para desempenhar um papel na sociedade. Assim, a escola é uma instituição social básica vocacionada a satisfazer interesses e necessidades comuns.
Em idêntica posição se associa o pensamento de MARTINS (1999:113), que confirma que "a escola é a instituição por meio da qual é transmitida a herança social e, ao mesmo tempo, é responsável pelo desenvolvimento de novos conhecimentos".
Na perspectiva de Martins, a escola é considerada como meio usado pela sociedade para a transmissão da cultura que constitui a herança da sociedade. Esta herança é transmitida pela geração adulta à geração jovem. É um pensamento que corresponde ao que acontece actualmente.
A escola, com efeito, por meio da transmissão de conteúdos, incute uma nova cultura aos alunos e ajuda-os a apropriar-se de todo o conhecimento que adquirem, relacionando-o com a nova realidade.
A educação adquirida na escola não é só para satisfazer as necessidades da sociedade, mas também, e sobretudo, para humanizar o ser humano. Assim, como instituição educativa, a escola é um ambiente educativo ao serviço da sociedade. A sua presença assegura a continuidade da educação dos filhos. Por esta razão, há mesmo necessidade de a escola estar em perfeita sintonia com a família.
A escola é um grupo social em que o professor realiza um trabalho de superação das diversidades, reduzindo-as à unidade. Por meio do professor, o aluno tem acesso à cultura formal, o que faz da escola um grupo intermediário entre grupos primários, como a família e os grupos secundários. Na escola, desenvolve-se um processo socializante que objectiva integrar o educando na comunidade, recapitulando os resultados da experiência social, transmitindo-lhe os padrões do grupo social e cultural a que pertence. Além disso, a escola é um instrumento consciente de aperfeiçoamento social (MARTINS,1999: 49).
Para Martins, a escola é uma instituição destinada a socializar o indivíduo, integrando-o na sociedade e transmitindo-lhe os padrões do grupo social a que pertence. Esta transmissão da herança realizada na escola é feita de forma diferente daquilo que é transmitida pela família. É por esta razão que o autor trata a escola como sendo instrumento consciente de aperfeiçoamento social, considerando a transmissão feita pela família de não consciente, dado que, as crianças adquirem herança à base das experiências do dia-a-dia. Na nossa opinião, achamos que, independentemente da metodologia, dos meios ou procedimentos usados para transmitir a herança, quando bem adquirida e encarrada na vida do individuo, não há problema. O importante é que a criança se identifique com a sua cultura. Portanto, a transmissão da herança feita na família, como na escola, ajuda a pessoa a se integrar na sociedade. A diferença é que a da escola é estruturada e a da família, não.
PIMENTA et al (1999: 93) mostram também que fazem parte das funções da escola,
proporcionar conhecimentos e desenvolver capacidades que permitam aos indivíduos adquirir as competências básicas necessárias à sua vida de adultos e à sua integração numa sociedade em mudança; transmitir a cultura, modelos de comportamento e normas sociais de convivência a novas gerações para que estas as integrem e se integrem na sociedade. Neste contexto, a prática educativa, na sua acepção mais ampla, e através das suas mais diversas manifestações, é um instrumento privilegiado de socialização.
O mesmo autor mostra que, nas suas funções, a escola prepara o indivíduo para o presente e sobretudo para o futuro. Assim, a escola deve preparar o indivíduo para que seja um cidadão independente, crítico, criativo, responsável e participativo, disposto a exercer os seus direitos e deveres como membro de uma sociedade democrática e pluralista e capaz de assumir atitude favorável à educação permanente e à formação contínua (IBIDEM).
A escola é, com efeito, uma instituição que determina os valores e padrões de uma sociedade, isto é, procura desenvolver hábitos de pensamento e de acção necessários e aceites pela sociedade, incutir nos educandos o senso de solidariedade social, do desenvolvimento do senso social e do modo de viver conforme as exigências da sociedade.
Olhando numa outra perspectiva, Martins considera que a escola não é responsável apenas pela transmissão cultural, pois tem a função de promover o desenvolvimento global da personalidade do educando, moldando sua motivação e capacitando-o a um bom desempenho social (MARTINS,1999:113). Assim, embora a família seja a primeira responsável e educadora das crianças, a escola, através dos professores, é uma instituição potente para o veículo da cultura da sociedade. Esse por que as duas instituições, escola e família, são parceiras inseparáveis no "transporte" da cultura, que devem unir esforços, partilhar objectivos e reconhecer a existência de um mesmo bem comum para os alunos. O divórcio entre as duas parceiras pode criar um obstáculo que possa dificultar a união de esforços e a partilha de objectivos com risco de criar graves prejuízos para os alunos.
Gestão da escola
Segundo BUSS (2008), o termo "gestão" vem do verbo latim "genere", que significa fazer, exercer, executar, administrar. Partindo da sua etimologia, vimos que a gestão implica uma acção para um determinado objectivo. É uma acção que produz certos efeitos para o bem de todos. Assim, o conceito de gestão escolar tem o significado de governo da educação, entendido como acto de administrar a escola de forma colectiva e evitando as práticas individuais da gestão (IBIDEM). Este acto de administrar ou exercer não é excludente, pelo contrário, inclui a todos. Assim, falar da gestão da escola supõe a participação de todos.
Continuando nesta linha de raciocínio, LUCK (2005:17) mostra que "a gestão é a mobilização de talentos e esforços colectivamente organizados, à acção construtiva conjunta de seus componentes, pelo trabalho associado, mediante reciprocidade que cria um todo orientado por uma vontade colectiva".
Na perspectiva de Luck, cada pessoa tem os seus talentos, aptidões ou capacidades para realizar algo. Mas por si só, estes talentos não podem produzir efeitos. Precisam de ser unidos a outros talentos e serem mobilizados para poderem produzir acções. Em outras palavras, este pensador quer mostrar que quando um trabalho é feito em conjunto produz efeitos, o que é diferente do trabalho individual.
A gestão implica a união das forças ou a colaboração de muitos para o bem de todos. Quando se trata de gestão, pensa-se logo de como se pode operacionalizar ou organizar uma estrutura ou actividade. Assim, a gestão da escola seria esta mobilização das habilidades e talentos dos membros da comunidade escolar para potencializar e maximizar o trabalho que leve a alcançar os objectivos previstos para a organização, tendo em conta que estes membros tomam parte na decisão que envolve a organização. A gestão é a democratização das tarefas e abertura para a participação de todos. É aqui onde Luck mostra que
a gestão é orientada pelos princípios democráticos e é caracterizada pelo reconhecimento da importância da participação consciente e esclarecida das pessoas nas decisões sobre a orientação, organização e planeamento de seu trabalho e articulação das várias dimensões e dos vários desdobramentos do seu processo de implementação (LUCK, 2005:34).
Na perspectiva escolar, a gestão é a participação de todos na planificação das actividades, na tomada de decisões e no envolvimento de todos nas áreas onde se precisa este envolvimento. É neste sentido que Paro considera que
a participação da comunidade na escola é, além de ser um direito, uma necessidade do bom ensino sendo por isso preciso que a estrutura da escola seja tal que, não apenas permita, mas também facilite e estimule essa participação, seja na execução de actividades que os próprios usuários consideram legítimas, seja nas tomadas de decisões previstas nas normas e mecanismos internos de participação (PARO, 2011, 219).
Nesta perspectiva, percebe-se que há necessidade de integração de todos os membros que compõem a comunidade escolar para uma gestão efectiva.
O processo de ensino e aprendizagem
Segundo alguns autores, ensino e aprendizagem são duas acções que vão juntas. Freire, por exemplo, diz que não existe ensino que não seja ligado à aprendizagem. Educar alguém é um processo dialógico, um intercâmbio constante. Nessa relação, educador e educando trocam de papéis o tempo inteiro: o educando aprende ao mesmo tempo que ensina seu educador e o educador ensina e aprende com seu educando (FREIRE apud RIBEIRO, 2010). Nesta perspectiva, professor e aluno são dois agentes no processo contínuo de descoberta. A aprendizagem é um processo contínuo de troca de experiência entre professor e aluno. Neste processo todos aprendem mas a níveis diferentes. Existe um adágio que diz: "aquele que ensina, aprende duas vezes". Isto significa que à medida que o professor ensina , também aprende. Neste caso, concordamos com pensamento de Freire que mostra que, ao ensinar, o professor aprende com o seu aluno.
NÉRICI (1991: 161) oferece-nos uma definição por cada palavra. Para ele, "o ensino pode ser entendido como forma de levar o educando a reagir a certos estímulos, a fim de serem alcançados determinados objectivos". Nesta definição, o ensino não está associado ao professor que ensina o aluno. Aqui o professor orienta a aquisição do conhecimento do aluno. Este conhecimento irá se revelar na mudança do comportamento.
A aprendizagem, por sua vez, "é o processo pelo qual se adquirem novas formas de comportamento ou se modificam formas anteriores" (IBIDEM: 163). A aprendizagem portanto, tem que ver com a modificação de comportamento, ou seja, é uma actividade que leva o educando a adquirir um conhecimento que vai se revelar na mudança de comportamento. Em outros termos, a aprendizagem é um processo durante o qual se adquirem competências, habilidades, conhecimentos e valores. No mesmo tempo que há aquisição, há também modificação, que resulta do estudo ou experiência adquirida. Assim, na escola, a aprendizagem depende do ambiente, das intenções, das interacções e de modo como se adquire este comportamento. A escola, portanto, desempenha um papel importante nesse processo de mudança do comportamento do aluno. Mas sozinha não pode conseguir isso, ela necessita de ajuda da família para conseguir alcançar os objectivos.
a aprendizagem na escola pode ser principal e secundária: a principal é aquela representada pela intenção do professor ou pelos objectivos consignados nos planos de ensino; a secundária ou concomitante, representada pelo que o aluno aprende além do que estava previsto ou programado, como simpatia ou antipatia com o professor, agrado ou desagrado pela matéria, etc. (IBIDEM).
A aprendizagem, na linha do pensamento de Nérici, é um processo que envolve a actividade do professor, relacionada com o que está plasmado no plano de ensino, de modo a alcançar os objectivos previstos para o efeito, e do aluno que aprende, além do planificado, outras aprendizagens que podemos considerar de "ocultos", dado que não dependerem do professor, e o aluno adquirir de forma inconsciente. No entanto, como elemento relacionado à educação, a aprendizagem deve ser orientada numa direcção para desenvolver certos comportamentos positivos que irão ajudar o aluno. Por esta razão, a aprendizagem deverá ser orientada para motivar o educando a adquirir conhecimento que possa modificar o seu comportamento. Para isso, precisa de conhecer o educando na sua complexidade (social, cultural, afectiva, entre outras). Este conhecimento da complexidade do educando só pode ser possível se a família e a escola tiverem a mesma linguagem. Isto significa que o processo de ensino e aprendizagem é muito complexo e envolve muitos elementos para ser completo. Neste processo, todos (professor, aluno, família e comunidade) devem ser envolvidos e unir esforços para levar a termo a educação dos alunos.
Complementaridade família-escola
A questão de relação entre família e escola é um assunto que preocupa toda a nossa sociedade. O envolvimento da família na vida escolar é visto como o ponto crucial para o desempenho positivo das escolas e dos educandos. Por isso, muitos pesquisadores e autores tratam este assunto com muita atenção. Assim, a família passa a ser considerada como elemento-chave que contribui para o sucesso do processo de ensino e aprendizagem.
As pesquisas realizadas por vários autores mostram a pertinência do envolvimento da família na escola. Este envolvimento cria uma mudança positiva na atitude para com a escola, não só da parte das crianças, mas também da família em geral. BASTIANI apud BHERING & BLATCHFORD (1999), por exemplo, afirma que o envolvimento de pais com a escola passou a ser considerado nos últimos anos como uma preocupação necessária e legítima e não pode ser mais uma opção extra que as escolas poderiam ou não ter.
A ideia deste autor faz-nos entender que dantes, o envolvimento da família na vida escolar dos filhos não era uma preocupação para que ocorresse bem o processo de ensino e aprendizagem, mas hoje este envolvimento passa a ser uma preocupação necessária, e não pode ser ignorada, dado que é legítimo e influencia todo processo educativo. Em outras palavras, o envolvimento da família na vida escolar é uma "obrigação", porque, hoje, a escola não pode trabalhar sozinha sem envolver a família na sua missão de educar. Isto significa que os dois agentes, são gestores da vida dos educandos.
Para percebermos as possibilidades de relação entre família e escola, refiramo-nos aos trabalhos dos pesquisadores que se dedicaram no desenvolvimento de modelos que auxiliaram na compreensão do tema. São eles, Espstein, Hornby e Bhering & Siraj-Blatchford.
Modelo das "esferas sobrepostas"
Epstein, com o seu modelo teórico denominado "esferas sobrepostas" ganhou confiança na literatura sobre as relações entre família e escola. Este modelo explica como é que as duas instituições devem conjugar para potencializar o processo de ensino e aprendizagem. O modelo de esferas sobrepostas, privilegia a cooperação e a complementaridade entre a escola e a família, e encoraja a comunicação e colaboração entre estas duas instituições (EPSTEIN apud BHERING & BLATCHFORD, 1999).
Fonte: Epstein apud Bhering & Blatchford (1999)
Segundo Epstein (1997), a força A representa o tempo em relação a faixa etária da criança como também a época. De acordo com Epstein, o grau de sobreposição das esferas vai estar sempre relacionado com os valores da época em que vivemos e com a idade da criança.
A força B representa a contribuição dos pais (o que querem, pedem ou dão dentro de suas filosofias e experiências de vida) para a sobreposição ou separação das esferas.
A força C representa a filosofia, experiências, práticas, métodos e influências dos professores que, por sua vez, também contribuem para a movimentação das esferas. Ambas as forças criam um modelo dinâmico do relacionamento entre a escola e a família.
Trata-se de um modelo apresentado em forma de um diagrama, que retrata a relação escola-família, englobando todos esses pontos, e, ainda, acrescenta a contribuição de cada parte desta relação. As "esferas sobrepostas" (the overlapping spheres) representam a família e a escola actuando em favor da criança (IBIDEM). Assim, o modelo apresenta as três forças A, B e C como sendo independentes e dependentes ao mesmo tempo porque devem trabalhar juntas para a educação das crianças. Este modelo é considerado como a partilha das tarefas e responsabilidades entres a família e a escola.
Modelo de "transporte"
O "modelo de transporte", elaborado por Bhering, põe em relevo três elementos (comunicação, envolvimento e ajuda) a partir dos quais se cria um sistema de transportes, onde ilustrara de forma metafórica, através de ilhas e navios, a dinâmica de trocas e negociações entre pais e escola. Dentro deste sistema de troca de negociações, a comunicação é considerada como meio que possibilita as interacções entre estes dois agentes educativos (BHERING e BLATCHFORD, 2002:4). Neste modelo o autor mostra que, entre escola e família deve haver um sistema de comunicação que viabilize a sua relação. Só com isso é que a educação pode ser possível. Assim, a família deveria contribuir com as suas potencialidades (ideia, propostas, etc.) à vida da escola, para que em conjunto, consigam materializar os objectivos que são comuns.
Fonte: Bhering e Blatchford, 2002
Modelo das "Pirâmides invertidas"
Um outro modelo que nos ajuda a compreender a relação família-escola é o Modelo das Pirâmides invertidas proposto por HORNBY apud BHERING & NEZ (2002).
Este modelo consiste em duas pirâmides: uma, representando a hierarquia das necessidades dos pais, e outra, a hierarquia de suas habilidades e possíveis contribuições. Ambas as pirâmides demonstram os diferentes níveis das necessidades e habilidades dos pais (HORNBY apud BHERING & NEZ, 2002).
Os pais, por um lado, ao mandar os filhos à escola, têm uma certa preocupação e querem a todo o custo alcançar aquilo que pretendem para seus filhos. Por outro lado, estes pais podem ter vontade de ajudar, mas por ter uma certa limitação, não conseguem fazer tudo, e fazem o que está ao seu alcance, ficando o resto para a escola. Por isso, o modelo mostra que enquanto todos os pais têm algumas necessidades e habilidades que podem ser utilizadas, outros podem se envolver em actividades que demandam mais tempo e mais aptidão da parte dos profissionais; um número menor deles tem uma necessidade intensa de orientação, ou, por outro lado, a capacidade de contribuir extensamente e em muitas coisas diferentes (IBIDEM).
Figura 3. Modelo das Pirâmides invertidas
Fonte: Hornby apud Bhering &Nez (2002)
No pensamento destes autores ressalta a ideia de que existem muitos pais que se preocupam com a vida escolar dos filhos e que têm também possibilidades de ajudar a escola, se colocarem as suas habilidades ao serviço da mesma. Com efeito, os pais são uma riqueza para a escola. Com as suas aptidões, eles podem ajudar em diferentes sectores ou áreas de gestão da escola sem que a escola precise ainda uma outra ajuda externa. Esta participação na gestão da escola revela-se necessário e importante porque as potencialidades que elas têm, unidas às da escola podem ser uma força para que ocorre bem o processo educativo.
Em suma, os três modelos apresentados mostram como entre a família e a escola deve haver uma colaboração, sublinhando que ambas as partes têm possibilidade de dar o seu apoio e ajuda, tendo em conta as habilidades ou potencialidades que cada um tem.
Há muitos trabalhos que foram feitos em favor da contribuição/participação ou envolvimento da família na escola e, todos chegam à conclusão de que é muito importante que a família e a escola trabalhem em colaboração para o bem dos alunos. O nosso trabalho não se afasta daquilo que já foi dito, mas, sim, focaliza-se sobre as interacções das duas instituições na gestão da escola mostrando como a família pode contribuir eficazmente na gestão da escola se esta lhe oferecer espaço para tal. A escola, portanto, tem uma grande responsabilidade de incluir a família na sua gestão.
Formas e níveis de participação da família
Pesquisas de vários autores mostram que a participação da família na escola é um processo que ocorre de várias formas e em diferentes níveis, tendo em conta o tipo de liderança escolar e da maneira de considerar e fazer participar os envolvidos na gestão da escola. Portanto, a participação da família na escola está intimamente ligada com o tipo de relação que existe entre a escola e a família, que alguns autores falam em termos da política de aproximação da família, da atitude da escola em relação à família, do ambiente que se vive na escola e das acções feitas em conjunto como factores para incentivar esta participação. Assim, segundo a tipologia de PATERMAN apud AFONSO (1993) existem três formas de participação: a pseudo-participação, participação parcial e a participação total.
Na pseudo-participação, os participantes não têm qualquer poder para influenciar as decisões a tomar; a sua participação reduz-se a aceitarem as decisões que já foram tomadas pelos que têm o poder de decidir (IBIDEM, 138), isto é, os gestores da escola.
Na participação parcial, embora o poder de decidir esteja mantido nas mãos dos dirigentes ou gestores, os participantes têm o espaço e a capacidade de influenciar as decisões desses directores ou gestores (PATERMAN apud AFONSO, 1993).
Na participação total, cada participante tem a mesma capacidade para influenciar as decisões a tomar (IBIDEM). O poder não está nas mãos dum indivíduo ou duma instituição. Aqui todos os membros que constituem a comunidade escolar (as famílias, a escola, a comunidade local e outros organismos envolvidos na gestão da escola) têm a mesma capacidade de influenciar nas decisões.
A participação na escola é uma realidade complexa no momento em que nem todos participam da mesma forma. Isto significa que, a família pode estar presente em todas as reuniões organizadas pela escola mas sem ter nenhuma palavra sobre o que se decide. A sua participação limita-se em concordar com as decisões ou com aquilo que já foi definido e decidido pela escola. É o que Paterman trata de pseudo-participação. Mas quando a família tem a possibilidade de influenciar nas decisões com as suas opiniões ou propostas, mesmo que o poder de decisão esteja nas mãos da escola, trata-se de participação parcial. Neste tipo de participação, as opiniões ou propostas podem ser ou não aceites pela escola, porque é ela que decide. Quando a escola e a família têm os mesmos direitos e poder de decidir, trata-se de participação total.
Na mesma ordem de ideias, LIMA (1998:183-189) apresenta as formas de participação em termo de modelo baseado em quatro critérios: democraticidade, regulamentação, envolvimento e orientação.
A democraticidade representa uma forma de limitar certos tipos de poder e de superar certas formas de governo, garantindo a expressão de diferentes interesses e projectos com expressão na organização e a sua concorrência democrática em termos de influência no processo de tomada de decisões (LIMA, 1998: 182). Este critério explica-nos que há possibilidade de limitar certos tipos de poder e superar certas formas de governo para que a organização tenha uma gestão democrática e que todos os membros participem no processo de tomada de decisão. Assim, há categorias de intervenção na tomada de decisão. A intervenção ou participação pode ser directa ou indirecta.
A intervenção é directa quando cada indivíduo dentro dos critérios democráticos estabelecidos intervém directamente na tomada de decisões (IBIDEM). Numa organização democrática, em princípio, os direitos dos membros estão bem estabelecidos, o que faz com que, perante uma decisão para tomar, todos gozem deste direito e participem na tomada de decisão pessoalmente (LIMA, 1998: 184). Assim, podemos dizer que a intervenção directa dá direito ou possibilita a qualquer indivíduo a participar e intervir directamente no processo de decisão. Nas instituições escolares democráticas, o critério democrático aplica-se nas assembleias gerais da escola, quando se precisa, por exemplo, de escolher os membros do conselho da escola. Aqui todos têm o direito de voto para escolher a pessoa que acham certa para o cargo. Assim, este direito a voto é um direito concedido, reconhecido e estabelecido no regulamento que rege a escola.
A intervenção é indirecta quando a participação se realiza por intermédio de representantes designados para o efeito (IBIDEM). Aqui não são todos que participam na tomada de decisão de forma directa. A participação é feita por via dos representantes designados para esse fim. Mais concretamente, esta prática acontece nas escolas onde existem os conselhos da escola. Nestes conselhos, não são todas as famílias que participam nos conselhos, mas sim, alguns membros escolhidos pela comunidade. Estes intervêm na tomada de decisões por direito. Porém, este direito é exercido em nome da comunidade ou das famílias. Assim, a tomada de decisões é feita de forma indirecta pela comunidade ou famílias, uma vez que estão representados por estes membros.
No critério do envolvimento, Lima considera as atitudes e empenhamento variável dos actores face às suas possibilidades de participação na organização (LIMA, 1998: 185). Assim, a maneira de participar na gestão duma organização varia segundo as atitudes pessoais e as possibilidades que se oferecem para o efeito. Este envolvimento pode assumir as formas de participação activa, passiva ou reservada.
A participação é activa quando existe um elevado envolvimento na organização (IBIDEM). Na perspectiva do autor, existem níveis e graus do envolvimento nas actividades realizadas dentro da organização. Quando o grau é elevado significa que os actores participam de forma activa. Da mesma forma, podemos considerar os graus de participação das famílias na gestão da escola quando, por exemplo, as famílias têm interesse para se envolverem na vida escolar mostrando-se disponíveis com a sua presença nas reuniões, ou na sua intervenção em opiniões, propostas ou mesmo desempenhando algum papel relacionado com a gestão da escola.
A participação passiva caracteriza atitudes e comportamentos de desinteresse e de alheamento (LIMA, 1998: 188). Neste tipo de participação, o autor mostra que os actores não manifestam nenhum interesse à vida da escola, ou seja, não querem saber nada da escola. Este tipo de participação corresponde ao que acontece muitas vezes nas escolas. Existem famílias que não sabem nada da gestão da escola ou da vida dos seus próprios filhos na escola. Elas vão matricular os filhos e não acompanham o processo educativo. Abandonam os filhos nas mãos da escola e não querem saber se estes estudam ou não, têm dificuldades ou não, etc. Aqui a família é alheia a tudo o que acontece na escola. Portanto, a participação é passiva na medida em que há falta do interesse e há também alheamento na vida escolar.
A participação reservada pode se traduzir como sendo o ponto intermédio entre a participação activa e passiva (IBIDEM). Isto significa que os membros participam quando poderem ou quando têm tempo. Esta participação não pode ser considerada activa, porque nem sempre a família está presente na vida escolar, nem passiva, porque nem sempre está ausente, mas pode intervir ou dar as suas propostas de forma esporádica.
O critério de regulamentação analisa a participação tendo como base as regras que regulam a organização e legitimam a participação de todos os actores. Pode assumir os tipos de participação formal, não formal e informal (LIMA, 1998: 183-189). Assim, este critério refere-se às normas que orientam a maneira como os actores podem actuar na organização.
A participação formal, é uma forma de participação decretada, no sentido em que está sujeita a um corpo de regras formais-legais relativamente estável, explicitado e organizado, estruturado de forma sistemática e consubstanciado num documento com força legal (IBIDEM:185). Assim, é uma participação reconhecida e estipulada na lei. Esta participação tem uma força na actuação porque está bem estruturada e sistematizada.
A participação não formal é realizada tomando predominantemente como base um conjunto de regras menos estruturadas formalmente, geralmente constantes de documentos produzidos no âmbito da organização e em que, portanto, a intervenção dos actores na própria produção de regras organizacionais para a participação poder ser maior (LIMA, 1998:186).
Deste modo, é uma participação não legal, isto é, não tem nenhum documento reconhecido de forma legal, o que a torna menos estruturada, embora reconhecida pelos membros da organização e com muita influência sobre a organização.
Participação informal é realizada por referência a regras informais, não estruturadas formalmente, produzidas na organização e geralmente partilhadas em pequenos grupos (LIMA, 1998: 189). É assim, a forma oculta da participação. Aqui os actores agem fora das leis estabelecidas mas com muito poder de influência. Portanto, é exigível que a instituição escolar tenha o poder de acompanhar todos os grupos informais que se criam à sua volta, para que não ponham em causa a gestão escolar.
No critério de orientação, a participação assume duas vertentes: convergente e divergente.
A participação é convergente quando as pessoas se identificam, na generalidade, com os objectivos formais da organização e de uma forma mais consensual, colaboram, de forma empenhada, na consecução das metas estabelecidas ou apenas "ceder lugar" à ritualização e ao formalismo, assumindo-se, dessa forma, como obstáculo a inovação (LIMA, 1998:189).
Neste tipo de participação, os actores identificam-se nos objectivos estabelecidos pela organização, ou seja, identificam-se com aquilo que a organização definiu, e colaboram nas actividades de forma consensual de modo a alcançar as metas previstas pela organização. A transposição disto para a organização escolar gera a participação convergente na gestão escolar.
A participação é divergente quando os actores não conseguem se enquadrar naquilo que é considerado como objectivos formais da organização e adoptam posições diferentes (IBIDEM:189). Estas posições podem ser vistas como uma contestação, ou simplesmente como ideias diferentes mas indispensáveis para o bem da instituição. Portanto, a participação é divergente quando os actores têm uma posição diferente à da organização. Isto significa que, os objectivos não reflectem o que eles esperam. Perante uma tal realidade as reacções dos actores podem ser de contestação por não reflectir os seus anseios, mas também pode ser que, os objectivos da organização sejam mal definidos e que as opiniões dos actores sejam indispensáveis para a vida da organização. A mesma situação pode acontecer na gestão escolar. A escola pode definir certos objectivos que sejam diferentes ou contrários naquilo que a comunidade espera. Isso vai ser um motivo de contestação. Entretanto, a posição da comunidade pode ser positiva e aproveitável para uma boa gestão escolar. Neste caso, vai precisar do bom senso dos gestores para conciliar as duas realidades de modo a favorecer uma gestão onde todos se identifiquem.
A necessidade de promover a cultura da contribuição na gestão da escola
A contribuição da família na gestão da escola pode ser considerada como valor se ela mesma valoriza aquilo que faz, isto é, trabalha com consciência e com objectivo de ajudar a escola a crescer e a ter uma boa reputação. Da mesma forma, a escola deverá valorizar a presença da família e oferecer-lhe espaço para actuar de maneira efectiva. É nesta perspectiva que TEIXEIRA (1995) considera que "a participação terá de ser assumida por inteiro, como cultura, como orientação estratégica da acção". A cultura é uma coisa adquirida e depois dessa aquisição, fica gravada para sempre na vida do homem. Assim, se a participação da família se torna cultura, então vai ser uma prática quotidiana e vai fazer parte da vida da família.
Na mesma linha de raciocínio, Teixeira defende que a cultura participativa é uma condição para que os encarregados façam parte de uma mesma comunidade educativa, de modo a ampliar a representação qualificada para integrar as estruturas de decisão (IBIDEM). Trata-se da reconstrução da escola como espaço público, para ajudar a reflectir sobre estratégias na qual as famílias interiorizam a escola como espaço que lhes pertence (NÓVOA, 2001).
Na perspectiva do autor, a escola deve ser considerada como lugar onde os actores educativos podem se reunir para reflectir sobre como as famílias podem ter a consciência de que a escola é sua propriedade, ou seja, um bem pertencente à sociedade.
Na realidade, a escola é um espaço que ajuda a abrir horizontes sobre as realidades da sociedade, do mundo, da cultura, etc. Restruturar a escola para ajudar a reflectir sobre as estratégias para ter consciência de que a escola pertença à família pode ser uma maneira para despertar as famílias do seu papel como responsável e educador. No entanto, esta consciência já está presente em cada um. Precisa apenas de um estímulos para accionar as famílias a ter cultura de participar na gestão da escola. É nesta perspectiva que MARQUES (2001) desenvolve uma lista de práticas exemplares para a promoção da participação na escola e implementação de uma cultura participativa, nomeadamente,
a valorização da criação de um clima organizacional aberto, o conhecimento da realidade das famílias, a existência de uma comunicação contínua, positiva e horizontal, a abertura dos órgãos de gestão para dialogar com os pais, a organização actualizada de informação relevante (administrativa, pedagógica e social), a manutenção de reuniões periódicas, a participação directa dos encarregados de educação e das associações de pais em actividades lectivas ou voluntárias e a organização de programa de formação de pais.
Conforme o autor, estas práticas são uma maneira de promover a cultura de participação na gestão da escola. Porém, a cultura de participação deve ser um processo de consciencialização das famílias. No processo da mudança da cultura pode acontecer uma certa resistência por ser uma nova cultura. Tirar as famílias da antiga cultura significa acompanhá-las a perceber de que é importante que participem na vida escolar. Por esta razão o autor mostra que, neste processo de inculcar uma nova cultura, a escola deverá conhecer a realidade das famílias e ter um diálogo aberto para com ela, abrir as portas para encontros/reuniões e lhe incentivar a participar tanto nas reuniões organizadas pela escola quanto nas organizadas pelas associações de pais. Na nossa opinião, a participação das famílias na gestão escolar, deve ser a prioridade das prioridades que a escola pode promover dentro das suas possibilidades. Uma vez conseguir transmitir a cultura de participação, o resto do envolvimento das famílias fica facilitado. Aliás, a escola não terá que forçar as famílias a participar na gestão da escola, isto é, tudo irá acontecer com toda a naturalidade.
Ao longo deste capítulo vimos que a escola e a família são duas entidades responsáveis pela educação das crianças. Com base nas abordagens de diferentes autores, chegamos à conclusão de que a contribuição da família na gestão escolar é a chave para o sucesso educativo. Neste sentido, a escola tem o papel fundamental e constitui o ponto principal das interacções com a família. O seu papel consiste em aproximar a família para que contribua na gestão escolar.
Concluindo, pode-se dizer que apesar de apresentar vários modelos de participação das famílias na gestão da escola, não existe um modelo ideal, isto é, um modelo que se deve copiar e aplicar a todas as escolas. Só existem modelos inspiradores para a situação concreta de cada escola. Este vai depender da realidade do ambiente em que se vive e onde a escola está inserida. Para materializar isto, incumbe a escola promover as políticas ou estratégias que favorecem a aproximação das famílias à escola. As famílias, com certeza, têm possibilidades de contribuir na gestão da escola se esta última permitir e variar as modalidades da contribuição.
Vejamos, a seguir, o capítulo que trata da construção da escola democrática, onde todos os membros da comunidade escolar são considerados protagonistas da educação das crianças, com poder na tomada de decisão.
CAPÍTULO II
O presente capítulo trata da gestão democrática da escola. Falando disso, pretendemos mostrar que a gestão democrática é o modelo da gestão que considera a família como instituição ligada à escola, e que, a sua contribuição é de grande importância. Fazem parte deste capítulo os seguintes temas: a gestão democrática e a participação da família, a autonomia e a descentralização da gestão escolar, o enquadramento legal da contribuição da família na gestão da escola em Moçambique, a importância da parceria família-escola e o impacto pedagógico da presença da família na escola.
Gestão democrática da escola e participação da família
No passado, a participação da família na gestão da escola não era uma preocupação, dado que foi concebida a ideia de que o trabalho da educação era para família e a da instrução para a escola. Assim, quando a criança ia à escola, a família ficava tranquila, distanciando-se das suas responsabilidades. Mas, hoje em dia, com as pesquisas feitas, viu-se que a participação da família na educação escolar dos filhos é muito importante para o aluno, a escola e a própria família. Como a família já está ligada à educação dos filhos, a escola deve ter uma abertura na sua maneira de trabalhar, ou seja, deve envolver a família na gestão. Assim, a gestão democrática pode ser considerada como meio pelo qual todos os segmentos que compõem o processo educativo participam da definição dos rumos que a escola deve imprimir à educação de maneira a efectivar essas decisões num processo contínuo de avaliação de suas acções (SILVA, 2007: 34). A característica principal da gestão democrática é, segundo o autor, a participação de toda a comunidade educativa na definição dos objectivos educativos onde se acha plasmada a política para a educação dos alunos.
A gestão escolar democrática, portanto, é uma maneira de gerir a escola de forma aberta, participativa e transparente, ou seja, é aquela forma que promove o envolvimento de todos para o bem de todos. Nesta forma de gestão não existem sujeitos activos e passivos. Todos estão no mesmo patamar quanto à sua participação.
As responsabilidades partilhadas
A gestão democrática exige a colaboração entre os actores e a partilha de responsabilidades para o bom funcionamento da organização escolar. As responsabilidades são consideradas aqui como meio que incentiva os membros da comunidade escolar a contribuírem de forma eficiente na gestão desta organização. Por palavras alternativas, "a realização das responsabilidades da escola são responsabilidades de todos" (LUCK, 2005: 97 ). Isto significa que, o trabalho que a escola realiza não é apenas para ela, mas, sim, para toda a comunidade. Assim, no intuito de favorecer o bom funcionamento da escola e dar a oportunidade a todos os membros da comunidade educativa de participar na gestão, as tarefas e funções devem ser partilhadas. Esta partilha não significa divisão de poderes, mas unificação das forças. É neste sentido que a escola deverá partilhar as suas responsabilidades com a família para facilitar a gestão da escola que necessita da presença da família para alcançar os seus objectivos.
Se a prática democrática deve envolver a instituição escolar por inteiro, é certo que a organização da escola deve ser de modo a favorecer tal prática democrática, possibilitando a participação de todos na tomada de decisão (PARO, 2010:68). Aliás, a escola deve organizar-se de modo a envolver toda a comunidade escolar no exercício das responsabilidades e na tomada de decisões. Só desta forma é que a prática democrática pode ser enraizada na instituição escolar. Isto significa envolver todos (famílias, alunos, professores, funcionários e outras pessoas da comunidade) na gestão escolar. Este modo de proceder tem implicações positivas no sentido de, uma vez tomada uma decisão em conjunto, a possibilidade de a decisão dar certo é maior, dado que todos são corresponsabilizados em partilhar as consequências (positiva ou negativa) que podem resultar.
A contribuição da família na gestão da escola não se limita unicamente à partilha de responsabilidades ou tomada de decisões. Ampliando a sua área de actuação, CHALITA (2004: 47) considera que além da tomada de decisões, a gestão democrática implica identificar problemas, acompanhar acções, controlar, fiscalizar e avaliar resultados. Isso pressupõe a ampliação da participação das pessoas nessa gestão, isso significa que a participação não pode se resumir aos processos de tomada de decisões.
A gestão democrática estende-se a todas as acções relacionadas com o processo educativo, incluído a tomada de decisão. Mas, esta última não pode ser considerada como o resumo ou o cúmulo da gestão democrática. Caso contrário, seria reduzir a sua abrangência. A participação democrática, no entanto, pressupõe acções que regulam, fiscalizam e avaliam todo o processo educativo com a participação de toda a comunidade escolar. Deste modo, a participação da família na gestão da escola é a chave para o sucesso de qualquer actividade na escola.
NISKIER (1969: 115) mostra que "é de maior importância a participação dos pais na comunidade e organização escolar, a fim de que a complexa tarefa de educar se faça homogeneamente, através do esforço integrado da família e da escola".
Arnaldo apresenta uma posição favorável no concernente à participação da família na gestão da escola, porque, segundo ele, esta participação ajuda a uniformizar a educação que decorre graças ao esforço integrado dos actores educativos. De facto, para que haja uma boa gestão da escola e/ou uniformizar ou homogeneizar a educação, precisa que família e escola trabalhem em colaboração. O trabalho feito em colaboração facilita o comprimento das tarefas.
A contribuição da família nas áreas curriculares
A participação da família nas diversas actividades organizadas pela escola alimenta o espírito colaborativo, que faz com que todos os actores se disponibilizem a contribuir de forma eficiente na gestão da escola. Assim,
a família pode participar na selecção de materiais curriculares, na apresentação de propostas de temas a explorar (em conjunto, por alunos, pais e professores), nas áreas disciplinares, transdisciplinares e de complemento curricular, na participação da definição dos critérios que permitem determinar aquilo em que consiste um desempenho de sucesso, em áreas do currículo cuja concepção e planificação tenha contado com a sua intervenção (LIMA, 2002: 150).
Como se nota, o autor enumera muitas áreas em que a família pode intervir. Conhecendo as necessidades das crianças, a família pode ser uma ajuda na selecção de materiais curriculares, na proposta de alguns temas de interesse que podem ser explorados, e noutras actividades onde a sua intervenção pode ser útil. Assim, a família, pelo conhecimento particular que tem dos seus educandos, é um dos elementos fundamentais, mas nem sempre valorizados no desenvolvimento do currículo.
Sem entrar em contradição com a ideia de Lima, Brannam apresenta uma outra maneira de a família contribuir na gestão curricular. Para ele, além de tudo que se pode fazer, a promoção da informação é muito importante. No entanto, a família pode também
Proporcionar informação sobre as necessidades especiais dos alunos; transmitir informação sobre o comportamento do aluno; dar a conhecer as suas ideias sobre a educação do aluno e a sua relação com planos futuros de aprendizagem; organizar visitas familiares de estudo com um interesse curricular; colocar os seus conhecimentos e habilidades especiais à disposição da escola; etc. (BRENNAM apud PACHECO, 2001: 98).
A família como a escola tem todo interesse de trocar informação entre elas para poder acompanhar o processo educativo. Vivendo com as crianças, a família consegue descobrir o comportamento, as atitudes, os talentos e outras dificuldades das crianças. Do mesmo modo, o pouco tempo que os alunos vivem na escola dá para os professores conhecer alguns aspectos da vida dos alunos. Neste sentido, no quadro da gestão compartilhada, ambas as partes devem trocar as informações sobre as realidades dos alunos. Assim, a família coloca à disposição da escola a vida dos alunos e vice-versa.
Na mesma ordem do pensamento, Robeiro admite que a extensão da intervenção da família na gestão da escola seja efectivo. Assim, a família pode ser associada a trabalhar nos assuntos como
a progressão/retenção dos alunos, as regras de disciplina a vigorar na escola, o cumprimento dos programas por parte dos professores, o regulamento de faltas, a organização interna da escola (por exemplo, a organização do currículo, a composição das turmas, o calendário escolar, as actividades de complemento curricular), a nomeação, controlo e avaliação do pessoal docente, na avaliação de desempenho e na progressão de carreira (ROBEIRO apud LIMA, 2002: 150).
O autor mostra que a intervenção da família na vida escolar pode ser útil em diferentes assuntos relacionados com o processo educativo. Deste modo, pode trabalhar em matéria relacionada com a vida académica dos alunos como a progressão ou retenção dos alunos, as regras de disciplina e a organização interna da escola. Também, pode trabalhar na matéria relacionada com os professores como por exemplo, a nomeação, avaliação do desempenho e a progressão na carreira dos professores.
Na verdade, a família pode trabalhar nas diferentes áreas como o autor sugeriu. Porém, na nossa realidade, existem áreas onde a família não tem acesso ou direito de intervenção, uma vez que não está estipulado no regulamento que rege as escolas; outrossim, há áreas reservadas aos órgãos superiores, por exemplo, a nomeação de professores, a avaliação de desempenho e a progressão de carreira, entre outros. Portanto, tudo depende do tipo de escola. Quando se trata duma escola pública onde as directrizes são bem definidas e tudo está legalizado, esta proposta não vai funcionar. Mas, se a escola for comunitária, onde a família tem todo poder de gestão, a proposta é aplicável. Portanto, a intervenção da família pode ser efectiva, onde as condições permitirem. Porém, reconhecemos, segundo as palavras de LIBÃNEO (2013:97) que, "a exigência da participação da família na organização e gestão da escola corresponde às novas formas de relações entre escola, sociedade e trabalho, que repercutem na escola nas práticas de descentralização, autonomia e corresponsabilização".
Autonomia e descentralização da gestão escolar
A autonomia é definida como a faculdade das pessoas de autogovernar-se, de decidir sobre o próprio destino (MARTINS, 2002:97). Nesta perspectiva, pode-se dizer que a autonomia é a liberdade ou independência de realizar certos actos de forma livre e sem uma pressão externa.
No quadro escolar, a autonomia pode ser definida como a faculdade que uma unidade escolar tem de decidir sobre o seu destino, isto é, ter a liberdade de elaborar o seu projecto educativo, o seu regulamento interno, elaborar o seu plano de actividade, e planificar as actividades, etc. Desta forma, qualquer escola precisa duma autonomia para poder trabalhar de forma livre e realizar os seus projectos sem que haja uma imposição ou pressão externa. Para que isso aconteça, a escola deve ser independente de outros poderes para ter a verdadeira autonomia de decidir. É dessa forma que a escola pode desenhar o seu próprio caminho, incluindo, nela, todos os agentes educativos para serem corresponsáveis pelo êxito da instituição.
A autonomia é um processo que exige uma determinação da parte dos envolvidos e a disposição para a sua implementação. No entanto, a comunidade escolar constitui uma força que pode enfrentar o desafio da autonomia. É esta comunidade escolar que deve definir os seus objectivos, programar as actividades, gerir os recursos e decidir sobre matérias relevantes ligadas à escola. Em outras palavras, é a comunidade escolar que deve gerir a escola. Neste caso, não é a escola que decide, mas sim, a comunidade escolar. Só desta maneira é que se pode falar da autonomia escolar.
O princípio da autonomia escolar requer o vínculo mais estreito com a comunidade educativa, basicamente os pais, as entidades e organizações paralelas à escola (LIBÃNEO, 2013: 120). O autor mostra que a autonomia está estreitamente ligada à comunidade educativa e outras organizações que trabalham no âmbito educacional, como UNICEF e outros.
Na sua actuação, a autonomia deve ser abrangente, ou seja não se limitar ao nível administrativo, mas sim, estender-se ao nível pedagógico, com intuito de melhorar a prática educativa.
A autonomia escolar, portanto, é uma forma da emancipação escolar. No passado, a escola não tinha nenhuma autonomia, porque não havia liberdade de contextualizar o ensino no sentido de escolher os conteúdos, métodos ou procedimentos. A escola dependia daquilo que tinha sido elaborado a nível central, e, neste caso, não havia espaço para as famílias contribuírem na elaboração dos projectos educativos. Mas, hoje em dia, a participação da família é incontornável para falar da autonomia escolar.
A gestão democrática da instituição escolar considera a autonomia como descentralização do poder de decisão e unificação de esforço para potencializar o processo educativo. Assim, podemos considerar que "a descentralização é uma tomada de decisão compartilhada" (LUCK, 2006: 99). Nesta perspectiva, descentralizar é conceder o mesmo poder de decisão a outros membros, ou seja, trabalhar em conjunto considerando que todos têm os mesmos direitos na tomada de decisões.
O processo de tomada de decisão pode estar assente num grau de centralização e descentralização dependendo de maneira como os gestores da organização concentram a autoridade para tomar as decisões. A centralização constitui uma maneira de os gestores controlarem o processo de tomada de decisão e excluírem dele os vários intervenientes ao processo. Já na tomada de decisão descentralizada os membros são envolvidos, consultados e as suas opiniões são levadas em consideração no momento em que as decisões são tomadas, resultando deste modo decisões livres e diferenciadas (CHIAVENATO apud IBRAIM & MACHADO, 2014:8).
A gestão da escola exige que esta se descarregue do cúmulo das funções, tais como, a tomada de decisão, definição das políticas escolares, etc., para ser partilhada com outros membros da comunidade.
Na perspectiva de descentralização da gestão escolar, a escola pode, por exemplo, pensar em criar um conselho da escola que tenha autoridade nas deliberações e decisões, na criação de comissões de recursos financeiros da escola, que tenha também autonomia na escolha de professores para determinada classe, dado que nem todos os professores têm capacidade de ensinar em todas as classes. Ainda se pode pensar na existência de escolas comunitárias onde o governo apareça como um simples agente fiscalizador. Só desta forma é que a comunidade/família poderá ter o direito total na gestão da escola.
A autonomia da escola relaciona-se com a participação dos membros na definição dos objectivos da organização e na tomada de decisões para concretizar certas acções importantes da organização. Neste aspecto, Libâneo mostra que
a participação é o principal meio de se assegurar a gestão democrática da escola. Além disso, proporciona um melhor conhecimento dos objectivos e metas, da estrutura organizacional e da sua dinâmica, das relações da escola com a comunidade, e favorece uma aproximação maior entre professores, alunos e pais (LIBÃNEO apud SANTOS, 2001: 29).
Na óptica deste autor, a participação está ligada à autonomia concebida como capacidade de conduzir a sua própria vida. A escola, portanto, é autónoma, dado que tem possibilidade de realizar actividades de forma livre em conjunto com a família e outras entidades. A sua autonomia opõe-se às outras formas de gestão centradas no gestor. Aqui, a gestão é colectiva, democrática e participativa. O que concretiza isto é a sua liberdade de elaboração do projecto educativo. Este instrumento mostra de forma concreta como a escola goza da sua autonomia, isto é, faz participar as famílias na sua elaboração e implementação.
Enquadramento legal da contribuição da família na gestão da escola em Moçambique
Neste ponto, queremos falar da legitimidade do envolvimento da família na gestão da escola, isto é, mostrar que a contribuição da família na gestão da escola é legal, reconhecida e recomendada pela instância mais alta da sociedade moçambicana, que é o Estado. Este reconhecimento é o princípio da democracia escolar.
Em Moçambique, o envolvimento da comunidade externa nas escolas não foi notado no tempo colonial, dado que o sistema naquela altura não dava o espaço para tal. De acordo com a pesquisa realizada por IBRAIMO & MACHADO (2014:1), o envolvimento da comunidade externa nas escolas verifica-se após a independência, quando as primeiras experiências de participação dos pais e encarregados de educação começam a se fazer sentir através das comissões de pais e de ligação escola-comunidade (CLEC).
Desde a instauração do sistema escolar em Moçambique, todo o processo educacional estava nas mãos do colonizador e foi ele que se encarregava do acompanhamento dos educandos. Segundo os autores, a comunidade externa, que eram as famílias, não tinham nada a fazer na escola, o colonizador não abria o espaço para isso, e as famílias não sabiam que podiam se aproximar da escola para a devida colaboração. As famílias começaram a despertar no período pós-independência. Nesse sentido, vimos que no tempo colonial o povo era considerado como um povo sem consciência, sem experiência e sem opinião no concernente à educação escolar dos filhos, porque o sistema educativo foi considerado como um círculo fechado, onde o colonizador era o único patrão da escola. Portanto, o tempo colonial era um bloqueio ou impedimento para o povo moçambicano ter consciência da sua responsabilidade para a educação escolar dos filhos. Aliás, na nossa opinião, a consciência de acompanhar a vida escolar dos filhos existia no povo, mas é o sistema que não favorecia ou não dava esta oportunidade. Dizemos isso, porque, logo após a saída do colonizador, começou já a tentativa de as famílias se envolverem na vida escolar através das CLEC. Isso significa que, a saída do colonizador era um alívio para o povo moçambicano e a inauguração duma nova etapa do sistema escolar que reconhece o lugar da família e o seu papel na gestão da escola.
Lei nº 4/83 e a ligação família-escola
O nº 1 do Art. 88 Da Constituição da República (CR) mostra que "a educação na República de Moçambique constitui direito e dever de cada cidadão". Do mesmo modo, o Art 1 da Lei nº 4/83 do Sistema Nacional de Educação (SNE), reforça a ideia anterior ao dizer que a educação é um direito e um dever de todo o cidadão, o que se traduz na igualdade de oportunidades de acesso a todos os níveis de ensino e na educação permanente e sistemática de todo o povo. Portanto, todo cidadão tem direito a uma educação, independentemente do tipo de família onde nasceu ou do lugar onde vive.
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