O poder diretivo do empregador versus privacidade do trabalhador no ambiente virtual

Enviado por Mário Paiva


Partes: 1, 2, 3

  1. Introdução
  2. Privacidade de dados do trabalhador
  3. Linhas gerais sobre correio eletrônico
  4. Da proteção do sigilo de correspondência na maioria das constituições do ocidente e nos tratados internacionais
  5. Correio eletrônico e o correio convencional
  6. Poder de direção do empresário e a intimidade do trabalhador
  7. A intervenção no correio eletrônico da empresa pelo empregador
  8. O controle do e-mail pelo empregador
  9. A posição de alguns doutrinadores sobre o assunto
  10. Direito Comparado
  11. Jurisprudência nacional
  12. Recente decisão do Tribunal Superior do Trabalho
  13. Jurisprudência estrangeira
  14. Diretrizes para utilização dos meios eletrônicos no ambiente de trabalho
  15. O uso social do e-mail
  16. Processo de adaptação
  17. Bibliografia

I- INTRODUÇÃO

Em agosto de 2006 fui instado a participar do 14º Congresso Goiano de Direito do Trabalho sobre o tema objeto deste ensaio e, pude constatar, o quando o mesmo é pouco debatido e, até mesmo, desconhecido pelos profissionais do direito e pelos atores sociais nas relações de trabalho.

Antes de mais nada teremos que despertar nos profissionais da área jurídica a atenção devida para o assunto que aborda especificamente o impacto que a informática teve, tem e terá no universo jurídico uma vez que o vínculo entre o direito e a tecnologia é cada dia mais estreito causando verdadeira dependência mútua difícil de ser dissociada.

Porém, percebemos que, devido à velocidade das transformações ocorridas no mundo virtual, que nada mais é do que o nosso próprio mundo torna-se cada vez mais fundo o fosso que separa as relações fáticas das jurídicas exatamente o contrário do desejado pelo legislador e sociedade de um modo geral.

Estamos diante de modificações tão intensas que sugerem novas realidades e que necessitam até mesmo de reformulação de institutos jurídicos sob pena de vermos direitos duramente conquistados ao longo dos anos e, até mesmo séculos, serem relegados ao ostracismo levando a total ausência de determinados direitos como o da privacidade.

Exemplo dessa situação é o conceito de soberania e competência aplicável aos crimes cometidos por intermédio do computador onde os chamados "delitos virtuais" são cometidos por um hacker em vários países simultaneamente levando a problemática de qual país é competente para julgar o infrator e colocando em xeque os institutos acima mencionados.

Acreditamos que um dos bens jurídicos mais afetados com a inserção da informática na sociedade é sem dúvida nenhuma, a privacidade. Com o acesso ilimitado das redes de computadores invadimos a intimidade de milhares de pessoas sem muitas das vezes sua devida permissão com um simples toque no teclado do computador.

Alertamos a todos que, enfoquem o impacto da informática no direito sob dois aspectos: o primeiro no que diz respeito aos benefícios evidentes que a tecnologia traz para o universo jurídico e o segundo os malefícios e prejuízos que causam aos direitos das pessoas. Assim entendemos que a partir do momento que os lidadores do direito passarem a enxergar esta realidade será possível sensível diminuição da questão negativa dos direitos alijados pelas mudanças tecnológicas.

Feitas essas considerações preliminares passaremos no tópico seguinte a analisar a questão do impacto da informática nas relações trabalhistas demonstrando primeiramente em breve tópico a questão da vulnerabilidade de dados do trabalhador com o intuito de demonstrar o lado negativo do avanço apontando concomitantemente, alternativas para que sejam minimizados esses malefícios, dependendo da vontade dos administradores, e, segundo abordando o tema propriamente dito enfocando para melhor explicação a questão da possibilidade de monitoramento do correio eletrônico do empregado pelo empregador que demonstrará claramente um embate entre o poder diretivo do empregador e a privacidade do trabalhador no ambiente de trabalho.

II- PRIVACIDADE DE DADOS DO TRABALHADOR

Sempre com o objetivo de trazer a baila discussões que tenham efetiva vinculação com a realidade exemplificaremos a questão dos dados judiciais do trabalhador dispostos nas home-pages dos tribunais trabalhistas para, uma vez mais, demonstrar a importância da discussão a respeito da privacidade do trabalhador.

Bom, antes da criação dos sites dos tribunais na internet algumas empresas de grande e médio porte discriminavam no momento da contratação de trabalhadores os que haviam anteriormente ajuizado reclamação trabalhista contra seus ex-empregadores. Mas, como o entrevistador a empresa sabia disso? Respondo, através das chamadas "listas negras" que nada mais eram do que listas com o nome de trabalhadores que já possuem ou possuíram reclamações trabalhistas contra seus ex-empregadores e que eram repassadas de empresa para empresa para a realização da exclusão do candidato a vaga para o emprego.

Essa prática durou anos e anos e, até hoje, infelizmente, ainda vem sendo realizada por alguns empregadores inescrupulosos, porém, o que as listas negras tem haver com os sites dos tribunais? E que, quando os sites de tribunais foram implementados e colocados a disposição de todos, os mesmos disponibilizavam pesquisa em seu acervo eletrônico pelo nome do reclamante e, sem querer, na melhor das intenções, (mas diz o ditado popular que, "de boas intenções o inferno esta cheio"), potencializavam sobremaneira a discriminação de trabalhadores que já tinham reclamações trabalhistas quando da conquista de um novo posto de trabalho, pois, várias empresas consultavam nos próprios sites dos tribunais do trabalho se o empregado ajuizou ação trabalhista vindo a discriminá-lo por causa disto, ou seja, formou-se uma espécie de lista negra digital organizada pelo próprio órgão jurisdicional como plus negativo de facilitar ainda mais a segregação.

A situação era tão grave que à época recebemos vários e-mail’s, pois tínhamos escrito anteriormente sobre o assunto, de pessoas que se sentiam discriminadas já que a primeira atitude que o entrevistador tinha, ao realizar a entrevista do candidato para o novo emprego, era a de pesquisar o nome do candidato à vaga no sites dos tribunais trabalhista para verificar se seu nome figurava em algum processo judicial.

Á época um dos casos que mais nos chamaram a atenção foi a de um senhor que, ao ser demitido de um alto cargo de gerência que exercia em uma instituição financeira, não conseguiu mais emprego em nenhuma instituição equivalente, pois em todas as entrevistas era censurado por já haver ajuizado reclamação trabalhista na Justiça do trabalho contra seu ex-empregador e esta informação era obtida justamente no site o tribunal regional do trabalho. Em resumo, este bancário teve que se mudar para a Inglaterra para trabalhar como garçom para poder sustentar sua família uma vez que, no Brasil, não conseguiria um novo emprego.

Entendemos que o procedimento de disponibilização de dados judiciais do trabalhador nos sites de tribunais fere frontalmente sua privacidade, e, pior atenta contra o livre acesso do trabalhador a um novo emprego e, por isso, defendo tese de mossa autoria e esposada em trabalho jurídico intitulado "Responsabilidade Civil do Estado: Danos provenientes de veiculação de dados nos sites dos tribunais" realizado em 2003 e publicado pela revista Síntese onde demonstramos que o Estado deve ser responsabilizado de forma objetiva pelos danos que o trabalhador vier a ter em virtude da disponibilização indiscriminada de seus dados judiciais em sites dos tribunais regionais do trabalho.

Mesmo diante de tudo isso referidos dados, ainda vieram a ser disponibilizados por muito tempo pelos sites dos tribunais causando prejuízos incalculáveis a vários e, pior, anônimos trabalhadores. A primeira medida efetiva contra essa disponibilização foi a do Tribunal Regional do Trabalho da 14º. Região que por intermédio de provimento resolveu em 13/12/2001 retirar de seu site a pesquisa pelo nome do reclamante. Meses depois o Tribunal Superior do Trabalho, precisamente em 30/08/2002, expediu circular para todos os Tribunais Regionais do Trabalho para que tirassem a ferramenta de pesquisa pelo nome do reclamante.

Além disso, a nível internacional, participamos da elaboração das Regras de Heredia que são diretrizes a serem adotadas pelos órgãos judiciais para proteção de dados de seus jurisdicionados elaboradas no encontro denominado "Internet y Sistema Judicial em América Latina y el Caribe" (Home-page: http://www.iijusticia.edu.ar/Seminario_Taller/) realizado pelo Instituto de Investigación para la Justicia Argentina, Corte Suprema da Costa Rica e International Development Research Centre do Canadá onde foram analisados por especialistas e ministros de cortes superiores de justiça de vários países da América Latina, inclusive do Brasil, os benefícios e dificuldades advindas das home-pages dos Poderes Judiciais na rede, os programa de transparência e proteção de dados pessoais.

Portanto, após esta pequena demonstração do quanto é importante o estudo do impacto da informática nas relações de trabalho passaremos a analisar o caso específico que diz respeito ao monitoramento do correio eletrônico do empregado pelo empregador começando pela conceituação do e-mail, poder diretivo do empregador, legislação estrangeira e nacional, jurisprudências alienígenas e nacionais e por fins as recomendações para a melhor utilização do e-mail no ambiente de trabalho.

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