Tecnologias do conhecimento: os desafios da educação

Enviado por Ladislau Dowbor


Partes: 1, 2, 3

  1. Tecnologias do Conhecimento
  2. Um mundo intensivo em conhecimento
  3. Salto tecnológico da informática e da comunicação
  4. Deslocamento dos paradigmas da educação
  5. A educação articuladora dos espaços do conhecimento
  6. Tecnologias do conhecimento e tecnologias organizacionais
  7. Tecnologias do conhecimento e desafios institucionais
  8. Comunicação, escola e comunidade
  9. Comunicação e Poder: os novos desafios
  10. Potencial de democratização
  11. Resumo e Conclusões
  12. Bibliografia

Março de 2001

Terminada a última guerra mundial foi encontrada, num campo de concentração nazista, a seguinte mensagem dirigida aos professores:

"Prezado Professor,
Sou sobrevivente de um campo de concentração.
Meus olhos viram o que nenhum homem deveria ver.
Câmaras de gás construídas por engenheiros formados.
Crianças envenenadas por médicos diplomados.
Recém-nascidos mortos por enfermeiras treinadas.
Mulheres e bebês fuzilados e queimados por graduados de
colégios e universidades.
Assim, tenho minhas suspeitas sobre a Educação.
Meu pedido é: ajude seus alunos a tornarem-se humanos.
Seus esforços nunca deverão produzir monstros treinados ou
psicopatas hábeis.
Ler, escrever e aritmética só são importantes
Para fazer nossas crianças mais humanas.".

As tecnologias são importantes, mas apenas se soubermos utilizá-las. E saber utilizá-las não é apenas um problema técnico.

Tecnologias do Conhecimento

Tentamos aqui identificar as grandes linhas do imenso potencial que abrem as novas tecnologias do conhecimento, e também os novos perigos que apresentam. A educação já não pode funcionar sem se articular com dinâmicas mais amplas que extrapolam a sala de aula. Da mesma forma, a economia já não pode funcionar de maneira adequada sem enfrentar a questão da organização social do conhecimento.

O autor destas linhas é economista. Porque está se aventurando nesta área que normalmente é da educação? Por um lado, porque ensinar economia é um trabalho de educação, e não há educador que não sinta que estamos avançando para novos horizontes. Por outro lado, estamos avançando a passos largos para uma sociedade do conhecimento, e a problemática da educação se tornou central para todos nós, para o desenvolvimento econômico e social de maneira geral.

As tecnologias em si não são ruins. Fazer mais coisas com menos esforço é positivo. Mas as tecnologias sem a educação, conhecimentos e sabedoria que permitam organizar o seu real aproveitamento, levam-nos apenas a fazer mais rápido e em maior escala os mesmos erros. Achávamos que o essencial para desenvolver o país seria criar fábricas e bancos. Hoje constatamos que sem os conhecimentos e a organização social correspondente, construímos uma modernidade com pés de barro, um luxo de fachada que já não engana mais ninguém.

Alguns trechos do presente livro apareceram em artigos, ou capítulos de livros. Com a dimensão dos desafios que enfrentamos, achamos útil elaborar uma visão de conjunto, e apresentar os nossos principais desafios de maneira sistematizada, ainda que sumária.

1 - Da educação à gestão do conhecimento

As transformações que hoje varrem o planeta vão evidentemente muito além de uma simples mudança de tecnologias de comunicação e informação. No entanto, as TCI, como hoje são chamadas, desempenham um papel central. E na medida em que a educação não é uma área em si, mas um processo permanente de construção de pontes entre o mundo da escola e o universo que nos cerca, a nossa visão tem de incluir estas transformações. Não é apenas a técnica de ensino que muda, incorporando uma nova tecnologia. É a própria concepção do ensino que tem de repensar os seus caminhos.

Tradicionalmente, a educação seria um intrumento destinado a adequar o futuro profissional ao mundo do trabalho, disciplinando-o, e municiando-o de certa maneira com conhecimentos técnicos, para que possa "vencer na vida", inserindo-se de forma vantajosa no mundo como existe. Esta inserção vantajosa, por sua vez, asseguraria reconhecimento e remuneração, ou seja, "sucesso".

Este paradigma, amplamente dominante, gerou outra visão, contestadora, que tenta assegurar à educação uma autonomia que lhe permita centrar-se nos valores humanos, na formação do cidadão, na visão crítica e criativa. Virgem de relações com o mundo econômico, de certa forma, esta educação estaria livre dos moldes que este lhe quer impor.

Sem os instrumentos técnicos para ser competente na linha profissionalizante, e frágil demais para ser transformadora, a educação realmente existente termina por constituir um universo relativamente ilhado dos processos de transformação econômica e social.

O mundo que hoje surge constitui ao mesmo tempo um desafio ao mundo da educação, e uma oportunidade. É um desafio, porque o universo de conhecimentos está sendo revolucionado tão profundamente, que ninguém vai sequer perguntar à educação se ela quer se atualizar. A mudança é hoje uma questão de sobrevivência, e a contestação não virá de "autoridades", e sim do crescente e insustentável "saco cheio" dos alunos, que diariamente comparam os excelentes filmes e reportagens científicos que surgem nas televisão e nos jornais, com as mofadas apostilas e repetitivas lições da escola.

Mas surge também a oportunidade, na medida em que o conhecimento, matéria prima da educação, está se tornando o recurso estratégico do desenvolvimento moderno. O conhecimento científico, é preciso dizê-lo, nunca esteve no centro dos processos de transformação social. Desempenhava um papel folclórico na Grécia antiga, mais preocupada com as guerras, e mobilizou minorias ínfimas em termos sociais nas grandes civilizações, seja da China, de Roma, ou do mundo árabe.

Frente às transformações tecnológicas que varrem o planeta, o mundo da educação permanece como que anestesiado, cortado de boa parte do processo de pesquisa e desenvolvimento, hoje essencialmente concentrado nas empresas transnacionais, e privado de uma visão mais ampla do desafio que tem de enfrentar. A realidade é que, por primeira vez, a educação se defronta com a possibilidade de influir de forma determinante sobre o nosso desenvolvimento.

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