O uso dos telemóveis generalizou-se de tal modo, que se pode afirmar que essa tecnologia se naturalizou, passou a fazer parte integrante das dinâmicas do indivíduo. Quem não tem hoje um telemóvel em Portugal e, no mundo ocidental em geral? O fenómeno expandiu-se sem olhar a classe social, económica, cultural, género ou idade. Os serviços disponibilizados pelos equipamentos foram-sedesdobrandopara atrair esatisfazer necessidades e desejos.
Onde quer que se esteja está-se com quem e com o que se quer e precisa – "A era da conexão é a era da mobilidade" (Lemos,2004:3). Abre-se uma nova vaga na dinâmica das rotinas cognitivas e sociais metamorfoseadas pelas tecnologias da informação e da comunicação, em que a ubiquidade e o nomadismo são características marcantes. Mas, não deixa de ser igualmente marcante a nova dinâmica de gestão dos contactos e dos laços sociais. O que aparentemente traria um alargamento do círculo de sociabilidade, afinal afigura-se como meio de fechamento do sujeito num círculo restrito e controlado, no qual só entra quem é reconhecido. Deste modo, gerandoo queGournay(2002:355) designa de insularidade mediática mas, que também poderemos designar de geração de arquipélagos de comunicação – «L"insularité médiatique constitue la propriété marquante de la communication mobile, autant dans l"espace public que prive. Une insularité mouvante qui assure une fluidité maximale de la circulation des informations et des personnes, au prix de l"évitement ou du contournement de la proximité indésirable avec l"entourage, qu"il s"agisse du public anonyme, de clients ou d"administrés inopportuns, ou tout simplement derelations trop pesantes.»(Gournay2002:355).
Com a expansão do uso das comunicações móveis são identificados três níveis de tensão com a ecologia do espaço público (Morel,2002:51), a saber: o primeiro deve-se às melodias e sonoridades intempestivas que ferem a dinâmica sonora e relacional dos espaços; em segundo lugar, o acto de telefonar onde quer que se esteja altera os modos de presença e relacionamento com o espaço públicos e respectivos actores, alguns dos quais passama estar presentes, mesmo na ausência física; num terceiro nível, o uso público de meios de comunicação móvel transporta do que foi durante muito tempo tido como do espaço privado para o espaço público, ou seja, o acto de telefonar estava associado ao lar ou ao espaço de trabalho, passa agora a estar onde quer que estejamos, com especial impacto na dinâmica de estar no espaço público ou em espaço partilhados (semi-públicos).
A presente comunicação propõe-se reflectir sobre as mudanças sociais que a comunicação móvel introduz e apresentar alguns resultados frutos de estudos empíricos. Deste modo, pretende-se dar um contributo para estimular a reflexão sobre as implicações do uso de uma tecnologia que se alojou no nosso quotidiano como um vírus multi-resistente ao qual ninguém escapa, mesmo os quetentamminimizar a sua presença eimpacto, taléa pressãosocial.
No contexto actualos desafios face às tecnologias de comunicação móveis não são tanto de natureza tecnológica mas sim de natureza sócio-tecnica, ou seja, analisar e reflectir as repercussões sociais de uma tecnologia no âmbito dos relacionamentos e das representações. Como bem sublinhou Postman (1994) a introdução de uma tecnologia num determinado contexto social nunca é meramente aditiva mas, sim, ecossistémica. Muda tudo. Com o crescente uso das comunicações móveis a paisagem das práticas de comunicação inter-individual mudou de forma considerável. O uso de dispositivos de comunicações móveis deve ser perspectivados segundo três características transversais, talcomo pospõe Licope e Relieu (2002,9-10):
Trata-se de um objecto portátil que redefine o tipo de investimento necessário para a pessoa estabelecer relações. Basta pensar na facilidade com que se inicia uma chamada telefónica num telemóvel: selecciona-se o nome da pessoa com quem se quer comunicar, enquanto que num telefone público ou no telefone doméstico se terá de marcar o número. É certo que se assiste à transferência de facilidades típicas dos telemóveis para os telefones fixos, como exemplo a possibilidade de ter os números registados em memória, a identificação da pessoa/número que está a querer entrar emcontacto, o envio e recepção de mensagens escritas ou o registo de mensagens de voz. Estes são exemplos que ilustram como a ferramenta sócio-técnica que é o telemóvel está a contaminar o seu antecessor, que também ganhou alguma portabilidade doméstica, com os telefones sem fios.
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