Fraude à execução, registro imobiliário e boa-fé objetiva



  1. Resumo
  2. Introdução
  3. Alienação na pendência de ação reivindicatória (art. 593, I, do CPC)
  4. Alienação por devedor insolvente (art. 593, II, do CPC)
  5. A questão da boa-fé na hipótese de alienação por devedor insolvente e a posição da jurisprudencia
  6. Alienação de imóvel penhorado (art. 593, III, do CPC c.c. art. 240 da LRP)
  7. Conclusão

Resumo

Há várias modalidades de fraude á execução e todas levam á ineficácia da compra do bem em face do credor-exeqüente. Porém, pode estar o comprador do bem imóvel de boa-fé, desconhecendo a existência da fraude á execução. Essa boa-fé do comprador tem o condão de tornar eficaz a aquisição também em face do credor? A solução apontada pelo artigo responde essa pergunta, discriminando a hipótese da existência, no plano prático, da possibilidade do comprador saber da existência da ação contra o vendedor, da hipótese em que isso não é possível. A solução dada pelo artigo protege o adquirente cauteloso, que tem sua boa-fé aferida objetivamente. Para aferição dessa boa-fé do adquirente, tem grande relevo os registros constantes do cartório imobiliário e dos distribuidores judiciais, haja vista que esses órgãos conferem publicidade aos atos.

1.Introdução.

O bem imóvel adquirido em fraude á execução continua passível de responder pelos débitos de seu antigo proprietário, por força do disposto no arts. 592, V, e 593, do CPC.

Discute-se, na doutrina e na jurisprudência, a questão da relevância da existência da boa-fé do adquirente do imóvel para efeito de tornar a alienação do imóvel eficaz também em face do credor. A questão não é pacífica.

Vejamos as modalidades de fraude á execução, bem como o modo pelo qual pode ser caracterizada a a existência da boa-fé do comprador e a questão da sua eventual relevância.

2.Alienação na pendência de ação reivindicatória (art. 593, I, do CPC).

A aquisição de imóvel litigioso, isto é, na qual existe demanda afirmando que aquele que consta como proprietário no registro de imóveis na verdade não o é, caracteriza fraude á execução nos termos do art. 593, I, do CPC.

Com efeito, não é possível ao comprador sustentar que desconhece a existência da ação reinvidicatória, pois um mínimo de cautela a ele exigível consiste na obtenção, no distribuidor cível da comarca onde está situado o imóvel, das distribuições cíveis em face do vendedor. Quem não faz nem isso é, seguramente, um incauto; não está, objetivamente, de boa-fé, não merecendo ser protegido pelo direito. Além do mais, o art. 1º, da Lei nº 7.433, de 18/12/85, exige a apresentação da certidão do distribuidor cível por ocasião da lavratura do instrumento de compra e venda.

é imperioso lembrar que a ação reinvindicatória somente pode tramitar na comarca de situação do imóvel. é caso de competência absoluta, a despeito de ser territorial.

é verdade que o autor da ação reivindicatória, que deixa de providenciar o registro da citação da ação na matrícula do imóvel, também não está agindo, objetivamente, de boa-fé. Ele tem o dever, decorrente do princípio da boa-fé objetiva, de proteger o seu suposto direito, devendo providenciar o registro da ação para que todos os possíveis compradores do imóvel possam saber da existência da ação. Há de se analisar, assim, quais são os efeitos da omissão do autor da ação reivindicatória em proceder ao registro da citação na matrícula do imóvel.

No tocante á eficácia da decisão judicial de procedência da ação em face do comprador, qual a melhor solução para a hipótese em que o comprador não obteve a certidão do distribuidor cível e o reivindicante não promoveu o registro da citação da sua ação no cartório imobiliário?

Poderíamos entender, inicialmente, que a obrigatoriedade do registro, mencionada no art. 169 da LRP, exige que o autor da ação proceda ao registro da citação na matrícula do imóvel, sob pena do resultado do julgamento não ser oponível a terceiros.

Essa solução é adotada por parte da doutrina e da jurisprudência. Há, porém, outra solução, que, com a devida venia, é de melhor técnica.

Na verdade, ainda que se admita que o art. 169 da LRP imponha obrigação do registro á parte e não apenas ao cartório imobiliário, a conseqüência jurídica da ausência do registro, por ato omissivo do autor da ação, não será a de impedir que os efeitos da ação reivindicatória atinjam o comprador. E é assim porque a lei não impõe essa sanção á omissão.

Com efeito, o art. 42, § 3º, do CPC, é claro ao determinar a estensão dos efeitos da decisão proferida em razão da ação reivindicatória ao adquirente do imóvel. Não há, portanto, na lei, qualquer exigência a somente ter eficácia esse dispositivo na hipótese de existência do registro da citação na matrícula do imóvel. Ele tem plena eficácia se ocorrente no caso a sua previsão abstrata.

Assim, com ou sem registro da citação na matrícula do imóvel, na hipótese de procedência da ação reivindicatória, o comprador perderá o direito á propriedade do bem, nos exatos termos do art. 42, § 3º, do CPC.


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