A jurisdição e seus princípios



  1. Jurisdição - considerações gerais
  2. Princípio da investidura
  3. Princípio da indeclinabilidade ou da inafastabilidade
  4. Princípio da indelegabilidade
  5. Princípio da improrrogabilidade
  6. Princípios da iniciativa das partes e da inércia
  7. Princípio da correlação
  8. Princípio da definitividade
  9. Princípio do juiz natural

JURISDIÇÃO - CONSIDERAÇÕES GERAIS

A jurisdição - palavra que tem sua origem na composição das expressões jus, júris (direito) e dictio, dictionis (ação de dizer) - surgiu da necessidade jurídica de se impedir que a prática temerária da autodefesa, por parte de indivíduos que se vissem envolvidos em um conflito, levasse a sociedade à desordem oriunda da inevitável parcialidade da justiça feita com as próprias mãos.

O Estado chamou para si o dever de manter estável o equilíbrio da sociedade e, para tanto, em substituição às partes, incumbiu-se da tarefa de administrar a justiça, isto é, de dar a cada um o que é seu, garantindo, por meio do devido processo legal, uma solução imparcial e ponderada, de caráter imperativo, aos conflitos interindividuais.

Reconhecendo a necessidade de um provimento desinteressado e imparcial, o Estado, mesmo sendo o titular do direito de punir - detentor da pretensão punitiva - autolimitou seu poder repressivo atribuindo aos chamados órgãos jurisdicionais a função de buscar a pacificação de contendas, impondo, soberanamente, a norma que, por força do ordenamento jurídico vigente, deverá regular o caso concreto.

O Estado, então, por intermédio do Poder Judiciário, busca, utilizando-se do processo, investigar qual dos litigantes tem razão, aplicando, ao final, a lei ao caso litigioso em comento.1

Eis aí o conceito de jurisdição.

Cintra, Grinover e Dinamarco a definem como sendo "uma das funções do Estado, mediante a qual este se substitui aos titulares dos interesses em conflito para, imparcialmente, buscar a pacificação do conflito que os envolve, com justiça".2 Em outras palavras, apregoam os autores que "através do exercício da função jurisdicional, o que busca o Estado é fazer com que se atinjam, em cada caso concreto, os objetivos das normas de direito substancial".3

Nesse mesmo sentido, Tourinho Filho conceitua jurisdição como "aquela função do Estado consistente em fazer atuar, pelos órgãos jurisdicionais, que são os juízes e Tribunais, o direito objetivo a um caso concreto, obtendo-se a justa composição da lide".4 Reforça ainda que "esse poder de aplicar o direito objetivo aos casos concretos, por meio do processo, e por um órgão desinteressado, imparcial e independente, surgiu, inegavelmente, como impostergável necessidade jurídica à própria sobrevivência do Estado".5

Importa frisar que o fato de ser a jurisdição uma emanação da própria soberania estatal originou o artigo 345 do Código Penal, onde está estabelecido como crime o fazer justiça com as próprias mãos, mesmo se tratando de pretensão legítima.

Cintra, Grinover e Dinamarco lembram que a jurisdição é, ao mesmo tempo, poder, função e atividade. Como poder, é uma emanação da soberania nacional. Como função, é a incumbência afeta ao órgão jurisdicional de, por meio do processo, aplicar a lei aos casos concretos. Como atividade, é o complexo de atos do juiz no processo, tendentes a dar a cada um o que é seu.6

Observe-se, contudo, que não só o Poder Judiciário exerce a função jurisdicional. Por esse motivo, Scarance Fernandes7 e Mirabete8 lecionam que a jurisdição, quanto à função, pode ser ordinária ou comum e extraordinária ou especial, conforme o órgão que a exerça ser pertencente (ordinária) ou não (extraordinária) ao Poder Judiciário. Um exemplo clássico de jurisdição extraordinária é aquela exercida pelo Senado Federal, nos termos do artigo 52, inciso I e II, da Constituição Federal.

A doutrina costuma atribuir à jurisdição algumas características que lhe são inerentes. Para Cintra, Grinover e Dinamarco, a existência de uma lide, a inércia dos órgãos jurisdicionais (princípio da inércia) e a suscetibilidade de os atos jurisdicionais tornarem-se imutáveis (princípio da definitividade) são as três características básicas da jurisdição.9 Tourinho Filho, por sua vez, acresce às características citadas pelos sobreditos doutrinadores a substitutividade, que ocorre quando o juiz, no exercício da atividade jurisdicional, como terceiro revestido de desinteresse e imparcialidade, substitui os interessados na aplicação da justiça ao caso concreto, privando-os de, pelas próprias mãos, buscarem a satisfação de suas pretensões.


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