A fundamentalidade dos Direitos Sociais no Estado Democrático de Direito



  1. Resumo
  2. Considerações introdutórias
  3. A fundamentalidade dos direitos sociais e o princípio da proibição de retrocesso social
  4. Considerações finais
  5. Referências bibliográficas

O que me impressiona à vista de um macaco, não é que ele tenha sido nosso passado: é este pressentimento de que ele venha ser nosso futuro. Mário Quintana (1973, p. 22).

Título: A fundamentalidade dos Direitos Sociais no Estado Democrático de Direito.

Resumo

O artigo discute o papel dos Direitos Fundamentais frente à moderna Teoria da Constituição. Em razão disto, adota o entendimento de que os direitos sociais são direitos fundamentais, incitando a discussão justificada e fundamentada acerca dos valores albergados e escolhidos pela Constituição Federal ao erigir no Brasil o Estado Democrático de Direito. O artigo visa demonstrar a necessidade de uma hermenêutica constitucional condizente com a realidade brasileira e fomentadora da verdadeira democracia.

Palavras-chave: Direitos Fundamentais - Direitos Sociais - Estado Democrático de Direito - Hermenêutica Jurídico-Constitucional.

Title: The fundamentability of the Social Rights in the Legal Democratic State

Abstract: This essay discusses the role of the Fundamental Rights opposed to the modern Constitutional Theory. Therefore, it is conceived that the social rights are fundamental rights, instigating a justified and grounded discussion upon the sheltered and chosen values of the Federal Constitution when founding the Legal Democratic State in Brazil. The article seeks to demonstrate the necessity of one constitutional hermeneutics well suited with the Brazilian reality as well as stimulator of the true democracy.

Key Words: Fundamental rights; Social Law; Legal democratic state, Legal Hermeneutics

1. Considerações Introdutórias


O presente artigo tem como fito discutir o papel dos direitos fundamentais frente à moderna teoria da constituição. Para tanto, adota o entendimento de que os direitos sociais são direitos fundamentais. Utilizando-se desta premissa, mister se faz uma justificação e fundamentação acerca de quais benefícios traz tal entendimento ao destinatário final da Constituição, o cidadão brasileiro.

A temática é de extrema relevância, mormente quando se observa uma tendência de supressão destes direitos e minimização de sua aplicabilidade.

Os direitos sociais, por sua própria natureza, invocam do poder político uma demanda de recursos para sua aplicabilidade plena, o que gera fortes pressões ideológicas e envolve escolhas políticas determinantes para conseguir alcançar o ideal de uma sociedade livre, justa e solidária1 , objetivo consagrado em nossa Carta Magna.

Elencados do art. 6º ao 11º da Constituição Federal, os direitos sociais são: educação, saúde, trabalho, moradia, lazer, segurança, previdência social, proteção à maternidade e à infância e assistência aos desamparados. Entretanto, o conteúdo de que o art. 7 ao 11 trata é exclusivamente de conteúdo normativo referente ao trabalho, onde muitas garantias, ainda que mínimas, são garantidas ao trabalhador brasileiro, seja ele urbano ou rural. A visão de que os direitos sociais são também direitos fundamentais exsurge como um escudo de proteção a estes direitos, inclusive por meio de Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental - ADPF, impingindo um dever de observância e realização material dos mesmos.

2. A Fundamentalidade dos Direitos Sociais e o Princípio da Proibição de Retrocesso Social


Em que pese a topologia constitucional não privilegiar a vertente de pensamento que acolhe os direitos sociais como fundamentais, sua essencialidade reside em sua ligação aos direitos humanos e à dignidade da pessoa humana, valores albergados na principiologia constitucional, consagrados doutrinária e jurisprudencialmente.

Muito se discute sobre a inclusão ou não dos direitos sociais no rol das cláusulas pétreas, uma vez que a Constituição adotou uma terminologia que não abriga, à primeira vista, esta posição. E, a partir da leitura do art. 60, § 4º, inciso IV da Constituição Federal2 a controvérsia ganha corpo. A interpretação literal abre um horizonte para a imprecisão dos vocábulos usados, uma vez que estes não se repetem em nenhum outro lugar da Constituição.

Há referências no texto constitucional de direitos individuais e coletivos no art. 5º da CF, de modo que a interpretação literal deixaria de fora o rol do art. 5º, resultado absurdo num Estado submetido às leis sob um regime democrático. A interpretação literal não se presta a elucidar a questão, pelo próprio caráter sistemático adotado na redação da Constituição.

Para resolver o problema, a adoção do entendimento de que tanto os direitos individuais quanto os coletivos são cláusulas pétreas exsurge viável, até mesmo pela orientação hermenêutica emanada do próprio art. 5º, § 2º da CF que diz expressamente: "os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou os tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte". O que orienta de maneira incontroversa que se trata de um rol exemplificativo.

A leitura restritiva dos direitos fundamentais resulta em notável prejuízo ao cidadão, porque este terá seu patrimônio jurídico reduzido. Isto ocorre de forma numérica, quando reduz o rol de direitos fundamentais, quanto de forma sofisticada, através do enquadramento dos direitos sociais como normas programáticas.

O encarceramento dos direitos fundamentais sociais no conceito frágil e patético de normas programáticas não faz sentido, uma vez que os valores sociais são os pilares do Estado Democrático de Direito3 . E o que são as cláusulas pétreas se não o reconhecimento de que aqueles valores são de suma importância e por isto precisam ser cuidadosamente protegidos dos reveses políticos, marcados pela instabilidade e pelo jogo ou troca de interesses? Sendo assim, a manutenção da nossa ordem constitucional emerge como única forma de não contradizer a finalidade dela mesma.

No plano do direito internacional, o Brasil foi signatário de alguns tratados que reconhecem os direitos sociais como direitos humanos fundamentais, a exemplo da Declaração Universal de Direitos Humanos (1948), Protocolo de São Salvador (1988) adicional à Convenção Americana sobre Direitos Humanos (1969) e o Pacto de São José da Costa Rica. Neste último, o Brasil acolheu expressamente o princípio do não retrocesso social, também chamado de aplicação progressiva dos direitos sociais4 .

Joaquim José Gomes Canotilho (1998, p. 221) ao demarcar o ser humano como fundamento da República e limite maior ao exercício dos poderes políticos inerentes à representação política ressalta a importância da dignidade da pessoa humana albergada no ordenamento:

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