- Resumo
- Considerações introdutórias
- A fundamentalidade dos direitos
sociais e o princípio da proibição de retrocesso social
- Considerações finais
- Referências bibliográficas
O que
me impressiona à vista de um macaco, não é que ele tenha sido nosso passado: é
este pressentimento de que ele venha ser nosso futuro. Mário Quintana (1973, p.
22).
Título: A fundamentalidade dos Direitos
Sociais no Estado Democrático de Direito.
O artigo discute o papel dos Direitos
Fundamentais frente à moderna Teoria da Constituição. Em razão disto, adota o
entendimento de que os direitos sociais são direitos fundamentais, incitando a
discussão justificada e fundamentada acerca dos valores albergados e escolhidos
pela Constituição Federal ao erigir no Brasil o Estado Democrático de Direito.
O artigo visa demonstrar a necessidade de uma hermenêutica constitucional
condizente com a realidade brasileira e fomentadora da verdadeira democracia.
Palavras-chave: Direitos Fundamentais -
Direitos Sociais - Estado Democrático de Direito - Hermenêutica
Jurídico-Constitucional.
Title: The fundamentability of the
Social Rights in the Legal Democratic State
Abstract: This essay discusses the
role of the Fundamental Rights opposed to the modern Constitutional Theory.
Therefore, it is conceived that the social rights are fundamental rights,
instigating a justified and grounded discussion upon the sheltered and chosen
values of the Federal Constitution when founding the Legal Democratic State in Brazil.
The article seeks to demonstrate the necessity of one constitutional
hermeneutics well suited with the Brazilian reality as well as stimulator of
the true democracy.
Key Words: Fundamental rights; Social
Law; Legal democratic state, Legal Hermeneutics
O presente artigo tem como fito discutir o papel dos direitos fundamentais
frente à moderna teoria da constituição. Para tanto, adota o entendimento de
que os direitos sociais são direitos fundamentais. Utilizando-se desta
premissa, mister se faz uma justificação e fundamentação acerca de quais benefícios
traz tal entendimento ao destinatário final da Constituição, o cidadão
brasileiro.
A temática é de extrema relevância, mormente quando se observa uma tendência de
supressão destes direitos e minimização de sua aplicabilidade.
Os direitos sociais, por sua própria natureza, invocam do poder político uma
demanda de recursos para sua aplicabilidade plena, o que gera fortes pressões
ideológicas e envolve escolhas políticas determinantes para conseguir alcançar
o ideal de uma sociedade livre, justa e solidária1 , objetivo
consagrado em nossa Carta Magna.
Elencados do art. 6º ao 11º da Constituição Federal, os direitos sociais são:
educação, saúde, trabalho, moradia, lazer, segurança, previdência social,
proteção à maternidade e à infância e assistência aos desamparados. Entretanto,
o conteúdo de que o art. 7 ao 11 trata é exclusivamente de conteúdo normativo
referente ao trabalho, onde muitas garantias, ainda que mínimas, são garantidas
ao trabalhador brasileiro, seja ele urbano ou rural. A visão de que os direitos
sociais são também direitos fundamentais exsurge como um escudo de proteção a
estes direitos, inclusive por meio de Ação de Descumprimento de Preceito
Fundamental - ADPF, impingindo um dever de observância e realização material
dos mesmos.
Em que pese a topologia constitucional não privilegiar a vertente de pensamento
que acolhe os direitos sociais como fundamentais, sua essencialidade reside em
sua ligação aos direitos humanos e à dignidade da pessoa humana, valores
albergados na principiologia constitucional, consagrados doutrinária e
jurisprudencialmente.
Muito se discute sobre a inclusão ou não dos direitos sociais no rol das
cláusulas pétreas, uma vez que a Constituição adotou uma terminologia que não
abriga, à primeira vista, esta posição. E, a partir da leitura do art. 60, §
4º, inciso IV da Constituição Federal2 a controvérsia ganha corpo. A
interpretação literal abre um horizonte para a imprecisão dos vocábulos usados,
uma vez que estes não se repetem em nenhum outro lugar da Constituição.
Há referências no texto constitucional de direitos individuais e coletivos no
art. 5º da CF, de modo que a interpretação literal deixaria de fora o rol do art.
5º, resultado absurdo num Estado submetido às leis sob um regime democrático. A
interpretação literal não se presta a elucidar a questão, pelo próprio caráter
sistemático adotado na redação da Constituição.
Para resolver o problema, a adoção do entendimento de que tanto os direitos
individuais quanto os coletivos são cláusulas pétreas exsurge viável, até mesmo
pela orientação hermenêutica emanada do próprio art. 5º, § 2º da CF que diz
expressamente: "os direitos e garantias
expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos
princípios por ela adotados, ou os tratados internacionais em que a República
Federativa do Brasil seja parte". O que orienta de maneira
incontroversa que se trata de um rol exemplificativo.
A leitura restritiva dos direitos fundamentais resulta em notável prejuízo ao
cidadão, porque este terá seu patrimônio jurídico reduzido. Isto ocorre de
forma numérica, quando reduz o rol de direitos fundamentais, quanto de forma
sofisticada, através do enquadramento dos direitos sociais como normas
programáticas.
O encarceramento dos direitos fundamentais sociais no conceito frágil e
patético de normas programáticas não faz sentido, uma vez que os valores
sociais são os pilares do Estado Democrático de Direito3 . E o que
são as cláusulas pétreas se não o reconhecimento de que aqueles valores são de
suma importância e por isto precisam ser cuidadosamente protegidos dos reveses
políticos, marcados pela instabilidade e pelo jogo ou troca de interesses?
Sendo assim, a manutenção da nossa ordem constitucional emerge como única forma
de não contradizer a finalidade dela mesma.
No plano do direito internacional, o Brasil foi signatário de alguns tratados
que reconhecem os direitos sociais como direitos humanos fundamentais, a
exemplo da Declaração Universal de Direitos Humanos (1948), Protocolo de São
Salvador (1988) adicional à Convenção Americana sobre Direitos Humanos (1969) e
o Pacto de São José da Costa Rica. Neste último, o Brasil acolheu expressamente
o princípio do não retrocesso social, também chamado de aplicação progressiva
dos direitos sociais4 .
Joaquim José Gomes Canotilho (1998, p. 221) ao demarcar o ser humano como
fundamento da República e limite maior ao exercício dos poderes políticos
inerentes à representação política ressalta a importância da dignidade da
pessoa humana albergada no ordenamento: