O sistema processual vigente conhece várias categorias de eficácia de sentença, sendo que a doutrina tradicional parece conceber como classificação das ações, tão-só a trinária ou ternária, como querem outros, mesmo sob os olhares críticos de Luiz Guilherme Marinoni. (1)
A doutrina brasileira pouco tem tratado do assunto, restando apenas alguns apontamentos da doutrina tradicional que praticamente só admite a existência de três categorias de eficácia da sentença:
"a) declaratória - que
declara a existência ou a inexistência de relação jurídica, a falsidade ou a
autenticidade de certo documento, mais precisamente, declara uma situação
preexistente;
b) condenatória - que condena o
réu a dar, pagar, fazer ou não fazer alguma coisa, preparando a execução
futura, com a criação de um título executivo judicial;
c) constitutiva - por sua força
assegura ao autor a criação, a modificação ou a extinção de uma relação
jurídica."(2)
Glauco Gumerato Ramos doutrina que "o tema da classificação das ações ganha relevo a partir da empreitada de processualistas italianos, em especial da primeira metade do século XX, em classificar as ações de conhecimento, o que fizeram levando em consideração o conteúdo da respectiva sentença, ou, afirmou Liebman, a partir dos diferentes tipos de sentença que o autor pede". Daí surge a divisão trinaria (ou clássica) das ações de conhecimento em ação meramente declaratória, ação constitutiva e ação condenatória".(3)
Deixando ao largo essa classificação trinária, ao que parece já superada, alguns processualistas falam ainda na existência da classificação quinária, fase pós Pontes de Miranda, incluindo mais duas categorias de cargas eficaciais presentes em muitas sentenças.
Seriam elas, segundo Pietroski, mais as seguintes, completando as cinco:
"d) mandamental - mero ato estatal praticado pelo juiz em substituição da parte autora, sem, contudo, produzir coisa julgada material;
e) executiva - contém no seu bojo uma força interna, oriunda do direito material com aptidão para realizar uma mudança no mundo físico."(4)
Dessa classificação, trinária e quinária, trata também Joel Dias Figueira Júnior, mas com outra conotação.
Diz ele: "afigura-se-nos a formulação de uma classificação diversa das "ações" tomando-se como ponto de partida e critério a tutela jurisdicional perseguida e baseada na respectiva relação de direito material sobre a qual incidirá a proteção pleiteada. Nessa seqüência, classificamos as ações da seguinte forma: a) declaratória; b) constitutiva; c) ressarcitória; d) recuperatória; e) vindicatória; f) inibitória; g) acautelatória; e h) executivas stricto sensu."(5)
Dinamarco(6) e José Garcia Medina(7), dentre outros, já trataram do princípio do sincretismo entre cognição e execução.
Como não é nosso propósito questionar ou querer polemizar as teorias sobre classificação das ações, mas tão somente tratar das ações sincréticas, tema que exige conhecimento, ainda que superficial, sobre a classificação das ações, acreditamos que o instituto ora sob comento, deverá ser nos próximos anos a base de todo procedimento; consignamos a observação acima pois está na doutrina das ações e fatalmente sobre ela muito se verá escrito doravante.
Denominam-se ações sincréticas "todas as demandas que possuem em seu bojo intrínseca e concomitantemente cognição (processo de conhecimento) e execução, ou seja, não apresentam a dicotomia entre conhecimento e executividade, verificando-se a satisfação perseguida pelo jurisdicionado numa única relação jurídico-processual, onde a decisão interlocutória de mérito (provisória) ou a sentença de procedência do pedido (definitiva) serão auto-exequíveis."(8)
Ganha-se tempo, custo e torna-se o processo mais rápido e eficaz, o que á toda evidência, representa melhor distribuição e acesso á Justiça.
Na linguagem gramatical, o sincretismo é o nome que se dá ao fenômeno de uma palavra exercer duas ou mais funções.(9)
é claro que ao se falar em ações sincréticas, o sentido é o da linguagem gramatical, pela qual temos as duas funções de um processo, conhecimento e execução, numa mesma fase.
Não há nenhuma conotação filosófica, onde o termo sincretismo foi usado por RENAN (L´avenir de la science) para distinguir três atos do conhecimento humano relativo a um objeto completo: 1º) visão geral e confusa do todo (sincretismo); 2º) visão distinta e analítica das partes (análise); 3º) recomposição sintética do todo com o conhecimento que se tem, das partes (sínteses).
As ações sincréticas são, portanto, aquelas que numa mesma fase, concomitantemente faz-se a cognição (processo de conhecimento) e execução, inexistindo os dois procedimentos, um após o outro, como comumente é feito, razão pela qual, a sentença com trânsito em julgado é auto-exequível, ou executável mediante a simples expedição de um mandado.
Entendemos que a lei processual deve obrigar o Juiz a dar sempre sentença líquida; na fase de conhecimento ele não só decide o "an debeatur", como também o "quantum debeatur"; isto geralmente ocorre nas denominadas ações condenatórias, pois nas constitutivas e mandamentais, v.g., já temos a aplicação do sincretismo no sistema processual brasileiro.
A ação possessória tem eficácia executiva lato sensu, e em sua tese de doutoramento, sobre o título, "A Execução de Sentença e a Garantia do Devido Processo Legal", o Prof. Humberto Theodoro Júnior, citado pelo Ministro Athos Carneiro no REsp. nº 739-RJ, "sustenta que da natureza executiva lato sensu das sentenças que acolhem a demanda possessória decorre o efeito importantíssimo da inadmissibilidade de embargos á execução."
A impossibilidade de se apresentar Embargos de Retenção, na fase executória das ações possessórias já foi objeto de apreciação pelo Superior Tribunal de Justiça, que por unanimidade da sua 4ª Turma decidiu: "Nas ações possessórias, a sentença de procedência tem eficácia executiva "lato sensu" , com execução mediante simples expedição e cumprimento de um mandado. Inocorrência, nas ações possessórias, da dicotomia ação de cognição e ação de execução".(10)
No STJ há outro julgado entendendo que não cabe embargos de retenção por benfeitorias em ação possessória, e se ele não foi pleiteado na resposta ao pedido possessório, o direito fica precluso.(11)
No mesmo sentido doutrina Ovídio Baptista da Silva (12) e Adroaldo Furtado Fabrício, para quem "há um outro ângulo pelo qual o problema pode e deve ser encarado, e é o da eficácia da sentença. Seja de manutenção, seja de reintegração, o julgado impõe por si mesmo os seus efeitos, sem necessidade de um ulterior processo de execução: esta se restringe á expedição e cumprimento de um mandado, sem necessidade de outra citação ou formalidades outras. A auto-executabilidade da sentença deferitória da reintegração ou manutenção é característica da proteção interdital e, portanto, independente do rito, assim como independente de haver decorrido tempo maior ou menor de ano e dia desde a ofensa á posse até o ajuizamento da ação."(13)
As ações possessórias, a ação de despejo, o mandado de segurança, v.g. são exemplos clássicos de ações sincréticas, pois não exigem, após o trânsito em julgado do processo de conhecimento, um novo processo (execução) para haver o direito pleiteado.
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