Os Órgãos Jurisdicionais e a Concreção dos Direitos Sociais
A separação dos poderes, a exemplo dos demais princípios estruturantes do Estado de Direito, apresenta-se como mecanismo imprescindível à garantia do exercício moderado do poder e à conseqüente contenção do totalitarismo. De modo semelhante às múltiplas vertentes que pode assumir, todas de indiscutível importância na organização do Estado, são igualmente múltiplas as classificações que pode receber.
É possível adotar um critério científico ou jurídico, que indica as características essenciais das funções atribuídas aos diversos órgãos; um critério técnico-organizativo, que trata da repartição das funções entre os distintos órgãos, buscando assegurar o melhor rendimento das instituições; ou mesmo um critério político, com o fim de garantir a satisfação dos interesses de determinada instância social.
A análise do princípio unicamente sob o prisma funcional não constituiria óbice a que um mesmo órgão exercesse distintas funções, possibilidade não afastada por Locke, mas, como veremos, combatida por Montesquieu. É preferível, assim, conjugá-la com o sentido orgânico, que busca sistematizar o exercício do poder por distintos órgãos.
Adotando-se uma perspectiva funcional, à função legislativa compete a formação do direito (rule making), enquanto que às funções executiva e judicial é atribuída a sua realização (law enforcement). No entanto, apesar de ser inegável a constatação de que tanto o Executivo como o Judiciário executam a lei, não nos parece correto falar em bipartição do poder. O designativo poder, além de indicar o plexo de funções para cuja execução o órgão está finalisticamente voltado, denota uma estrutura organizacional devidamente individualizada, autônoma e que não se encontra hierarquicamente subordinada às demais. Concentrar as funções executiva e judiciária sob a mesma epígrafe poderia comprometer a autonomia que acabamos de realçar, o que, por via reflexa, produziria efeitos sobre a própria independência dos juízes. Preservada a autonomia, o designativo é relegado a plano secundário. Nesse particular, vale lembrar a advertência de Barthélemy e Duez, ao ressaltarem que o importante é resguardar a independência dos juízes, sendo irrelevante questionar se o Judiciário "é um poder ou simplesmente uma autoridade do Estado", pois "ele é o que nós o fizermos, ele terá o nome que arbitrariamente nós lhe dermos".
Além disso, não é de boa técnica preterir um conceito específico, que melhor designe as peculiaridades e as funções de determinado órgão, por um conceito mais amplo, terminando por enquadrá-lo juntamente com referenciais de análise que ostentem sensíveis diferenças. À função jurisdicional compete velar pela prevalência da norma de direito, atuando nos casos de ameaça ou efetiva violação ou quando a lei o determinar, ainda que não haja violacão. Sua intervenção final, ademais, observada a sistemática legal, será definitiva (final enforcing power), sendo essa a principal característica que a diferencia da outra função de realização da norma. Negando-se essa constatação, não haveria porque falarmos, sequer, em funções executiva e legislativa, pois, no fundo, ambas se enquadram na noção mais ampla de exercício da soberania estatal.
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