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Álcool e mulher: experiências subjectivas na dependência e na família (página 2)


Partes: 1, 2, 3

Mot-clé : consommation d´alcool, femme, significations, méthodologie qualitative, Grounded Analysis.

Introdução

O consumo de álcool tem aumentado no sexo feminino (Ferreira-Borges & Filho, 2007). Este fenómeno tem suscitado discussões e estudos que visam uma melhor compreensão das especificidades do alcoolismo feminino, bem como melhorar as intervenções psicoterapêuticas (Thom, 2000). Segundo Tung, Demétrio e Andrade (2000) o alcoolismo na mulher é uma questão actual e pertinente, dadas as evidências de aumento da prevalência, da incidência mais precoce com um padrão de ingestão semelhante ao do alcoolismo masculino e maior gravidade e morbilidade.

Tradicionalmente, o consumo excessivo de álcool tem sido considerado como uma conduta associada ao sexo masculino. O problema do consumo excessivo nas mulheres tem sido frequentemente visto em termos de desvio dos papéis tradicionalmente femininos, numa atitude socialmente estigmatizante. Constatamos assim, que o modelo moral permanece ainda muito vincado na nossa sociedade e que por detrás do rótulo de "alcoólica" há uma pessoa com vivências específicas, marcadas pelo sofrimento (físico e psicológico), angústia, frustração, insegurança, necessitando de uma reorganização do seu projecto de vida sem o consumo de álcool.

Os factores físicos, sociais, económicos, culturais e psicológicos influenciam o modo como a mulher se posiciona face ao consumo de bebidas alcoólicas, as circunstâncias em que bebe, o modo como o seu organismo responde a esse consumo (Goodman, 2000).

A presente investigação pretende explorar e compreender o significado do consumo de álcool em mulheres com o diagnóstico de dependência alcoólica (segundo critérios da DSM-IV-TR (2000), recorrendo à metodologia qualitativa Grounded Analysis.

Especificamente, os objectivos deste estudo consistem em: a) perceber alguns aspectos relativos à vivência destas mulheres com dependência de álcool; b) compreender como estes aspectos vivenciais se articulam com as relações familiares e c) explorar e perceber a motivação dessas mulheres para o tratamento.

PARTE A – Enquadramento teórico

I. Álcool e Mulher

Durante muitos anos, a maior parte dos estudos efectuados sobre o consumo de álcool foram conduzidos sobre amostras com indivíduos do sexo masculino. Vanicelli e Nash (1984), numa revisão bibliográfica a 530 estudos, onde avaliaram o tratamento do alcoolismo, constataram que apenas 7% da população estudada era do sexo feminino. Porém, a proporção de estudos epidemiológicos relacionados com o consumo na mulher têm vindo a aumentar, sobretudo durante os últimos 20 anos, tendo como propósito, por um lado compreender e explicar um fenómeno até a pouco considerado como sendo exclusivamente masculino, por outro procurar estabelecer modelos de intervenção mais apropriados à população feminina (Blume, 1990; Plant 1997; Edwards, 1999). Blume (1990) relatou o aumento do número de mulheres com problemas associados ao consumo de álcool a partir da segunda Guerra Mundial, dando importância ao processo histórico e ao contexto sócio-cultural que poderiam ter influenciado este consumo. Alguns autores (Áran, 2003, Neves & Nogueira, 2003) referem que este novo padrão de consumo se iniciou com os movimentos feministas, onde a mulher começou a reivindicar os mesmos direitos e opções que os homens. A mulher, segundo estes autores, teve a necessidade de adoptar os mesmos comportamentos que o homem, para socialmente se igualar a ele. Esta evolução social acarreta, consequentemente, aquisição de novos padrões de comportamentos, atitudes e novas formas de consumo, nomeadamente para o álcool.

A prevalência do alcoolismo entre as mulheres ainda é significativamente menor do que a encontrada entre os homens (Blume et al., 1994; Grant, 1997). Ainda assim, o consumo abusivo e/ou a dependência do álcool traz, reconhecidamente, inúmeras repercussões negativas sobre a saúde física, psíquica e social da mulher.

Estudos, envolvendo mulheres consumidoras de álcool, começaram a clarificar padrões e problemas de consumo na mulher. Em geral os homens bebem em maior quantidade do que as mulheres mas são estas que apresentam consequências mais nefastas desse consumo (Schuller, 1991). Não nos podemos esquecer que, ao nível metabólico, a mulher apresenta diferenças, comparativamente com o homem. Estas diferenças devem-se principalmente à presença do acetaldeído gástrico (ADH), responsável pela degradação e metabolização do álcool em menor quantidade na mulher. Como consequência, o estômago da mulher metaboliza menos álcool, fazendo com que a concentração de álcool no sistema circulatório seja maior, uma vez que só vai ser absorvido no intestino delgado (Goodman, 2000). Outro aspecto a ter em conta é que a mulher apresenta mais tecido adiposo e menos músculo, o que acarreta um maior nível de intoxicação, devido à maior concentração de álcool no organismo (Fernandez 1981; Bach &, Gual, 1978; Cole-Harding & Nilson, 1987; Goodman, 2000; Novaes, Mell, Bronstein, & Zilberman, 2000).

Segundo Goodman (2000) o consumo por parte da mulher é socialmente recriminado quando comparado com o do homem, levando assim que o consumo nas mulheres seja muito mais um comportamento escondido. Associado a esta culpabilização e vergonha emerge um diagnóstico de dependência alcoólica muito tardio (Petit, 2002). Segundo estes autores as mulheres alcoólicas são alvo de um estigma social muito forte, sendo este factor só por si gerador de stress sociocultural contínuo, mantendo e reforçando o consumo.

A exposição ao álcool durante a gravidez pode prejudicar o desenvolvimento cerebral do feto e está relacionada com défices intelectuais que se manifestam em períodos mais tardios da infância. Em França, por exemplo, nasceram mais de 700 crianças com síndrome fetal alcoólico em 2001 e, estima-se que são mais de 60000 as pessoas que sofrem desta patologia (dados apurados pelo INSERM - "Expertise collective" em Setembro de 2001), no seguimento de dois estudos epidemiológicos realizados no norte da França e na ilha da Reunião. Assim, o Síndrome Alcoólico Fetal, definido por Lemoine (1968) e Jones e Smith (1973), surge com a ingestão de álcool durante a gravidez e é caracterizado por perturbações do recém-nascido (prematuridade, hipotrofia e dismorfia craneo-facial, malformações associadas e perturbações de adaptação neo-natal) e por alterações de desenvolvimento pós-natal. Segundo Roseth e Weimer (1984) o aumento do consumo de álcool é responsável por um aumento na incidência de malformações, em percentagens que podem ultrapassar os 30% nas consumidoras excessivas, podendo as mesmas encontrar-se já, significativamente, em mulheres que consomem doses superiores a 30 cl. de álcool por semana, o que equivale a um consumo diário de 4 dl. de vinho de 11º. O álcool tem efeitos tóxicos directos no processo de divisão, migração e diferenciação celular, sendo, portanto, o risco de malformações tanto mais elevado, quanto o consumo por parte da grávida se fizer por episódios agudos, nos primeiros meses de gravidez, provocando alcoolemias elevadas durante o período embrionário.

Os resultados dos estudos nacionais e europeus evidenciam que os padrões de consumo de risco e nocivo estão a aumentar entre as mulheres jovens na maioria dos Estados-Membros, nomeadamente em Portugal. Segundo o relatório da Comissão das Comunidades Europeias 2006 (Public Health Portal of the European Union), embora muitas mulheres parem de consumir álcool durante a gravidez, um número significativo (25%-50%) continua a beber e, algumas continuam a beber a níveis danosos.

II. Álcool e Família

Há mais de 30 anos que o interesse em estudar as famílias com elementos dependentes do álcool tem vindo a aumentar. Uma ênfase particular foi dada ao facto de que, quer os padrões comportamentais, quer certas desordens psicológicas têm mais probabilidade de se desenvolver em famílias com dependentes de álcool em comparação com outras (Moos et al. 1979) O risco de problemas emocionais nas crianças em famílias alcoólicas é consideravelmente maior do que em crianças da população geral (Brands, Sproule & Marshman, 1998). Edwards (1982) afirma que a influência dos factores sociais, mais especificamente a família, deve ser tida em consideração.

O alcoolismo tem um forte poder organizacional e sistémico (Mialon-Fouilleul, 2006). A organização familiar deixa de se centrar na satisfação das necessidades dos seus membros, passando a orientar-se no sentido da manutenção da relação do consumidor com os seus comportamentos de consumo de álcool. Esta dinâmica vai-se estabelecendo de uma forma implícita e irá ganhando visibilidade ao longo do tempo com um conjunto de situações e suas consequências, que vão ocorrendo repetidamente, originando rituais na vida familiar. Assim, a família com problemas relacionados com o consumo de álcool, interfere no ambiente, nas capacidades, nas crenças e valores e até mesmo na pertença/dependência a esse sistema (Mialon-Fouilleul, 2006). A teoria sistémica considera que o álcool representa, para um casal ou para uma família, um elemento adaptativo que contribui para a manutenção do equilíbrio do sistema (homeostasia) e, que assim se opõem a qualquer mudança, promovendo a disfuncionalidade da família (Delage, 1998).

O fenómeno da violência, no âmbito familiar, não é um fenómeno recente. As análises históricas revelam que tem sido característica da vida familiar aceite desde os tempos remotos. No início dos anos 70, a crescente influência do movimento feminista resultou decisivamente para atrair a atenção da sociedade sobre as formas e as consequências da violência contra as mulheres. Browne (1989) reflecte sobre esta temática e considera ser necessárias investigações sobre a relação existente entre violência conjugal e o abuso de álcool e outras drogas. Muitos estudos têm chegado à conclusão de que em crimes violentos, o agressor, a vítima ou ambos tinham consumido álcool. De facto, a experiência clínica revela que muitas mulheres dependentes de álcool são vítimas de abuso físico e/ou psicológico por parte dos seus companheiros (consumidores ou não de álcool).

PARTE B – Estudo Empírico

I. Objecto e Objectivos do estudo

A presente investigação pretende explorar e compreender o significado do consumo de álcool em mulheres, com o diagnóstico de dependência alcoólica (segundo critérios da DSM-IV-TR (2000)), sem consumir álcool há pelo menos três meses, num máximo de doze meses.

Os objectivos deste estudo consistem em: a) perceber alguns aspectos relativos à vivência destas mulheres na dependência do álcool; b) compreender como estes aspectos vivenciais se articulam com as relações familiares e c) explorar e perceber a motivação dessas mulheres ao tratamento.

II. Metodologia

2.1. Metodologia qualitativa: Grounded Analysis

Pretendemos, no presente estudo, analisar os discursos de mulheres dependentes do álcool, segundo a metodologia de Grounded Analysis, concebida por Barney Glaser e Ansem Strauss (1967). A utilização dessa abordagem qualitativa, influenciada por uma epistemologia interpretativa, afigurou-se-nos particularmente apropriada para a condução desta investigação Esta abordagem articula-se com a epistemologia que enfatiza a participação do indivíduo na construção do conhecimento a partir da sua experiência como sendo um aspecto central para a aquisição do conhecimento (Orlikowski, 1993; Baskerville & Pries-Heje, 1999; Hughes, 2000; Pace, 2004).Podemos considerar este estudo como descritivo, uma vez que a investigação fornece informação acerca dos participantes no estudo, mas também transversal porque os dados foram recolhidos num único momento (Ribeiro, 1999).

Segundo Creswell (1998) a Grounded Theory é um modelo que tem por objectivo gerar ou descobrir uma teoria a partir de uma situação na qual os indivíduos interagem. Para Moustakas (1994) é um modelo cujo foco é decifrar os elementos e suas inter-relações, desenvolvendo-se uma teoria que, torna o investigador apto a entender a natureza e o sentido de uma experiência para um grupo particular de indivíduos, num contexto particular. A teoria é gerada durante o processo de pesquisa e, concomitantemente, à recolha dos dados. As hipóteses e os conceitos são trabalhados fora do curso da pesquisa..

Alguns pressupostos são assumidos por Glaser & Strauss no desenvolvimento e proposição da Grounded Theory. O primeiro deles é que a relação entre pesquisador/realidade/teoria é contínua e intrínseca, isto é, o pesquisador interage com a realidade e formata a teoria de forma contínua ao longo do tempo e processo (Fernandes & Maia, 2001). O segundo é que a teoria evolui durante o processo de pesquisa e é o resultado de contínua interpolação de dados e análise (Goulding, 1998). Tal como em outros métodos de pesquisa qualitativa (etnografia, fenomenologia, por exemplo), pode-se utilizar qualquer tipo de informação, vinda de qualquer fonte (entrevistas, observação, materiais escritos e relações envolvendo todas essas fontes). Depois, através do "método de comparação constante" (Glaser & Strauss, 1967, p.101-116), passamos à codificação e, portanto, à conceptualização e categorização dos dados, segundo o percurso sugerido pelos criadores da Grounded Analysis: codificação aberta, axial e selectiva. Trata-se de um percurso nem sempre sequencial já que a linha separadora entre cada tipo de código é artificial (Strauss & Corbin, 1990).

Para Creswell (1998), os desafios deste modelo são os seguintes: a) o investigador deve colocar de lado as teorias e ideias prévias em relação ao objecto a ser estudado (idêntico à "redução" na fenomenologia); b) apesar da natureza indutiva do trabalho, trata-se de uma abordagem sistemática de pesquisa, com passos específicos a serem seguidos e respeitados; e) há uma certa dificuldade na indicação do que significa "saturação" e, d) deve-se reconhecer que o resultado primário é uma teoria com componentes específicos.

III. Método

3.1. Participantes

Foi efectuada uma amostragem teórica por conveniência, não probabilística, isto é, a selecção dos participantes foi intencional, de acordo com o tipo de informação que nos podiam fornecer, de acordo com o objectivo do estudo (Ribeiro, 1999). Esta escolha intencional, de pequenos conjuntos e relativamente homogéneos, de pessoas e acontecimentos é pertinente quando se pretende investigar uma realidade pouco estudada (Maxwell, 1996). Nas abordagens qualitativas o conceito de amostra possui uma conotação e significado, digamos assim, diferente do que lhe é atribuído nas abordagens quantitativas. Se, nestas últimas, o critério de amostragem é definido pela sua representatividade externa relativamente a um universo, nas primeiras, o critério é o da sua significatividade interna por relação à dimensão da realidade que é o objecto de estudo, ou como refere Ruquoy (1995, p. 103): "nesta óptica, os indivíduos não são escolhidos em função da importância numerária na categoria que representam, mas antes devido ao seu carácter exemplar".Foram seleccionadas 21 mulheres com diagnóstico de dependência alcoólica (DSM-IV-TR (2000)) em seguimento na Consulta Externa da U.A.N.-D.R.N.-I.D.T., IP,, com filhos e sem consumir álcool há pelo menos três meses, num máximo de 12 meses. Foram também recolhidos dados sócio-demográficos, através de um Questionário, preenchido pelo investigador, através da consulta dos respectivos processos clínicos, com vista a caracterização sócio-demográfica das participantes.

Podemos constatar que as idades das participantes se situam entre os 36 e os 60 anos, com média de idade 45 anos. Em relação ao estado civil catorze mulheres são casadas, duas vivem em união de facto, duas são divorciadas, uma é solteira, uma é separada e outra é viúva. Doze entrevistadas são naturais do distrito do Porto, três do distrito de Braga, duas do distrito de Vila Real e, três dos distritos de Coimbra, de Bragança e de Aveiro, respectivamente. No referente ao distrito de residência dezanove mulheres residem no distrito do Porto, uma no distrito de Bragança e outra no distrito de Aveiro.

Em relação as habilitações literárias onze entrevistadas possuem cinco a nove anos de escolaridade (3º Ciclo do Ensino Básico), seis possuem o 1º Ciclo do Ensino Básico, sendo de referir que apenas uma entrevistada é licenciada (Ensino Superior) e outra não possui escolaridade. Em termos de profissão, sete entrevistadas não têm profissão (são domésticas), quatro são operárias especializadas, três são administrativas, duas são vendedoras, duas são trabalhadoras não qualificadas, duas são técnicas de nível intermédio e uma é professora. È de referir que, actualmente, nove mulheres estão desempregadas, oito no activo e quatro estão reformadas.

Em relação aos padrões de consumo de bebidas alcoólicas, no que se refere ao tempo de abstinência alcoólica, sete entrevistadas estão há doze meses abstinentes, cinco estão há três meses, duas estão há quatro meses, duas há sete meses, duas há nove meses, duas há dez meses e uma há seis meses. Em relação à idade de experimentação (primeira vez que consumiu bebidas alcoólicas) onze mulheres referiram consumir pela primeira vez entre os 10 e os 16 anos de idade, sendo que uma delas experimentou pela primeira vez aos 8 anos de idade. É de referir que duas das entrevistadas experimentaram álcool pela primeira vez aos 17 anos de idade, duas aos dezoito, quatro aos 20 anos e uma aos 22 anos de idade. No que se refere à história do consumo de álcool, a média de idade de iniciação ao consumo é de 15 anos e a média de idade do consumo regular de álcool é de 21 anos de idade. Em relação à idade de consumo excessivo a média de idade é de 34 anos.

Todas as 21 entrevistadas referiram que quando consumiam o faziam diariamente, sendo que dezasseis mulheres consumiram durante a gravidez e a amamentação.

Em relação aos problemas associados ao consumo de álcool há a salientar que as 21 entrevistadas referiram ter problemas familiares, quatro referiram ter problemas judiciais (relacionados com o Ministério Público, Comissões de Protecção de Crianças e Jovens) e duas sofreram acidentes laborais associados ao consumo de álcool. No entanto, vinte mulheres referiram não ter tido situações de sinistralidade rodoviária associadas ao consumo de álcool e vinte e uma mulheres nunca tiveram a carta de condução apreendida por condução sob efeito do álcool.

É de salientar que dezanove entrevistadas referiram ter familiares alcoólicos tendo sido referido o pai sete vezes, o marido e o ex-marido quatro vezes, a mãe e os irmãos cinco vezes, avós maternos e paternos uma vez, tia materna e prima também uma vez.

3.2. Procedimentos

As 21 mulheres realizaram entrevistas individuais semi-estruturadas, cuja duração foi sensivelmente de uma hora cada, com base num guião específico. O guião de entrevista é constituído por quinze perguntas principais e abertas, tendo a entrevista uma forma semi-estruturada, onde as perguntas foram colocadas pela ordem apresentada, respondendo as entrevistadas de acordo com essa mesma ordem.

Foram obtidos, junto das entrevistadas, os consentimentos informados para a realização da entrevista (Anexo I), com referência à participação voluntária no estudo, com explicação do objectivo, a confidencialidade do material, autorização para gravação da entrevista e reconhecimento de que, mesmo sendo voluntário, poderia desistir da entrevista a qualquer momento. Antes da entrevista começar foi dito às participantes que no fim do estudo, o investigador estaria ao dispor para lhes revelar os resultados do mesmo.

As entrevistas foram efectuadas em registo áudio (gravador de voz) em contexto de gabinete de atendimento na U.A.-D.R.N.-I.D-T., IP., no período compreendido entre Janeiro e Abril de 2009, por um único investigador. Posteriormente, as entrevistas foram transcritas na íntegra, permitindo assim que as respostas dadas pelas entrevistadas fossem posteriormente comparadas entre si. Através desta sistematização de codificação das entrevistas elaboraram-se categorias que foram sendo definidas ao longo da análise individual das entrevistas (Fonte, 2005). Os conteúdos que se desenvolveram, constituíram a base para promover o acumular de dados, abrindo assim redes para a emergência de novas respostas e conceitos (Strauss & Corbin, 2008).

O processo de análise desenrolou-se, assim, em três fases: 1) Selecção das entrevistas individuais com posterior categorização descritiva das unidades de análise, recorrendo a elaboração de memorandos para cada uma das respostas dadas por cada entrevistada; 2) Obtenção, através do processo de clarificação estrutural, de três tipos de categorias: categorias de primeira ordem, categorias de segunda ordem e categorias centrais e 3) Construção do discurso colectivo.

3.3. Instrumentos de recolha de dados

O material utilizado neste estudo foi um guião de entrevista semi-estruturada e um questionário sócio-demográfico e padrão de consumo. Com base na experiência clínica com mulheres dependentes do álcool (DSM-IV-TR (APA, 2000)), foi elaborado um guião com quinze questões, abordando temas como: experiências subjectivas relacionadas com o consumo, significados em relação ao álcool, relação com elementos significativos da família, motivação para o tratamento e projectos de futuro.

A informação sócio-demográfica e de padrão de consumo (idade, estado civil, profissão, situação profissional actual, tempo de abstinência, consumo ou não na gravidez, alcoolismo na família e problemas associados ao consumo) foi obtida pelo investigador através da consulta do processo clínico das mulheres entrevistadas em seguimento na Unidade de Alcoologia da Delegação Regional do Norte do Instituto da Droga e Toxicodependências, Instituto Público (U.A.-D.R.N.-I.D.T, I.P.) (Anexo III).

IV. Apresentação e discussão de resultados

4.1. Resultados obtidos na categorização conceptual e na categorização central com hierarquização das categorias

Após transcrição das entrevistas na íntegra desenvolve-se a análise para codificar as mesmas e, a partir das unidades de significado encontradas nos discursos, constrói-se categorias. Deste modo, o processo de categorização inicia-se pela selecção do material relevante para a análise, efectuando-se de seguida uma caracterização descritiva que consiste numa categorização onde a unidade de análise é a frase/ideia expressa pelas entrevistadas (memoings). Os memoings devem ser construídos de modo a que, cada categoria contenha uma hipótese e ideias acerca dos significados das categorias (Sani, 200). Estas categorias vão sendo trabalhadas de modo a que as primeiras categorias (mais descritivas) sejam mais próximas da linguagem utilizada pelas entrevistadas e, que gradualmente, sejam encontradas categorias mais conceptuais ou abstractas (categorias de segunda ordem), com o culminar de um conjunto de categorias centrais. O objectivo da categorização é a integração do que é particular no geral, tendo em conta os dados brutos e as categorias mais genéricas, num contínuo de andar de trás para a frente (Fernandes & Maia, 2001; Fonte, 2001).

Seguidamente serão apresentados os resultados obtidos a partir da hierarquização das categorias em relação as respostas às quinze questões.

No que respeita à questão 1: "O que significa para si ter uma dependência alcoólica?" (Quadro 1) há a realçar o facto de a maior parte das participantes ter referido que ter uma dependência alcoólica é "algo muito prejudicial/negativo", centrado nas consequências do consumo:

"É uma coisa má, péssima, horrorosa, que não leva a nada." (E7)

". ter um mal estar físico, psicológico, uma situação má, de muito mal estar." (E11)

"É terrível! É muito terrível a nível pessoal, familiar, não desejo a ninguém." (E13)

Treze participantes referiram vinte e quatro vezes a categoria "definição científica" de dependência do álcool, associando-a a falta de controle sobre o comportamento de beber, ao consumo excessivo regular e à necessidade de beber:

".porque as pessoas dependentes do álcool não sabem o que fazem." (E6)

"É estar constantemente a beber, não conseguir deixar de beber." (E8)

"É uma pessoa não conseguir resistir sem beber o álcool, não resistir, tem mesmo de beber, sentir mesmo

aquela necessidade de beber álcool e se não beber não se sente bem." (E20)

Embora, com uma menor pertinência, três entrevistadas referiram a dependência como resposta a mal estar emocional, indo de encontro aos resultados do estudo de Graham (1959), referido por Skutle (1999), segundo o qual o abuso de álcool na mulher está associado à problemas emocionais e interpessoais:

"Quanto mais uma pessoa bebe a pessoa fica mais bem disposta e isso levanta a moral." (E1).

Na hierarquização das categorias obtidas na questão 2: "Actualmente, quando pensa em consumo de álcool que pensamentos/ideias lhe vêm a ideia?" (Quadro 2) emerge, em primeiro lugar, a categoria central "crítica", verificando no discurso das entrevistadas crítica ao comportamento de consumo, arrependimento, ideia muito má e perda:

"Muito más! Aquilo que eu fazia não era de uma pessoa normal..Acho muito mal, muito mal. Se eu soubesse há mais tempo, eu não tinha consumido tanto como eu consumi." (E1)

"Vêm-me à ideia tudo o que eu consegui destruir na minha memória, as atitudes que eu tinha perante as outras pessoas e a sociedade, que de todo não estou interessada em tê-las." (E11).

Quadro 1- Hierarquização das categorias em relação as respostas à questão 1 ("O que significa para si ter uma dependência alcoólica?")

CATEGORIA 1 ª ORDEM

CATEGORIA 2ª ORDEM

CATEGORIA CENTRAL

Prejuízo do consumo a nível pessoal N1= 8; n2= 15

PREJUÍZO A NÍVEL PESSOAL

N1= 8; n2= 23

Prejuízo do consumo a nível familiar N1= 4; n2 = 8

PREJUÍZO A NÍVEL FAMILIAR

N1= 4; n2= 8

ALGO MUITO PREJUDICIAL/NEGATIVO (centrado nas consequências do consumo)

Coisa má N1= 8; n2= 15

COISA MÁ

N1= 8; n2= 15

Falta de controle N1= 8; n2= 15

FALTA DE CONTROLE

N1= 8; n2= 15

"DEFINIÇAO CIENTÍFICA" ( dependência do álcool )

Consumo excessivo e regular

N1= 3; n2= 4

Necessidade de beberN1= 2; n2= 5

NECESSIDADE DE BEBER

N1= 5; n2= 9

Doença N1= 7; n2= 12

DOENÇA

N1= 7; n2= 12

DOENÇA

Não sei N1= 4; n2=8

NAO SABE

N1= 4; n2= 8

NAO SABER

Dependência como resposta mal estar emocional N1= 3; n2= 7

DEPENDÊNCIA COMO RESPOSTA A MAL ESTAR EMOCIONAL

N1= 3; n2= 7

RESPOSTA A MAL ESTAR EMOCIONAL

Comparação com a droga

N1=2; n2= 2

COMPARAÇAO COM A DROGA

N1= 2; n2= 2

ÁLCOOL COMPARADO A DROGA

  • 1- Nº de entrevistadas que se enquadram na categoria

  • 2- Nº de vezes que a categoria é mencionada pelas entrevistadas

Metade das mulheres entrevistadas referiu que pensa na "família" (problemas com familiares e filhos) quando pensa em consumo de álcool:

".o berrar com a minha filha, não lhe dar a atenção devida.até discutir com o marido por tudo e por nada, problemas familiares." (E8)

"Tenho recordações más em que o meu filho me viu alcoolizada, ele viu coisas que de facto não devia ter visto.Foi das piores coisas que não devia ter acontecido. Eu amo o meu filho. Tive muitos maus momentos com o meu marido também. Agressões eu a ele e ele a mim. mau ambiente em casa." (E21)

Estudos indicam que padrões comportamentais e certas desordens psicológicas têm maior probabilidade de se desenvolver em famílias com dependentes de álcool em comparação com outras (Moos et al., 1979). Brands, Sproule & Marshman (1998) consideram que o risco de problemas emocionais nas crianças em famílias alcoólicas é consideravelmente maior do que em crianças da população geral.

A rejeição/fuga, quanto a nós, é uma categoria a ter em consideração não só

pelo significado que o vocábulo rejeição/fuga traz consigo, mas pelas emoções transmitidas pelas entrevistadas ("Para agora não tenho pensamentos nenhuns."( olhar distante) (E4))

Quadro 2- Hierarquização das categorias em relação as respostas à questão 2 ("Actualmente, quando pensa em consumo de álcool que pensamentos/ideias lhe vêm a ideia?")

CATEGORIA 1ª ORDEM

CATEGORIA 2ª ORDEM

CATEGORIA CENTRAL

Crítica ao comportamento

N1= 10; n2= 20

CRÍTICA AO COMPORTAMENTO

N1= 10; n2=20

Arrependimento N1= 4; n2= 4

ARREPENDIMENTO

N1= 4; n2= 4

CRÍTICA

Ideia má N1= 3; n2= 6

IDEIA MUITO NEGATIVA

N1= 3; n2= 6

Perda N1= 2; n2= 7

PERDA

N= 2; n2= 7

Nada N1= 2; n2 = 2 Nenhum pensamento sobre o álcool

N1= 7; n2= 15

NAO PENSAR

N1= 9; n2= 17

REJEIÇAO/FUGA

Faço de conta que o álcool não existe N1= 1; n2= 1

Álcool irrelevante N= 1; n2= 1

ÁLCOOL SEM IMPORTÃ,NCIA

N1= 2; n2= 2

Problemas familiares

N1= 5; n2=10

PROBLEMAS FAMILIARES

N1= 5; n2= 10

FAMÍLIA

Filhos N1= 5 n2= 7

FILHOS

N1= 5; n2= 7

Sentir-se bem sem o álcool

N1= 3; n2= 5

SENTIR-SE BEM

N1=3; n2= 5

Nunca mais consumir álcool

N1= 2; n2= 5

NUNCA MAIS CONSUMIR

N1= 2; n2= 5

LIDAR COM AS COGNIÇÕES (estratégias para lidar)

Penso noutra coisa N1= 2; n2= 8

PENSAR NOUTRA COISA

N1= 2; n2= 8

Esquecer N1= 2; n2= 4

ESQUECER

N1= 2; n2= 4

ESQUECER

  • 1- Nº de entrevistadas que se enquadram na categoria

  • 2- Nº de vezes que a categoria é mencionada pelas entrevistadas

Em relação à questão 3: "Que sentimentos/emoções surgem quando recorda o início do seu consumo abusivo de álcool?" (Quadro 3) é de referir que o início do consumo abusivo, para estas mulheres, está associado a um conjunto de emoções predominantemente associadas à temática depressiva (sentimentos de tristeza, angústia, sofrimento, vergonha):

"Vergonha, tenho vergonha de mim, fico envergonhada, é a única coisa que sinto, vergonha." (E7)

"Sentia bastantes depressões, à nível depressivo, uma auto estima muito baixa, não me sentia absolutamente nada bem. O álcool fazia com que eu me sentisse ainda pior do que aquilo que eu já me sentia." (E10).

Quadro 3- Hierarquização das categorias em relação as respostas à questão 3 ("Que sentimentos/emoções surgem quando recorda o início do seu consumo abusivo de álcool?")

CATEGORIA 1ª ORDEM

CATEGORIA 2ª ORDEM

CATEGORIA CENTRAL

Arrependimento N1= 4; n2= 6

Mágoa N1=1; n2= 1

Culpa N1= 1; n2= 5

Vergonha N1= 2;n2= 5

RESSENTIMENTO

N1= 8; n2=17

Tristeza N1= 7; n2= 12

Sentir-se mal N1= 1; n2= 2

Sentimentos depressivos

N1= 2; n2= 2

Tentativa suicídio N1= 1; n2= 2

Angústia N1= 1; n2= 1

Sofrimento N1= 1; n2= 1 Recordações tristes N1= 2; n2= 3

Péssimo N1= 1; n2= 2

SENTIMENTOS DEPRESSIVOS

N1= 16; n2= 25

EMOÇÕES PREDOMINANTEMENTE ASSOCIADAS À TEMÁTICA DEPRESSIVA

Idade de consumo N1= 6; n2= 8

IDADE DE CONSUMO

N1= 6; n2= 8

Abuso N1= 4; n2= 4

Repetição do comportamento do consumo N1= 2; n2= 2

CONSUMO ABUSIVO/FALTA DE CONTROLE

N1= 6; n2= 6

Revolta N1= 3; n2= 8

Raiva N1= 2; n2= 4

Zanga N1= 1; n2= 2

REVOLTA

N1= 6; n2= 14

RACIONALIZAÇAO

Nada N1= 2; n2= 2

Nenhum pensamento sobre o álcool

N1= 7; n2= 15

NAO PENSAR

N1= 9; n2= 17

Problemas familiares N1= 5; n2= 11

PROBLEMAS FAMILIARES

N1= 5; n2= 11

Mau N1= 2; n2= 3

Coisa Má N1= 1; n2= 1

Período mau da vida N1=1 ; n2= 1

MAU

N1= 4; n2= 5

Não sei explicar N1= 5 n2= 7

Sei lá N1= 2; n2= 3

NAO SABE

N1= 7; n2= 10

NAO SABE EXPLICAR

  • 1- Nº de entrevistadas que se enquadram na categoria

  • 2- Nº de vezes que a categoria é mencionada pelas entrevistadas

Segundo Adès e Lejoyeux (1997) a prevalência de sintomas depressivos em mulheres dependentes do álcool é três vezes mais elevada do que nas restantes mulheres não consumidoras. As mulheres dependentes de álcool referem mais sintomatologia ansiosa-depressiva, sintomatologia neurótica, isolamento social quando

comparado com homens dependentes, evidenciando uma auto-estima mais baixa bem como défices de concentração e uso de psicotrópicos (Amodei, 1994).

Em relação à questão 4: "O que sente actualmente em relação ao consumo de bebidas alcoólicas? " (Quadro 4) permite constatar que a maior parte das entrevistadas associa ao consumo actual de bebidas alcoólicas à noção de "prejuízo":

"Acho mal. Acho mal". (E1)

"Acho que isso (consumo de álcool) não dá proveito nenhum. A gente não tira proveito nenhum disso

(consumo de álcool)". (E2)

"Acho péssimo, não faz bem nenhum". (E4)

". a gente com a cerveja, com o vinho faz muita coisa que não devia fazer. A gente alcoolizada perdemos

tudo aquilo que a gente temos. Com o álcool a gente fica mais revoltada". (E5)

É de referir que todas as entrevistadas estão entre três a doze meses sem consumir álcool e logicamente que o seu pensamento contempla a ideia de abstinência, com a noção da irrelevância das bebidas e de consumo terminado:

".não me importo de quem bebe ou não, tanto faz!" (E15)

"Agora não consumo de maneira nenhuma, para mim agora não me diz nada." (E21)

Quadro 4- Hierarquização das categorias em relação as respostas à questão 4 ("O que sente actualmente em relação ao consumo de bebidas alcoólicas?")

CATEGORIA 1ª ORDEM

CATEGORIA 2ª ORDEM

CATEGORIA CENTRAL

Acho mal N1= 4; n2= 7

Coisa má N1=3; n2= 3

Consumo asneira/estupidez

N1= 2; n2= 2

AVALIAÇAO NEGATIVA GERAL

N1= 9; n2=12

PREJUÍZO

Prejuízo do consumo a nível pessoal N1= 6; n2= 12

PREJUÍZO PESSOAL

N1= 6; n2= 12

Prejuízo do consumo a nível familiar

N1= 2; n2= 7

PREJUÍZO FAMILIAR

N1= 2; n2= 7

Irrelevância das bebidas alcoólicas

N1= 6; n2= 8

Não vale a pena o consumo

N1= 2; n2= 2

IRRELEVÃ,NCIA DAS BEBIDAS

N1= 8; n2= 10

IDEIA DE ABSTINÊNCIA

Acabou o consumo N1= 2; n2 = 3 Não penso em beber N1= 2; n2= 2

CONSUMO TERMINADO

N1= 4; n2= 5

Não sei N1= 4; n2= 4

Sei lá N1= 2; n2= 2

Não dá para explicar N1= 1; n2= 1

NAO SABE

N1= 7; n2= 7

NAO SABER

  • 1- Nº de entrevistadas que se enquadram na categoria

  • 2- Nº de vezes que a categoria é mencionada pelas entrevistadas

Entretanto, seis mulheres referem não saber o que sentem em relação ao seu não consumo ("Não sei (.) não sei." (E1); "Sei lá?" (E9))

Na questão 5: "Como é que a sua família reagiu ao seu consumo?" (Quadro 5) treze mulheres referiram que as suas famílias reagiram com sofrimento e mal-estar ao consumo:

"Muito mal" (E1)

"Era a maior tristeza que eles tinham." (E3)

"Não reagiram lá muito bem, mas no princípio foi muito mal. Não reagiu bem: a minha filha, o meu filho. é uma coisa muito ruim! O meu marido também não reagiu muito bem." (E6)

" A minha família ficou bastante triste, já teria havido casos de álcool, incluindo os meus tios e a minha mãe e ficaram tristes" (E11)

Quadro 5- Hierarquização das categorias em relação as respostas à questão 5 ("Como é que a sua família reagiu ao seu consumo?")

CATEGORIA 1ª ORDEM

CATEGORIA 2ª ORDEM

CATEGORIA CENTRAL

Mal N1= 13; n2= 30

MAL

N1= 13, n2= 30

MAL

Chamar a atenção N1= 6; n2=9

Pedidos para não beber N1= 3; n2=3

Chamavam-me de "bêbada"

N1= 1; n2= 1

CONFRONTO VERBAL CONTRA O CONSUMO

N1= 10, n2= 13

CONFRONTO PARA A MUDANÇA

Violência física N1= 2; n2= 2

VIOLÊNCIA FÍSICA

N1= 2 n2= 2

Problema com a família N1= 4; n2= 8

PROBLEMAS COM A FAMÍLIA

N1= 4; n2= 8

Problemas com os filhos

N1= 4; n2 = 10

Filho violento em relação ao consumo da mãe N1= 1; n2= 1

Filho ficou saturado N1= 1; n2= 1

PROBLEMAS COM OS FILHOS

N1= 6 n2= 12

INTERFERÊNCIA NEGATIVA NA FAMÍLIA

Sofrimento N1= 3; n2= 4

Tristeza N1= 3; n2= 3

Momentos difíceis N1= 1; n2= 2

Tinham pena N1= 1; n2= 1

Desgosto N1= 1; n2= 1

Momentos difíceis N1= 1; n2= 1

SOFRIMENTO

N1= 10 n2= 13

SOFRIMENTO

Apoio da família N1= 9; n2= 13

APOIO DA FAMÍLIA

N1= 9; n2= 13

APOIO

Admirados/ não se aperceberam

N1= 4; n2= 6

ADIMIRADOS/NAO SE APERCEBERAM

N1= 4; n2= 6

DESCONHECIMENTO DO CONSUMO

  • 1- Nº de entrevistadas que se enquadram na categoria

  • 2- Nº de vezes que a categoria é mencionada pelas entrevistadas

Como não podia deixar de ser referido, o consumo de álcool por estas mulheres interferiu negativamente na família, com problemas com filhos e com a família em geral:

"Eu tive muitos problemas com a minha família, com os meus irmãos. Eu estive algum tempo sem falar com

eles; houve um grande problema e a gente deixamos de nos falar, a minha mãe sentiu-se, começou a sentir-se mal, achei que a minha filha estava a sofrer.a menina com aquele medo de a tirarem de mim."(E5)

"Passaram muito, foram momentos terríveis para eles, foram momentos terríveis para todos. O meu marido reagiu mal, mas tinha pena, .os filhos tinham medo quando iam para a escola pois não sabiam como eu ia estar em casa, se estava bem ou mal." (E13)

No entanto, nove entrevistadas referiram sentir apoio por parte da família:

" Mas tentou de todos os modos, de todas as maneiras em apoiar-me e imediatamente depois auxiliar-me no que precisasse." (E10)

Em relação à questão 6: "Qual é o comportamento deles (família) face ao consumo de álcool em geral?" (Quadro 6) constatamos que a família banaliza o consumo de álcool, considerando-o mesmo como "normal" e restrito a determinadas situações, tais como às refeições e fora de casa:

"Acham que sim, que é normal se forem a um casamento, a uma boda ou a um jantar, pois com certeza não bebem água". (E16)

"O meu marido bebe às refeições, a minha cunhada também bebe às refeições." (E19)

"Consideram que um consumo normal é uma coisa que se admite, que é o das refeições." (E10)

Nove entrevistadas referiram que a família critica o consumo, uma vez que não aceita muito bem, achando mal o consumo ("Eles reagem mal. Eles são mesmo contra o consumo de álcool." (E1)), enquanto três entrevistadas referiram que familiares consumiam em excesso:

"Quem era alcoólico era o meu pai, o meu pai é que era. O meu ex-marido é alcoólico, mas ele não admite que é alcoólico." (E5)

"Se ele (marido) for a mãe, a mãe põe-lhe um garrafão de vinho e não fica uma gota no garrafão, é uns copos atrás dos outros. Ele (marido) diz que não exagera, que é normal, mas eu acho que não, pois se fosse normal não tinha o cheiro que tem às vezes." (E12)

Comparando o discurso das entrevistadas com os dados sócio-demográficos, constatamos que o discurso destas mulheres "omite" a existência de familiares alcoólicos, uma vez que dezanove das entrevistadas têm familiares alcoólicos, segundo os dados sócio-demográficos.

Na questão 7: " O que pensa a sua família sobre o seu consumo?" (Quadro 7) foi referido, pelas entrevistadas, que as suas famílias vivenciaram negativamente o seu consumo, com críticas em relação ao

Quadro 6- Hierarquização das categorias em relação as respostas à questão 6 ("Qual é o comportamento deles (família) face ao consumo de álcool em geral?")

CATEGORIA 1ª ORDEM

CATEGORIA 2ª ORDEM

CATEGORIA CENTRAL

Família consome N1= 12; n2= 28

FAMILIARES CONSOMEM

N1= 12; n2= 28

Beber é normal N1= 8; n2= 12

Pedidos para não beber N1= 3;n2= 3

BEBER É NORMAL

N1= 8; n2= 12

CONSUMO BANALIZADO/NORMALIZADO

Familiares não bebem em exagero

N1= 3; n2= 5

NAO BEBEM EM EXAGERO

N1= 3 n2= 5

Familiares não consomem

N1= 9; n2= 13

FAMILIARES NAO CONSOMEM

N1= 9 n2= 13

FAMÍLIA NAO CONSOME

Filhos não consomem

N1= 12; n2= 16

FILHOS NAO CONSOMEM

N1= 12; n2= 16

Familiares consomem às refeições

N1= 12; n2= 19

CONSOMEM ÀS REFEIÇÕES

N1= 12; n2= 19

Beber às refeições é normal

N1= 2; n2= 4

BEBER ÀS REFEIÇÕES É NORMAL

N1= 2; n2= 4

CONSUMO RESTRITO A DETERMINADAS SITUAÇÕES

Familiares não consomem em casa N1= 3; n2= 5

NAO CONSOMEM EM CASA

N1= 3; n2= 5

Família contra o consumo

N1= 3; n2= 4

Família não concorda N1= 1; n2= 1

Família não aceita muito bem

N1= 2; n2= 3

Acham mal o consumo N1= 2; n2= 2

Família reage mal ao consumo

N1= 1; n2 = 2

CRÍTICAS AO CONSUMO

N1= 9; n2= 12

CRÍTICA AO CONSUMO

Familiares consomem em exagero

N1= 3; n2= 7

CONSUMIDORES EXCESSIVOS

N1= 3; n2= 7

CONSUMO EXCESSIVO

  • 1-  Nº de entrevistadas que se enquadram na categoria

  • 2- Nº de vezes que a categoria é mencionada pelas entrevistadas

comportamento de consumo e também alguma indiferença.

"Tristes, tinham desgosto. Elas (filhas) tinham muita tristeza quando me viam assim." (E3)

No entanto, cerca de metade das entrevistadas referiram a vivência positiva da abstinência por parte de familiares:

"Eles (família) andam satisfeitos, pois eles sabem que eu não bebo.eles vão à casa da minha mãe, eles estão contentes." (E4)

Quadro 7- Hierarquização das categorias em relação as respostas à questão 7 (" O que pensa a sua família sobre o seu consumo?")

CATEGORIA 1ª ORDEM

CATEGORIA 2ª ORDEM

CATEGORIA CENTRAL

Acham mal N1= 5; n2= 8

Não gostavam do consumo

N1= 1; n2= 1

Fazia "figuras tristes" N1= 1; n2= 1

Perda da razão N1= 1; n2= 1

CRÍTICOS DO CONSUMO

N1= 8; n2= 11

Não diz nada N1= 3; n2= 4

Não pensa nada N1= 1;n2= 1

Não acha nada N1= 1; n2= 1

Indiferença N1= 1; n2= 1

INDIFERENÇA

N1= 6; n2= 7

VIVÊNCIA NEGATIVA DO CONSUMO

Tristeza N1= 3; n2= 4

Desgosto N1= 1; n2= 1

Angústia N1= 1; n2= 1

Sofrimento N1= 1; n2= 1

Preocupação com o consumo

N1= 1; n2= 1

Ansiosa N1= 1; n2= 1

Revolta N1= 1; n2= 1

PROVOCA SOFRIMENTO

N1= 9; n2= 10

Contentes com o não consumo

N1= 5; n2= 13

Acham bem o não consumo

N1= 1; n2= 1

Melhor tratamento pela família

N1= 1; n2= 1

Que estou bem N1= 1; n2= 1

FAMILIARES CONTENTES COM A ABSTINÊNCIA

N1= 8; n2=16

VIVÊNCIA POSITIVA DA ABSTINÊNCIA

Medo da recaída N1= 2; n2= 2

MEDO DA RECAÍDA

N1= 2; n2= 2

MEDO DA RECAÍDA

  • 1- Nº de entrevistadas que se enquadram na categoria

  • 2- Nº de vezes que a categoria é mencionada pelas entrevistadas

Seguidamente, serão analisadas as respostas das mulheres em estudo sobre a interferência do álcool na sua vida como mulher, companheira, mãe e profissional (Quadros 8a, 8b, 8c e 8d).

De acordo com Goodman (2000), a baixa auto-estima é a característica predominante da mulher alcoólica. O estigma associado ao alcoolismo, de ser promíscua e má mãe, coloca a mulher numa espiral de negativismo que interfere na sua identidade. A baixa auto-estima é reforçada por uma sociedade que insiste que a mulher com abuso de álcool falhou os seus papéis e, se lhe for diagnosticado alcoolismo, corre o risco de "perder" os filhos, sendo sinónimo de ser uma mãe incapaz, incompetente, falhando nas suas responsabilidades e para com os seus filhos (Finklestein, cit in Goodman, 2000).

Nas respostas à questão 8a: "Em que medida o álcool interferiu na sua vida como mulher?" (Quadro 8a) é evidente que a maioria das entrevistadas assume a interferência do álcool na sua vida como mulher, com prejuízos tanto a nível pessoal como a nível familiar

" Muito, muito, muito. Fiquei um farrapo, fiquei um farrapo, não tinha objectivos como mulher, não tinha objectivo como ser humano, perdi o amor, perdi tudo!" (E13)

" Eu maltratava o meu marido." (E14)

"Em relação às minhas filhas não lhes dava a atenção devida." (E18)

É de referir que apenas quatro mulheres referiram que o álcool não interferiu no seu papel como mulher.

Contrariamente ao mito de que as mulheres estão mais envolvidas sexualmente quando consomem álcool, várias pesquisas demonstram que o abuso de álcool produz depressão, baixa de auto-estima e conflitos nos relacionamentos, resultando disfunção sexual (Finklestein et al., 1990 cit in Goodman, 2000). Outros estudos demonstram que a glândula adrenal é afectada pelo consumo de álcool, com interferência na líbido, originando um quadro de disfunção sexual (Goodman, 2000). Estudos realizados nesta área indicam que a maioria das mulheres é capaz de reconhecer que a qualidade das suas experiências sexuais piorou acentuadamente desde o seu alcoolismo crónico (Barrucand, 1980, cit in Benoit, 1980). No entanto, Jean-François (1996) refere que existem mulheres consumidoras de álcool com maiores dificuldades em analisar, de forma precisa, as suas reacções sexuais, tendo a impressão de experimentarem mais excitação sexual à medida que se vão tornando mais impregnadas.

Quadro 8a- Hierarquização das categorias em relação as respostas à questão 8a ("Em que medida o álcool interferiu na sua vida como mulher?")

CATEGORIA 1ª ORDEM

CATEGORIA 2ª ORDEM

CATEGORIA CENTRAL

Interferiu N1= 3; n2= 3

Prejuízo N1= 10; n2=38

Mal N1= 4; n2=7

Muito N1= 2; n2=4

Tudo N1= 1; n2=3

Fazer asneiras N1= 1; n2= 1

PREJUÍZOS DE FORMA GLOBAL

N1= 21; n2= 56

PREJUÍZOS PESSOAIS

Perdas a nível pessoal N1= 3; n2= 8

PERDAS PESSOAIS

N1= 3; n2= 8

Interferência no casal N1= 7; n2= 10

Inferioridade em relação ao marido

N1= 1;; n2= 1

INTERFERÊNCIA NO CASAL

N1= 8; n2= 11

PREJUÍZOS NA DINÃ,MICA FAMILIAR

Interferência na relação com os filhos N1= 4; n2= 4

INTERFERÊNCIA NA RELAÇAO COM OS FILHOS

N1= 4; n2= 4

Não interferiu N1= 4; n2 = 10

NAO INTERFERIU

N1= 4; n2= 10

SEM INTERFERÊNCIA

Não sei N1= 3; n2= 5

NAO SABE

N1= 3; n2= 5

NAO SABE

  • 1- Nº de entrevistadas que se enquadram na categoria

  • 2- Nº de vezes que a categoria é mencionada pelas entrevistadas

Deste modo, na questão 8b: "Em que medida o consumo de álcool interferiu na sua vida como companheira?" (Quadro 8b), verificamos que, de acordo com a literatura supra citada, metade das entrevistadas referiram que o álcool interferiu na sua vida como companheira, ao nível do comportamento sexual, com diminuição da líbido ou, pelo contrário, com um comportamento mais desinibido:

"Com o meu marido não tinha vontade de fazer relações sexuais, não tinha vontade de fazer nada, parecia que ele estava sempre a perturbar-me, não tinha aquela vontade, não tinha aquele gosto." (E4)

" Interferiu nas relações sexuais, o álcool em mim punha-me impulsiva. Fazia coisas que agora já não acontece, ficava toda desinibida, totalmente diferente!" (E8)

Quadro 8b- Hierarquização das categorias em relação as respostas à questão 8b ("Em que medida o consumo de álcool interferiu na sua vida como companheira?")

CATEGORIA 1ª ORDEM

CATEGORIA 2ª ORDEM

CATEGORIA CENTRAL

Sem vontade de ter relações sexuais N1= 9; n2=16

Relações sexuais só quando estava sóbria N1= 2; n2= 2

Relações sexuais desinibidas

N1= 1; n2= 4

INTERFERÊNCIA NO COMNPORTAMENTO SEXUAL

N1= 12; n2= 22

INTERFERÊNCIA NO COMPORTAMENTO SEXUAL

Interferiu muito N1= 4; n2= 6

Vida sofredora N1= 1; n2= 1

Mal N1= 4; n2= 4

Quando alcoolizada só dormia

N1= 2; n2= 2

INTERFERIU

N1= 11; n2= 13

INTERFERÊNCIA GLOBAL NEGATIVA

Conflitos conjugais N1= 5; n2= 5

Separação N1= 1; n2= 1

Casal não tão amigo N1= 1; n2= 1

"Mulher que bebe é companheira do álcool" N1= 1; n2= 1

Não ser companheira N1= 1; n2= 3

CONFLITOS CONJUGAIS "ROTINEIROS"

N1= 9; n2= 11

CONFLITOS CONJUGAIS "ROTINEIROS"

Agressão física por parte do marido

N1= 3; n2= 5

Ameaças N1= 3; n2= 4

Queixa à polícia N1= 1; n2= 1

Agressividade verbal N1= 1; n2= 2

VIOLÊNCIA DOMÉSTICA

N1= 8; n2= 12

VÍTIMA DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA

Não interferiu N1= 5; n2= 12

NAO INTERFERIU

N1= 5; n2= 12

SEM INTERFERÊNCIA

Casal alcoólico N1= 2; n2= 2

CASAL ALCOÓLICO

N1= 2; n2= 2

CASAL ALCOÓLICO

  • 1- Nº de entrevistadas que se enquadram na categoria

  • 2- Nº de vezes que a categoria é mencionada pelas entrevistadas

Segundo a Confederation of Family Associatios in the European Union (1998), mais de um terço dos dependentes alcoólicos em tratamento hospitalar referem o conflito conjugal como um dos principais problemas causados pelo álcool. Nas participantes do estudo a temática da violência é abordada por oito mulheres, e nove referem conflitos conjugais "rotineiros" (associados a aspectos da vida quotidiana do casal):

".não havia um dia que não houvesse barulho em casa. O meu companheiro batia-me." (E1).

"Às vezes estávamos os dois alcoolizados. era quando ele me batia muito." (E3)

"Só foi magoar um ao outro, havia agressões físicas. Cheguei a fazer queixa dele a polícia. Ele dormia com facas debaixo dos travesseiros. Eu não queria nada com ele, não tinha prazer, às vezes ele queria ter relações e eu dizia sempre que não apetecia e ele chegou a um ponto que até chegou a forçar-me, foi quando ele chegou a dormir com facas para me assustar." (E5).

Na família, onde exista um ou mais elementos consumidores abusivos de álcool, o ambiente é muitas vezes caracterizado como um caos: confusão de papéis dos vários membros, arbitrariedade, inconsistência, crenças irracionais, bem como violência e até incesto são frequentes neste tipo de famílias. Segundo Goldstein (1986), uma das principais causas que cataliza a agressão física dentro da família é o consumo de álcool. Brassard (1939) considera mau trato psicológico, como um padrão repetitivo de comportamentos que proporciona à criança a ideia de que é desprovida de valor, não amada, não desejada.

Quinze das entrevistadas, em relação à questão 8c: "Em que medida o consumo de álcool interferiu na sua vida como mãe?" (Quadro 8c) referiram interferência do consumo abusivo de álcool no (Brands, Sproule & Marshman, 1998).

Quadro 8c- Hierarquização das categorias em relação as respostas à questão 8c ("Em que medida o consumo de álcool interferiu na sua vida como mãe?")

CATEGORIA 1ª ORDEM

CATEGORIA 2ª ORDEM

CATEGORIA CENTRAL

Falta de carinho N1= 5; n2= 7

Falta de amor N1= 1; n2= 2

Falta de atenção N1= 1; n2= 1

Agressividade com os filhos

N1= 4; n2= 8

Não queria saber N1= 13; n2=30

Perda das fases de crescimento dos filhos N1= 13; n2= 30

INTERFERÊNCIA NO COMPORTAMENTO AFECTIVO COM OS FILHOS

N1= 15; n2= 26

INTERFERÊNCIA NEGATIVA

Interferiu N1= 6; n2= 9

Mal N1= 3; n2= 6

Péssimo N1= 1; n2= 1

Consumo na gravidez N1= 4; n2= 6

INTERFERÊNCIA NAO ESPECIFICADA

N1= 14; n2= 22

INTERFERÊNCIA GLOBAL NEGATIVA

Alteração comportamental dos filhos

N1= 4; n2= 6

INTEFERÊNCIA NO COMPORTAMENTO DOS FILHOS

N1= 4; n2= 6

Não interferiu N1= 8;n2= 8

Nunca bati nos filhos N1= 3; n2= 4

Nunca fiz mal aos filhos

N1= 1; n2= 1

Filhos não se aperceberam do consumo N1= 2; n2= 3

NEGAÇAO DE COMPORTAMENTOS NEGATIVOS COMO MAE

N1= 14; n2= 16

Sempre tiveram os cuidados necessários N1= 5; n2= 7

Procedido bem N1= 3; n2= 3

Boa mãe N1= 2; n2= 2

Sempre atenta aos filhos

N1= 1; n2= 1

Sempre preocupados com os filhos

N1= 1; n2= 1

"mãe galinha" N1= 1; n2= 1

Mãe meiga N1= 1; n2= 1

AFIRMAÇAO DE COMPORTAMENTOS POSITIVOS COMO MAE

N1=14; n2= 16

SEM INTERFERÊNCIA

  • 1- Nº de entrevistadas que se enquadram na categoria

  • 2- Nº de vezes que a categoria é mencionada pelas entrevistadas

comportamento afectivo com os filhos, como falta de carinho, falta de amor, falta de atenção, bem como agressividade:

"Eu era também um bocado agressiva com os meus filhos.quando ele (filho) vinha falar comigo eu falava aos berros, batia-lhe por tudo e por nada." (E4)

" Eu bebia mas não faltava com nada às minhas filhas, mas faltava com os carinhos, com o amor. Embora eu não lhes faltasse com nada faltava-lhes com o carinho e amor de mãe, não era uma mãe que fosse companheira para ficar com elas à noite a conversar.eu não queria saber." (E2)

Podemos inferir que os filhos destas mulheres estão em risco, dado que o risco de problemas emocionais nas crianças em famílias alcoólicas é consideravelmente maior do que em crianças da população gera.l No entanto, catorze entrevistadas, negam comportamentos negativos como mãe e outras catorze mulheres realçam comportamentos positivos como mãe, com um discurso no qual é evidente o reforço e empenho dedicado aos filhos, sem falhas nas suas responsabilidades como mãe (Goodman, 2000):

"Nunca fiz mal aos meus filhos, nunca levantei a mão, nunca bati nos meus filhos. Sempre tiveram banhos tomados, refeições à horas. Acho que o álcool nunca interferiu no meu papel como mãe." (E1)

Apenas quatro entrevistadas referiram consumo de álcool na gravidez, o que contraria o registado no processo clínico onde se constata que dezasseis mulheres consumiram durante a gravidez e amamentação. Isto pode ser explicado pelo grande sentimento de culpa que afasta qualquer possibilidade de serem rotuladas como "mães negligentes", omitindo assim este consumo no seu discurso.

Na questão 8d: "Em que medida o consumo de álcool interferiu na sua vida como profissional?" (Quadro 8d), doze mulheres referiram, perdas e penalizações laborais, com situações de baixa médica, despedimento, processo disciplinar e falhas no trabalho:

" Eu fui despedida por causa do álcool. Eu meti baixa e depois entretanto despediram-me." (E1)

"Prejudicou-me, pois nunca mais consegui trabalhar." (E2)

"Tive um processo disciplinar. Estive três meses em casa de castigo porque bebia no trabalho. Sou auxiliar de acção educativa, chegava lá e a educadora notava logo porque eu cheirava a álcool, como eu não tinha antecedentes fui perdoada." (E12)

Hammer e Vaglum (1989), em estudo efectuado, realçaram a interferência do consumo de álcool nas mulheres que exerçam actividade profissional. O encontrado no discurso das entrevistadas vai de encontro ao referido por estes autores: são evidentes alterações comportamentais tais como irritação, nervosismo, desmazelo no desempenho da actividade laboral. Apenas oito mulheres consideraram que o álcool não interferiu na sua vida como profissional:

"Andava bastante nervosa, tinha de arranjar sempre maneira de uma saída do trabalho para eu poder beber, porque sentia falta, bastante irrequieta." (E20)

" . eu não tinha vontade de fazer absolutamente nada, eu cai de tal maneira que não tinha vontade nem de lavar a louça nem de limpar o pó, não tinha vontade de fazer nada." (E21)

Quadro 8d- Hierarquização das categorias em relação as respostas à questão 8d ("Em que medida o consumo de álcool interferiu na sua vida como profissional?")

CATEGORIA 1ª ORDEM

CATEGORIA 2ª ORDEM

CATEGORIA CENTRAL

Baixa médica N1= 2 n2= 3

Reformada por doença N1= 2 n2= 2

INTERFERÊNCIA NA ASSIDUIDADE

N1= 4 n2= 5

Despedida do emprego N1= 1; n2= 2

Ameaça de despedimento

N1= 1; n2= 1

Nunca mais consegui trabalho

N1= 1; n2= 1

Processo disciplinar N1= 1; n2= 1

Conflito com colegas N1= 2; n2= 2

Falhas no trabalho N1= 1; n2= 1

Baixa de rendimento N1= 1; n2=1

PERDAS E PENALIZAÇÕES EM CONTEXTO LABORAL

N1= 8; n2= 9

PERDAS E PENALIZAÇÕES LABORAIS

Irritada N1= 1; n2= 1

Irrequieta N1= 1; n2= 1

Nervosa N1= 1; n2= 1

Só dormia N1= 2; n2= 2

Desmazelava-me N1= 1;n2= 1

Não tinha vontade de fazer nada

N1= 1;n2= 1

ALTERAÇÕES COMPORTAMENTAIS SEM ESPECIFICAÇAO

N1= 7; n2= 7

ALTERAÇÕES COMPORTAMENTAIS

Consumia no trabalho N1= 2; n2= 1

Saía durante o trabalho para beber

N1= 1; n2= 2

Conflito com colegas N1= 3; n2= 3

ALTERAÇÕES COMPORTAMENTAIS EM CONTEXTO LABORAL

N1= 6; n2= 6

Interferiu nas tarefas domésticas

N1= 4; n2= 5

INTERFERÊNCIA NAS TAREFAS DOMÉSTICAS

N1= 4; n2= 5

INTERFERÊNCIAS

Interferiu N1= 4; n2= 6

INTERFERÊNCIAS NAO ESPECIFICADAS

N1= 4; n2= 6

Não interferiu N1= 8 n2= 12

NAO INTERFERÊNCIA

N1= 8; n2= 12

NAO INTERFERÊNCIA

Quando trabalhava não bebia

N1= 2; n2= 2

Só bebia à noite N1= 2; n2= 2

CONSUMO FORA DA HORA DE TRABALHO

N1= 4; n2= 4

CONSUMO FORA DA HORA DE TRABALHO

  • Partes: 1, 2, 3


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