«… mesmo se o comércio não é suficiente para erradicar a pobreza, é essencial se se quiser que os pobres tenham esperança num futuro melhor. Por exemplo, há 30 anos, a Coreia do Sul era tão pobre quanto o Ghana. Actualmente, graças ao crescimento proporcionado pelo comércio, é tão rica quanto Portugal».
M. Mike Moore, Director geral da OMC
Nos últimos anos, devido às crescentes preocupações com o desenvolvimento económico e social, a Geografia económica e do desenvolvimento tornou-se um campo fértil, onde investigadores indagam as razões da existência de tamanhas desigualdades entre territórios. No nosso caso, as razões prendem-se com as implicações da unificação do mercado europeu através da criação da União Europeia, ou ainda das preocupações surgidas por parte de alguns sectores humanistas das disparidades entre países desenvolvidos e países subdesenvolvidos, ou seja, o fosso entre o Norte e o Sul.
No entanto, embora a Geografia Económica seja um ramo bastante antigo da ciência geográfica, tendo florescido no século XIX, principalmente na Alemanha, alguns assuntos eram tidos como intratáveis, devido à utilização de conceitos como o dos rendimentos constantes. Recentemente surgiram novos métodos de trabalho e novas temáticas, reflexos de uma mudança de paradigma, como sejam a organização industrial, o comércio internacional e o crescimento económico que removeram barreiras técnicas cruciais e transformaram aquele campo inóspito num terreno fértil para os investigadores.
Relativamente aos avanços nos métodos de trabalho, é de destacar a premissa de que o desenvolvimento regional e urbano deve depender do papel dos rendimentos crescentes em vez dos rendimentos constantes. Contudo este pressuposto ainda é negado por muitos teóricos mais renitentes. De facto, a localização das actividades económicas difere enormemente: existem desigualdades na densidade da população e o comércio também está dependente do ambiente natural: em termos de vias de comunicação, ou ainda no que se refere à fertilidade do solo, uma vez que nenhuma localidade poderá produzir todos os bens mesmo sob rendimentos constantes.
Assim, a enorme desigualdade verificada – entre as áreas industriais densamente povoadas e as áreas agrícolas abandonadas, entre as cidades congestionadas e as áreas rurais desoladas – é seguramente o resultado não de diferenças inerentes entre lugares mas de um conjunto de processos cumulativos, bem como da acção de rendimentos crescentes, através dos quais a concentração geográfica se auto-reforça. Esta será a lei geral, no entanto, existem excepções.
Em termos metodológicos, os rendimentos crescentes sempre colocaram dificuldades aos geógrafos, mas a partir da década de 1970, apareceu uma «nova geografia económica», que é a quarta vaga da revolução dos rendimentos crescentes na economia, sendo aplicada no campo da organização industrial, à medida que investigadores começaram pela primeira vez a desenvolver modelos aplicáveis da concorrência na presença de rendimentos crescentes, sendo de destacar Dixit & Stiglitz (1977) que desenvolveram em 1977 a formalização do conceito de concorrência monopolística que foi posteriormente aplicado a numerosos campos. Ainda no final da década de 1970, a metodologia analítica da nova teoria da organização industrial foi aplicada ao comércio internacional; poucos anos depois a mesma metodologia foi aplicada às mudanças tecnológicas e ao crescimento económico.
Em cada caso foi preciso ir mais além do que aplicar o modelo de Dixit-Stiglitz ao assunto em causa: desenvolveram-se novos conceitos, proliferaram modelos semelhantes ainda que inconsistentes, em que cada autor inventava a sua própria linguagem. No final deste período de turbulência surgiram as notáveis teorias do «novo comércio» e do «novo crescimento».
Com este estudo pretendemos compreender o processo de desenvolvimento dos territórios, nomeadamente através do contributo do comércio, para tal apresentaremos as ideias-chave de um autor de renome no campo da nova geografia económica: Paul Krugman, que se tem notabilizado devido aos seus trabalhos sobre a introdução da concorrência imperfeita e dos rendimentos crescentes nas análises do comércio internacional assim como sobre a abordagem espacial dos fenómenos de aglomeração, quer se trate da localização industrial ou da aglomeração urbana, ao que se seguem algumas críticas à sua teoria da localização e do comércio internacional e considerações acerca das políticas de desenvolvimento económico regional mas de aplicação global.
Assim, se em 1998, segundo o Banco Mundial, 1,2 mil milhões de pessoas vivia com menos de 200 escudos por dia, ou seja 24% da população mundial e cerca de 56% da população mundial vivia com menos de 400 escudos por dia, não deverão as medidas políticas fomentar o desenvolvimento, ao tornarem o crescimento económico mais inclusivo abrangendo toda a população?
Até porque o crescimento económico está intimamente ligado às outras vertentes do desenvolvimento.
O subdesenvolvimento, com todas as suas expressões como a pobreza, as fracas condições de trabalho, a falta de respeito pelos direitos humanos, o analfabetismo e a degradação ambiental, é um problema multi-dimensional que não pode ser resolvido através de uma única solução. As causas e expressões do subdesenvolvimento não são as mesmas em todo o lado. No entanto, alguns denominadores comuns podem ser encontrados, incluindo a falta de acesso à educação (especialmente das mulheres), cuidados básicos de saúde e a distribuição desigual dos recursos. No entanto, as comunidades rurais, que são as mais afectadas pela pobreza, enfrentam os seus problemas de desenvolvimento relacionados com as fracas ou inexistentes infra-estruturas (vias de comunicação, electricidade, telecomunicações, etc.), que tanto impedem como dificultam a sua participação na economia desses países, bem como na economia mundial. Outro factor que perpetua o subdesenvolvimento é a inexistência de voz política por parte dos seus habitantes para influenciar as prioridades dos governos. É necessária, então, uma estratégia global, elemento essencial do desenvolvimento durável e sustentável.
O nosso objectivo, como já foi salientado, não é compreender o subdesenvolvimento no seu conjunto, mas focar uma parte particular do problema: o papel do comércio na localização das actividades económicas.
Comecemos por notar que as relações entre comércio e subdesenvolvimento não são tão directas e imediatas como as ligações entre subdesenvolvimento e políticas nacionais de educação e de saúde, reformas agrárias, fomento ao crédito, construção de infra-estruturas, «governância», etc. Nem deve o comércio ser comparado com outras políticas internacionais, como o perdoar da dívida externa, os programas de vacinação ou a investigação em doenças tropicais como a malária, ou outras doenças como a SIDA, que afectam os países em desenvolvimento. O comércio pode, todavia, afectar as oportunidades de rendimento dos seus habitantes de várias maneiras – umas positivas, outras negativas.
Em termos macro-económicos, as relações entre o comércio e o crescimento têm sido um tema controverso entre os economistas. Durante o período que seguiu à II Guerra Mundial, muitos investigadores concluíram que as políticas comerciais proteccionistas estimulavam o crescimento, e políticas de substituição das importações estavam largamente em vigor nos países desenvolvidos. Ao longo dos anos 1980, contudo, as análises nacionais e internacionais demonstraram a ineficácia da abordagem de substituição das importações, e então, como consequência, as políticas visando as exportações têm sido favorecidas. Se os estudos internacionais ulteriores sublinham em geral a eficácia, em termos de crescimento, das políticas que favoreçam as exportações, alguns estudos recentes têm contestado esta conclusão.
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