O ensino religioso nas escolas públicas do Brasil: discurso e poder frente ao pluralismo religioso



  1. Resumo
  2. Introdução
  3. A representação de um Brasil católico
  4. Identidade e estrutura do discurso religioso
  5. Reestruturação do ensino religioso no brasil
  6. Considerações Finais
  7. Referências

The religions teaching at Brazillian public schools: discourse and power facing of religious pluralism

Revista Diálogo Educacional, Curitiba, v. 5, n.16, p. 121-145, set./dez. 2005.

Resumo

O ensino religioso no Brasil hodierno redefine-se sob a égide do pluralismo religioso. O processo de reestruturação do ensino religioso perpassa a discussão da hegemonia religiosa católica no país. Este parâmetro evidenciase na construção de um discurso sobre o ensino religioso articulado pelos especialistas da religião que oscilam entre uma ênfase no aspecto confessional e outro fenomenológico de abordagem. No Paraná este embate adquire características polarizadas, de um lado o discurso das lideranças religiosas e de outro a práxis dos professores que atuam nas escolas públicas de ensino fundamental. A partir deste contexto, considera-se que a iniciativa de democratização do saber não resolverá por si só os problemas do preconceito e intolerância religiosa. Associado à expansão do saber sobre o fenômeno religioso, necessita-se uma revisão do posicionamento dos líderes religiosos diante da comunidade e das entidades civis do ensino religioso. Palavras-chave: Ensino religioso; Discurso religioso; Pluralismo religioso.

Abstract

The religious teaching in Brazil currently redefines itself under the aegis of religious pluralism. The restructuring process in the religious teaching surpasses the discussion about the Catholic hegemony in the country. This benchmark becomes evident in the construction of an discourse on religious teaching, articulated by specialists who range from an emphasis on either the confessional aspects or another phenomenological one by approach. In Paraná, this clash acquires polarized characteristics, one hand the leading religious institution discourse and on the other hand the práxis of the teachers who act in public schools in primary education. Hence it is considered that thee initiative to democratize the knowledge will not alone solve the problems with religious prejudice and intolerance. Associated with the knowledge expansion on the religious phenomenon a revision of the religious leaders" positioning is needed facing the community and of the civil institutions of the religious teaching. Keywords: Religious Teaching; Religious Discourse; Religious Pluralism.

Introdução

Muito se tentou definir uma unidade cultural brasileira, ou mesmo os parâmetros do chamado ser brasileiro. Afinal temos a tendência de nos afirmar diante da alteridade e assim construir uma identidade. Mas o caso brasileiro é único porque sua realidade cultural é plural, não como uma conseqüência, mas na sua própria gênese. A sociedade brasileira é melhor expressa não pelos atores sociais em si mas, acima de tudo, pelas relações que estabelecem. Sob esta ótica a cultura brasileira é relacional, ela não é produto nem fim, mas o próprio devir de diferentes culturas em constante transformação.

Sendo assim, o Brasil é refém e resgate de sua própria multiculturalidade. Muito das expressões do cotidiano no Brasil representam a idéia de um envolvimento do outrem em determinadas situações. Esta dinâmica social ten-de a cristalizar representações de tolerância religiosa, interação étnico-cultural ou mesmo generosidade e democracia cultural.

Esta imagem idealizada do Brasil é pautada pelo discurso da democracia cultural e religiosa no país. Assim, o que pretendemos neste ensaio é revelar uma faceta deste processo relacional, a estruturação do ensino religioso nas escolas públicas do Brasil.

A Constituição Brasileira promulgada em 1988, artigo 210, parágrafo 1.º do Capítulo III da Ordem Social introduziu o dispositivo de que: "o ensino religioso, de matrícula facultativa, constituirá disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental". Este dispositivo não era novidade na história da legislação brasileira republicana, pelo menos em caráter facultativo o ensino religioso sob o decreto de 30 de abril de 1931[1]assegurava o direito do cidadão ao mesmo, nas escolas públicas. Nos anos do regime de exceção de 1964 a 1984, manteve-se a inclusão do ensino religioso em todos os graus de ensino da escola pública. Todavia, muito embora houvesse um debate entre laicaicidade do ensino público e o caráter eclesial do ensino religioso, havia uma preocupação dos legisladores em garantir a liberdade religiosa promessa ontológica da república.

No período recente, a partir da Lei de Diretrizes e Base da Educação Nacional de 1996 (LDB) abriram-se novas incertezas sobre o ensino religioso, sob este impacto alguns legisladores propuseram modificações a esta lei. O texto original da referida lei mantinha o caráter restrito confessional dele, embora admitisse a pluralidade em uma proposição de caráter interconfessional.


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