"Os espaços
antropológicos são mundos de significação
e não categorias coisificadas
que partilham entre si objectos corporais."
(Lévy, 1997:186).
A comunicação reticular sustentada nas Redes e Serviços Telemáticos, das quais a Internet é a mais conhecida, gerou a possibilidade de criação e desenvolvimento de um novo espaço público, uma Nova Ágora que apresenta como característica fundamental o facto de ser um híbrido, digamos um Fórum Híbrido em que "o sujeito vive a possibilidade de ambivalência entre o local e o global, entre o eu e o anonimato, entre o eu e o outro do pseudónimo, entre a pertença e o desenraizamento, entre o ser produtor e consumidor de conhecimentos á escala global, entre a nacionalidade e o cosmopolitismo, etc.." (Silva,1999:62).
A Internet é simultaneamente real e virtual (representacional), informação e contexto de interacção, espaço (site) e tempo, mas que altera as próprias coordenadas espacio-temporais a que estamos habituados, compactando-as, ou seja, o espaço e o tempo na rede existem na medida em que são construção social partilhada. Esta construção é estruturada pelos laços e valores socio-políticos, estéticos e éticos que tipificam este novo espaço antropológico.
Este novo espaço com áreas de privacidade -um novo mundo virtual ou mundo mediatizado -é um suporte aos processos cognitivos, sociais e afectivos, os quais efectuam a transmutação da rede de tecnologia electrónica e telecomunicações em espaço social povoado por seres que (re)constroem as suas identidades e os seus laços sociais nesse novo contexto comunicacional. Geram uma teia de novas sociabilidades que suscitam no-vos valores. Estes novos valores, por sua vez, reforçam as novas sociabilidades. Esta dialéctica é geradora de novas práticas culturais.
Trata-se de um novo tipo de organização socio-técnica que facilita a mobilidade no e do conhecimento, as trocas de saberes, a construção colectiva do sentido, em que a identidade sofre uma expansão do eu baseada na diluição da corporeidade, ou seja, o que se perde em corpo ganha-se em rapidez e capacidade de disseminar o eu no espaço-tempo. Assiste-se, assim, a uma aceleração do metabolismo social. Geram-se as chamadas comunidades virtuais (Rheingold,1996; Soares,1999) que se sustentam na partilha intelectual e na convergência da pluralidade e riqueza dos conhecimentos que emanam dos sujeitos. Nestes novos espaços sociais geram-se novas solidariedades, novos excluídos, novos mecanismos de participação, novas formas de democracia, de negociação, de decisão, de cooperação, de afectividade, de intimidade, de sociabilidade que potenciam a emergência de sujeitos colectivos ou de inteligências colectivas conectivas (Lévy,1997; Kerckhove,1998).
As redes e serviços telemáticos geram no-vos espaços de encontro, novos espaços antropológicos, há que questionar em que medida esses novos espaços representacionais (re)criam as identidades e as práticas culturais.
Existe a necessidade de um pensamento crítico para analisar as transformações promovidas pelos media, nomeadamente a Internet, para que o discurso sobre esta realidade social não seja apenas o discurso utopicamente redentor, tão comum nos últimos tempos.
A razão crítica continua a ser o instrumento adequado para reflectir sobre a realidade. Contudo, não poderá ser a razão crítica fundada no pensamento da modernidade, a razão crítica de tipo cartesiano, que apesar de levar a crítica ao seu estado hiperbólico não a estende a si própria. Há, por-tanto, necessidade de re-pensar a razão crítica porque é necessário descentrá-la da razão racional-instrumental e do modelo estritamente ocidental. É necessário re-fundar a razão crítica numa pluralidade de saberes que não têm como único modelo a racionalidade lógico-matemática, mas racionalidade(s) que entretecem razão e emoção, lógico e lúdico, ociental-oriental. Sem esquecer a importância da ambiência afectiva no desenvolvimento da segurança ontológica (Damásio,1995).
"Caída a ideia de uma racionalidade central da história, o mundo da comunicação generalizada explode como uma multiplicidade de racionalidades "locais" minorias étnicas, sexuais, religiosas, culturais ou estéticas -que tomam a palavra, finalmente já não tacitamente aceites e retomadas pela ideia de que só existe uma única forma de humanidade verdadeira a realizar, não obstante todas as peculiaridades, todas as individualidades limitadas, efémeras, contingentes. Este processo de libertação das diferenças, diga-se de passagem, não é necessariamente o abandono de toda e qualquer regra, a manifestação bruta do imediato." (Vattimo,1991:16-17).
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