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Curitiba, a capital do Estado do Paraná, está localizada na região mais industrializada da América do Sul. O próprio município de Curitiba, conta com uma área correspondente a 432,17 Km e uma população de mais de 1,5 milhão de habitantes em seus arredores criou-se uma região metropolitana, criada em 1973, no corpo da lei federal 14/73. Atualmente agrega 26 municípios, os 14 originais e 5 desmembrados desses e, sete municípios integrados aos limites regionais por legislações estaduais. Em um raio de 1.500 Km, estão localizados os maiores pólos econômicos do Brasil: São Paulo, Rio de Janeiro, Porto Alegre e Belo Horizonte; ainda neste raio, se encontram as capitais dos países integrantes do MERCOSUL (Mercado Comum do Sul): Brasília, Assunción, Buenos Aires e Montevidéu. Assim, a cidade de Curitiba está bem situada em termos de comércio, criando um cenário atrativo de consumo. Curitiba conta com 75 bairros, que são agrupados em regiões administrativas.
No centro da cidade se exprime a identidade cultural, e a memória da sociedade urbana. Aí, encontramos a maioria das edificações urbanas históricas. A cidade originou-se como ponto de garimpeiros, e a passagem dos tropeiros pela região no século XVII e XVIII. Nesta época, a praça Tiradentes e, pouco depois o Largo da Ordem eram os principais lugares de encontro dos habitantes. Durante o século XVIII, grandes fazendas já cercavam a cidade e no século XIX, os imigrantes europeus iniciam a ampliação do povoamento criando núcleos de suas culturas nos bairros de Curitiba. No século XX, a urbanização devido à industrialização, transforma gradativamente a cidade e na década de 1960, Curitiba passa a figurar entre as 8 maiores cidades brasileiras. A população que aqui vivia já sentia as marcas da transformação, como se fosse uma "mini" São Paulo, incluindo os problemas que vinham junto ao desenvolvimento: favelas, problemas ambientais, infra-estrutura.
Em 1965, foi elaborado o primeiro Plano Diretor de Curitiba; pelo Instituto de Pesquisa e Planejamento de Curitiba – IPPUC, com o objetivo de reorientar o crescimento urbano, de modo a projetar um desenvolvimento racional e otimizado. Nesta política, houve também uma preocupação com lugares para se encontrar e praticar um lazer. Em 1970, os primeiros parques foram criados, áreas de preservação, centros de cultura e esporte; algumas escolas foram transformadas em núcleos comunitários. Paralelo a tudo isso se iniciou o resgate dos valores de antigos prédios e lugares como igrejas, escolas, hospitais, praças e outros.
Nos últimos 20 anos, o processo de urbanização do Paraná, apresentou índices que duplicaram a população de Curitiba. A transformação da realidade econômica estadual provocou movimentos migratórios do campo para a cidade, o que originou novas formas da distribuição espacial na cidade. Com novas tecnologias, comunicações e transportes, a busca por uma melhor qualidade de vida foi uma preocupação dos planejadores da cidade de Curitiba, que procuravam ligar o desenvolvimento a qualidade. Com o aumento da população, fez se necessário a elaboração de programas que protegessem as áreas de lazer e determinasse áreas para o desenvolvimento do comércio. Deste modo, muitas das funções comerciais acabaram sendo fixadas em bairros mais distanciados do centro, mas que fossem de fácil acesso, partindo-se do centro da cidade. Assim, surgem dentro da inovação urbana às instalações comerciais de grande porte, os shopping centers.
Os shopping centers iniciaram seu processo de disseminação no Brasil, nos anos 70. As condições econômicas da região sudeste do país, como a forte industrialização e urbanização, propiciaram, em 1966, a instalação do primeiro shopping center na cidade de São Paulo, sendo denominado de Shopping Center Iguatemi. Mais tarde, foram construídos mais dois, sendo um no Distrito Federal, e outro no Paraná. Entre 1975 e 1979, mais quatro foram inaugurados em São Paulo, Minas Gerais e na Bahia. Mas, só a partir da década de 1980, observou-se que os shopping centers, foram conquistando uma abrangência maior em todo o país, oferecendo possibilidades de lazer e consumo, na vida das pessoas de diferentes níveis de renda. Hoje, segundo pesquisa realizada por SOUTO (2000, p. 53), nos diversos shopping centers espalhados pelo país, circulam em média 100 milhões de pessoas por mês.
Os shopping centers, são um fenômeno dos centros urbanos. Com o aumento da população urbana no Brasil, a especulação imobiliária e a intensificação do trânsito, a expansão dos shopping centers, teve expressivo crescimento. Como em outros países, isto coincidia com uma mudança profunda da socialização das pessoas. Os padrões de consumo, mudaram muito devido ao surgimento dos shopping centers, principalmente para as pessoas com níveis de renda média e alta. Sofisticação, qualidade, exclusividade e um ambiente acolhedor e atraente, boa decoração e segurança, tornaram-se critérios importantes neste sentido, eles reproduzem uma cidade no seu interior. Encontramos amplos corredores, como ruas largas, alguns bancos, como nas praças, plantas ornamentais, como nos parques, placas de sinalização orientando os usuários para onde se dirigir à busca de serviços, e a praça de alimentação que lembra dos restaurantes, lanchonetes. Existem ainda, agência e serviços como correio, chaveiro, sapataria e diversas lojas que reproduzem a antiga paisagem de consumo do centro da cidade. Tudo pode ser encontrado em um ambiente climatizado, bonito e seguro, diferente das imprevisibilidades da "realidade" climática e insegura no mundo de fora. Deste modo, o shopping possui quase tudo o que a "cidade" oferece, mas com mais segurança, comodidade, variedade, fazendo que muitos sejam usuários constantes deste ambiente, sentindo-os como "lugares especiais".
Neste sentido, Carlos afirma:
Depois da casa, os lugares mais seguros são os shopping centers que procuram na sua artificialidade, recriar a vida exterior, simulando ruas, praças, alamedas, bulevares, implantando praças de alimentação e outros equipamentos de lazer como cinemas, discotecas, parques de diversão, circos, pistas de patinação, exibindo shows, desfiles de moda, exposições de artes, só para citar alguns.. Longe de resgatar a vida social tradicional dos antigos bairros, as relações são impessoais, garantindo o anonimato, tão afeito ao individualismo pós-moderno. (CARLOS, A.F.,1996, p.79).
A experiência de conhecer o shopping center, é sentida de maneira diferente por cada indivíduo; alguns podem sentir segurança e estabilidade, outros excitação, outros rejeitam a sua artificialidade; isso varia de acordo com a percepção de cada um.
Esta experiência vivida está sempre ligada ao pensamento e sentimento da respectiva pessoa; em um primeiro momento, conhecer um shopping center pode ser algo impessoal, mas como este espaço possui cheiros, sons, aspectos visuais como as vitrines, os letreiros, placas e faixas, cria-se uma impressão geral para o cliente. A localização das lojas, a sua ordem em cada andar, a iluminação, a decoração, tudo contribui para evocar um ambiente na mente do visitante. Quando começamos a utilizar freqüentemente esse lugar, ele nos parece familiar à nossa experiência e nos permite conhecê-lo mais intimamente, passando a fazer parte de nossa realidade concreta através de laços especiais.
Deste modo, a escolha de shopping centers representa a construção de um "lugar", onde se pode tanto consumir como praticar o lazer. Trata-se para a maioria das pessoas de uma opção de entretenimento, de alegria, de se sentir bem. Parece que eles mesmo criaram este espaço, como um lugar através dos seus atos.
Em Curitiba, os shopping centers enfrentam no início muita resistência, decorrentes do costume do comércio de rua. Principalmente os próprios comerciantes da cidade não aceitavam a mudança, devido à necessidade de um alto investimento. Precisamos lembrar, que esta inovação tecnológica e comercial estava vindo de fora, ambos em padrões de investimentos como de mudança social e, assim, perturbou bastante a estrutura social e comercial das cidades na época. Em Curitiba, os shopping centers começaram a se manifestar no final da década de 1980, e início da década de 1990. O primeiro grande centro de compras de Curitiba, o Shopping Mueller (figura 01)foi inaugurado em 1989. Acostumados com a espacialidade do comércio de rua, a população teve que se adaptar. As pessoas edificaram novas identidades na busca de uma adaptação aos encantos que poderiam ser encontrados dentro de um shopping. O senhor Salomão Soeifer, diretor-presidente da Companhia Brasileira de Shoppings (Combras Shopping), administradora do Shopping Mueller, em entrevista ao Viver Bem da Gazeta do Povo (conceituado jornal do Paraná) em 16 de setembro de 2001, relata que apesar do sucesso que os shopping centers faziam nas outras capitais brasileiras, em Curitiba este tipo de empreendimento ainda era desacreditado. "Tivemos que mostrar credibilidade ao público, e aos lojistas daqui", afirma ele. Nos jornais da época, foram apresentados os contratos com as lojas de departamento de Rio de Janeiro e São Paulo. Isto junto a propagandas do Shopping Mueller, foram conquistando a credibilidade e a atenção dos usuários que até hoje, são fiéis ao primeiro shopping center inaugurado na cidade. A localização próxima ao centro como é o caso do Shopping Mueller, faz com que muitas pessoas se tornem clientes constantes, já o tratando como um novo vizinho. Numa entrevista fornecida ao jornal Gazeta do Povo em 16 de setembro de 2001, uma entrevistada nos conta que freqüenta o shopping Mueller desde o dia de sua inauguração. Neste dia, ela foi contemplada com um vale compras, que trocou por um liquidificador que mantém até hoje como uma lembrança daquele dia de festa. Ela ainda comenta que costuma ir ao shopping center Mueller diariamente. "Lá encontro artigos para casa, e para toda a família, é um ótimo ambiente para fazer um lanche e conversar com as amigas."
Os primeiros shopping centers em Curitiba tiveram sua localização escolhida pelos empreendedores perto do centro da cidade, com uma tendência para o Nordeste da cidade, onde predominam as classes média e alta. Este é o caso do Shopping Mueller, do Shopping Curitiba, do Shopping Omar e do Shopping Crystal. Mais tarde, os shopping centers começam a serem construídos em locais mais afastados do centro, e surgem os shopping centers de bairro, como é o caso do Shopping Center Jardim das Américas, localizado no bairro que lhe dá o nome, do Shopping Água Verde e do Shopping Novo Batel.
De modo geral, os shopping centers são concebidos como espaços que refletem a dinâmica da cidade, com todas as comodidades e atrativos que de certa maneira condicionam a prática do consumo. É um lugar onde se acumula em forma concentrada um grande número de lojas, de grifes e de espaços estetizados em função do entretenimento e o consumo, catalisando novas identidades de grupos culturais urbanos que manifestam padrões estéticos e performances específicas. Também é um lugar onde se criam necessidades de moda, alimentadas pelas vitrines que expõem suas mercadorias de forma elegante e atrativa, sob apoio de estratégias sofisticadas de propaganda e publicidade. Desta forma, as necessidades básicas de sobrevivência dos consumidores, são gradativamente substituídas por bens de consumo cada vez mais supérfluos, que poderão trazer aos consumidores prestígio e status. Esta substituição representa uma modificação profunda da estruturação social de forma fragmentária pulverizando as identidades. Neste contexto, o shopping center pode ser identificado como um espaço de convergência cultural e de consumo que formam valores e estéticas, atitudes e comportamentos para um grande número de pessoas.
Figura 01 – Foto do Shpping Center Mueller -Curitiba-PR-Brasil
Fonte: http://img371.imageshack.us/img371/2808/ acesso 12/02/2009
O shopping center transforma as relações socitárias como também o caráter do consumidor e o seu mundo vivido. O indivíduo que procura este espaço sofre através das prefigurações dos produtos, uma fragmentação da sua identidade, em base de padronizações modistas ou de comportamentos incentivados. Afinal, A preocupação com a aparência faz um jogo simbólico, o cuidado com o corpo, com o vestuário está na origem do comércio, a moda marca uma época – "tempo social", a moda permite a participação mágica, fazer parte, valoriza a teatralidade global, á a moda de todos, do grupo. Assim, o indivíduo coloca sua máscara e faz parte do conjunto da sociedade; o vestuário e os costumes estão interligados, A aparência social é também uma proteção social, a moda, a vestimenta a linguagem do corpo não tem nada de frívolo, é um motivo de identificação de comunidades que se reconhecem. As aparências são valorizadas, não como frivolidades, mas como expressão externa de uma comunhão interna que precisa menos de uma consciência teórica do que de uma proximidade instintiva, inconscientemente de dominante corporal. Os corpos servem nesse momento de mediação, o cuidado com o corpo constitui uma preocupação social. O corpo é oferecido em espetáculo e que de forma alguma é individual, serve como meio de reconhecimento, ostentar uma participação em um grupo. Cada um assim, leva a sério o jogo teatral, ressaltando a importância da comunicação não verbal – Logo centrada, dando ênfase ao "patrimônio afetivo", cada um só pode existir em relação ao outro. E, nada melhor do que no shopping center para se observar essa questão dos jogos da aparência.
Maffesoli (1999) comenta que quando o homem adere às imagens estereotipadas das imagens publicitárias, ele reconhece os arquétipos do "mundo imaginal", enraizado no imaginário de nossa existência coletiva, sendo a aparência um conjunto de realidades que pode ser verificada. A preocupação com a aparência faz um jogo simbólico, o cuidado com o corpo, com o vestuário está na origem do comércio, a moda marca uma época – "tempo social", a moda permite a participação mágica, fazer parte, valoriza a teatralidade global, á a moda de todos, do grupo. Assim o indivíduo coloca sua máscara e faz parte do conjunto da sociedade; o vestuário e os costumes estão interligados, exemplo roupa branca geralmente ligada ao profissional da saúde – médicos, nomeia o modo de ser, identificação do grupo. A atração da moda não é insignificante, ela marca o papel da pessoa na teatralidade geral, o que o autor denomina de temática do véu. A máscara do indivíduo ou a marca do grupo. A aparência social é também uma proteção social, a moda, a vestimenta a linguagem do corpo não tem nada de frívolo, é um motivo de identificação de comunidades que se reconhecem. Valorizar a aparência é de um lado, escrever as formas em jogo e de outro apreciar as articulações. – o formismo que pode caracterizar a cultura de um lugar num dado momento. É. a ponte e a porta, como comenta o autor.. A forma justifica o geral e o particular, sendo a maneira pela qual o grupo vai se aninhar, se apropriar de um valor geral ou de um conjunto de valores. Ao freqüentar constantemente um shopping center as pessoas começam a identificar-se com o lugar, adotando novas posturas e utilizando vestimentas adquiridas lá. Assim, à medida que a pessoa começa a freqüentar com maior assiduidade o shopping center, ele passa a ser uma localidade especial, determinando identificações com ele, tornando-se um lugar de significado e de representações. Tratase, então não apenas de um objeto da geografia econômica, mas também da Geografia social e cultural.
Percebemos então que a vida cotidiana se organiza através de imagens sociais e através do que identificamos por meio das formas, como a ação repetitiva de ir até um determinado shopping center, de praticar algum esporte, de ir até a casa da mãe. São formas de reconhecimento social onde a inteligência imaginativa age, reconhecendo objetos cotidianos, constituindo a cultura local. A banalidade vivida é retratada como objeto de estudo, banal não é o supérfluo, o que pode ser deixado de lado e, sim o que deve ser observado e estudado no mundo da vida, o autor prefere chamar de emoção coletiva, é um mundo a se explorar.
Na aparência temos que tentar ver mais do que a corporeidade (ambiente) o geral é preciso como Maffesoli (1996) nos afirma "captar a estética em ação em todo o dado mundano" Para isso, as formas surgem como grandes quadros de análise, o formismo passa de uma lógica da identidade para uma lógica da identificação, a criação mais "eterna", são as criações do cotidiano, os "nadas" do dia a dia tomam forma, a integração do minúsculo privilegia o conjunto, causando emoções comuns na sociedade que se comunica por meio de um universo simbólico.A frívola aparência ganha importância, se destaca, é diferente, é única.e, pode caracterizar a cultura num dado momento. E, é isso que encontramos dentro do shopping center, novos modismos são lançados e incorporados pelas pessoas que o freqüentam.
Goffman(1996) por sua vez ressalta a questão das representações, ou seja, na crença no papel que o indivíduo está representando. O autor utiliza o termo "representação" para se referir a toda atividade de um indivíduo que ocorre em um período caracterizado por sua presença contínua no local e, que exerce sobre este alguma influência. O estudo das representações começa invertendo a questão de que o indivíduo faz sua representação e dá seu espetáculo para o benefício dos outros.
Goffman (1996) salienta que "embora normalmente as pessoas sejam o que aparentam, as aparências podem ser manipuladas", ou seja, as aparências muitas vezes enganam. No caso do de uma representação teatral podemos perceber isso, se um indivíduo consegue decorar o texto e repassar aos que assistem um sentido de realidade do que está representando é um bom ator. No entanto pode ocorrer o inverso, o indivíduo pode não acreditar no que está representando não crer na sua própria atuação,
o autor salienta que o indivíduo quando não crê na sua própria atuação e também não se interessa pelo que o público acredita, podemos chamá-lo de cínico. Por exemplo, em uma loja no shopping center, o lojista pode convencer seus clientes que os preços de alguns produtos oferecidos são os mais baixos e de melhor qualidade da cidade, no entanto outros produtos são ofertados com preços abusivos, o agir de forma honesta ou desonesta depende no que o ator acredita e representa, se tornando "sincero" ou "cínico".O ator pode então estar totalmente envolvido no seu número, tornando o seu papel uma verdadeira realidade, ou simplesmente "iludir" a platéia. O autor "utiliza os termos "sinceros" e cínicos" para diferenciar as atuações dos atores. O que pode ocorrer com qualquer ator devido a vários fatores é ser levado a praticar algumas representações sem ser cínico e ao mesmo tempo sem ser "sincero". Por exemplo, médicos com pacientes terminais, o público não permitiria a sinceridade nesse caso. Assim sendo, o médico veste uma "máscara", representando seu papel.
Para que aconteça a representação são necessários: a fachada, o cenário e outros atores. O cenário compreende a disposição física de objetos, os suportes do palco para o desenvolvimento da ação humana, o cenário geralmente e geograficamente permanece no mesmo local o que nos dá a fachada. A fachada também pode ser "fachada pessoal", o exemplo do médico de novo, sempre com roupa branca, a aparência do médico, revela o seu status social e, a maneira como se reporta ao paciente revelam o papel de interação que espera desempenhar na situação. Normalmente o que se espera desse ator é uma compatibilidade entre aparência e maneira. No entanto, Goffman (1996) afirma que muitas vezes a maneira e aparência podem se contradizer uma a outra E, que o ator pode apenas assumir um papel social já estabelecido. Por exemplo, uma funcionária de uma loja de jóias pode alcançar o cargo de gerente da loja, para tal deve se vestir adequadamente, falar de modo convincente e dirigir com competência a loja.Se não estiver executando e passando essa "imagem" para os outros provavelmente terá que mudar de função.
É de fundamental importância compreender que uma cidade e os seus lugares são palcos de ações sociais. (GOFFMAN, 1996). Neste contexto, também os shopping centers estão inseridos. Eles representam novos espaços de consumo e de lazer, onde se manifesta um tecido de atividades. Como lugar urbano de consumo, eles mantêm a prática de consumir em constante movimento através das suas ofertas e dos seus incentivos para ações rotinizadas. Eles fazem isto através de uma estrutura espacialmente distribuída, que tem como conseqüência uma "regionalização" das ações. "A regionalização deve ser entendida, não meramente como localização no espaço, mas como referente ao zoneamento do tempo-espaço, em relação às práticas sociais rotinizadas" (GIDDENS, 1997, p. 96). Giddens introduz quatro aspectos de regionalização: a forma, a duração, a extensão e o caráter. (Figura 02)
A forma define as fronteiras, geralmente demarcadas por indicadores físicos ou simbólicos. Citando: a parede em uma casa demarca a fronteira entre um ambiente e outro. Dentro de um quarto pode haver a reunião de alguns membros da família por algum tempo, podendo ser interrompida por outros componentes da família.
A duração define a permanência da regionalização. Países têm uma permanência ampla por séculos, enquanto um encontro nos corredores de um shopping center com um conhecido, demora raramente mais do que uma hora.
O caráter de uma regionalização pode ser funcional, como numa fábrica, social como num baile, intencional etc. Assim, ele é a maneira como a organização do tempo-espaço acontece, dentro dos sistemas sociais mais abrangentes.
A extensão, o estar-junto depende da disponibilidade dos atores em se juntar, dependendo da forma, da duração e do caráter.
A regionalização, diz respeito à disponibilidade de presença de pessoas associada as formas do local. Desse modo, em um shopping center, diferentes agentes participam na regionalização. Corredores largos, boa iluminação, lojas com vitrines atrativas, espaços destinados para alimentação, normas e regras que fazem do shopping center um lugar. Consequentemente, a regionalização deste estabelecimento acontece através da configuração, pelos administradores em base de recursos alocativos e autoritários e está estruturada pelos comportamentos dos consumidores, sejam eles habituais ou inovadores. Isto tem como conseqüência uma certa normatização do comportamento no shopping.
No entender de Giddens (1989, p. 02), "as atividades sociais humanas, à semelhança de alguns ítens auto-reprodutores na natureza são recursivas. Quer dizer, elas não são criadas por atores sociais, mas continuamente recriadas por eles, através dos próprios meios." O espaço do consumidor acontece em grande parte no campo da rotinização. Deste modo, freqüentar determinados lugares que a maioria das pessoas freqüenta, Como os shopping centers. Consumir o que a maioria consome, pode ser um ato de motivação inconsciente, deliberadamente desejado e motivado pelos consumidores no seu sentido inicial, mas sendo rotinizado durante a sua execução. Neste caso, a ação racional se transforma num habitus.
De fato, o consumo e na sua grande parte um habitus, no sentido de Bourdieu (1997). Está baseado em princípios básicos transmitidos através da educação dos consumidores desde pequenos. As crianças percebem que quanto mais dinheiro tiverem, mais "coisas" poderão comprar e assim poderão ter os últimos lançamentos de brinquedos, roupas e outros. Assim, as "coisas" exercem uma espécie de poder e de dominação, possibilitando determinadas realizações de ações e, consequentemente, prefigurando as suas identidades através destes produtos.
Segundo Pietrocolla:
O ritual de compra vale igualmente para adultos, sejam eles integrados no mercado de trabalho (produção) ou não. A compra e o uso de uma mercadoria,é quase um ritual de encontro do homem consigo mesmo. Ele reafirma neste gestual, sua personalidade e valores. Através de objetos que compra, ele se humaniza, pois são esses que lhe devolverão a identidade perdida no mundo da produção da sociedade de massa. (PIETROCOLLA, L. G. 1987, p. 61)
Analisando as relações de consumo podemos perceber que a vontade de consumir ocorre tanto para as crianças como para os adultos, em todos os níveis diferenciados de uma sociedade. Por meio da compra, acontece a realização; de se obter algo sonhado, idealizado anteriormente, transformando este sonho na sua realização em um posicionamento social no conjunto de uma sociedade.
Na geografia social os estudos do cotidiano enfatizam a incidência espacial dos problemas sociais asseverando a importância do espaço na constituição do cotidiano. De modo a examinar as estruturas espaciais sob as relações sociais e a reincerção do espaço na teoria social. Goffman, com sua metodologia sóciointeracionista avança na discussão do cotidiano tomando como ponto de partida o sujeito, como protagonista da ação e sua interação com as estruturas sociais, bem como as performances que vão sendo efetuadas, Maffesoli, ressalta a questão das aparênciasutilização das máscaras, que cada indivíduo utiliza em seu cotidiano de modo a teatralizar suas ações de modo convincente, podendo essas serem observadas nos shopping centers. Em Curitiba, o fenômeno dos shopping centers encontraram a princípio grande resistência, hoje fazem parte do cotidiano da maioria da população que os procura para realizar suas compras e praticar o lazer, pois são considerados lugares fechados e seguros. Neles podemos então observar a questão do jogo das aparências e a espacialização do consumo.
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CERTEAU, M., A invenção do cotidiano – Artes de Fazer, Petrópolis, Vozes: 1999.
CERTEAU, M. GIARD L. e MAYOL P. A invenção do cotidiano – Morar e Cozinhar, Petrópolis, Vozes: 1997
GIDDENS, A. A., A Constituição da Sociedade, São Paulo: Difel, 1983.
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Autor:
Ana Helena Corrêa de Freitas Gil
Professora de Geografia da Escola Técnica da UFPR e doutoranda do Programa dePós Graduação de Geografia da UFPR -Brasil.
Helena Midori Kashiwagi
Professora da UFPR-litoral e doutoranda do Programa de Pós Graduação deGeografia da UFPR – Brasil
Sylvio Fausto Gil Filho
Professor Adjunto Doutor do Departamento de Geografia da Universidade Federal doParaná -UFPR –Brasil
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