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Na Conferência de Tbilisi em 1977, a EA foi definida como uma dimensão dada ao conteúdo e à prática da Educação, orientada para a resolução dos problemas concretos do meio ambiente através de enfoques interdisciplinares e de uma participação ativa e responsável de cada indivíduo e da coletividade.
Assim, a EA está baseada na conscientização da humanidade, buscando uma forma de vida mais harmônica, promovendo então um equilíbrio entre sociedade e natureza. É nosso objetivo proporcionar aos educandos e à sociedade, meios para que compreendam a importância do seu papel e de suas responsabilidades no meio em que vive, para que possa ter uma melhor qualidade de vida (DIAS, 1994).
De acordo com REIGOTA (1995), Freire (1986) e TALAMONI (2003), a Educação Ambiental é um processo coletivo, que busca principalmente o diálogo como forma de se chegar a um objetivo desejado, com alternativas sócio-ambientais que favoreçam a grande maioria e que integre o ser humano no seu meio.
Para tanto, é necessário o desenvolvimento de um trabalho que leve os indivíduos a refletirem sobre suas ações e atitudes, analisando o seu espaço enquanto lugar de vivência. Através dos mapas mentais, será representada a percepção que cada um tem em relação ao meio onde está inserido.
O aporte da percepção fenomenológica irá proporcionar subsídios para a compreensão da realidade vivida pelos indivíduos. Através dessa compreensão, devem ser buscadas soluções para amenizar a situação caótica, muitas vezes constrangedora, gerada pela precariedade das condições de vida, em especial pela falta de saneamento básico nos espaços onde os indivíduos são obrigados a lutarem pela própria sobrevivência. Assim dentro desse contexto, a maior preocupação é com relação à sobrevivência, pois, na maioria das vezes, a reciclagem que praticam, tem motivação apenas econômica e não ambiental. A necessidade (sobrevivência) fala mais alto que a própria razão (reciclagem).
Percebe-se, que cada indivíduo tem sua interpretação de espaço, de acordo com a realidade em que vive. O espaço vivenciado é que será refletido nas percepções E esse parâmetro justifica a necessidade de compreender as ações de cada indivíduo, pois cada um tem uma percepção diferente. No entanto, não existe percepção errada ou inadequada, existem sim, percepções diferentes, condizentes com o espaço vivido.
De acordo com Kozel (2001, p.146), é através dos processos perceptivos, a partir dos interesses e necessidades que estruturamos e organizamos a interface entre realidade e mundo, selecionando-as, armazenando-as, e conferindo-lhes significados.
De acordo com Merleau-Ponty, (1999), o conhecimento espacial adquirido pelos homens, consiste, sobretudo em imagens mentais, construídas na trajetória em sua vivência a partir de sua percepção.
Nesse processo de percepção do meio ambiente, a Fenomenologia fornece subsídios que permitem desvendar o mundo percebido e vivido do ser humano e mostrar que estes estão sempre compartilhando percepções comuns e mundo comum, pelo fato de possuírem órgãos similares. No entanto, para analisar as relações do ser humano com o meio, é necessário compreender, como está estruturado esse espaço percebido na mente das pessoas, ou seja, como ocorre a construção das imagens mentais. Desta forma, no texto seguinte, será abordada a questão sobre os mapas mentais, como forma de compreender e interpretar o meio ambiente.
Dentro do processo fenomenológico deve-se analisar a essência dos fatos e não a aparência, a partir desse contexto a abordagem da percepção fenomenológica é muito mais importante, pois de acordo com Merleau-Ponty (1999, p.64), a percepção que os outros tem do mundo nos deixa sempre a impressão de uma palpação cega, de forma que a percepção do mundo pelos outros não pode entrar em competição com a de quem está de fora do contexto.
De acordo com Kozel (2001), o termo "carta mental"" foi introduzido na geografia por Peter Gould[1]ao discutir o imaginário individual e coletivo relacionado à concepção de mundo.
Para discutir a relação entre mapa e a percepção ambiental tornou-se necessário definir o termo "mapa" conforme o contexto da abordagem humanística e não cartográfica. De acordo com Andrews (1996), apud Seemann (2003), o mapa é ""uma imagem simbolizada da realidade geográfica, representando feitos ou características selecionadas, que resultam do esforço criativo da escolha do seu autor e que são desenhados para o uso em que relações espaciais são de relevância espacial.
Ao discutir sobre os ""mapas da mente"", os pesquisadores nem sempre distinguem entre mapas cognitivos e mapas mentais. Os mapas cognitivos são vistos como informações dentro da mente, sem serem desenroladas sobre um plano (Aguirre, 1999 apud Seemann, 2003, P, 200-223).
Ainda neste contexto, Niemeyer (1994, p.6), salienta que os mapas mentais são produtos de mapeamentos cognitivos, tendo diversas formas como: desenhos e esboços de mapas ou listas mentais de lugares de referência, elaborado antes de se fazer um percurso.
Mapas mentais na percepção ambiental, não devem ser vistos como meros produtos cartográficos, mas como forma de comunicar, interpretar e imaginar conhecimentos ambientais.
De acordo com Wood (1992), torna-se importante salientar que, um mapa não é a realidade e não nos deixa ver coisa nenhuma, mas ele deixa nos saber, o que outras pessoas viram, acharam ou descobriram. Sob esta perspectiva salienta que, "mapas são realmente caricaturas científicas do fenômeno que eles representam. Os detalhes e a complexidade da realidade são selecionados, simplificados e, em seguida, enfatizados de uma maneira que eles apenas retratam o que o fazedor do mapa acredita ser essencial a respeito do espaço referido no mapa. Wood (1992, p.333).
Os mapas como representações simbolizadas da realidade, podem ser um ponto de partida para as pesquisas, em geral.
Desta forma, nesta pesquisa analisou-se os mapas mentais, para avaliar o nível de percepção ambiental dos moradores das vilas (Centenário, S. Domingos, Camargo, Acrópole e Trindade) no bairro Cajuru de Curitiba-Pr, com relação ao meio onde estão inseridos.
Os Mapas Mentais – a Interpretação do Espaço Vivido
As pesquisas sobre percepção ambiental requerem uma abordagem bastante ampla, necessitando englobar várias ciências, entre elas a Psicologia, a Antropologia a Sociologia, a Geografia.
A percepção acontece de forma diferente entre os indivíduos, isto é, cada pessoa apresenta determinada percepção com relação ao espaço, sua experiência de vida. Esse mundo percebido através da apreensão dos significados provoca a construção mental, na qual a razão não decodifica essas imagens. Essas imagens foram denominadas a princípio de mapas cognitivos, mapas conceituais e posteriormente mapas mentais. A partir da década de 60, em busca de novas perspectivas de comunicação, houve a preocupação de desvendar essa imagem. O arquiteto americano Kevin Lynch[2]foi um dos pioneiros a associar a percepção do meio ambiente ao comportamento e ação humana, a partir de mapas mentais (Kozel, 2001).
Cabe dizer que o mapa no seu sentido mais amplo, exerce a função de tornar visíveis, pensamentos, atitudes, sentimentos, tanto sobre a realidade percebida, quanto sobre o mundo da imaginação. São chamados de mapas mentais, por realizar representações espaciais, oriundas da mente humana, que precisam ser lidas como mapeamentos (= processos) e não como meros produtos estáticos (Cosgrove, p.02-03 1998, in Seemann, 2003).
Conforme Tuan, (1975), os mapas mentais têm as seguintes funções:
nos preparam para comunicar efetivamente informações espaciais;
tornam possível ensaiar comportamentos espaciais na mente;
são dispositivos mnemônicos[3]quando se deseja memorizar eventos, pessoas e coisas, eles ajudam, a saber, sua localização;
como mapas reais, os mapas mentais são meios de estruturar e armazenar conhecimento;
eles são mundos imaginários, porque permitem retratar lugares muitas vezes não acessíveis para as pessoas;
Dentro desta perspectiva, é importante destacar que os mapas mentais estão relacionados às características do mundo real, ou seja, não são construções imaginárias, de lugares imaginários, mas são construídos por sujeitos históricos reais, reproduzindo lugares reais, vividos, produzidos e construídos materialmente (kozel Teixeira e Nogueira, 1999).
Desta forma ao estudar os mapas mentais das pessoas, não se pode impor categorias acadêmicas e artísticas, mas sim interpretá-los como uma forma de comunicação.
No desenvolvimento deste trabalho na educação básica, utilizou-se os mapas mentais, com objetivo de avaliar a percepção que os indivíduos tinham do espaço onde estão inseridos. Desta forma, os mapas mentais correspondem aos desenhos realizados pelos indivíduos, onde representam o seu espaço vivido. Para interpretação e análise dos mapas mentais elaborados pelos entrevistados, selecionamos as representações que contém imagens, e para realizar a análise das referidas imagens foram adotados procedimentos propostos por Kozel (2001), que tem como parâmetro à interpretação quanto à forma de representação dos elementos na imagem, sendo uma distribuição quanto à classificação de ícones (pela representação da paisagem natural, construída, vivida, elementos humanos e móveis), as letras, (palavras complementando as representações gráficas) e os mapas, formam de representação gráfica do espaço. Podendo ainda aparecer outras formas de representação que serão analisados de acordo com a temática desenvolvida.
Apresentação dos Mapas Mentais em Suas Várias Formas de Representação de elementos da Imagem.
Outros Aspectos:
As transformações no espaço ocorrem diariamente, surgem locais de referência, que se transformam em pontos de referência à medida que se tornam espaços de identificação e de expressão urbana, ou seja, à medida que esses locais relacionam-se com os humanos pelos sentimentos e vivências. Cada cidade tem seu próprio estilo, cada bairro tem suas características próprias, cada vila tem sua identidade. Essa diferença deve-se a um conjunto de características ambientais, sociais, culturais, espaciais e locacionais. São essas características do lugar que levam os indivíduos a terem imagens diferentes uns dos outros. A formação mental de cada um, deve-se às relações do meio onde estão inseridos e as relações consigo mesmo e a sua capacidade de abstrair do mundo real aquilo que é visível a si mesmo.
Nesse sentido, percebe-se, nas representações mentais, a imagem que cada indivíduo tem sobre o lugar, baseada em suas experiências e vivências.
As imagens permitiram identificar, a partir dos resultados das interpretações mentais, que as pessoas entrevistadas, de uma forma geral, têm consciência da problemática central da pesquisa, que é a questão dos resíduos sólidos. Ficaram bem claro nas representações, os sérios problemas sócio-ambientais enfrentados por grande parte dos entrevistados, que habitam as áreas mais periféricas, pois eles realmente representaram o seu dia-a-dia, com os problemas ambientais, econômicos, e de transporte, além da violência, que foi mencionado pela maioria dos entrevistados como um dos problemas mais sérios.
As representações podem ser diferenciadas de acordo com a escolaridade e local de moradia. Aqueles que estão nas áreas com menor segurança e estrutura retrataram bem a questão da violência e poluição dos rios. Por sua vez as representações dos moradores que estão mais próximos do colégio, (vilas Centenário e Camargo), foram mais relacionadas à coleta seletiva do lixo, ruas, comércio e carros, apesar de que a poluição dos rios foi bastante mencionada nos mapas mentais, já que vários rios recortam o espaço estudado.
A conclusão sobre a análise dos mapas mentais é que a população, de uma maneira geral, sabe o que precisa ser feito para melhorar o espaço em que vive, porém precisa de meios mais eficientes para compreender a importância de mudanças de hábitos e atitudes, para uma melhor qualidade de vida. Além do que, na realidade que a maioria vive, a preocupação maior é garantir a própria sobrevivência.
Apesar de a percepção ser uma linha de pesquisa recente, acreditamos que esta, possa contribuir nos trabalhos desenvolvidos por professores, psicólogos, e até mesmo pelo poder público, que poderão utilizar os métodos utilizados nesta pesquisa com o intuito de compreender melhor o dia-a-dia das pessoas mais pobres, e, de uma forma mais concreta, fazer algo para amenizar seus problemas sócio-ambientais.
DIAS, G.F. Educação Ambiental: princípios e práticas. 3. ed. São Paulo; Gaia, 1994.
FREIRE, Paulo. Educação e mudança. São Paulo: Atual, 1986.
KOZEL T. S. e NOGUEIRA. A. R. B. A. Geografia das Representações e sua aplicação pedagógica: contribuições de uma experiência vivida, In: Revista do Depº de Geografia de São Paulo. FFLCH-USP. 1999(13)239-257).
KOZEL, T. S. - Das imagens às linguagens do geográfico: Curitiba, a "capital ecológica". São Paulo, 2001. Tese de Doutorado-Departamento de Geografia da Universidade de São Paulo.
LYNCH, Kevin. A imagem da cidade. São Paulo, Martins Forte, 1980, 207 p.
MERLEAU-PONTY M. Fenomenologia da percepção. 2aed. São Paulo: Ed. Martins Fontes, 1999.
NIEMEYER, Ana Maria de. Desenhos e mapas na orientação espacial: pesquisa e ensino de antropologia. Textos Didáticos (Campinas-IFCH/UNICAMP, n.12, janeiro de 1994.
REIGOTA, Marcos. Meio ambiente e representação social. São Paulo: Cortez, 1995.
SEEMANN, Jörn. Mapas e Percepção Ambiental: do Mental ao Material e vice-versa. Vol. 3, nº1, p. 200-223, setembro de 2003. Rio Claro.
TALAMONI, J. L. B. & SAMPAIO, A. C. (Org.) Educação ambiental: da prática pedagógica à cidadania. São Paulo: Escrituras Editora, 2003.
TUAN, Yi-Fu. Ambigüidade nas atitudes para com o meio ambiente. Boletim geográfico, Rio de Janeiro, IBGE, 245 (33): 5-23, 1975.
WOOD, Denis. The power of maps. New York: Guildford Press, 1992.
Autor:
Nilza Aparecida da S. Oliveiranilollyver[arroba]yahoo.com.br
Volume 16, janeiro a junho de 2006
Mestrado em Geografia-UFPR.
Rua: Catulo da Paixão Carense, 35
Vila Centenário – Bairro Cajuru
CEP: 82960-000 Curitiba-Pr
[1] GOULD. P. Mental Maps In Image and Environment. R.M. & D.Stea Ed. Chicago. 1973, apud KOZEL, 2001.
[2] LYNCH, K. A imagem da cidade. São Paulo, Martins Fontes, 1980, apud KOZEL, 2001, p.208.
[3] Mnemônicos: Arte e técnica de desenvolver a memória. Dicionário Ferreira Aurélio Buarque de Holanda, p. 466, ed. Nova Fronteira, 1998.
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