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Weber definiu democracia como sendo um mecanismo institucional de seleção de políticos competentes e capacitados. Para ele a democracia seria uma seleção natural de líderes competentes para a formação do parlamento. O povo ficaria restrito à escolha dos seus representantes retirados de um grupo elitista de políticos profissionais.
Weber e Schumpeter tinham uma concepção restrita da vida política onde, para eles, não havia espaço abrangente à participação política. Para ambos, a coletividade era uma constante ameaça a estrutura do Estado.
Weber estruturou toda uma visão burocratizada da democracia que foi absorvida e fortalecida por Schumpeter na década de 40 (Held, 1987). A visão da incompetência dos cidadãos médios para assuntos públicos e a necessidade de criação de partidos políticos no lugar da democracia direta, são pontos que perpassaram para a análise de Schumpeter. Tais partidos teriam de disputar os votos num amplo "mercado" político competitivo e teriam também de racionalizar suas estratégias para lograrem êxito em seus intentos.
Schumpeter (1984) criticou a teoria clássica da democracia de forma a levantar, segundo ele, falhas conceituais que não mais se adequavam à realidade do século XX. A Teoria Clássica de democracia surgiu no século XVIII, em um momento histórico onde as estruturas daquela sociedade inspiravam mudanças bruscas no estado. Esse estado nascente refletia as idéias e perspectivas da classe em ascensão naquele momento, a burguesia. O liberalismo, que se tornou à filosofia política da classe burguesa, alicerçou os pensamentos de filósofos que introduziram a filosofia utilitarista no âmbito da sociedade burguesa. Os interesses dos indivíduos estariam acima de quaisquer outros interesses e daí surgiria o bem comum como sendo o resultado de um "propósito comum" dos interesses individuais. Mesmo os não-utilitaristas como Rousseau, compartilhavam da conceituação de um bem comum universalizante. As definições de bem comum, vontade do povo, vontade geral, segundo a teoria clássica, não tinha sentido para Schumpeter.
A teoria clássica seria na verdade uma ficção, pois os cidadãos são totalmente desprovidos de razão quando o assunto envolve questões políticas. As definições de bem comum, vontade da maioria e vontade do povo são conceitos que variam de acordo com os interesses daqueles que se envolvem na política, ou seja, são manufaturados por eles. O bem comum aparece como algo que não pode ser definido de forma coerente, pois a sua concepção para diferentes grupos dentro de uma sociedade pode se mostrar de forma multifacetada. "Não existe algo que seja um bem comum unicamente determinado, sobre o qual todas as pessoas concordem ou sejam levadas a concordar através de argumentos racionais (...) para diferentes indivíduos e grupos, bem comum está fadado a significar diferentes coisas" (Schumpeter, 1984; pp. 314-5). A doutrina clássica traz a vontade geral como sendo o substrato das vontades dos indivíduos (Rousseau, 1997). As vontades dos indivíduos podem ser as mais diversas possíveis e para se chegar a uma conclusão do que é à vontade do povo tem-se que se levar em consideração as mais variadas formas de vontades dos indivíduos em sociedade. A vontade do povo e a vontade da maioria podem divergir em vários aspectos, a universalização desses termos mostra-se equivocadamente errada (Schumpeter, 1984; pp. 318 - 9).
Schumpeter (1984) fez a revisão da doutrina clássica para chegar a conclusão de que a mesma não condiz à realidade da sociedade industrial do século XX. A doutrina clássica é um credo no qual os homens encontraram o substituto da religião, da moral e da ética. Para Schumpeter (1984), a doutrina clássica da democracia aparece como um ideal incorporado por grupos que só pretendem proteger os seus interesses. "A revolução democrática significou o advento da liberdade e da decência, e o credo democrático significou um evangelho de razão e de melhorias. É certo que essa vantagem estava fadada a se perder e o abismo entre doutrina e prática da democracia estava destinado a ser descoberto. Mas o encanto da aurora demorou a desfazer-se. (...) os políticos apreciam uma fraseologia que lisonjeie as massas e que ofereça excelente oportunidade não apenas de fugir à responsabilidade, mas também de esmagar os oponentes em nome do povo" (Schumpeter, 1984: 334). Utilizando a doutrina clássica e seu ideal humanístico, muitos políticos que na verdade não estariam interessados em pressupostos humanísticos, poderiam usar tal doutrina no intuito de ludibriar as massas. O discurso intrínseco naquela doutrina, para Schumpeter não passava de um rito utópico impraticável que serviria como subterfúgio para políticos mal intencionados. E, sendo assim, estaria aí a posição na qual Schumpeter acreditaria estar perpetuada a doutrina clássica da democracia.
As mudanças advindas com o avanço tecnológico e com as revoluções no mundo do trabalho trouxeram uma nova perspectiva para o conceito de democracia. A democracia passou a ser um método de escolha de representantes em um contexto de competição política pelo voto dos cidadãos. A democracia sendo vista como um mecanismo, não mais como um ideal. "Por democracia, Schumpeter queria se referir a um método político, ou seja, uma estrutura institucional para chegar a decisões políticas (legislativas e administrativas) investindo certos indivíduos com o poder de decidir sobre todas as questões como conseqüências de sua dedicação bem sucedida à obtenção do voto popular" (Capitalism, Socialism and Democracy, p. 269 in Held, 1987: p. 151). Para Schumpeter a democracia da teoria clássica não passava de um ideal irrealista, a democracia na verdade seria um método de escolha de governantes e o povo seria um ator passivo. A partir disso questiono: qual a consistência da democracia para Schumpeter? O que caracteriza os seus "ingredientes" principais?
No que diz respeito à democracia real de Schumpeter, esta é "um mecanismo que permite o registro de desejos mais amplos das pessoas comuns, o que deixa a verdadeira política pública nas mãos dos poucos suficientemente experientes e qualificados para fazê-la" (Held, 1987: p. 151). A democracia como método real e aplicável deveria excetuar a tirania da maioria e restringir a participação política dos cidadãos apenas ao aspecto de escolha de seus líderes. Estes viriam de escalões da elite política, os políticos profissionais, que, como o empresário no mercado tenta maximizar suas ações para obter maiores lucros, deveriam utilizar todos os recursos para a obtenção da maioria dos votos dos cidadãos numa competição livre por tais votos. Os políticos estariam inseridos em partidos que têm como principal objetivo chegar ao poder ou manter-se nele (Shumpeter, 1984). Obtendo êxito na disputa, o político vitorioso assumiria o poder onde permaneceria até as próximas eleições.
A participação política se restringe à escolha dos representantes. O debate político fica restrito à elite política eleita. Então, para Schumpeter, "a democracia não significa e não pode significar que o povo realmente governa em qualquer sentido óbvio dos termos "povo" e "governo". A democracia significa apenas que o povo tem a oportunidade de aceitar ou recusar os homens que os governam (...)" (Capitalism, Socialism and Democracy, pp. 284-5 in Held, 1987: p. 152).
Schumpeter percebia o cidadão como um "fantoche" nas mãos da opinião pública pré-fabricada pela propaganda. A opinião popular seria manufaturada facilmente pelos veículos midiáticos e por aqueles que estivessem dispostos a persuadir as massas no intuito de fazer prevalecer os seus interesses mais imediatos. As decisões políticas teriam, segundo Schumpeter, de ficar no âmbito do parlamento tal como Weber diagnosticou. A política, no entanto, não seria atividade para pessoas que não os políticos profissionais advindos de elites políticas com alta capacidade técnica e de aparelhos burocratizados que seriam os partidos políticos.
Portanto, a teoria democrática de Schumpeter é conhecida como tendo caráter minimalista, pois na sua argumentação a democracia "pode suportar, na melhor das hipóteses, apenas um envolvimento político mínimo: aquele tipo de envolvimento que poderia ser considerado suficiente para legitimizar o direito das elites políticas em condições de competir para governar" (Held, 1987: p. 153).
No que diz respeito à competição pelos votos, Schumpeter acompanha Weber no quesito da formação dos partidos políticos. Estes existem por questão da incapacidade dos cidadãos em seguir um ordenamento em suas ações políticas. Os partidos políticos seguiriam as regras eleitorais e articulariam suas estratégias no sentido de alcançarem os melhores resultados nas eleições. Eles representariam, de forma organizada e burocratizada, os anseios dos grupos de cidadãos.
Schumpeter afirmou que para o método democrático ter eficiência é necessário o preenchimento de certas condições:
1. O calibre dos políticos deve ser alto.
2. A competição entre líderes (e partidos) rivais deve ter lugar dentro de uma esfera relativamente restrita de questões políticas, vinculadas por consenso à direção geral da política nacional, ao que constitui um programa parlamentar razoável e a questões constitucionais gerais.
3. Um corpo burocrático bem treinado e independente, de "boa posição e tradição", deve existir para ajudar os políticos em todos os aspectos da formulação e administração da política.
4. Deve haver um "autocontrole democrático", ou seja, uma ampla concordância sobre o fato de que coisas como a confusão entre os respectivos papéis dos eleitores e dos políticos ou um excesso de críticas ao governo em todas as questões são comportamentos indesejáveis. Cabe ao governo impor a si limites quando certas questões ultrapassarem sua esfera de conhecimento, algumas questões têm de ser entregues a especialistas.
5. Deve haver uma cultura capaz de tolerar diferenças de opinião (Held, 1987: p.160, cópia do original).
Aqui percebe-se muitos argumentos para os críticos de Schumpeter, bem como aos seus seguidores. Reduzir a democracia a um método de escolhas e dar ao indivíduo uma total incapacidade de discutir problemas políticos, fez com que vários estudiosos argumentassem contra a posição de Schumpeter.
"Se a democracia clássica (...) não existe, apenas este fato não prova que ela é impossível." (Parry, 1964: p.149; veja Duncan e Lukes, 1963 in Held, 1987: p. 163). A democracia clássica do século XVIII nasceu como um movimento de crítica à dominação política da aristocracia. Para os democratas clássicos, o cidadão aparece como agente potencial e a vontade geral como o que existe de comum a todas as vontades individuais, ou seja, o substrato coletivo das consciências (Rousseau, 1997: p. 185). Mas, segundo Schumpeter, o cidadão comum é irracional para assuntos políticos.
De acordo com a crítica de Held (1987), a teoria de Schumpeter estaria mais próxima de uma visão antiliberal e antidemocrática. O´Donnell (1999) também ressalta o caráter minimalista da teoria de Schumpeter destacando a questão das liberdades exigidas para que exista sucesso do método democrático. Para O´Donnell o caráter minimalista de Schumpeter não procede, pois, para que existam as condições que Schumpeter enumera para a eficácia do método democrático, é de fundamental importância o respeito de certas atribuições do Estado de direito, bem como a formação de uma cultura "tripartite" da sociedade civil, ou seja, onde as prerrogativas liberais, republicanas e democráticas façam parte da cultura política do cidadão. Mas, existem defensores do minimalismo schumpeteriano, como Elster (1999) e Przeworski (1999 e 2000), que enveredaram por uma interpretação processual de democracia com grande eficácia teórica.
Para a existência da democracia é necessário o mínimo de conforto material, o mínimo de eficiência da máquina estatal, também é necessário um capital social de elevado nível no corpo da administração do estado e no corpo político (accountability horizontal). Por fim, é necessário um accountability vertical suficientemente relevante e liberdades garantidas para todos ou a grande maioria[2]
O conceito minimalista de democracia nos faz refletir sobre dois conceitos que são fundamentais para o estudo da política contemporânea. Seriam eles, os conceitos de bem comum do humanismo cívico e a apatia política como direito (Reis, 2002). O primeiro traz para a discussão a necessidade da participação política ativa de todos os cidadãos numa esfera pública de deliberação em pé de igualdade e o segundo releva a questão da apatia política ou a não participação nas questões políticas como um direito a ser respeitado[3]
Essa discussão está enquadrada em duas arenas, uma caracterizada pelo mercado e outra pelo fórum. Na primeira a política é vista como uma disputa em livre competitividade e a outra se refere à política deliberativa que traz em si uma visão normativa da política que busca um bem comum que seja a vontade da maioria garantida pela ação coletiva da sociedade. No mercado prevalece a visão individualista da política e no fórum a visão da comunidade[4]
Reis (2002) elabora uma análise pertinente sobre a apatia política como direito e, em alguns casos, como tendo caráter virtuoso. A não-participação algumas vezes pode ser importante para o processo político. Se eu como indivíduo não tenho conhecimento suficiente sobre determinado assunto, nada mais racional e prudente do que me negar a participar do processo político de discussão sobre ele. Pode ser que a minha ausência em determinado processo de decisão, como uma eleição, seja decisivo para a eficiência do processo político democrático (Reis, 2002).
Dentro desse contexto, seguindo a linha schumpeteriana, vamos ter desenvolvido a concepção que segue a visão mercadológica da política. Os políticos são vistos como atores que buscam, a todo custo, maximizarem suas ações em prol da otimização dos seus interesses. Essa abordagem de caráter econométrico traz para a discussão da política um viés mais realista e quantitativo da teoria democrática. O mundo moderno, na visão de Madison (Reis, 2002), estaria pouco propenso a absorver a perspectiva coletivista da democracia como viam aqueles que "bebiam" na teoria clássica de democracia.
Dessa forma, os estudos de grupo e de ação coletiva passaram a visualizar o indivíduo como principal agente e não a coletividade. Olson (2002), afirma que dentro de um grupo que tem um interesse comum também encontramos interesses estritamente individuais. Tais interesses podem diferir dos interesses da organização ou do grupo. O indivíduo, independentemente de seu ideal de grupo, mantém seus interesses particulares. Nessa perspectiva o indivíduo que está inserido em um grupo latente, ou grande grupo, tem poucos estímulos para a participação política em prol de bens públicos coletivos. Olson (2002) compara o indivíduo a empresa no mercado competitivo, sua participação ou não-participação dependerá das oscilações mercadológicas. O esforço dispensado em prol de um benefício público em um grande grupo será desfrutado com a participação do indivíduo ou com sua ausência no processo. Dessa forma, a tendência a não querer participar do ônus da participação prevalecerá[5]O bem público será desfrutado mesmo sem a participação. Para existir uma maior eficácia da democracia vai ser fundamental a formação de pequenos grupos ou comitês (Olson, 2002.: p. 66). Para Olson (2002) os pequenos grupos têm maior eficiência quando a perspectiva é a ação, os grupos latentes ou grandes grupos teriam melhor desempenho nas arenas de discussão, numa visão da democracia como fórum.
Contudo, a visão minimalista da democracia coloca o elemento procedural como ponto chave da teoria. Como num mercado o indivíduo escolherá, de acordo com suas preferências, a plataforma que mais condiz com suas necessidades e o partido ou indivíduo eleito vai buscar otimizar suas ações tendo como principal intuito manter-se no poder e/ou ser reeleito numa próxima eleição Caso o eleito consiga seu intento, provar-se-á que sua conduta no governo foi aprovada pela maioria; já sendo negativa a sua empreitada, teremos sua reprovação consolidada nas urnas (Przeworski, 1999: pp. 23-55). Przeworski defende a concepção minimalista, pois é o único mecanismo em que conflitos são resolvidos sem derramamento de sangue. Seguindo a linha de Popper, democracia nessa perspectiva permite livrar-se de governos de forma pacífica. Seria o melhor meio para a regulação dos conflitos, pois dificilmente deixará de existir conflitos. Na sua defesa da concepção minimalista, Przeworski (1999) releva questões importantes. "Ainda assim este milagre (democracia) não opera sob todas as circunstâncias (...) Lipset (1959: p. 46) estava indubitavelmente correto quando ele disse que "quanto mais próspero um país, maior é a chance que ele sustentará democracia."" E ainda, apelando para o aspecto institucional, "uma concepção minimalista da democracia não suaviza a necessidade de pensar em design institucional" (Przeworski, 1999: pp. 49- 50).
Raymond (1996), no Tratado de Sociologia, atribui a Schumpeter, o uso da expressão "individualismo metodológico", que é a premissa central da teoria da escolha racional. Essa linha de raciocínio traz em seu bojo a política como um campo vasto de oportunidades de ações que tem em sua base uma linha de escolhas e estratégias de indivíduos racionais. Estudo de forte caráter econométrico, a escolha racional tem suas raízes nos estudos de Schumpeter.
1.2 ESCOLHA RACIONAL, ACCOUNTABILITY E A TEORIA DEMOCRÁTICA
Com o que foi desenvolvido a partir das reflexões de Schumpeter (1984), a respeito da democracia como um método de escolhas de governantes num sistema competitivo de eleições livres e competitivas, temos centrado na discussão conceitual o indivíduo. O individualismo metodológico passa a ser visto como premissa para a análise política pelos teóricos da escolha racional. O indivíduo como ator político racional, os custos de ação, as estratégias, o homo economicus que visa maximizar e otimizar suas escolhas. Os indivíduos montam estratégias e agem a partir delas, são atores políticos que estão preocupados sempre com suas ações objetivando o melhor resultado que elas possam lhe proporcionar. Nessa perspectiva o mundo político abrange uma série de estratégias entre atores políticos que buscam tirar proveito de suas ações em um curto espaço de tempo para, por exemplo, manter-se no poder ou ganhar uma eleição. É a visão da economia deslocada para o estudo da análise política.
Nesse contexto o que vai servir de restrição aos movimentos e estratégias dos indivíduos são as instituições políticas - numa linguagem da escolha racional - que são as regras do jogo democrático. Na perspectiva da escolha racional a política é vista como um jogo onde encontramos a interação das estratégias dos indivíduos. A teoria dos jogos é um mecanismo de análise muito utilizado pelos teóricos da escolha racional o que faz da política um campo permeado por jogos e subjogos em cadeia, onde as instituições, como já foi assinalado, servem como as regras desses jogos[6]
Como a votação é uma escolha individual, a escolha racional aparece como uma teoria que tem um forte impacto no estudo da democracia política. Segundo esta teoria, o voto aparece como a principal instituição da democracia. Este controle que está nas mãos do cidadão é o que chamamos de accountability vertical em sua conceituação mais simplória (O´Donnell, 1999).
A teoria da escolha racional analisa as escolhas dos indivíduos de acordo com suas preferências e suas informações a respeito do que está sendo deliberado para uma possível escolha e as ações desses indivíduos. O problema está na interpretação das preferências e das informações a respeito das preferências (Elster, 1999). Os indivíduos são incapazes de informar suas verdadeiras opiniões a respeito dos assuntos públicos, suas informações e suas preferências geralmente ficam internalizadas. Quando um governo ou estado procura centralizar ações de políticas públicas através de agregações de preferências dos indivíduos, o que caracteriza a teoria da escolha social, pode ter resultados insatisfatórios em seus intentos. Por isso, quanto menos for centralizada as ações do governo ou estado e maiores forem às prerrogativas às ações individuais, melhor poderá ser o desempenho das políticas públicas, segundo os teóricos da escolha racional. Mas, isso é um assunto prático e não teórico.
Importante ressaltar os limites da teoria da escolha racional. A questão cultural do meio contextual, por exemplo, não é levada em consideração pelos teóricos dessa escola. Alguns elementos do contexto cultural influem nas escolhas dos indivíduos, mas para a escolha racional o que importa é a utilidade da escolha e não o seu aspecto normativo. Apesar do interesse empírico dessa teoria, a formação das preferências, que é de fundamental importância para a escolha, sofre grande influência do contexto histórico-cultural e isso é negligenciado pela teoria.
Na visão de Baert (1997) a cultura importa, e o desenvolvimento da filosofia da ciência enfraquece teorias que afirmam estar no seu poder de predição sua força explicativa. Mas, suas argumentações se mostram um pouco frágeis para criticar a teoria da escolha racional. Para ele há uma distinção entre agir como se fosse racional e o agir racionalmente, neste ponto ele diz "para que os indivíduos ajam como se eles fossem racionais não há necessidade de que ocorra nenhum processo de decisão racional remotamente similar ao atribuído aos indivíduos pela teoria da escolha racional" (Baert, 1997). Apesar do esforço de Baert para comprovar uma certa nebulosidade da teoria da escolha racional, não fica muito claro o que ele pretende com essa afirmação. Agir racionalmente ou agir como se fosse racional, para a teoria da escolha racional não tem muita diferença. A ação pode se mostrar ao observador como irracional, ou até mesmo racional não otimizada, a priori. Mas, a posteriori, com uma avaliação que considera resultados a longo prazo, pode-se contradizer a afirmação de irracionalidade , chegando a conclusão de que a ação do indivíduo foi racional visando um resultado a longo prazo e não a curto prazo, que é o que geralmente importa para a teoria da escolha racional. Também podemos acrescentar o fato de que uma ação racional pode contradizer as hipóteses levantadas pela teoria, mas não deixará de ser racional apenas por não ter sido pareto-otimizada.
Outro questionamento a teoria da escolha racional foi exposto por Habermas, "não é realista a idéia segundo a qual todo comportamento social é concebido como agir estratégico, podendo ser explicado como o resultado de um cálculo egocêntrico de possíveis vantagens. A força sociológica desse modelo é visivelmente limitada: mesmo que haja o risco de um comportamento egoísta, o nível de sua presença efetiva varia muito. Grande parte da literatura relativa à escolha social e à escolha pública, que presume ser o comportamento universalmente oportunista, parece ter perdido o contato com um mundo real, onde se pode encontrar muita honestidade e senso de dever. Se as pessoas adotassem sempre um comportamento oportunista e o conseguissem impor, a civilização tal qual nós a conhecemos não existiria" (Habermas, 1997: p. 66).
A posição de Habermas me parece um tanto quanto radical, ou até mesmo ingênua, a honestidade e o senso do dever são virtudes que pode-se encontrar na sociedade, são questões absorvidas no conceito republicano de democracia, mas a escolha racional preocupa-se com questões mais realistas nas relações individuais, que muitas das vezes são oportunistas; algumas vezes não descarta a possibilidade de certas preferências que não sejam egocêntricas. Quando mergulhamos em análises mais sofisticadas que utilizam a escolha racional como ferramenta, percebe-se construções de variáveis relevantes de conteúdo normativo. Alguns estudos utilizam a variável ideologia para mensurar impactos de partidos políticos no agir estratégico de certos atores políticos relevantes (Neto, 2000)[7]. Mas, a maioria dos estudos da escolha racional está centrada no indivíduo.
De fato, a teoria da escolha racional apresenta limites, mas qual a teoria que não apresenta limitações?
A escolha do indivíduo é de fundamental importância para a construção de um regime político democrático. Seguindo essa linha, a escolha dos governantes aparece como premissa básica do controle por parte da sociedade. Por que a teoria democrática é tão importante para a ciência política contemporânea? Hoje, num mundo globalizado, premissa básica para a inserção de um país no quadro político internacional é a organização e a formatação de sua democracia. O acesso dos países aos mais diversos benefícios depende da avaliação da condição democrática de cada um deles (O´Donnell, 1999). A qualidade dessa democracia vai depender de várias questões, dentre elas a accountability em sua estrutura e a versatilidade de suas ações em prol de eficiências nas gestões em todos os níveis, melhor dizendo, governança. No mundo moderno a democracia direta é algo inexistente e temos como tipo de democracia aquele ao qual chamamos de representativo. Nesta democracia os cidadãos são levados a escolher seus líderes em eleições livres. Aí está aquilo que chamamos de accountability vertical (O´Donnell, 1998) no qual o controle é exercido pelos cidadãos com o poder de voto em eleições livres, competitivas e periodicamente realizadas. A escolha é definida nas eleições com o voto da maior parte dos cidadãos. Isso é chamado de accountability ou responsabilização[8]a de caráter vertical, o controle exercido naqueles aos quais nós delegamos as prerrogativas de nos governar.
A dificuldade está no bom agenciamento da accountability vertical. Várias questões podem interferir de forma negativa no bom funcionamento da accountabily no que diz respeito ao controle sobre as questões políticas no processo deliberativo. Países onde a concentração de renda e o monopólio da informação (a mídia desempenha papel chave no controle, pois praticamente as informações que vão a público passam por ela) são fatores preponderantes, pois a capacidade de accountability por parte da sociedade civil fica gravemente comprometida. Reflexos de supercorporações que influenciam decisivamente na política de países periféricos, como é o caso do Brasil, levam a um mau desempenho da democracia e a um sério comprometimento das instituições políticas desses países. Mas, o ponto fundamental de uma eficiência governamental está na questão da representatividade, é nela que encontra-se o potencial do controle individual da cidadania, aquilo que chamo de acountabilidade[9]verticalizada.
Luis Felipe Miguel em artigo recente (texto que inclui resultados iniciais de sua pesquisa "Modelos alternativos de representação política", pelo CNPq)[10] discute a problemática da representatividade em democracias contemporâneas, sejam elas de países cêntricos ou periféricos. Inicia sua análise fazendo uma "viagem" histórica sobre a crise democrática das décadas de 60 e 70, no que diz respeito à representatividade ele atribui uma crise que acompanhou a crise das democracias. A desconfiança do cidadão para com o seu corpo político gerou uma série de trabalhos a respeito de novas alternativas de representatividade. Sorteio, seleção aleatória e vagas especiais para grupos marginalizados são exemplos de tais mecanismos alternativos. O fato é que com a crise de confiança na representatividade temos uma fragilização do processo de accountability vertical. É importante ressaltar que para um bom accountability é fundamental a representação em níveis mais universalizantes dentro do processo deliberativo. As cotas para representatividade são expedientes inteligentes e apreciáveis para esse tipo de deliberação. Mas, é também importante colocar que a eleição aparece como ponto fundador da relação entre representantes e representados (Miguel, 2001), apesar da visão aristocratizada que os fundadores da democracia tinham desse processo. Nele temos o poder de delegar o governo a um representante e, conforme for, este representante tem de nos prestar contas de seus atos no governo. Está aí a essência do controle responsivo pelo cidadão. A prestação de contas vem com as eleições, a escolha da manutenção do status quo ou o deslocamento para outra opção de representação fica à mercê do voto do cidadão.
Há, desde meados do século passado, uma queda na confiabilidade da democracia como sistema político, não só em países desenvolvidos europeus e norte-americanos, mas também nos recentes países redemocratizados, tanto da América Latina como do leste europeu[11]Esse descrédito vem da falta de interesse pelos assuntos públicos somados ao distanciamento com que os representantes se apresentam perante a comunidade.
Alguns teóricos da representatividade, como Pitkin (1967), elaboraram mecanismos representativos no intuito de sugerir uma visão mais abrangente da representatividade. Como muitos grupos na sociedade são subrepresentados, ou mesmo não tem nenhum tipo de representatividade, os representantes aparecem sempre mais distantes da realidade de tais grupos. Mesmo com a franquia eleitoral passando para grupos considerados minoritários, o problema da representatividade permanece. O grupo que se apresenta no poder na maioria das democracias políticas ainda é majoritariamente uma elite dominante branca, instruída e corporativista.
A crise na questão da representatividade gera um fraco controle responsivo por parte da sociedade civil, ou seja, a accountability vertical declina ainda mais. Mas, de acordo com Íris Marion Young (1990), são importantes as políticas de franquias para grupos marginalizados. Segundo ela, "o acesso de integrantes de grupos marginalizados às deliberações públicas é necessário não porque eles compartilhem das mesmas opiniões ou interesses, mas porque partem de uma mesma perspectiva social, ou seja, um local de onde se vê o mundo, vinculado a certos padrões, socialmente estruturados, de experiências de vida" (Miguel, 2001). Isso é importante, pois a participação de grupos marginalizados historicamente na discussão pode levar a formação de uma outra agenda política (Miguel, 2001) fazendo pressão nos representantes no processo deliberativo. A formação da agenda política perpassa à simples tomada de decisões. Young vem de uma linha habermasiana de democracia deliberativa, distanciando-se do que foi discutido em toda esta seção onde foi destacado o aspecto procedural minimalista da democracia em algumas teorias relevantes. Buscarei agora delinear a discussão da teoria deliberativa, uma vertente rival do que até agora foi discutido, um viés de democracia que não incorpora apenas a questão eleitoral da democracia, mas uma participação mais abrangente e ativa do cidadão.
1.3 A TEORIA DELIBERATIVA
Nesta seção passo a analisar o conceito de democracia como fórum. Depois de analisar a democracia em sua perspectiva elitista, onde o que prevalece é o conceito de democracia como mercado, passo a analisar a democracia como argumentação (Avritzer, 2000) que é uma visão antagônica ao elitismo democrático e que parte de outros conceitos e teorias. Questões normativas, como a cultura, ficam de fora numa concepção elitista de democracia, na teoria deliberativa a cultura e outros aspectos normativos importam para o processo argumentativo que prescinde, na visão de Habermas, o momento decisório e serve como mecanismo de pressão (Habermas, 1997: p. 91). Centrada num processo de contradição à democracia como mecanismo decisório, a perspectiva democrática deliberativa introduz o valor da argumentação ao processo político. Os dois maiores expoentes da visão democrática decisionística[12](Avritzer, 2000) são Weber e Schumpeter. A democracia como argumentação ou como fórum (Elster, 1997) tem em John Rawls e Jürgen Habermas teóricos fundamentais da linha teórica da democracia deliberativa.
Rawls analisa a democracia de forma "híbrida", ora apresentando elementos decisionísticos ora elementos argumentativos (Avritzer, 2000). Em sua obra intitulada Uma teoria da justiça (1971), Rawls demonstra bem isso. Ele afirma que as pessoas na posição original desconhecem as diferenças argumentativas. Na posição original os indivíduos não têm informação completa a respeito dos assuntos discutidos, existe um véu da ignorância que faz com que não exista um entendimento coeso sobre o que está em discussão. A convergência das opiniões acontece como uma intersecção das diversas opiniões, tal convergência advém de uma concepção unânime de justiça. Esta concepção se aproxima muito do conceito de maioria de Rousseau, já que a solução final no processo argumentativo na posição original levaria a um consenso. Mas, por outro lado, Rawls defende a idéia de que a opinião da maioria, que resulta do consenso sobre justiça, deve levar em consideração as outras opiniões daqueles que as questionam. Isso seria importante segundo ele, pois levaria a uma maior perspectiva do processo deliberativo.
Em Uma teoria da justiça Rawls ainda vê os indivíduos como iguais em suas capacidades, essa visão mudou bruscamente em sua outra obra de grande importância chamada O liberalismo político (1993). Nela Rawls não define os indivíduos como sendo iguais, mas sim possuindo elementos importantíssimos que os diferem. Valores, concepções sobre a moralidade, religião e outros aspectos idiossincráticos influem na formação de diferentes pontos de vistas e opiniões, esta diversidade de elementos leva a conflitos de valores, passando a existir necessidade de regulação para tais conflitos[13]Mas, mesmo com esta mudança de perspectiva, Rawls mantém o seu conceito de deliberação ainda "amarrado" ao aspecto individualista no processo decisório. A concepção de justiça que aparece como sendo um ponto convergente da posição original passa para uma outra perspectiva, no O liberalismo político, na qual há um consenso sobreposto que tenta conciliar pluralismo e deliberação. O consenso sobreposto teria respaldo das principais instituições da sociedade civil. Podemos dizer que o conceito de deliberação em Rawls tem caráter transitório daquilo que Habermas desenvolve em seu conceito de esfera pública.
O conceito de esfera pública de Habermas (1997) amplia a participação no processo político. O que prevalece na teoria habermasiana é o fórum como um amplo lugar de discussão da sociedade civil. Apesar desse papel fundamental da esfera pública, Habermas não descarta o parlamento como ator principal no processo decisório, ou seja, o ambiente decisório ainda permanece sob a responsabilidade de especialistas no parlamento. A esfera pública aparece como uma caixa de ressonância das demandas provocadas pelos indivíduos na esfera privada que são trazidas ao público pelo agir comunicativo. Essa ação está vinculada a grupos e subgrupos sociais que transmitem suas opiniões e problemas a respeito de suas realidades e demandas sociais num conjunto de esferas públicas inter-relacionadas. Habermas chama essas realidades idiossincráticas de mundo da vida. Os meios de comunicação de massa aparecem como o principal mecanismo de troca de opiniões e de movimentos deliberativos do mundo da vida conduzindo para o mundo político as pressões da sociedade civil. Dessa forma, passo a analisar alguns conceitos intrínsecos na teoria da deliberação em Habermas.
A esfera pública é uma rede complexa de comunicação onde posicionamentos e opiniões advindos da esfera privada são discutidos. Aparece como uma arena de discussão que apresenta uma linguagem comunicativa em comum. Como já foi dito, este mecanismo de deliberação não descarta a ação especialista do aparato parlamentar. A opinião pública que é formada na esfera pública permanece informal. "A influência pública é transformada em poder administrativo somente depois que ela passa pelos filtros dos procedimentos institucionalizados da formação democrática da opinião e da vontade política e se transforma, por meio dos debates parlamentares, em uma forma legítima de legislação" (Habermas, 1995: p. 371 in Avritzer, 2000). A esfera pública aparece como uma estrutura intermediária que serve como mediadora das relações entre o sistema político de um lado e os setores privados do mundo da vida do outro. Representa uma rede de estrutura complexa que se ramifica em outras cadeias deliberativas. É uma rede de comunicação que aborda as tomadas de posição e opiniões. Nela os dados comunicacionais são filtrados e resumidos, chegando a reduzir as opiniões públicas em temas mais específicos para um melhor processo de deliberação no âmbito decisório. São três os tipos de esferas públicas. A Episódica que encontramos nos bares, nos cafés, em encontros na rua, etc. A de presença organizada que representa grupos organizados como os encontros de pais, público que freqüenta teatro, reuniões de partidos ou congressos de igrejas. E uma terceira conhecida como abstrata produzida pela mídia, são os leitores, ouvintes e espectadores singulares espalhados no globo (Habermas, 1997). A esfera pública legitima as decisões deliberadas pelo aparato parlamentar, pois serve como filtro para as questões que vão ser significantes para a maioria dos indivíduos da sociedade civil.
A sociedade civil tem papel fundamental na teoria democrática deliberativa. Seu conceito tem início nos séculos XVIII e XIX e estava ligado a sociedade burguesa. Hoje, com o aumento da complexidade social e das novas políticas inclusivas, o conceito de sociedade civil tomou um novo rumo. As associações e organizações livres, de caráter não estatal e não econômicas que são as estruturas de comunicação da esfera pública, formam o núcleo institucional da sociedade civil (Habermas, 1997). Ela é responsável pelo agir comunicativo. Esse agir comunicativo é formado pelas já ditas associações no mundo da vida que capturam as problemáticas da esfera privada transferindo-as para a esfera pública, fazendo com que surjam temas de interesse geral no intuito de que ocorra deliberação servindo como pressão para o mundo sistêmico. A sociedade civil é formada por uma miríade de atores e associações que tem voz ativa no processo argumentativo no mundo da vida. A valoração dessa visão multifacetada da sociedade descarta o mero individualismo como propulsor de motivações e decisões, a racionalidade da ação perpassa para um nível social maior de grandes e pequenos grupos que se formam no mundo da vida, dando mais consistência as decisões no nível institucional. A opinião pública formada no mundo da vida pelos diversos agentes da sociedade civil é o ponto principal na discussão do agir comunicativo na esfera pública. Para a formação livre de empecilhos internos e externos dessa opinião é relevante a garantia de certas liberdades, sobretudo a liberdade de imprensa (Arato e Cohen, Habermas, 1997). A preservação dessas garantias serve para que as diversas formas de consciência e de bem viver sejam preservadas para a integridade da esfera pública e da sociedade civil como um todo. O agir comunicativo precisa dessas garantias para a efetividade de um processo de discussão livre de deformações.
Contudo, apesar de toda a magnitude e complexidade conceitual da democracia argumentativa habermasiana, há uma manutenção do aspecto decisório nas instituições do Estado. Habermas não é capaz de produzir arranjos institucionais, pois a sua formulação conceitual não supõe nada mais que a influência em relação ao sistema político (Avritzer, 2000). Habermas também tem uma visão um pouco exagerada da sociedade em seu aspecto normativo, em algumas passagens ele mostra uma confiança bastante irreal de uma sociedade formada por virtudes cívicas, numa realidade que muitas das vezes aparece como tendenciosa a formação de seres egocêntricos que estão em última instância preocupados com virtudes cívicas. A teoria deliberativa traz para o bojo da discussão outras visões da democracia como processo participativo. A participação leva a outros aspectos importantes que são encontrados em visões republicanas de participação política, bem como a conceituações multiculturais que envolve discussões mais complexas a respeito de identidades subrepresentadas e políticas de reconhecimento nos âmbitos deliberativos e decisórios.
2.1 O RENASCER DO REPUBLICANISMO
O republicanismo contemporâneo, apesar de suas limitações como teoria acabada (Melo, 2002), tem se destacado como teoria rival ao liberalismo e a escolha racional, e, também, por apontar algumas divergências internas, apresenta-se como uma teoria importante para a análise da política como fórum. A teoria do republicanismo tem sido constantemente colocada em destaque para o estudo da democracia deliberativa, aparecendo como alternativa importante ao liberalismo (Melo, 2002). O republicanismo tem origem histórica remota, encontramos aspectos dele desde a Grécia e na Roma clássicas até nas repúblicas italianas do período renascentista com a importante figura de Maquiavel. Mas, a minha preocupação é discutir o republicanismo à luz da nossa contemporaneidade. Daí as análises de Berlin (1969), Skinner (1984 e 1993) e Taylor (2000) se mostrarem tão importantes para o republicanismo contemporâneo.
A análise republicana contemporânea tem como ponto de partida o conceito de liberdade. Mais especificamente, o conceito de liberdade negativa. Tal conceito apareceu como oposição ao republicanismo clássico, definindo a liberdade como a ausência de constrangimentos ou obstáculos aos indivíduos. Esta é a fórmula hobbesiana e consiste no núcleo duro da tradição liberal clássica (Melo, 2002). As divergências entre os principais autores contemporâneos do republicanismo aparecem nas suas definições a respeito de liberdade negativa e de liberdade positiva.
Berlin (1969) distingue os dois conceitos de liberdade de forma muito sofisticada. Defende o conceito de liberdade negativa como o elemento nucleador da concepção de liberdade. Afirma que aqueles que defendem a liberdade negativa têm o interesse de limitar a autoridade, enquanto os opositores de tal concepção querem a autoridade em suas mãos. Para Berlin (1969), aí se encontra uma profunda e irreconciliável divergência.
Seguindo essa linha, ele afirma que "quem me governa" tem uma lógica diferente da afirmação "até que ponto o governo interfere em minha vida" (Melo, 2002: p. 59). Para ele, a idéia de liberdade que surge a partir da participação e do autogoverno, adicionando dever com interesses não passa de hipocrisia. A visão de Berlin (1969) é da defesa de uma dose de pluralismo somado a uma certa medida de liberdade negativa. Isso seria de um valor humanístico mais próximo da realidade, diferente do proposto "pelas metas daqueles que buscam, nas estruturas grandes, disciplinadas e autoritárias, o ideal do autodomínio "positivo" por classes, por povos, e pelo conjunto da humanidade" (Berlin, 1969: p. 171, in Melo, 2002).
Berlin faz a observação de que na noção de liberdade positiva há uma idéia de que os indivíduos devem agir de forma idealizada, sendo coagidos a agir de forma específica para que sua liberdade real seja efetivada. Para ele a liberdade positiva nada mais é do que uma imposição perfeccionista do viver, ou melhor, da forma de viver ditada por uma ordem superior. As críticas dos republicanos contemporâneos têm aí seu ponto de partida. Berlin apresenta uma posição sobre a política que navega entre a concepção de uma defesa da democracia representativa pluralista e a visão schumpeteriana de democracia (Melo, 2002).
Os defensores da concepção republicana colocam como precondição para a democracia o envolvimento com a coisa pública e o autogoverno. A cidadania ativa e mobilizada será a garantia das liberdades negativas. Para Skinner (1993), a visão liberal — que afirma que se todos perseguirem seus próprios interesses estará assegurado que o resultado final será o melhor bem-estar para toda a comunidade —, do ponto de vista da tradição republicana levará na verdade à corrupção (Melo, 2002). A análise republicana de Skinner está vinculada historicamente aos pensamentos de Maquiavel. Skinner (1984) utiliza a história como instrumento às críticas liberais das concepções negativas de liberdade. Ele afirma que as interpretações da liberdade negativa em Constant e Berlin estão equivocadas. "Embora tenha se originado na Grécia o republicanismo é fundamentalmente neo-romano, e não se assenta exclusivamente na participação e cidadania ativa, mas em um desenho institucional específico de checks and balances" (constituição mista) (Melo, 2002). Para os republicanos, a maneira de persuadir os cidadãos naturalmente centrados em seus interesses particulares a agir virtuosamente se encontra nos poderes coercitivos da lei[14]
Taylor, apesar de partir de uma análise republicana da política, aparece como contestador da posição de Skinner sobre liberdade. Diz que Skinner define de forma incorreta a liberdade como as virtudes do interesse próprio que justificam a concepção positiva de liberdade (Melo, 2002). Taylor distingue a tradição cívico-humanista da "tese republicana" de Skinner. A tradição republicana estaria centrada numa visão instrumental do envolvimento com a res publica, ou seja, de uma racionalidade instrumental por parte do indivíduo. Já a cívico-humanista estaria embasada numa visão não instrumental. Para Taylor, a liberdade negativa seria um conceito de oportunidade que denotaria uma ausência de obstáculos externos aos indivíduos. E a liberdade positiva consistiria em um conceito de exercício. Taylor critica o conceito de oportunidade por ver que os obstáculos aos indivíduos muitas das vezes são internos e não externos.
É neste ponto que está a principal crítica de Taylor aos liberais. Ele afirma que os liberais da concepção negativa defendem os indivíduos como sendo aqueles que melhor arbitram seus interesses e que, por isso, não podem ser forçados a serem livres, ou ter suas preferências verdadeiras externalizadas. Segundo ele, os liberais insistem em uma ausência total de falhas das preferências internalizadas. Para Taylor podem existir travas internas, ou seja, preferências internalizadas que interferem na liberdade do indivíduo. Taylor afirma que é praticamente impossível entender a liberdade como conceito de oportunidade, já que ela também é um conceito de exercício. Para que eu possa realizar meus objetivos mais importantes e, também, superar os meus limites internos – sejam eles emocionais ou não – é de fundamental importância a compreensão do meu eu.
Taylor discute o republicanismo baseado nos conceitos do patriotismo, do bem comum e do bem convergente. O bem comum tem profundo caráter normativo, como a amizade e a confiança, que é partilhado pela comunidade. O bem convergente equivale aos bens públicos na linguagem da economia, são benefícios materiais que englobam toda a comunidade, são bens coletivamente providos. Para Taylor, a tese republicana reduz a liberdade a um bem convergente, prescinde do interesse pelo bem comum. A tese republicana, para ele, estaria vinculada ao interesse da manutenção de liberdades, com o medo da perda de tais liberdades. Taylor vê no republicanismo real, o humanista-cívico, o interesse pelo verdadeiro bem, o bem comum, com uma forte identificação patriótica[15]
Sendo assim, o republicanismo aparece em duas vertentes, uma considerada por Taylor como instrumental a qual é elaborada por Skinner e que tem uma forte ligação histórica com o republicanismo de Maquiavel. Uma outra é a defendida por Taylor que a chama de cívico-humanista mais ligada com a filosofia e o conceito de identidade. O cidadão aparece como um agente engajado, enraizado no processo político e com um profundo sentimento patriótico. Ambas formas republicanas são adversárias da concepção liberal que enxerga na liberdade negativa o modus operandi principal da política.
2.2 A POLÍTICA DO RECONHECIMENTO: IDENTIDADE, MULTICULTURALISMO E DIREITOS
A política do reconhecimento, do pluralismo, do multiculturalismo e a questão dos direitos são análises muito delicadas e de forte conteúdo ideológico-normativo. Desde a ascensão dos direitos fundamentais como algo universal, historicamente nascido com a formação do estado moderno e do liberalismo político, as problemáticas a esse respeito só recrudesceram. A igualdade de direitos patrocinada pelo liberalismo e a política do reconhecimento que critica tais direitos como limitadores das culturas idiossincráticas, aparecem como teorias rivais.
Os defensores de uma política que reconheça minorias de forma a introduzir suas culturas no contexto da sociedade de forma que haja respeito por tais minorias, geralmente condenam o liberalismo como tendo um enfoque limitador, elitista na formação das regras, das leis. Nesta seção colocarei análises dos dois lados, ou seja, estudiosos que defendem o liberalismo igualitário e aqueles que defendem a visão multicultural da política. Antes de entrar nas discussões e críticas entre os dois grupos vou salientar uma questão importante, enquanto os liberais igualitários estão preocupados com o bem-estar do indivíduo, os multiculturalistas se detêm na questão das defesas dos direitos de grupos. Isso já nos dá uma certa visão da problemática em questão.
A análise do conceito de cidadania está intrínseca na conjuntura dialógica do texto. Um primeiro grupo segue a linha do conceito liberal de cidadania que vem desde Kant a estudiosos contemporâneos como Rawls e Dworkin. Nessa linha o individuo prevalece como o ser supremo, ficando, dessa forma, de fora atributos cívicos e de bens comuns, tão reconhecidos no republicanismo desde a antiguidade clássica, sobretudo, Roma. O que tem de maior relevância aqui é a questão da liberdade negativa implícita no discurso liberal que tem como objetivo livrar os indivíduos de constrangimentos institucionais. O segundo segue a linha republicana ou do humanismo cívico, cujas origens remontam a Cícero, Maquiavel, Montesquieu e, mais recentemente, Hannah Arendt (Carvalho, 2000). A preocupação desse grupo é escandalosamente diferente do grupo anterior. Tal preocupação está totalmente direcionada ao interesse do grupo, da coletividade, da res publica, mesmo que para isso seja necessário o sacrifício do interesse individual.
Taylor (2000) defende a política como sendo a garantia de direitos e prerrogativas a grupos considerados culturalmente menos favorecidos historicamente. Ele afirma que negar reconhecimento a grupos culturais minoritários pode ser uma forma de opressão.[16]
Com a ascensão do liberalismo e de suas cartas constitucionais que garantiam direitos iguais a todos os cidadãos, os indivíduos passaram a serem vistos como algo coeso dentro da sociedade. Para isso haveria a necessidade de uma política da igual dignidade em que todos teriam as mesmas prerrogativas em consonância com o que se entendia por uma vontade geral. Rousseau foi o elemento chave na construção de uma filosofia política na qual a igualdade consistiria numa rigorosa exclusão das diferenças.
A crítica de Taylor ao que ele denomina liberalismo "cego às diferenças" é a de poder ser visto como um particularismo mascarado de universal. "Há uma forma de política de respeito igual, tal como entronizada num liberalismo de direitos, que é inóspita à diferença, dado que (a) existe na aplicação das regras que definem esses direitos, sem exceção, e (b) suspeita de metas coletivas" (Taylor, 2000: p. 265). Para Taylor a necessidade de reconhecimento é de extrema necessidade, já que em todas as sociedades o fator multicultural está se tornando cada vez maior e a complexidade em que estão inseridas essas diferenças exige uma política do reconhecimento mais relevante. O exemplo que ele ressalta é a questão de Quebec. Nesse caso, ele levanta um problema filosófico. Seria liberal interferir na conduta de certos indivíduos por questão de uma ação coletiva? Alguns dispositivos da Carta Constitucional do Canadá davam abertura a certas prerrogativas discriminatórias a alguns grupos. Algumas leis foram aprovadas no Quebec e gerou uma discussão muito séria em torno da política do reconhecimento. Uma delas regula o envio de crianças as escolas de língua inglesa, os francófonos e os imigrantes não podem dirigir seus filhos a tais escolas. Uma outra regula empresas onde existam 50 empregados ou mais, nelas os negócios têm de ser dirigidos em francês[17]Utilizando o exemplo do Quebec, Taylor procura endossar a necessidade de se aplicar políticas diferenciadas mesmo em sociedades liberais, dando prerrogativas de redistribuição de oportunidades a certos grupos para que sua cultura não seja destruída. Há uma tendência a se manter a tradição intacta, a proteção dessa tradição é de fundamental importância para a garantia de que as gerações futuras tenham uma "motivação" para mantê-las. Para o liberalismo procedimental, ele afirma não haver variações quanto as políticas que corroborem o aspecto das diferenças, a tendência é a sua inaplicabilidade num momento futuro.
Há uma exigência em reconhecer o igual valor de diferentes culturas. Taylor propõe uma série de políticas de ação afirmativa como a questão da modificação dos currículos escolares para o devido reconhecimento de culturas marginalizadas, o reconhecimento cultural nos currículos escolares serviria para uma revisão da identidade de crianças que estariam colocadas à margem da cultura hegemônica do homem europeu branco. Todo o discurso de Taylor tem como principal foco a valorização cultural dos grupos minoritários. Ele defende iguais direitos civis e políticos, mas, ao mesmo tempo, evoca o pressuposto de que as culturas tradicionais dos mais diversos grupos devam ser valorizadas, é o que se chama de política da diferença. Esta é criticada pelos defensores da política da dignidade universal a qual Taylor (2000) critica afirmando que tal dignidade é deveras "cega". "Cega às diferenças". É nessa questão que reside a teoria da política do reconhecimento e que os seus críticos mais se apegam.
Em estudo dialógico Vita (2002) aponta críticas importantes ao papel do multiculturalismo. Ele defende a concepção de Brian Barry em diversos trabalhos a respeito desse assunto no qual o liberalismo igualitário impõe alguns limites ao multiculturalismo. Vita questiona a objeção multiculturalista ao liberalismo igualitário. A acusação dos multiculturalistas ao liberalismo igualitário reside no que eles afirmam como sendo "cego às diferenças". Os adeptos do multiculturalismo acusam que o liberalismo igualitário corrobora uma imposição cultural hegemônica. Sendo assim, Barry enfrenta a crítica multiculturalista defendendo o posicionamento do liberalismo igualitário.
Praticamente todas as sociedades de hoje são pluralistas e multiculturais. O reconhecimento de tal pluralidade é o ponto de partida do liberalismo. O liberalismo nasceu de um contexto multicultural na Europa dos séculos XVI e XVII de forte caráter conflituoso. As guerras religiosas são bem conhecidas na História da Europa. O liberalismo apareceu como uma proposta de tratamento igual aos adeptos do catolicismo e do protestantismo em instituições laicas, comuns a ambos (Vita, 2002). A idéia central do multiculturalismo é que não basta garantir direitos iguais entre os membros de minorias e os membros da maioria cultural. A justiça exigiria o reconhecimento público de direitos diferenciados cujos portadores não são indivíduos, mas sim grupos (Vita, 2002). O que aparece como ponto central da desconfiança dos liberais igualitários é justamente a intervenção que políticas multiculturais poderiam, ou podem, ter na vida, ou no que deve ser a boa vida do indivíduo.
Barry (Vita, 2002) enfatiza que algumas questões como a dos negros, das mulheres, dos idosos, dos homossexuais e até mesmo de minorias étnicas e nacionais, não tenham conteúdo cultural. O equívoco do multiculturalismo é a tendência universalizante de colocar que culturas distintivas constituem a característica definidora de todos os grupos (Vita, 2002). Para Barry a cultura não é o problema, é na verdade o que menos importa, a diferença entre os grupos é a questão da inclusão. O problema étnico nos EUA em tempos atrás foi mais um problema político do que de cunho cultural.
O problema dos direitos defendidos pelos multiculturalistas reside na questão desses direitos serem atribuídos a entidades coletivas. Há uma posição radical por parte dos liberais igualitários quando analisamos a afirmação de Vita (2002) embasado em Barry, "conceder direitos culturais a determinados grupos na prática significa conceder uma "carta branca" para que seus chefes, líderes, elites ou militantes mais aguerridos obriguem os membros desses grupos a se conformar ao figurino da identidade coletiva reconhecida" (Vita, 2002). Tais direitos concedidos a entidades coletivas seriam, de certa forma, admitir que quaisquer tipos de tratamentos dispensados aos seus membros individualmente teriam justificativa em nome da preservação de uma identidade coletiva. Há no discurso liberal aqui levantado uma preocupação em manter-se uma neutralidade. A questão do Quebec é vista pela visão liberal como uma coerção aos franco-canadenses e imigrantes que queiram colocar seus filhos em escolas de língua inglesa, ou qualquer outra que seja, em nome da necessária manutenção de uma cultura ou de alguma identidade.
O liberalismo não está preocupado em tratar o bem de grupos, que para eles poderiam acarretar em autorizar violações aos direitos de membros individuais, mas sim na garantia de condições institucionais que visem assegurar um tratamento em pé de igualdade a todos os membros da sociedade sem relevar concepções x, y ou z do que seja o bem e a melhor forma de vida. É preciso que a filiação de grupo seja livre de empecilhos ou coerções e que a saída de tal grupo também seja de uma forma que não leve ao indivíduo, constrangimentos e impedimentos na continuidade de sua existência.
A concepção multicultural da política e a concepção liberal são concepções antagônicas que trazem questionamentos difíceis de seguir uma linha. Os dois conceitos de justiça em ambas concepções são pertinentes e levam à reflexão. A tarefa de se chegar a uma conclusão da melhor forma de aplicar os direitos seja no viés liberal ou no viés multicultural não é fácil e, também, não leva a nenhum tipo de definição final. A política do reconhecimento e a política da igual dignidade são questões complexas e de difícil solução conceitual. Qual a melhor forma de política para uma sociedade heterogênea e multicultural, a política do reconhecimento ou a da igual dignidade? Fica aqui o questionamento levantado.
A discussão contemporânea da política navega entre duas vertentes majoritárias de grande importância. Tais vertentes encontram-se incorporadas nas concepções da política como mercado e fórum. Nessas duas arenas temos desenvolvido uma grande variação de teorias, tanto tendo como vista a política como mercado quanto tendo no fórum sua tarefa de análise política. Tais teorias são rivais, mas dentro de suas arenas encontramos sérias divergências conceituais. São teorias importantíssimas para o desenvolvimento da política como ciência. Todas essas análises teóricas desenvolvidas neste artigo tiveram como intuito principal checar as possíveis formas de averiguação da política democrática.
Teóricos dos dois lados (mercado e fórum) elaboraram teorias de grande sofisticação que trouxe para a análise política uma vasta literatura.
Concepções minimalistas, como a de Shumpeter e Przeworski, influem em novos estudos sobre democracia. Mainwaring et alii, em estudo de classificação democrática na América Latina (2001), afirmam que a concepção de democracia de Przeworski e Schumpeter é "submínima", ou seja, menos abrangente que a concepção minimalista. Em estudos referentes à classificação de regimes políticos na América Latina a análise dicotômica de Przeworski et alli (2000) não se enquadraria por ser dicotômica. A escala de classificação exigiria mais que o simples mecanismo de afirmação que um país é democracia ou ditadura. Em sua análise classificatória, Mainwaring et alii (2001) aplicaram uma terceira escala para classificar países como semidemocracias ou semiautoritários ("gray zone"), seria uma análise tricotômica minimalista mais completa que a dita "submínima" de Przeworski et alli (2000) e Schumpeter (1984). Este é apenas um exemplo do desenvolvimento da concepção minimalista de democracia que partiu de Schumpeter (1984) e Dahl (1971) e se desdobrou em estudos bastante relevantes para a Ciência Política contemporânea.
A teoria política voltada para o fórum, para a participação e a cultura cívica também se mostra presente com forte impacto. A deliberação pública é o oposto da visão mercadológica do "individualismo metodológico", nela a participação e a discussão tem papel de grande relevância. A teoria da deliberação pública juntamente com o republicanismo e a política do reconhecimento são concepções importantes e que estão na ordem do dia nas discussões políticas nacionais e internacionais. Temas contemporâneos importantes, como o sistema de cotas para negros nas universidades brasileiras e o orçamento participativo como fórum deliberativo de discussão e decisão (Avritzer, 2000), são exemplos de fórmulas práticas que partiram de discussões teórico-filosóficas.
Inferindo, a política como mercado e a política como fórum são faces de uma mesma moeda, e, como um conjunto de fórmulas que se antagonizam, no final ambas servem para trazer luz aos estudos sobre o estado, a sociedade, a economia e, sobretudo, a política.
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Autor:
José Maria Pereira da Nóbrega Jr
josemariajr23[arroba]hotmail.com
Graduado em História pela UFPE, Universidade Federal de Pernambuco é mestrando no Programa de Pós-Graduação em Ciência Política pela mesma universidade.
[1] Apesar de afirmar que a democracia direta poderia existir sob certas condições. 1) a organização deve ser local ou limitada de alguma forma em termos do número de seus membros; 2) as posições sociais dos membros não devem diferir grandemente umas das outras; 3) as funções administrativas devem ser relativamente simples e estáveis; 4)... deve haver um desenvolvimento mínimo de treinamento de formas e meios objetivamente determinados. (Economia e Sociedade, vol. II, p.949) in Held, 1987: p. 136.
[2] Para uma boa discussão sobre Accountability ver O´Donnel em (1999) "Horizontal Accountability and New Polyarchies", in A. Schedler, L. Diamond e M. F. Plattner (eds.), The Self-Restraining State: Power and Accountability in New Democracies. Boulder/London, Lynne Rienner, pp. 29-52.
[3] Na segunda parte deste texto discutirei em maior detalhe o primeiro caso.
[4] Maiores desdobramentos na segunda parte quando direciono as reflexões ao campo da política como fórum.
[5] Nesse ponto Reis (2002) levanta uma crítica ao trabalho de Olson. Para ele, não necessariamente aqueles que se abstém da participação do processo político são beneficiários.
[6] Para uma análise mais aprofundada destas questões veja Elster (1989).
[7] Em estudo em que utiliza recursos conceituais da escolha racional, Octávio Amorim Neto analisou alguns aspectos da formação de coalizões e estratégias do Presidente da República utilizando o Gabinete Presidencial; nesse estudo utilizou uma variável independente para mensurar ideologia. NETO, Octávio Amorim (2000). Gabinetes Presidenciais, Ciclos Eleitorais e Disciplina Legislativa no Brasil. Dados v.43 n.3 Rio de Janeiro.
[8] Accountability nesse sentido não tem uma tradução literal para a língua portuguesa. A que mais se aproxima é responsabilização ou responsividade.
[9] Mesmo que Accountability Vertical.
[10] Impasses da accountability: dilemas e alternativas da representação política.
[11] "Segundo pesquisa realizada pelo instituto chileno Latinobarómetro, apenas 37% dos brasileiros consideram a democracia o melhor sistema de governo. O índice de confiança na democracia registrado no Brasil é o mais baixo entre os 17 países incluídos na pesquisa, publicada na última edição da revista inglesa The Economist." (UOL Mídia Global, matéria publicada em 20 de agosto de 2003). "Pesquisa indica que o brasileiro é, entre os habitantes de 17 países do continente, o que menos apóia esse regime" (Folha de São Paulo, terça-feira, 10 de junho de 2003).
[12] A democracia decisionística tem como referência o processo decisório não dando relevância a argumentações que estejam fora do parlamento.
[13] O consenso sobreposto seria o mecanismo regulador dos conflitos.
[14] Maquiavel: é a fome e a pobreza que tornam os homens trabalhadores. E são as leis que os tornam bons.
[15] O bem é aquilo que se partilha. Os bens convergentes são fruídos coletivamente (a segurança, etc.), mas o caráter coletivo refere-se apenas ao fato de que sua provisão tem que ser pública ou coletiva em virtude da não-exclusão ou consumo não rival. A segurança como fim valorizado será sempre segurança para A, B, ou C. (Melo, 2002: p. 66).
[16] Como exemplo tem-se a questão dos negros americanos que mesmo depois de ter conseguido seus direitos políticos muitos ainda incorporavam uma certa inferioridade frente aos brancos; a franquia de certos direitos não garantiu uma política de reconhecimento efetiva da cultura afro-americana.
[17] Nessa questão também existe o problema das placas comerciais que deveriam ser escritas na língua francesa.
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