O corpo e a mulher na história da filosofia: uma leitura a partir de Merleau-Ponty centrada na atual discussão sobre a corporeidade



  1. A presença da mulher na história da filosofia
  2. O desprezo do corpo e a marginalidade da mulher na história da filosofia
  3. A filosofia na perspectiva da corporeidade segundo Maurice Merleau-Ponty
  4. Considerações finais
  5. Referências

A construção dos corpos: violência material e simbólica– ST 49.

Universidade Regional do Noroeste do Estado do RS – UNIJUÍ

Palavras-chave: corpo, mulher, filosofia

O reconhecimento social das mulheres como "seres pensantes" foi e continua sendo um desafio para o equilíbrio nas relações de gênero. Nos currículos escolares e universitários podemos perceber que pouco consta sobre as mulheres que se destacaram enquanto filósofas. Na maioria das vezes, falta uma referência acerca do conhecimento da vida e obras de pensadoras. Pode-se constatar uma reduzida valorização das mulheres na vida acadêmica e sua participação na história da construção do conhecimento. Simone de Beauvoir pronuncia-se sobre isso dizendo que "toda a história das mulheres foi feita por homens"[1]. Neste contexto, pretende-se, aqui, discutir brevemente sobre a presença das mulheres na história da filosofia, com ênfase ao desprezo do corpo e à marginalidade da mulher, bem como, introduzir o tema da corporeidade a partir do filósofo Maurice Merleau-Ponty.

1. A presença da mulher na história da filosofia

Ao realizar um resgate sobre a presença das mulheres na história da filosofia, percebe-se que a figura do feminino "é discutida por meio de um sujeito que não é o que a representa, mas sim outro sujeito: o sujeito masculino. Mesmo assim, este discurso é sempre evitado no campo filosófico"[2].

A mitologia grega destaca fortemente a presença de mulheres através da figura das deusas Artemis, Atena, Afrodite, Deméter, Hera, Perséfone, Pandora e Gaia. Embora a inteligência e o pensamento sejam representados pela deusa Minerva (versão latina da deusa Atena), é interessante destacar, que esta nasce não do corpo de sua mãe, mas da cabeça de seu pai, Zeus. Isto demonstra, desde o princípio, a desvalorização da mulher.

Sendo assim, na história da filosofia, que mulheres alcançaram ao longo da história o reconhecimento oficial de filósofas? Kant, em uma de suas passagens afirma que: "uma mulher que tem a cabeça cheia de grego, como Mme. Dacier, ou que, tal como a marquesa de Châteler, disputa sabiamente sobre temas de mecânica, só lhes falta a barba para expressar melhor a profundidade do espírito que ambicionam"[3]. Isto significa que o fato das mulheres se destacarem na história por sua capacidade intelectual não era fator suficiente para serem reconhecidas. Para isto teriam que ser "homens".

A forma como os filósofos, em geral, tematizam a mulher ao longo dos séculos, demonstra um claro desprezo ao ser feminino. Já Pitágoras, afirmava que "existe um princípio bom que gerou a ordem, a luz e o homem; há um princípio mau que gerou o caos, as trevas e a mulher"[4].

No entanto, apesar da discriminação das mulheres no campo filosófico, é possível perceber que, ao longo da história da filosofia, várias mulheres se destacaram como seres humanos que buscaram saber e conhecimento. No século XX há um destaque especial a algumas filósofas importantes. Dentre elas, encontram-se Hannah Arendt, Simone Weil, Edith Stein, Mari Zambrano, Simone de Beauvoir e Rosa Luxemburgo. Estas mulheres, contrariando a ordem patriarcal de seu tempo, foram filósofas importantes e, sem dúvida, contribuíram decisivamente para a construção do conhecimento.

2. O desprezo do corpo e a marginalidade da mulher na história da filosofia

Embora a mulher tenha sido desprezada na história da filosofia, o tema "mulher" foi abordado por muitos pensadores. Textos de importantes filósofos como Platão, Aristóteles e Kant, retratam a diferenciação entre os sexos. No entanto, estudos sobre as mulheres aparecem em obras menos conhecidas, as quais tratam de temas relacionados à moral, o que, certamente, contribuiu para que a questão da discriminação da mulher passasse despercebida. Além disso, quando o tema da mulher aparece em textos filosóficos, então, ele é cercado de muitos preconceitos, tentando demonstrar uma suposta inferioridade natural da mulher. No mais, é preciso lembrar que as abordagens sobre a mulher encontram-se numa história da filosofia que foi escrita por homens.

A relação entre mulher e homem está, geralmente, fundamentada na relação entre corpo e alma. Neste contexto, surge a discussão sobre a corporeidade. A alma não apenas se distingue do corpo, como também está ligada tradicionalmente à racionalidade, ao universal, ao masculino. O corpo físico encontra-se associado à sensibilidade, ao particular, ou seja, ao feminino. De um lado, encontram-se os homens, com a linguagem filosófica e o conhecimento. De outro lado, estão as mulheres com a linguagem da poesia e da música. No que diz respeito à mulher instruída, Kant ironiza: "ela se serve de seus livros da mesma forma como se serve de seu relógio: ela o usa para que se veja que tem um, pouco se importando que, em geral, ele esteja parado ou que não marque a hora certa"[5].


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