O presente artigo destina-se a apresentar algumas reflexões acerca do Exercito Zapatista de Libertação Nacional. Movimento que estará completando, em janeiro de 2004, dez anos de rebeldia. Pretendemos então, contribuir um pouco com o este debate, trazendo alguns subsídios para entendermos melhor o porque da revolta destes insurgentes e qual o seu relevante papel em uma época em que se preconizava o fim das utopias.
Palavras-chave: movimento social, zapatismo, México, revoluções, fim da história.
Após o declínio do "socialismo real", simbolizado pela queda do muro de Berlim em 1989 e o fim da U.R.S.S., uma corrente filosófica (não tão recente[1]passou a ganhar bastante notoriedade. Ela pregava o triunfo do capitalismo em sua forma neoliberal e um inexorável "fim da história", pois se considerava que o "Homo Economicus" pacificaria o planeta e que o desaparecimento de um adversário significaria o fim da adversidade, e que, os conflitos subsistentes não passariam de vestígios do passado[2]
O século XX termina com a hegemonia mundial do capitalismo. A crise dos países socialistas, e o fim de muitos deles, colocaram a utopia socialista em crise. Muitos gritaram e escreveram que o sonho tinha acabado, que a história tinha acabado. O capital passava a reinar soberano em uma economia mundializada. (ARELLANO; OLIVEIRA, 2002, p. 51).
Desta forma, a mercantilização das relações sociais e dos valores, eliminaria qualquer perspectiva utópica ou revolucionária de mudança social, deixando como legado para o século XXI a desilusão e a perda da esperança[3]Para John Holloway, a herança mais triste que o século XX nos deixa, se reflete na desilusão adotada nas teorias e nos modos de pensar das Ciências Sociais (HOLLOWAY, 2002).
Neste contexto mundial, numa época em que supostamente as Revoluções haviam terminado, irrompe em 1º de Janeiro de 1994, no sudeste mexicano, no estado de Chiapas, o Exército Zapatista de Libertação Nacional (EZLN), composto, em sua grande maioria, por camponeses de diversas etnias indígenas que trazem consigo várias características comuns, não apenas milenares, mas atuais, como a pobreza, a exploração e a marginalização.
Para entendermos os motivos que fizeram com que estes indígenas se levantassem em armas, temos que conhecer um pouco mais do local e da situação em que vivem. Como nos diz Coggiola (apud ARELLANO; OLIVEIRA, 2002, p. 9), "O estado de Chiapas, teatro do levantamento, é o mais pobre de um México já pobre, com uma população cuja maioria não chega a ganhar dois dólares diários" .Chiapas é um estado periférico e praticamente esquecido do restante do país (a não ser pela grande concentração de recursos naturais, como o petróleo e sua biodiversidade), e que apresenta índices de desenvolvimento humano muito inferiores comparados ao restante do México, como nos mostram dados apresentados em um texto do subcomandante Marcos (porta voz do EZLN), de 1992, dois anos antes da rebelião:
A contribuição que o capitalismo cobra de Chiapas é algo sem igual ao longo da história. De toda a energia hidroelétrica produzida no México, 55% vem deste Estado e aqui se produz 20% de toda a energia elétrica do país. Apesar disso, somente um terço das moradias chiapanecas tem luz elétrica. Para onde vão os 12,907 gigawatts que são anualmente produzidas pelas hidroelétricas de Chiapas? (MARCOS, 1992, não paginado).
Essa discrepância entre o que é produzido e o que retorna para o estado, não para por aí, abrangendo todos os itens da seguridade social:
A metade dos chiapanecos não tem água encanada e dois terços deles não tem esgoto. No campo, 90% da população tem rendas extremamente baixas ou nulas. [...] Educação? A pior do país. De cada 100 crianças que freqüentam o ensino primário, 72 não terminam a primeira série. [...] Saúde e alimentação andam de mãos dadas com a pobreza. O 54% da população de Chiapas está desnutrida e, nas regiões de montanha ou na selva, o número dos desnutridos supera o 80%. A alimentação média de um camponês é composta de café, tortilha e feijão. [...] temos cerca de 7 quartos de hotel para cada mil turistas e apenas 0,3 leitos de hospital para cada mil chiapanecos. (MARCOS, 1992, não paginado).
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