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Modelo de entreposto aduaneiro em sistema logístico integrado (página 2)

Reinaldo Toso Júnior

É difícil dissociar a integração e a gestão destas redes globais do emprego da alta tecnologia de telecomunicações, uma vez que é a tecnologia que permite o conceito de resposta em tempo real ás necessidades dos clientes, ou ainda, oferecer meios de lidar com o fortuito (terremotos, furacões, atos políticos, ações de guerra etc.) e estabelecer uma remediação (BOWERSOX e CLOSS et al. ,2001 p. 53; DORNIER, 2000 p.217 e FLEURY et al., 2000, p.284-287). Pode-se definir que os sistemas de informação são um componente fundamental para o gerenciamento da cadeia permitindo ás empresas alcançarem melhores padrões de competitividade (LALONDE, 2000).

A operação de uma rede internacional de plantas por meio de sistemas informatizados que controlam e medem as atividades de compras, manufatura, logística, distribuição, transporte, suas conexões e as decisões tomadas baseadas nos dados apresentados é que fazem a gestão da cadeia de suprimentos global (DORNIER, et al., 2000, p.369-372), enfim é uma abordagem sistêmica e complexa e ainda em discussão (FLEURY et al., 2000, p.42-73).

O maior desafio das empresas fabricantes de produtos que empregam alta tecnologia é relacionado á aquisição de máquinas e matérias-primas no mercado internacional, uma vez que nem todas as necessidades são atendidas pelo mercado nacional, e quando trata-se de produtos de alta tecnologia temos 60%, 70% e até 80% dos componentes importados (SIQUEIRA, 2001 e STAUB, 2001). Para as empresas instaladas no Brasil o cenário exposto representa, em termos práticos, a impossibilidade de usar largamente o financiamento local devido ás taxas praticadas no mercado doméstico serem superiores as taxas internacionais, o que torna onerosa a manutenção de estoques. (FLEURY et al, 2000, p. 182).

Se, por um lado, as empresas buscam a satisfação do cliente reduzindo prazos de entrega a custos competitivos, por outro lado ocorre a necessidade de se trabalhar com estoques cada vez menores (FLEURY et al., 2000, p. 182). Transportando este cenário para o acirrado mercado internacional de tecnologia, onde o ciclo de vida dos produtos é diminuído pelas constantes inovações tecnológicas, o esforço no gerenciamento de estoques e flexibilidade exige das empresas inseridas neste mercado muito competitivo um "estado de excelência". Quando trata-se deste cenário em países em vias de desenvolvimento as dificuldades globais somam-se ás dificuldades domésticas (CASTELLS, 1999, p. 138-139 e 146-148). Não existem receitas prontas para lidar com o inesperado ou contra adversidades particulares de cada região, por mais confiáveis que sejam as análises e prospecções de mercado sempre há o fortuito. Acredita-se, portanto, que o que resta ás empresas, nesta gama de opções, é a flexibilidade para adaptar-se ás mudanças, sobreviver nos tempos de crise e aumentar as margens em tempos de oportunidades (PORTER ,1986).

Esta busca pela flexibilidade, sob o ponto de vista logístico, é a habilidade de programar, de maneira rápida, as compras, a produção e as entregas de acordo com as necessidades do cliente, adequando as operações logísticas aos volumes e prazos exigidos (DORNIER et al., 2000, p. 42 e 698) e paralelamente realizar os arranjos físicos, divisão dos turnos e as medidas de capacidade produtiva em conjunto com as necessidades geradas na cadeia de suprimentos (MOREIRA, 1998 p. 7 e BALLOU, 2001, p. 312-314). Evidentemente, verifica-se a forte ênfase no gerenciamento dos estoques e os objetivos operacionais dos estoques podem ser divididos de modo genérico em (BALLOU, 1993 p.66-67; BOWERSOX e CLOSS, 2001 p. 224-225; MOREIRA, 1998 p.464 e BALLOU, 2001, p.251-253): mudanças previstas no suprimento e na demanda, estoques que protegem contra incertezas e estoques que permitem produção ou compras de lotes econômicos.

No caso de materiais importados, a compra pode ser feita em lotes para conseguir descontos em função da quantidade comprada, assim dentro de certos limites pode ser interessante comprar lotes maiores diluindo os custos de fretes e baixando os custos unitários de compras (BOWERSOX e CLOSS, 2001, p. 230-231). Neste estudo de caso o benefício da compra em lotes econômicos ocorre por meio de negociações globais e busca-se trazer cargas consolidadas em um único embarque do fornecedor. Entretanto, se por um lado os custos de transporte são minimizados, há uma característica prejudicial: mesmo que sejam negociados prazos longos de pagamentos com os fornecedores, os impostos de importação (II) e sobre produtos industrializados (IPI) são proporcionais ao montante importado e seu pagamento ocorre no curto prazo, são incidentes no ato da importação (VAZQUEZ, 2001). Existem ainda outros fatores, quedas de demanda ou cancelamento de pedidos dos clientes e o risco cambial, podendo transformar a estratégia de estocagem em um risco com custos e perdas inesperados.

A alternativa para minimizar o impacto no fluxo de caixa da empresa é a compra em lotes menores com maior freqüência, evitando-se a imobilização de grandes capitais de uma só vez. O ponto problemático é que esta alternativa encarece o transporte, aumentando o número de embarques, ocorrendo, ainda, sobre o mesmo: frete, seguro e taxas padrões mínimas (despachante aduaneiro, taxas, armazenagem mínima etc.).

A natureza das operações da empresa de manufatura sob contrato, onde ocorreu este estudo de caso, é a fabricação sob encomenda (make to order) que se impõe ao conceito de fabricar para estocar (make to stock). Deste modo, a manutenção de estoques seria apenas para cobrir as ordens de produção em aberto e um pequeno excedente para cobrir incertezas, em mercados globais as incertezas são muitas e estes estoques de segurança tornariam proibitivas as operações fabris (DORNIER, 2000, p.383). Para este modelo de operação o método mais usual de cálculo de demanda é o Planejamento das Necessidades (BALLOU, 2001, p. 253, 317, 322 e 323). De fato as operações de uma empresa de manufatura sob contrato são "parte" das operações e ações de marketing do cliente, portanto dependem do cliente, entretanto, sempre há uma previsão ou período firme que cobre no mínimo o ciclo produtivo do item encomendado, por isso ocorre a predominância do conceito de demanda dependente e a aplicabilidade do Planejamento das Necessidades. (BALLOU, 2001, p. 224; BOWERSOX e CLOSS, 2001, p. 410).

Como o planejamento das necessidades é mais aplicável no conceito de fabricar para estocar (BALLOU, 2001, p. 317) em oposição ao conceito de fabricar sob pedido das empresas de manufatura sob contrato, tem-se que o foco do Planejamento das Necessidades nestas empresas globais fica sob a incerteza dos tempos de reabastecimento (BALLOU, 2001, p. 322) e surge deste ponto a relevância sobre o controle dos tempos de cada etapa do processo ao longo da cadeia de suprimentos. Dentro deste conceito de Planejamento de Necessidades, onde a variabilidade maior da demanda está nas mãos dos prazos de cada etapa, é interessante contrabalancear ressuprimento com consolidação de cargas (FLEURY et al., 2000 p.191).

Apesar dos estoques de segurança compensarem, em parte, as incertezas por questões de custo financeiro, os mesmos não podem representar todo um lote de pedidos do cliente, principalmente, para produtos eletrônicos que possuem elevado valor agregado e uma rápida obsolescência. Portanto, há sempre um risco envolvendo importações de componentes com alto valor agregado (BOWERSOX e CLOSS, 2001, p. 229). Para minimizar estes riscos empregam-se várias técnicas, deste a substituição de importações (no caso de produtos tecnológicos esta substituição ocorre em longo prazo ou pode até não ocorrer por questões econômicas) até manter vários embarques em andamento (que pode agregar maiores custos de frete, seguro, armazenagem etc.). BALLOU, 2001.

Se por um lado há a possibilidade de falhas por falta de materiais, também pode sofrer com o excesso de inventário. Cancelamentos de pedidos podem ocorrer a qualquer momento: atraso de entregas, problemas internos no cliente, variações de mercado ou conjuntura. Muitos fornecedores não aceitam cancelamentos dentro de uma determinada "janela", ou seja, visam proteger estoques já adquiridos, materiais em processamento ou acabados no estoque (FLEURY et al., 2000, p.181-183). Nos dias de hoje o que são exigidos prazos menores, lotes menores, flexibilidade e pontualidade, porém 100% de eficácia nas ações empreendidas nestes esforços raramente são atingidos, esta margem de erro representa os estoques em excesso. Segundo Fleury, o mundo real é aquele com incerteza. (FLEURY et al. 2000 p. 180)

Este delineamento serve de ponto de partida para explicar que a programação da produção (ou sequenciamento) baseia-se no que foi planejado e que se transforma na medida que as requisições são confirmadas, ou não, nos prazos e quantidades na negociação dos pedidos, principalmente para itens fora do prazo que os fornecedores especificam, além dos imprevistos ou mudanças da carteira do cliente de última hora. Este descompasso entre real e planejado deve ser minimizado para: empreender

O melhor método disponível para minimizar o tempo perdido, criar meios para melhor liberação de pedidos aos clientes, honrar as entregas, manter os processos e os estoques consistentes com os objetivos da empresa e com os dois itens anteriores (BOWERSOX e CLOSS, 2001, p. 229 e FLEURY et al., 2000, p. 183-184).

4-O MODELO ATUAL

Como ferramenta integradora de seus negócios, cujo objetivo é a integração das várias áreas deuma fábrica, a empresa onde foi realizado o trabalho adotou o sistema SAP R3. é sobre este ERP (Enterprise Resources Planning -ERP), que todas as operações da empresa ocorrem no Brasil e no mundo. Os registros de dados, operações, listas de peças, contabilidade, cálculo das necessidades (MRP), o gerenciamento da cadeia de suprimentos (SCM) etc. estão todas integradas sobre esta plataforma. As vantagens que levaram essa empresa a operar com o SAP é que os diversos módulos existentes neste sistema são aplicáveis em qualquer unidade, comunicáveis entre si constituem uma plataforma bastante confiável e acessível em qualquer lugar; sendo possível trabalhar com índices de medida de desempenho, controles e indicadores, calculados de um mesmo modo em múltiplas plantas.

Nas operações logísticas da empresa, na qual foi realizado o estudo de caso, a enorme complexidade das cadeias de suprimentos aliadas ás estratégias de estoques com a distribuição escalonada, levou a empresa a explorar o conceito de consolidação (FLEURY et al., 2000, p.159; de BOWERSOX e CLOSS, 2001, p. 327 e 406). A remessa de grandes lotes por longas distâncias é muito mais barato do que o envio de cargas fracionadas (FLEURY et al., 2000, p. 155), permitindo o melhor aproveitamento de espaço ao agrupar várias cargas fracionadas.

Com esse tipo de arranjo cada elemento da cadeia pode conseguir custos totais de embarques menores do que custos de embarques individuais (BOWERSOX e CLOSS, 2001, p. 327). O desafio da consolidação é a flexibilidade, o eterno equilíbrio entre custos e serviço ágil (FLEURY, 2000, p. 153). Ao ponderar-se sobre este equilíbrio entende-se a aplicação dos múltiplos tipos de nós (métodos de distribuição e armazenagem) que se empregam na logística internacional. As operações de consolidação no exterior ocorrem em Miami, estado da Flórida -EUA e é fruto da negociação entre a empresa e o agente prestador de serviços escolhido. O desenho deste modelo pode funcionar a partir de qualquer ponto, dependendo das condições de infra-estrutura e de negociações comerciais vantajosas entre os parceiros que viabilizem a operação.

Nos dias atuais o esforço do Gerenciamento da Cadeia de Suprimentos é a integração externa, além dos limites dominados pela empresa (FLEURY et al., 2000 p. 37). A integração externa permite a redução de custos, customiza serviços e se fundamenta em respostas rápidas. Entre a década de 80 e o início dos anos 90 consolidou-se o conceito de resposta rápida ao consumidor (ECR -efficient consumer response) cujo objetivo é de racionalizar a cadeia de distribuição, a fim de aumentar o valor aos clientes (DORNIER et al., 2000 p. 217). Nas empresas de alta tecnologia o elevado valor agregado de seus produtos e a "volatilidade" das demandas faz com que boa parte da estruturação de seus fluxos logísticos seja sobre embarques aéreos, entretanto pode ser adotado o modal marítimo ou combinado, bastando atualizar os tempos de trânsito e agregar algumas operações típicas de outros modais (BALLOU, 2001, p. 126). A decisão pelo modal ou a combinação de vários modais vai além de prazos e valores de frete, dependem das condições geográficas, infraestrutura, legislação, aspectos mercadológicos e do tipo de carga (DORNIER et al., 2000, p. 97). No modelo estudado toda a operação foi desenhada sobre o modal aéreo. A decisão pelo modal aéreo justifica-se pelo elevado valor agregado das matérias-primas (componentes eletrônicos primários), por serem leves e pela necessidade de resposta rápida ao cliente.

A resposta eficiente ao consumidor não se limita a reduzir estoques ou aumentar o giro dos mesmos, mas permite administrar a estrutura logística e diminuir seu impacto nestes sistemas (BOWERSOX e CLOSS, 2001, p.558). Este conceito ganha importância dentro do gerenciamento da cadeia de suprimentos pelo fato da resposta rápida e segura ser fundamental dentro dos mercados dinâmicos e incertos. Repostas rápidas agregam vantagens competitivas e valor ao cliente e a excelência em logística busca desenvolver soluções baseadas no tempo (FLEURY et al., 2000, p. 37).

O fluxo logístico atual baseia-se no estabelecimento de um ponto de consolidação fora do território brasileiro para a recepção das mercadorias (Cross-docking -FLEURY et al., 2000 p. 157), com a ocorrência de embarques semanais visando á redução dos custos de fretes e das taxas de serviços por operação (BALLOU, 2201, p. 204 e BOWERSOX e CLOSS, 2001, p. 239). A ocorrência de embarques regulares permite a reserva antecipada de espaço nas aeronaves e, por conseqüência, tarifas de frete menores (BALLOU, 1993 p. 139-144). As taxas de serviços por operação são taxas únicas; exemplos: taxa de emissão de conhecimento de aéreo, taxa de abertura do processo na Receita Federal, taxa de despacho aduaneiro (despachante) etc. (VAZQUEZ, 2001).

É necessário verificar se o fluxo atual ajusta-se ás necessidades da empresa e como é possível ajustar o fluxo atual em caso de resposta negativa. Quando é efetuada a medição do trânsito internacional atual de suprimentos, verifica-se que o tempo médio para recebimento de um embarque, tão logo o fornecedor assinale que o material está pronto, é de quinze dias e que a execução dos cálculos das necessidades (o MRP) é semanal, ou seja, tem-se dois MRP"s dentro de um ciclo de trânsito. Há um descompasso entre as reprogramações de fábrica e as reprogramações logísticas, a demanda pode aumentar ou diminuir com mercadorias já lançadas em trânsito. (expectativa, integração e "gap"; FLEURY et al., 2000, p. 76-80).

O agravante deste processo é que se um item de uma carga consolidada tornar-se crítico e for solicitado com urgência, não podendo aguardar o vôo consolidado (pré-programado), todos os materiais pertencentes áquele lote terão de vir com ele, não podendo ser desmembrados um dos outros, seja por estarem no mesmo conhecimento de carga/embarque (VAZQUEZ, 2001) ou por limitações de re-embalar componentes eletrônicos sensíveis a descarga eletrostática (Norma ANSI/ESD S6.1 -1999, ESD Association, 11/12/2001).

Dentro da mesma situação estão as cargas atracadas em processo de desembaraço aduaneiro (processo de liberação da importação), se um item tornar-se crítico não há como efetuar o desembaraço deste item isoladamente: todos os itens serão liberados juntos, inclusive se um deles tiver problemas (quantidade errada, classificação tarifária errada, part number errado etc.) os demais deverão aguardar a retificação da Declaração da Importação (DI) antes de serem liberados (VAZQUEZ, 2001).

Além do aspecto logístico e do fluxo do processo também há o agravante financeiro. Nem sempre a necessidade dos componentes é imediata, porém é necessário mantê-los ao alcance da fábrica, uma vez que, serão usados em duas ou três semanas, podendo ocorrer problemas que antecipem esse uso. Como foi visto, anteriormente, há uma janela de duas semanas e quando fala-se de importação duas ou três semanas é um tempo demasiado curto (FLEURY et al., 2000, p. 189-190 e BALLOU, 1993, p. 211-212). O impacto financeiro que ocorre neste ponto é que, muitas vezes, são desembaraçadas cargas de U$ 15 milhões, sendo que apenas ¼ dessa será usada na primeira semana posterior ao desembaraço e o recolhimento dos impostos de importação (II) e sobre produtos Industrializados (IPI) é no ato da liberação e giram em média em torno de 15% juntos (média histórica da fábrica para os anos de 2000 e 2001), exercendo uma grande pressão sobre o fluxo de caixa da empresa, principalmente no Brasil, em que os juros bancários são muito altos e a captação de dólares nos bancos internacionais está atrelada ao risco cambial (DORNIER et al., 2000, p. 536-542 e VAZQUEZ, 2000, p.252, 265).

Na prática isto funciona como um depósito á vista sobre o que é importado. Se forem incluídas estas duas semanas de trânsito total ao ciclo produtivo médio de quatro semanas teremos seis semanas de material em estoque (matéria-prima+semi-acabado+acabado). Deve-se ressalvar aqui que a mercadoria em trânsito, que não entrou na fábrica, não é vista oficialmente como estoque da fábrica, mas a mesma é incluída nos cálculos da empresa (BOWERSOX e CLOSS, 2001, p. 229 e BALLOU, 2001, p. 279). A este capital imobilizado também se somam os estoques parados na fábrica, sejam eles estoques de segurança, erros de planejamento ou cancelamento de pedidos (BOWERSOX e CLOSS, 2001, p. 218).

Se por um lado existe a inflexibilidade para uma personalização das necessidades produtivas (que são as do cliente), do outro há um fluxo de caixa sob a pressão de elevadas somas a cada embarque e não há os benefícios das operações globais caso haja interesse em renegociar estes estoques com fornecedores ou outras unidades ao redor mundo, uma vez que os estoques nacionalizados já estão carregados com os impostos (DORNIER et al., 2000, p. 534-536). O mesmo problema ocorre nos componentes com vícios de qualidade que já estão nacionalizados e com impostos pagos. Mesmo sendo possível negociar a devolução do item importado defeituoso, sua reposição sem impostos demora tanto que na prática leva a desistência da reposição.

5-MODELO PROPOSTO DE ENTREPOSTAMENTO ADUANEIRO

Ao estudar as possibilidades previstas na Legislação Brasileira encontra-se um modelo que adeqüa-se ás necessidades de flexibilidade, custos, prazos e fluxo de caixa. é o entrepostamento aduaneiro, cuja operação é possível por meio da Instrução Normativa SRF nº 79, de 11 de Outubro de 2001 (IN 79). Evidentemente, a IN 79 regulamenta a operação, mas não faz ou define o modelo logístico operacional necessário a cada planta ou a viabilidade operacional de se trabalhar com este regime, ou não. Cabe a cada empresa analisar suas necessidades e preparar a infra-estrutura necessária para habilitar-se neste regime. O modelo proposto foi obtido atendendo a Legislação Brasileira e baseou-se, principalmente, no exemplo de BALLOU (2001, p. 204), seguido de em BOWERSOX e CLOSS (2001 p. 327) e FLEURY et al. (2000 p. 197, 199, 204-206).

Acredita-se que, neste estudo de caso, um centro de consolidação logístico é a melhor maneira de administrarmos a complexidade das necessidades da fábrica e dos clientes (FLEURY et al. 2000 p. 204). Fleury também afirma que as características do produto, a demanda e a necessidade de flexibilidade podem levar á descentralização de estoques. Estes centros são, na verdade, armazéns onde as cargas são recebidas, armazenadas e depois reconfiguradas e reparceladas para expedição atendendo ás múltiplas necessidades dos clientes (BOWERSOX e CLOSS, 2001).

No mercado nacional também são empregados os mesmos conceitos e existe a oferta dos armazéns e provedores de solução logística (FLEURY et al., 2000 p. 133-136), mas quando se fala de importações não basta apenas trazer a carga e realizar a operação de desconsolidação, troca, renegociação, retorno e redistribuição antes do processo de importação e recolher impostos ou observar o que define a legislação (VAZQUEZ, 2001 e IN 79). Os vários benefícios que o Governo oferece para incentivar as exportações e facilitar as importações de matérias-primas ligadas aos setores estratégicos são, na maioria das vezes, fiscais do tipo isenção, suspensão ou recuperação de impostos (Drawback, Zona Franca, RECOF etc.) (BOWERSOX e CLOSS, 2001 p. 333 e VAZQUEZ, 2001 p. 224, 227, 229 e 233).

O entrepostamento aduaneiro permite embarcar uma carga consolidada, que é transferida para um armazém alfandegado público e lá permanece sem nacionalização por até um ano, sendo prorrogável por até dois anos em casos especiais. Estes depósitos alfandegados, licenciados pelo Governo, permitem o armazenamento de mercadorias antes dos pagamentos dos impostos alfandegários (BOWERSOX e CLOSS, 2001p. 333). A grande vantagem nessa operação é que os custos incidentes durante este processo são frete, manuseio, seguro e armazenagem, colocando a mercadoria nos mesmos patamares do mercado internacional, pois nesta condição não há o recolhimento dos impostos uma vez que a carga permanece em território nacional, mas sob tutela alfandegária como se fosse uma carga em trânsito.

O recolhimento do II e IPI ocorre somente no momento de uso (nacionalização) e a carga pode ser desembaraça em lotes, caixas ou até em uma única unidade (IN 79). Neste regime as caixas podem ser abertas, o material inspecionado, reembalados e até sofrerem pequenas transformações em regime alfandegado. O que se exige para tal operação é que o local alfandegado possua um sistema informatizado para controlar os saldos desta operação. é certo que o mesmo problema de reembalagem e manuseio ressaltado, anteriormente, pode ocorrer, mas a proximidade com a equipe da fábrica e a adeqüação do local permite solucioná-lo. A devolução ou "reexportação" das mercadorias neste regime fica também isenta de impostos (apenas frete, seguro e armazenagem) e não caracterizam uma exportação propriamente dita, uma vez que, não foram nacionalizadas (VAZQUEZ, 2001).

Assim, caso o fornecedor embarque algo por engano ou errado basta ao importador (ou por meio de seu despachante aduaneiro) elaborar a Declaração de Admissão (DA) no entreposto de maneira correta (seguindo os procedimentos aduaneiros relativos á documentação) e depois entrar em contato com o fornecedor e negociar a devolução, cujos custos são aceitáveis pelo fornecedor (reconhecidos internacionalmente) ao contrário dos morosos e longos processos de devolução em garantia de produto já nacionalizado. Com a expedição da mercadoria o saldo da DA é ajustado e refletirá apenas o que houver no recinto alfandegado (VAZQUEZ, 2001 e IN 79).

O EADI (Estação Aduaneira do Interior) é o armazém alfandegado público habilitado para este regime de operação, constitui o fiel depositário da carga e a mesma continua propriedade do fornecedor que poderá reivindicá-la por falta de pagamento caso o importador não cumpra os termos de pagamento, o que é uma situação bastante confortável, pois arcará com frete, seguro e armazenagem em vez de perder a carga (BALLOU, 2001, p.211 e IN 79).

Um EADI também é capaz de recrutar mão-de-obra qualificada para operações especiais de manuseio e inspeção da qualidade, conforme o perfil que o cliente determinar, para trabalharem, de maneira exclusiva, nesta área dedicada do EADI. Esta vantagem agregada permite a terceirização total da operação de armazenagem (BOWERSOX e CLOSS, 2001 p. 337-338). O EADI (Depósito Público -BOWERSOX e CLOSS, 2001 p. 337-338) assume um papel importante, pois é capaz de desempenhar todas as funções de um provedor de solução logística e incorporar a autorização para operar como um entreposto alfandegado para o desembaraço e armazenagem de cargas. Dentro do EADI ficam também os fiscais da Receita Federal (Agentes de Fiscalização do Tesouro Nacional) dedicados para aquele EADI.

O fluxo de caixa é resolvido com a possibilidade de desembaraços parciais permitindo a empresa desembolsar os impostos bem mais perto do momento da produção (e como conseqüência do faturamento) reduzindo o ciclo financeiro. Na negociação com os fornecedores, para obter prazos de pagamentos maiores a partir da data do embarque, tem-se como grande vantagem o fato de que a mercadoria fica consignada podendo ser enviada a qualquer parte do mundo, caso não seja consumida no prazo estabelecido.

Uma vez identificado o processo que atende ás necessidades da empresa a segunda fase é a adequação dos processos ao regime de entrepostamento. Para esta adequação conta-se com o forte apoio do setor de tecnologia da informação no desenvolvimento de módulos no sistema ERP da empresa para comportar esta operação, ou seja: todo processo será rastreável pelo sistema e sem a dependência de terceiros. A terceira fase é a cooperação de fornecedores e a integração/treinamento de todos os envolvidos no processo para operacionalizar o sistema. Na verdade, esta fase inicia-se na busca de uma proposta nas diversas reuniões, consultas e divulgação dos resultados, cabendo somente um treinamento operacional, uma vez que os conceitos foram construídos junto aos colaboradores durante o processo (BOWERSOX e CLOSS, 2001, p. 342-343). Na Figura 1 são apresentados, de maneira resumida, os três modelos distintos nos quais é possível verificar a aplicação do EADI tanto como zona secundária para simples desembaraço, como no conceito avançado de entrepostamento aduaneiro.

O Modelo 1 é o modelo básico, sem entrepostagem, toda carga embarcada para o Brasil é desembaraçada na sua totalidade no próprio aeroporto e após a aprovação da DI (Declaração de Importação) e da autorização de saída a carga é entregue na fábrica. O recolhimento dos impostos é obrigatório para a liberação da DI.

No Modelo 2 a carga é removida para uma zona secundária, a partir da qual o processo de desembaraço segue seu ritmo normal. A vantagem é que as taxas da armazenagem no EADI são da ordem de 0,18%-0.30% do valor CIF (cost, insurance and freight) enquanto no aeroporto atingem até 3% do valor.(Portaria nº 219/GC-5, 27/03/2001. Comando da Aeronáutica, DAC).

Figura -1 Modelos do conceito de entreposto.

Fonte: Adaptação de modelos operacionais atuais na empresa; DORNIER et al., 2000 p.437; BALLOU, 2001, p. 204; BOWERSOX e CLOSS, 2001 p. 327 e FLEURY et al., 2000 p. 197, 199 204-206.

No Modelo 3, proposto, emprega-se o entrepostamento aduaneiro. A carga, com instruções especiais, é removida para um EADI e em vez de se elaborar a DI efetua-se a elaboração de uma DA (declaração de Admissão), ficando entrepostada por até um ano (renovável por mais um em casos especiais). A partir da DA pode-se efetuar o desembaraço (DI) de frações da carga com total liberdade na configuração das embalagens.

6-RESULTADOS OBTIDOS E CONCLUSÕES

O desenho do modelo de Entrepostamento Aduaneiro até aqui exposto foi também avaliado sob o aspecto operacional. Baseado neste desenho foi possível o levantamento das especificações técnicas e efetuar as cotações e cálculos para a quantificação dos retornos. Muitos aspectos positivos oriundos pela maior flexibilidade poderiam mostrar-se intangíveis em princípio, mas a montagem da viabilidade operacional permitiu quantificar a grande maioria deles. Não foram considerados os detalhes financeiros relativos aos ganhos obtidos com a diminuição da imobilização de grandes capitais tanto para pagamento de fornecedores ou impostos sobre os estoques das mercadorias importadas, como para os ganhos oriundos na diminuição da pressão sobre o fluxo de caixa. Também não foram detalhados alguns procedimentos aduaneiros, uma vez que os processos são operacionais e normatizados pela legislação vigente. Apenas as etapas chaves ou pontos principais relevantes á logística foram tratados.

Pode-se resumir que os estoques médios admitidos na empresa cairão para uma semana e o restante permanece no EADI sem a questão da tributação ocorrida na nacionalização dos modelos praticados e com a possibilidade de devolução de excedentes. Outro fator relevante é que a mercadoria consignada no EADI permanece propriedade do fornecedor e este estoque é negociável com o próprio, principalmente, pelo fato de que a maior parte das empresas fabricantes de componentes eletrônicos possuem atuação global em muitos mercados onde a concorrência é acirrada.

Quadro 1 -Demonstrativo da redução dos estoques médios.

Detalhe da estratégia operacional da imobilização dos estoques para produção

Conclui-se que o modelo logístico de entrepostamento aduaneiro proposto neste estudo de caso é uma solução viável conforme foi demonstrado, vale-se de respaldo teórico sólido e consegue atender de maneira satisfatória ao que foi proposto, oferecendo vantagem competitiva por meio da flexibilidade e ganhos operacionais. Foi possível pela análise de vários autores construir um modelo bem fundamentado em conceitos logísticos avançados e que atende aos desafios de se operar em um mercado globalizado.

Sob o conceito da gestão da cadeia de suprimentos observa-se que a flexibilidade oferecida pelo entrepostamento aduaneiro pode ser combinada com outras operações, pelo fato de ajustar-se ás particularidades de cada operação e de seu gerenciamento e controle apoiarem-se fortemente em sistemas de informação atuais. Recomenda-se este modelo em casos onde é necessária flexibilidade nas operações de importação com ganhos operacionais expressivos sobre imobilização de estoques, com enfoque especial nos mercados cuja demanda seja instável, com risco cambial atrelado e os valores movimentados ao longo da cadeia expressivos. O modelo logístico também adapta-se ao modal marítimo ou ás operações multi-modal, o que torna o modelo e a redução de fretes algo mais atraente ainda.

Espera-se que a utilização de entrepostamento aduaneiro difunda-se no mercado nacional e que desperte a atenção para outros estudos que combinem as vantagens deste modelo com outros regimes aduaneiros por meio da rede logística do comércio exterior que o País pratica, entre eles pode-se citar RECOF, Depósito Alfandegado Certificado -DAC e o Entreposto Industrial.

7-BIBLIOGRAFIA

BALLOU, Robert H. Gerenciamento da Cadeia de Suprimentos; Planejamento, Organização e Logística Empresarial. São Paulo, Bookman, 2001.

BOWERSOX, Donald J. e CLOSS, David J. Logística Empresarial; O processo de Integração da Cadeia de Suprimento. 1ª edição. São Paulo, Atlas, 2001.

BRASIL, Secretaria da Receita Federal. Instrução Normativa SRF nº 79, de 11 de Outubro de 2001, DOU de 15.10.2001. "IN 79".

_______, Portaria nº 219/GC-5, 27/03/2001. Comando da Aeronáutica, DAC).

CASTELLS, Manuel. A Sociedade em Rede; a Era da Informação: Economia, Sociedade e Cultura. Vol. 1. 1ª edição. São Paulo, Paz e Terra, 1999.

DORNIER, Philippe-Pierre; ERNST, Ricardo; FENDER, Michel e KOUVELIS, Panos. Logística e Operações Globais Textos e Casos. 1ª edição. São Paulo, Atlas, 2000.

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Artigo apresentado no SIMPOI 2002 na FGV - EAESP, São Paulo, Outubro de 2002.

 

 

 

Autores:

José Antonio Arantes Salles
Reinaldo Toso Júnior
tosojr-prof[arroba]yahoo.com.br



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