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Liquidez e certeza na compensação de tributos (página 2)

Bruno Mattos e Silva

Que existe um direito objetivo e "em tese" á compensação não se discute: a lei fala por si Contudo, o exercício desse direito somente se incorpora ao patrimônio jurídico do contribuinte após a certeza da existência jurídica dos aspectos levantados no parágrafo anterior, nos termos dos dispositivos legais acima transcritos.

Há de existir, assim, um provimento que apure tudo isso. De se lembrar que o próprio lançamento é um procedimento, que objetiva "verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente, determinar a matéria tributável, calcular o montante do tributo devido, identificar o sujeito passivo" (art. 142 do CTN).

De se lembrar que esse provimento deve ser tecnicamente útil, para apurar numericamente um crédito, compensando-o com outro. Não exige a lei, vamos insistir, a existência de um "alvará judicial" para a compensação: exige a liquidez e certeza dos créditos.

Pergunta-se: se o próprio fisco precisa instaurar um procedimento administrativo para que se reconheça (frisemos: para que se reconheça) a existência do fato gerador, por que poderia o particular ter um "crédito" em face do fisco apenas em razão de hipotéticos pagamentos?

Lembramos que o fato gerador, de per si, dá origem á obrigação principal do pagamento do tributo (art. 113, § 1º, do CTN). Com a ocorrência do procedimento de lançamento, por meio do qual se reconhece a existência de um fato gerador de uma obrigação, o crédito tributário é constituído e se tornará exigível pelo fisco.

Com o crédito do particular em face do fisco ocorre o mesmo. Para essa apuração, há de haver um procedimento, tal como ocorre na hipótese do art. 142 do CTN. Como se vê, o art. 170 é bastante coerente!

Pode a Administração Pública reconhecer a efetiva existência de pagamento indevido e autorizar a compensação. Vale dizer que, nesta hipótese, a Administração estará reconhecendo um fato (pagamento de tributo) e um direito objetivo (o tributo não era devido) e, por via de conseqüência, estará reconhecendo que esse contribuinte específico tem direito (subjetivo) á compensação do que foi pago indevidamente. Para que seja efetivada a compensação, há de se verificar qual o montante que foi pago a maior e qual os índices de correção aplicáveis. Há de se proceder á liquidação do crédito.

Tudo isso é um procedimento. Aliás, a Administração Pública somente pode agir assim.

Na hipótese da Administração Pública recusar-se á prática dos atos mencionados, surge ao contribuinte o direito de obter do Poder Judiciário um provimento de mérito (art. 3º do CPC), de modo a suprir todos os atos que a Administração Pública não praticou.

3."Alvará judicial" e compensação de tributos.

Na prática, porém, o que vemos não é isso. Muito pelo contrário, o que normalmente ocorre é tecnicamente um "festival de inutilidades" e, o que é pior, com flagrante violação do art. 170 do CTN.

Infelizmente, o que ocorre é isso mesmo: tem sido comum a pretensão de obtenção de provimento judicial para que possa ser o art. 170 do CTN violado.

Com efeito, por meio de mandado de segurança, de ação ordinária, ou de ação cautelar, via de regra os contribuintes afirmam que têm direito a um crédito, ás vezes nem mesmo especificam quanto ele seria, juntam vários recibos e, afirmando que têm direito á compensação, pedem que o juiz determine ao fisco que não os autue por esta razão. Pedem liminar ou tutela antecipada.

Muitas vezes eles obtêm esse provimento, seja ab ovo, seja ao final. Queiram ou não, a verdade é que esse provimento constitui uma autorização para compensar, ou seja, um "alvará", de modo a proteger de autuações o contribuinte que, ao arrepio do art. 170 do CTN, compensará créditos que nem a Administração e nem o próprio Judiciário afirmaram a sua certeza (para o caso concreto) e nem estabeleceram o seu montante (liquidez).

O agente fiscal, posteriormente, dirige-se á empresa e verifica que o alegado crédito inexiste, pois pagamento não houve. Ou verifica-se que o crédito não era suficiente para compensar com todos os débitos pretendidos, ou seja, o contribuinte deixou de pagar algumas competências, dada a efetiva inexistência de crédito. E, assim, o agente fiscal levanta o débito e emite a NFLD.

À toda evidência, essa conduta do fiscal foi totalmente lícita e não desrespeitou a decisão judicial. Afinal de contas, se o provimento jurisdicional obtido não declarou a efetiva existência do crédito, seu montante e a forma em que a compensação poderia ser feita, há de se reconhecer sua completa inutilidade, posto que apenas afirmou a existência de um direito "em tese"!

Bem se vê, assim, como tende a ser processualmente (frisemos: processualmente, tecnicamente) inútil qualquer provimento judicial que se limite a afirmar um abstrato direito á compensação, sem dizer qual é o montante atualizado do crédito a compensar, que pode até inexistir.

Por que, então, buscam os contribuintes essa "autorização judicial" para compensação? A razão é simples: apenas como forma de se obter uma "proteção judicial" contra a fiscalização, de modo a poderem violar o art. 170 do CTN, sem sofrer qualquer ônus por isso.

Toda essa matéria fica mais clara quando temos em mente que a compensação implica em extinção do crédito tributário (art. 156, II, do CTN). Vale dizer, nos termos do que dispõe o CTN, uma vez efetivada a compensação, estará extinto o crédito tributário. Como é possível, assim, extinguir um crédito líquido e certo com um crédito que não é nem líquido nem certo? Como se pode bem observar, o CTN é bastante coerente, estando as exigências do art. 170 em perfeita sintonia com o art. 156, II.

Como se vê, ou o juiz, reconhecendo a liquidez e certeza do crédito do contribuinte (art. 170), o que bastará para que ele passe a ter o direito á compensação e á extinção do crédito tributário (art. 156, II), ou, se ilíquidos forem os créditos do contribuinte, o juiz somente poderia "afirmar" a existência do direito "em tese" á compensação, o que é tecnicamente inócuo. Se o juiz, ao revés, "autorizar" uma "compensação" de créditos ilíquidos, estará sendo o art. 170 do CTN frontalmente violado, o que não pode ser admitido.

3.1."Alvará judicial" liminarmente concedido.

Se a "concessão" do direito á compensação, ao final do processo, para as hipóteses em que não foram atendidos os requisitos do art. 170 do CTN já é um absurdo, imagine-se essa concessão sem contraditório...

Inicialmente, é bom lembrar que os juízes tecnicamente mais preparados já não estão "concedendo" o "direito" á compensação liminarmente ou como provimento antecipado:

"I - Agrava [nome da empresa] do r. despacho monocrático que, em sede de Ação Ordinária, objetivando a compensação dos valores recolhidos indevidamente a título de Contribuição Social ao Salário Educação no período de março de 1989 a março de 1997, com débitos vincendos da mesma contribuição, na forma do disposto no art. 170 do CTN, combinado com o art. 66 da Lei nº 8.383/91, com a redação que lhe deu o art. 58 da Lei nº 9.069/95, indeferiu o pleito de tutela antecipada. Pede, de plano, o provimento denegado em primeiro grau.
II - Despicienda a requisição de informações ao MM. Juiz "a quo" ante a clareza da decisão arrostada.
III - Nesta fase de cognição sumária, do exame que faço do despacho agravado, não vislumbro eventual ilegalidade e ou abuso de poder a contaminá-lo, tampouco se evidenciando situação de irreversibilidade de prejuízo á parte.
(...)
Ademais, dispõe a Súmula nº 45 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região: "Descabe a concessão de liminar ou de antecipação de tutela para a compensação de tributos".
IV - Isto posto, mantendo "si e in quantum" a decisão singular, determino o processamento do presente independentemente da providência requerida. (...)"

(TRF-3ª Região, 6ª Turma, Agravo nº 98.03.052527-1, Relatora Juíza SALETTE NASCIMENTO, DJ, seção 2, 07/07/98, pp.177-178)

"(...) 2- Descabe á parte pretender obter a compensação de tributos, através do instituto da antecipação de tutela, uma vez que, em tal caso não se justifica o receio de dano irreparável ou de difícil reparação (STJ, RESP nº 97.153.611/PR, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, DJ 25.02.98, pág. 33; RESP nº 121.133/PR, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, DJ 29.09.97, pág. 48131). Além do mais, inexistindo liquidez e certeza no crédito, não há que se falar em compensação "initio litis" (STJ, RESP nº 96.113.368/PR, Rel. Min. José Delgado, DJ 19.05.97, pág. 20593). conseqüentemente, encontrando-se a autora, ora agravante, ao desabrigo dessas considerações, indefiro o pleiteado efeito suspensivo com eficácia ativa. (...)"
(TRF-3ª Região, 4ª Turma, Agravo nº 98.03.048972-0, Relator Juiz SOUZA PIRES, DJ, seção 2, 07/07/98, p. 157)

"PROCESSO CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. DECISÃO QUE INDEFERIU TUTELA ANTECIPADA PARA COMPENSAÇÃO DE CONTRIBUIÇÕES AO SALÁRIO EDUCAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. MANUTENÇÃO DO "DECISUM" AGRAVADO.
I. A Natureza satisfativa da tutela antecipada afasta sua admissão, pois faticamente, concretiza o direito pretendido, oferecendo á agravante o próprio objeto do pedido jurisdicional, donde o óbice da irreversibilidade.
II. Decisões que concedem liminares em casos tais, ás vezes podem ter o efeito de um bumerangue, voltando-se contra a própria parte que as obteve provisoriamente. Sem uma análise minuciosa e bem depurada do direito alegado e de extensão da violação afirmada, bem como da possibilidade de se ter em conta o que compensar-se com o quê, não é de boa natureza antecipar-se a tutela."
(TRF - 3ª Região, Agravo de Instrumento nº 51.602, Registro nº 97.03.032375-8, Relator Juiz Baptista Pereira, 3ª Turma, v.u., publicado no DJ em 29/07/98, Seção 2, pp. 252/253)

"Processual - Compensação Tributária - Antecipação de Tutela - Impossibilidade. Não é lícito ao Poder Judiciário, em antecipação de tutela, efetivar compensação tributária, negando ao Fisco a possibilidade de rever o lançamento."
(STJ, Resp nº 113.647/PR, 1ª Turma, unânime; Relator Ministro Humberto Gomes de Barros; DJU 15.09.97)

Várias são as razões pelas quais a compensação não pode ser antecipadamente concedida, tal como se vê acima. Costuma-se destacar, no mais das vezes, que o pagamento ocorrido há anos não comprometeu a vida da empresa e não será a impossibilidade de restituição ou compensação imediata que terá o condão de levá-la á falência. Não há, assim, o perigo da demora. Evidentemente, isso está correto.

Porém, tão importante quanto esses fundamentos para a denegação da liminar ou antecipação de tutela é, justamente, a total impossibilidade de declaração da efetiva existência de um crédito e do direito á compensação dele decorrente (art. 66 da Lei nº 8.383/91) em uma cognição sumária sem contraditório!

é preciso, pois, ouvir o fisco. Após, poderá o juiz reconhecer ou não a liquidez e certeza do crédito, de modo que terá o contribuinte, por via de conseqüência, o direito á compensação dos créditos.

Como vimos, se autoriza o juiz a compensação, estará autorizando também a extinção do crédito tributário (art. 156, II). Por essa razão exige o art. 170 do CTN a liquidez e certeza dos créditos para que seja feita a compensação. E, por óbvio, deve o fisco ser ouvido, sob pena de ser extinto o crédito tributário, sem a oitiva do seu titular, o que é um gigantesco absurdo, que atenta de forma violenta contra o princípio do contraditório.

é essa razão a mais forte para impedir seja concedida a compensação de créditos antes do final do processo, embora as demais também o façam.

Felizmente, o Superior Tribunal de Justiça, seguindo a orientação que já estava sendo trilhada pela melhor jurisprudência, firmou entendimento no sentido de não ser cabível a compensação liminar de tributos, o que gerou a Súmula nº 212:

"Súmula nº 212. A compensação de créditos tributários não pode ser deferida por medida liminar."

4.A ação declaratória e a compensação de tributos.

A ação declaratória, movida pelo contribuinte contra o fisco, não se presta nem á singela declaração da existência de um fato, nem tampouco da existência um direito á compensação "em tese". Muito ao revés, a ação declaratória (e aí incluímos também as condenatórias, posto que têm sempre alguma carga declaratória) somente se presta a declarar a existência ou inexistência de relação jurídica entre as partes litigantes.

À toda evidência, para que essa declaração ocorra, há de se verificar o efetivo pagamento do tributo (mediante produção de provas), se esse pagamento foi indevido, qual os índices de correção a ser aplicados, se existem e quais são os limites para a compensação mensal. Feito isso, a declaração da relação jurídica, entre as partes, pode ser concedida.

Sustenta-se que a singela e lacônica "declaração" (em seu sentido não-técnico) do direito á compensação, sem especificar os montantes e limites, seria possível nas hipóteses de lançamento por homologação, haja vista que, por essa modalidade, deve o contribuinte recolher o tributo por sua conta e risco, ressalvado-se ao fisco o poder-dever da conferência.

Com a devida venia, esse entendimento está incorreto, e não se sustenta mediante análise um pouco mais aprofundada da questão. Com efeito, inexiste qualquer norma a determinar que o art. 170 do CTN não se aplica ao lançamento por homologação. Na realidade, somente após obtida a declaração de liquidez e certeza da existência de crédito oponível ao fisco é que poderá o contribuinte proceder á sua compensação (art. 170 do CTN) e, nas hipóteses de lançamento por homologação, o fará por sua própria conta e risco. Frisemos: após obtida a declaração de liquidez e certeza, fará o contribuinte a compensação por sua conta e risco.

Afinal de contas, se pudesse o contribuinte compensar por sua conta e risco, sem a declaração de certeza e liquidez do crédito, sem sua específica apuração, para que serviria o provimento jurisdicional?

Ninguém em sã consciência pode afirmar que um processo entre contribuinte e fisco servirá apenas para dizer qual é o direito "em tese"... Ou o processo serve apenas para conceder ao contribuinte "alvará" para a compensação? A lei não prevê, para a compensação, a necessidade de obtenção de um "alvará judicial"; exige, muito ao revés, que os créditos sejam líquidos e certos!

Nessa toada, é forçosa a conclusão de que qualquer "declaração" que não contemple esses aspectos, tende á inutilidade, afrontando, assim, a nossa teoria geral do processo, que exige seja o provimento jurisdicional tecnicamente útil. O processo judicial, entre contribuinte e fisco, deve culminar com um provimento específico para o caso concreto e não pela lacônica afirmação de qual seja o direito objetivo, vale dizer, de que a compensação "em tese" é permitida pela lei.

Nessa medida, somente para os casos em que o contribuinte demonstra o efetivo recolhimento do tributo indevido, assim como demonstra seu montante, atendido o princípio do contraditório, pode o Judiciário conceder, ao final do processo, o provimento almejado, na forma acima exposta, o que inclusive dará grande segurança jurídica para as partes, se ficar delimitado se existem e quais são os limites da compensação para o caso concreto.

Porém, nas hipóteses em que a petição inicial nem mesmo traz a informação do montante pago, não poderá Judiciário declarar o montante do efetivo crédito, mas apenas poderia "declarar" um suposto direito (objetivo e "em tese") á compensação, vale dizer, repetindo o que diz a lei, o que não irá configurar a declaração de relação jurídica, prevista no art. 4º, I, do CPC, não podendo ser admitido.

A declaração que alude o art. 4º, I, do CPC, dentro do tema em análise, pode ser usada como forma de configuração da certeza jurídica de que o autor não devia um determinado tributo, em determinada época. Se já existe qualquer provimento erga omnes nesse sentido, há flagrante carência de ação, devendo o processo ser extinto sem julgamento de mérito. Por essa razão, o pedido deve ser mais específico, de modo compor o litígio que o tributo, além de abstratamente indevido, foi efetivamente pago, em montante determinado.

Se pretende o contribuinte ver "declarado" um direito á compensação, será o caso de improcedência do pedido, se os requisitos legais (art. 170 do CTN) não estiverem presentes. Não tem direito á compensação aquele que não tem créditos líquidos e certos.

5.O mandado de segurança e a compensação de tributos.

Oportuno lembrar que o mandado de segurança somente pode ser usado para efeito de compensação de créditos tributários na hipótese do contribuinte ter obtido, por via administrativa ou judicial, a declaração de liquidez e certeza de seu crédito e, cumulativamente, tenha o fisco praticado qualquer ato visando impedir o contribuinte de compensar esses créditos na forma estabelecida.

Nessa mesma medida, cabe o mandado de segurança preventivo se existe justo receio desse ato vir a ser praticado.

O direito á segurança surge nesses casos exatamente porque há um ato ilegal praticado ou a ser praticado por agente público. Portanto, fora dessas hipóteses, não há espaço para o mandado de segurança, exatamente em razão desta medida somente ser cabível contra ato ilegal e abusivo de autoridade pública (art. 1º da Lei nº 1.533, de 31/12/51).

Com a devida venia, é um crasso equívoco a concessão da segurança para efeito de impedir o agente fiscal de cumprir o que a lei lhe manda (autuação e levantamento de débitos não pagos).

Efetivamente, não é possível a utilização de mandado de segurança para fins meramente declaratórios, dado o caráter mandamental dessa medida, que exige a liquidez e a certeza do direito pré-constituídas pelo impetrante. Se pretende o contribuinte a "declaração" do quer que seja, o meio cabível é a ação declaratória.

O que não é nem um pouco razoável é a utilização do mandado de segurança como forma de, sem a existência de provimento reconhecendo a existência de créditos oponíveis contra o fisco, efetuar a compensação de créditos, em flagrante ofensa ao que dispõe o art. 170 do CTN, impedindo que o fiscal faça o que a lei lhe determina! Qual é o "ato ilegal ou abusivo"? Até que seja o art. 170 do CTN julgado inconstitucional, têm os agentes fiscais o dever de não reconhecer como válidas as "compensações" efetuadas sem a sua observância.

Nessa toada, data venia, a concessão da segurança para que esse agente público permita uma "compensação" de créditos ilíquidos ou incertos configura uma astronômica e inadmissível heresia jurídica.

O mandado de segurança, portanto, somente pode ser usado, em sede de compensação de tributos, na hipótese do contribuinte já ter obtido provimento no sentido de reconhecer a liquidez e certeza de créditos oponíveis contra o fisco, caso venha o contribuinte a ser autuado ou tenha justo receio de vir a sê-lo.

5.1.A Súmula nº 213 do STJ.

A questão da compensação de tributos em sede de mandado de segurança é objeto de Súmula do Superior Tribunal de Justiça:

"Súmula nº 213. O mandado de segurança constitui ação adequada para a declaração do direito á compensação tributária."

Salta aos olhos que essa súmula não afirma que créditos ilíquidos ou incertos podem ser compensados. Ademais, também não diz essa súmula quais são os créditos que podem ser compensados.

Afirma ela, singelamente, que o mandado de segurança pode ser usado para a declaração do direito á compensação.

Que o mandado de segurança declare o direito, não é nenhuma novidade. Afinal de contas, exatamente por ter essa ação o caráter mandamental, é óbvio que é necessário dizer (declarar) o direito para, em seguida, determinar (mandar) á autoridade impetrada que faça ou deixe de fazer algo.

Por outro lado, o direito á compensação, abstratamente considerado, já existe, nos termos da lei (art. 170 do CTN). De modo que o mandado de segurança realmente pode servir para a declaração do direito á compensação tributária...

... Desde que tenha o contribuinte esse direito, é claro.

Assim, bem se vê que a súmula em nada esclarece a controvérsia, existente nos tribunais, a respeito da necessidade da existência de créditos líquidos e certos para efeito de compensação tributária.

Portanto, toda vez que tenha o contribuinte o direito á compensação tributária, pode ele usar o mandado de segurança para protegê-lo.

À toda evidência, o mandado de segurança não tem nenhuma carga constitutiva, de modo que a existência do direito á compensação deve ser sempre antecedente á impetração do mandado de segurança. Com a devida venia, pretender que o mandado de segurança possa alterar o direito é uma heresia jurídica.

Portanto, o alcance da Súmula nº 213 do STJ, a teor de sua redação, só pode ser restrito ás hipóteses em que, efetivamente, já dispõe o contribuinte do direito á compensação, o que só ocorre se tem ele créditos líquidos e certos oponíveis ao fisco, nos termos do art. 170 do CTN, sob pena de se transformar o mandado de segurança em uma ação constitutiva. Vale dizer: caso o contribuinte tenha obtido a declaração de certeza e liquidez dos seus créditos, poderá ele impetrar mandado de segurança na hipótese do fisco desrespeitar seu direito ou de haver justo receio de que isso possa ocorrer.

Frise-se, finalmente: a Súmula nº 213 não diz que créditos ilíquidos ou incertos podem ser objeto de compensação tributária. Se dissesse, estaria violando a lei e os mais comezinhos princípios do direito processual que regem o mandado de segurança, o que, felizmente, inocorreu.

6.Conclusão: o provimento correto para a compensação de tributos.

Por todas as razões expostas, percebe-se que qualquer decisão judicial que "autorize" uma compensação de créditos ilíquidos ou incertos estará violando o art. 170 do CTN. Além disso, essa autorização, em última análise, consistirá em um mero "alvará judicial", não previsto por qualquer norma, servindo unicamente para que possa o contribuinte, contra texto expresso de lei, proceder á compensação, sem sofrer penalidade alguma, o que não pode ser admitido.

Diante da negativa da Administração em reconhecer a existência de créditos oponíveis contra si, tem o contribuinte o direito processual á propositura de ação judicial para esse reconhecimento.

Por meio dessa ação, deve ele, necessariamente, afirmar quanto pagou e produzir a prova pertinente, fundamentando a pretensão de ver seu pagamento indevido convertido em crédito a ser compensado.

Nessa hipótese, poderá a ação, se for o caso, ser julgada procedente. Inclusive poderá a sentença estabelecer a forma de atualização do crédito do contribuinte e as condições e limites da compensação, se estas questões forem objeto da lide.

Obtendo o contribuinte esse provimento, nos exatos termos do art. 170 do CTN, tem ele o direito de compensar os créditos. E é bom frisar que na hipótese de lançamento por homologação (agora sim!), será a compensação efetuada pelo contribuinte, por sua própria conta e risco, sem a participação inicial da Administração Pública, desde que obtida a declaração de liquidez e certeza, nos termos do disposto no art. 170 do CTN, que expressamente lhe confere esse direito.

Finalmente, se apesar de obtido o provimento que apure a certeza e liquidez dos pagamentos indevidos, for o contribuinte autuado pelo fisco em decorrência do não reconhecimento de uma compensação de créditos efetuada nos termos desse provimento, terá ele o direito processual de ver protegido o seu direito subjetivo por via de mandado de segurança, o que está de acordo com a Súmula nº 213 do STJ.



Autor:

Bruno Mattos E Silva

brunosilva2008[arroba]hotmail.com

Procurador do INSS junto aos Tribunais Superiores



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