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Ademais. A Convenção Americana (OEA) sobre Direitos Humanos, ou o chamado Pacto
de San José da Costa Rica (1969), determina que nenhum dispositivo da presente
Convenção poderá ser interpretado no sentido de permitir a supressão, excluir
ou limitar exercício de direitos e da liberdade.
O Conjunto de Princípios para a proteção de todas as pessoas submetidas a
qualquer forma de detenção ou prisão (das Nações Unidas), no princípio 3º reza
que: "Não se restringirá ou menosprezará nenhum dos direitos humanos das
pessoas submetidas a qualquer forma de detenção ou prisão reconhecidos ou
vigentes em um Estado em virtude de leis, convenções, regulamentos ou costumes
sob pretexto de que o presente Conjunto de Princípios não reconhece esses
direitos ou os reconhece em menor grau".
Também o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos (ONU/1966,
aderido ao ordenamento pátrio nacional, via Decreto nº 592/1992), no artigo 5.2
dispõe que: "Não admitirá qualquer restrição ou suspensão dos direitos humanos
fundamentais - cláusula pétrea - reconhecidos ou vigentes em qualquer Estado
Parte do presente pacto em virtude de leis, convenções, regulamentos ou
costumes, sob pretexto de que o presente pacto não os reconheça ou os reconheça
em menor grau".
O artigo 60 § 4º da Carta Magna estabelece que não poderão ser motivo de
propostas para deliberação, nem sequer por emenda constitucional, não se
permitindo tendência alguma para abolição, das seguintes questões:
I - A que se refere a forma federativa de Estado, onde a República Federativa
do Brasil, constituí-se em Estado Democrático de Direito (artigo 1.º, I, II,
III, IV, V CF).
Não se modificam e não se alteram os princípios da República, os fundamentos e
os objetivos do estado democrático, isto é, a soberania, a cidadania, a
dignidade da pessoa humana, os valores sociais do trabalho e da livre
iniciativa, o pluralismo político, a prevalência pelos direitos humanos, entre
outros (parágrafo único, do art. 1º, art. 3º, I, II, III, IV e art. 4º, I, II,
III, IV, V, VI, VII, VIII, IX, X, parágrafo único CF).
II - No que diz respeito ao voto direito, secreto, universal e periódico, ante
o sistema democrático de sufrágio universal (art. 14 CF).
III - Sobre a separação dos Poderes, executivo, legislativo e judiciário, posto
que todo Poder estatal emana do povo e em seu nome será exercido, sendo todos
independentes e harmônicos entre si (art. 2º CF).
IV - quanto aos direitos e garantias individuais da cidadania (art. 5º CF)
Note-se, são os direitos e garantias individuais, não coletivas e nem sociais,
o texto constitucional é taxativo. A este exemplo não está permitido instituir
a pena de morte, prisão perpétua, legalizar o aborto, posto que a Carta Magna
assegura a inviolabilidade da vida.
Ademais e conjuntamente: os direitos sociais (artigo 6º ao 11), no contexto da
individualidade de cada cidadão; a autonomia dos Estados Federados (artigo 25);
a autonomia dos Municípios (artigo 29, 30, I, II, III); a organização bicameral
do Poder Legislativo (artigo 44); a inviolabilidade dos Deputados e Senadores
(artigo 53); as garantias dos Juízes (artigo 95, I, II, III); a permanência
institucional do Ministério Público (artigo 127) e de suas garantias (artigo
128, I, a, b, c); as limitações do Poder de Tributar (artigo 150, I, II, III,
a, b, IV, V, VI, a, b, c, d, artigo 151); e os princípios da ordem econômica
(artigo 170, I a IX, parágrafo único).
Ditos preceitos estão relacionados no artigo 60, parágrafo quarto e incisos I
ao IV: a forma federativa de Estado; a separação dos poderes; o voto direto,
secreto, universal e periódico e os direitos e garantias individuais. São
classificadas como um leque de matérias que representam o cerne da ordem
constitucional, furtadas a disponibilidade do poder de revisão. São as chamadas
limitações materiais explícitas ao poder de reforma, manifestação do poder
constituinte originário, ao elaborar um novo texto, através da possibilidade de
exclusão de modo expresso, certas matérias e conteúdos do poder instituído (J.
J. CANOTILHO, 1998, p. 942).
Os direitos fundamentais da cidadania se manifestam através das cláusulas
pétreas auto-aplicáveis, posto que somente durante o Estado de Defesa ou de
Sítio (arts. 136 e 137 CF), mediante declaração expressa por parte do Executivo
e autorização do Parlamento, especificando a causa e o tempo da situação de
emergência concreta, poderá suprimi-los, daí o conceito correto de cláusula
pétrea e de blindagem das garantias individuais processuais no sistema penal
democrático. Ao Judiciário compete aplicar a lei vigente, não possuindo desta
maneira a função constitucional legal executiva que autoriza com exclusividade
e excepcionalmente a quebrar das garantias fundamentais. A mais alta Corte de
Justiça, ao Supremo Tribunal Federal, compete a guarda da Carta Magna e o
controle da constitucionalidade das normas. Assim, o artigo 27 da Convenção
Americana sobre Direitos Humanos - Pacto de San José -, dispõe que a suspensão
de garantias judiciais-constitucionais só se dará em caso de guerra, de perigo
público, ou de outra emergência que ameace a independência ou segurança do
Estado-Parte, podendo ser adotadas excepcionalmente medidas estritas por tempo
restritamente limitado ás exigências exclusivas da situação, devendo ser
obrigatoriamente informado os demais Estados-Partes da Convenção, por
intermédio do Secretário-Geral da Organização dos Estados Americanos (OEA),
sobre o início e o término da suspensão das referidas garantias judiciais.
Estando ainda, tudo sujeito a verificação "in loco" por intermédio de inspeção
da Comissão de Direitos Humanos, porque na hipótese de violações dos Direitos
Humanos e desrespeito ao contido no Pacto de San José (art. 34 e segts), ante
denúncia e queixa de qualquer pessoa ou grupo de pessoas, o Estado que
suspendeu as garantias fundamentais da cidadania encontra-se sujeito a
responsabilidades na ordem jurídica internacional dos Direitos Humanos, se
infundadas, injustificadas ou abusivas as suspeições. Da mesma forma, como é
obrigatória a comunicação ao Secretário-Geral da OEA, na hipótese de suspensão
ou supressão temporária de garantia judicial, ou de direito constitucional
fundamental; também manda proceder desta forma, o Pacto Internacional de
Direitos Civis e Políticos, a exigência de comunicação ao Secretario-Geral da
ONU. Trata-se, portanto, da chamada clausula de proteção regional e
internacional dos Direitos Humanos, na prática, controle e fiscalização dos
compromissos assumidos após a ratificação e adesão dos instrumentos
internacionais, pela República Federativa do Brasil; bem como qualquer
Estado-Parte pode fazer comunicação escrita denunciando o desrespeito á
clausulas não observadas, por qualquer um dos Estados-Parte da presente
Convenção Americana ou do presente Pacto Internacional.
Todos os demais dispositivos constitucionais são passíveis de reforma, de
maneira total ou parcial, através de inclusões ou exclusões de texto via emenda
constitucional, porque não são cláusulas pétreas.
Por exemplo, foi possível aprovar a Emenda Constitucional nº 40/2003, sobre o
sistema de taxas de juros, que reformulou o contido no art. § 3º do art. 192
CF; a Emenda Constitucional nº 45/2004, reformou questões referentes ao Poder
Judiciário e incluiu garantia fundamental; as Emendas Constitucionais nsº
20/1998 e 41/2003, que dispõem sobre tempo de serviço e aposentadoria dos
magistrados e dos servidores públicos, e muitas outras Emendas Constitucionais
foram aprovadas, como assuntos importantíssimos na ordem legal e social do
País, mas não são consideradas cláusulas pétreas, de acordo com a Carta Magna.
Os instrumentos internacionais de Direitos Humanos específicos ao tema da
prevenção da delinqüência juvenil e da administração da justiça de menores, não
definem taxativamente a idade de 18 anos como a mais adequada para a
responsabilização penal. A Convenção sobre os Direitos da Criança, adotada pela
Assembléia Geral das Nações Unidas, em 20-11-89, aderida pelo governo
brasileiro em 1990, somente conceitua, no art. 1º, que se entende por
criança-jovem-adolescente os menores de 18 anos de idade, e estes não devem ser
objeto de ingerências arbitrárias por parte das autoridades estatais, ademais,
que todo menor de 18 anos de idade, pode estar privado de liberdade, porém,
deverá ser separado dos adultos (art. 37), o item 56 das Diretrizes da ONU para
a Prevenção da Delinqüência Juvenil (adotadas pela Assembléia Geral em
14-12-90, Res. 45/112), prevê que os atos delituosos sancionados aos adultos
não sejam considerados da mesma forma, quando cometidos por um jovem.
Para fins de definições internacionais, as Regras Mínimas das Nações Unidas
para a Administração da Justiça de Menores (Assembléia Geral ONU Res. 40/33, de
29-11-85), conceitua "menor" como toda criança ou adolescente que o sistema
jurídico de cada País possa sancionar por um delito de forma diferente daquele
procedimento feito a um adulto; e "menor delinqüente" é toda criança ou
adolescente que se impute um delito e que se considere culpado por seu
comportamento (ação ou omissão).
Assim, o artigo 228 da Constituição federal pode ser perfeitamente modificado
por emenda constitucional, sem qualquer problema de ordem jurídica, posto que
não se trata de cláusula pétrea, nos termos da doutrina, literatura moderna e
do sistema legal constitucional pátrio e internacional.
Cabe ao Ministério Público proteger e tutelar os Direitos Humanos e
fundamentais da cidadania, quanto as clausulas pétreas, ante a incumbência
constitucional da instituição na proteção do regime democrático e dos direitos
indisponíveis (art. 17 "caput" CF). Seus membros são verdadeiros Ombudsman,
Promotores e Procuradores dos Direitos Humanos, na qualidade de paladinos da
justiça e advogados da sociedade por excelência.
O Ministério Público é a instituição essencial á função jurisdicional do Estado
(art. 127 "caput" CF), incumbida da promoção da ação penal em crime de natureza
pública, sendo titular exclusivo e dominus litis do ius persequendi estatal
(art. 129, inc. I CF), tem atribuições legais para a propositura de ação ex
delicto, para assegurar os direitos das vítimas de crime (MAIA NETO, Cândido
Furtado, in "O Promotor de Justiça e os Direitos Humanos"; ed. Juruá, Curitiba,
2003).
Note-se que, quanto as infrações praticadas por menores, a clausula 19 das
Diretrizes Básicas á Função dos Membros do Ministério Público, aprovadas no
Oitavo Congresso das Nações Unidas para a Prevenção do Crime e Tratamento do
Delinquente (Havana/Cuba, 1990), é clara e estabelece taxativamente o seguinte:
"Nos países onde os magistrados do Ministério Público estão investidos de
poderes discricionários devem poder decidir se convém, ou não, encetar um
processo contra um menor, deve ser dada uma atenção particular á natureza e á
gravidade da infração, á proteção da sociedade, á personalidade e aos
antecedentes do menor. Quando tomam uma decisão os magistrados do Ministério
Público devem ter em especial atenção as soluções consagradas pela legislação e
pela jurisprudência aplicáveis aos menores. Esforçar-se-ão por não encetar
quaisquer procedimentos judiciais contra menores senão quando tal se mostre
absolutamente necessário" (grifos nossos).
Não é possível e muito menos admissível que membros do Parquet, violem
cláusulas pétreas, porque estariam cometendo o mais bárbaro dos ilícitos - lesa
humanidade - contra a própria cidadania brasileira, quebrando o Estado de
Direito e o regime democrático, configurando abuso de poder (Declaração sobre
os Princípios Fundamentais de Justiça para as Vítimas de Delitos e do Abuso de
Poder - Resolução nº 40/34,1985, ONU) e de autoridade (Lei nº 4.898/65).
Historicamente, a respeito das cláusulas pétreas nas Cartas Magnas brasileira,
pode-se afirmar que na Constituição do Império (artigo 178), estava expresso:
"é só constitucional o que diz respeito aos limites e atribuições
respectivas dos poderes políticos, e aos direitos políticos e individuais dos
cidadãos; tudo o que não é constitucional pode ser alterado, sem as
formalidades referidas pelas legislaturas ordinárias."
Nenhuma outra Constituição pátria faz menção á cláusulas pétreas referente aos
direitos individuais do cidadão. Nas Cartas Magnas de 1891, 1934, 1967 e 1969,
a clausula pétrea é a forma republicana federativa. E as Constituições de 1937
e 1946, não expressam qualquer ressalva ao poder de reforma.
Não se pode dizer que direitos análogos são categorias de cláusulas pétreas
para os fins de considerar dispositivo não constante no art. 60, § 4º e incisos
I ao IV do Texto Maior. È fazer interpretação equivocada e defesa pela própria
Constituição e doutrina constitucional, onde somente se permite a interpretação
restritiva ou taxativa e não extensiva ou ampliativa, para se embutir
dispositivo não alcançado como tal, ou seja na categoria de clausula pétrea.
A interpretação constitucional extensiva permitida é a do § 2º do art. 5º que
permite a inclusão dos Tratados e instrumentos internacionais de Direitos
Humanos, como garantia fundamental individuai (grifo nosso), nada mais.
Nenhum dos instrumentos internacionais referente a criança ou adolescente,
proíbe taxativamente que menor de 18 anos a idade, não pode ser julgado pelo
Justiça Penal Comum, pelo contrário apenas faz referência e ressalva para que
nas legislações nacionais conste um sistema diferenciado de julgamento e
processamento e na hipótese de condenação, seja o menor colocado em
estabelecimento distinto daqueles destinados á maiores (MAIA NETO, Cândido
Furtado, in Responsabilidade e Justiça Criminal", Revista Prática
Jurídica; Ano II, n.15; ed. Consulex, Bsb-DF, Junho/2003).
A interpretação da norma constitucional deve ser obrigatoriamente restritiva,
não permite ilações, do contrário estaria ofendendo flagrantemente a ordem
legal, o pacto nacional e o processo constituinte que é soberano e imperativo.
Na teoria constitucional têm-se que os princípios da representação popular,
soberania e validade hierárquica das normas, no sistema democrático norteiam a
legitimidade jurídica e a legalidade da assembléia constituinte; desde a sua
criação, discussão, até o ato último, ou seja, a aprovação final da Carta Magna
via referendum popular. Tudo isto quer dizer: "nenhum legislador ordinário ou
jurista - diga-se, os operadores do direito -, possuem poder ou autorização
legal para interpretar dispositivo da Constituição, alargando ou ampliando o
texto que foi taxativamente descrito pelo legislador e devidamente aprovado,
para atender momentaneamente interesse próprio ou de grupo, visando esta ou
aquela situação fática ou de direito; assim, o previsto taxativamente possui
valor e o não expresso não existe, portanto este tipo de interpretação é
proibida".
Autor:
Prof. Dr. Cândido Furtado Maia Neto
Professor Pesquisador e de Pós-Graduação (Especialização e Mestrado). Associado ao Conselho Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Direito (CONPEDI). Pós Doutor em Direito. Mestre em Ciências Penais e Criminológicas. Expert em Direitos Humanos (Consultor Internacional das Nações Unidas - Missão MINUGUA 1995-96). Promotor de Justiça de Foz do Iguaçu-PR. Membro do Movimento Nacional prol Ministério Público Democrático (MPD). Secretário de Justiça e Segurança Pública do Ministério da Justiça (1989/90). Assessor do Procurador-Geral de Justiça do Estado do Paraná, na área criminal (1992/93). Membro da Association Internacionale de Droit Pénal (AIDP). Conferencista internacional e autor de várias obras jurídicas publicadas no Brasil e no exterior.
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