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A Teoria Dinâmica de Distribuição do Ônus da Prova no Direito Processual Civil Brasileiro (página 2)

Artigos de Antonio Danilo Moura de Azevedo


1.2. Valoração da prova

Depois da produção das provas pelas partes, cabe ao magistrado efetuar a valoração das provas produzidas. O sistema adotado pelo Processo Civil Brasileiro, atualmente, é o da persuasão racional ou do livre convencimento motivado, através do qual o juiz tem ampla liberdade para valorar a prova constante dos autos e, assim, formar seu convencimento, devendo, entretanto, motivá-lo de forma racional, consoante reza os arts. 131, 165, 436 e 458, II, do nosso Código de Processo Civil. Como principais balizas desse sistema apontam-se a exigência de fundamentação, a argumentação racional e a obediência ás regras da experiência. Enveredando sobre o tema em comento, OVÍDIO BAPTISTA DA SILVA assevera que o juiz tem o

"dever de fundamentar sua decisão, indicando os motivos e as circunstâncias que o levaram a admitir a veracidade dos fatos em que o mesmo baseara sua decisão. Cumpre-lhe indicar, na sentença, os elementos de prova com que formou sua convicção, de tal modo que a conclusão sentencial guarde coerência lógica com a prova constante dos autos".2

Destarte, no hodierno estágio da evolução da doutrina processualista civil, mais desapegada do formalismo exacerbado e com mais discricionariedade do magistrado, este passa a ter um papel cada vez mais ativo tanto na produção da prova, em sua valoração, bem como na repartição do ônus da prova como veremos a seguir pormenorizadamente.


1.3. Ônus da prova

Na linguagem técnico-jurídica, ônus não é sinônimo de obrigação. Processualmente, fala-se em ônus quando se tutela interesse próprio, e em obrigação quando há interesse de outrem. Eis o entendimento burilado de ALVIM NETTO, transcrito por RODRIGO GARCIA SCHWARZ, que faz essa diferenciação de maneira fulgente:

"A distinção que nos parece primordial é a de que a obrigação pede uma conduta cujo adimplemento ou cumprimento aproveita á parte que ocupa o outro pólo da relação jurídica. Havendo omissão do obrigado, este será ou poderá ser coercitivamente obrigado pelo sujeito ativo. Já com relação ao ônus, o indivíduo que não o cumprir sofrerá, pura e simplesmente, via de regra, as conseqüências negativas do descumprimento que recairão sobre ele próprio. Aquela é essencialmente transitiva e o ônus só o é reflexamente."3

Ônus, por conseguinte, é a faculdade que a parte dispõe para praticar ou deixar de praticar determinado ato processual. Ato este que lhe proporcionará alguma vantagem própria se adimplir com seu ônus. Se a parte não exercita o ônus que lhe compete, esta apenas deixa de usufruir a vantagem processual que obteria se o tivesse exercitado, no momento e na forma previstos nas leis processuais.

Por sua vez, o ônus da prova trata-se de uma regra processual que, ressalte-se, não atribui o dever de provar o fato, mas sim atribui o encargo a uma das partes pela falta de prova daquele fato que lhe competia. Na precisa lição do Mestre FREDIE DIDIER JR., a "expressão "ônus da prova" sintetiza o problema de saber quem responderá pela ausência de prova de determinado fato."4

O ônus da prova tem duas funções primordiais. Primeiro, estimular as partes a provarem as alegações que fizerem. Segundo, ajudar o magistrado, que ainda permanecer em estado de dúvida, oferecendo-lhe um critério de julgamento capaz de evitar o "nom liquet". Como cediço, no Direito Romano, era permitido ao juiz se recusar a julgar causas que, na visão dele, não estavam claras. Podia simplesmente sentenciar "sibi nom liquere". No entanto, hoje em dia, vigora regra da vedação do "nom liquet", não admitindo mais que o juiz se esquive de decidir sob qualquer alegativa, inclusive por falta ou insuficiência de provas. Deparando-se com a incerteza, plenamente aceitável no sistema do livre convencimento motivado, o juiz, nesse caso, utilizar-se-á das regras de distribuição do ônus da prova, onerando aquela parte que carregava o encargo da prova com uma sentença desfavorável visto que não produziu prova necessária a corroborar suas alegações. Tais regras resolvem a controvérsia nos casos em que a produção probatória não convence ao juiz, guiando-o a julgar em desfavor daquele a quem incumbia o ônus da prova, e não o cumpriu satisfatoriamente.


1.4. Distribuição do ônus da prova

Na dicção do art. 333, do Código de Processo Civil, a distribuição do ônus da prova, regra geral, se dá nos seguintes moldes: incumbe ao autor a prova dos fatos constitutivos de seu direito; e, ao réu, a existência de fatos modificativos, extintivos e impeditivos do direito do autor.

Segundo o entendimento clássico, as regras emanadas do artigo sobredito seriam objetivas e fixas, distribuídas de forma imutável pelo legislador. Entretanto, essa visão estática de distribuição do ônus da prova vem sofrendo críticas da doutrina moderna e, felizmente, perdendo forças, visto que essa rigidez muitas vezes dificulta a adequação do regime da prova ao caso concreto. Por exemplo, há situações onde o direito material alegado por uma das partes é de difícil, onerosa ou mesmo impossível demonstração pela mesma. Já para a parte adversa não existem tantos óbices dificultando a produção por ela da prova imprescindível ao deslinde da causa "sub judice". Por tudo isso, a doutrina contemporânea vem pugnando pela flexibilização destas regras de distribuição do ônus da prova no sentido de permitir ao juiz que, deparando-se com nítido desequilíbrio das condições probatórias entre as partes, motivadamente, decida por adequar a regra de distribuição do ônus da prova ao caso concreto, determinando que este ônus recaia sobre a parte que dispuser das melhores condições de provar os fatos submetidos a julgamento.

Assim sendo, a regra estática de distribuição do ônus da prova, acolhida pelo nosso Código de Processo Civil, notadamente em seu art. 333, vem sofrendo mitigações em prol de uma maior efetividade e instrumentalidade do processo, que são alguns dos estandartes da perspectiva publicista do processo, atual tendência do Direito Processual Civil, capitaneada por Cândido Rangel Dinamarco. Para esta corrente doutrinária, estas regras de distribuição do ônus da prova não devem ser interpretadas como limitadores dos poderes instrutórios do juiz. Ao contrário, defende uma atuação ativa do juiz no âmbito da instrução processual, com o escopo de corrigir eventuais desequilíbrios na produção probatória vislumbrados caso a caso, para, com isso, proferir uma decisão mais justa e equânime.


1.5. Poderes instrutórios do juiz

Ao finalizar a instrução probatória, o juiz, de posse do arcabouço probatório constante nos autos, formará seu convencimento. Se entender que já há provas suficientes a gerar um grau de certeza sobre os fatos apreciados, o juiz proferirá seu julgamento, pouco importando a quem competia o ônus da prova. Mas, se ainda persistir seu estado de dúvida o que deve fazer o magistrado?

Se tomarmos por parâmetro o entendimento da doutrina tradicional, fundamentada no Estado Liberal, cujos princípios vetoriais são o do dispositivo, o da inércia e o da imparcialidade do juiz, a atuação do magistrado seria excessivamente tolhida pelos supramencionados princípios devendo somente esperar que a prova venha ao seu crivo. Assim, não lhe restaria outra solução senão apenas regular o desenrolar do processo, até que o mesmo esteja em condições de ser julgado. A iniciativa do magistrado seria tão-somente complementar e dar-se-ia somente após as partes se desincumbirem de provar os fatos afirmados por cada uma delas. Se, depois das partes apresentarem suas respectivas provas ainda pairarem dúvidas a respeito dos fatos em questão no entender do juiz, só neste momento se movimentaria no afã de encontrar uma solução para o litígio. O que poderia implicar em algum suposto prejuízo, já que há alguns tipos de provas que se não colhidas no exato momento em que vem á tona não produzirão mais os mesmo efeitos caso tivessem sido produzidas naquele momento oportuno.

Noutro sentido, nos trilhos da Democracia Social, o Processo Civil passa a conferir uma intensificação na participação ativa do juiz, inclusive na fase instrutória, com o propósito fundamental de assegurar efetividade á tutela jurisdicional. LUIZ GUILHERME MARINONI E SéRGIO CRUZ ARENHART, empunhando a bandeira desse posicionamento, asseguram que só assim ocorrerá:

"i) a justa aplicação das normas de direito material; ii) a adequada verificação dos fatos e a participação das partes em um contraditório real e iii) a efetividade da tutela dos direitos, pois a neutralidade é mito, e a inércia do juiz, ou abandono do processo á sorte que as partes lhe derem, não é compatível com os valores do Estado atual."5

é incontestável que o ônus da prova continua sendo um encargo das partes. A estas competem provar os fatos que alegarem. Nada obstante, ao magistrado também interessa a produção da prova, posto que a falta de prova ou a falha na sua produção prejudicará, em demasia, seu convencimento. Daí, a principal mudança defendida pela doutrina moderna que vê o processo como um Direito Público. Tomando por base esta visão publicística, o juiz pode determinar a prova de ofício, bem como agir concomitantemente e em igual condições com as partes, respeitando, sem sombra de dúvidas, as garantias constitucionais do contraditório, da ampla defesa, do devido processo legal e da obrigatoriedade de motivação, tudo isso com o objetivo primordial de elucidar os fatos imprescindíveis para a formação de sua convicção sobre o mérito da causa. A possibilidade do juiz de participar de uma forma mais ativa na produção da prova não retira das partes, de maneira alguma, a possibilidade de continuarem participando da formação da prova e também da consideração de seus resultados. Na atual conjuntura da processualística civil não existem razões plausíveis para podar este progressivo aumento dos poderes outorgados ao juiz, que realmente deve desempenhar um papel cada vez mais diligente na fase probatória do processo porque como dizem os festejados processualistas MARINONI e ARENHART "um processo verdadeiramente democrático, fundado na isonomia substancial, exige uma postura ativa do magistrado"6 . Sustentar que agindo deste modo o juiz estaria perdendo sua imparcialidade configuraria, no mínimo, um despautério. Podem muito bem ocorrer, e, de fato, ocorrem situações fáticas onde fatos relevantes não são trazidos ao processo em decorrência de uma menor sorte econômica de uma das partes ou mesmo por astúcia de uma delas que omitem ou mascaram os fatos conforme a sua conveniência e ao seu bel-prazer. Nestes casos, o cruzar de braços do juiz é que caracterizaria uma parcialidade. Poderosas e irrefragáveis são as palavras de TERESA ARRUDA ALVIM WAMBIER firmando seu entendimento, cujo enxerto abaixo trasladado arremata perfeitamente o posicionamento aqui defendido:

"O juiz, nesse contexto, seria parcial se assistisse inerte, como espectador de um duelo, ao massacre de uma das partes, ou seja, de deixasse de interferir para tornar iguais partes que são desiguais. A interferência do juiz na fase probatória, vista sob este ângulo, não o torna parcial. Ao contrário, pois tem ele a função de impedir que uma das partes se torne vencedora na ação, não por causa do direito que assevera ter, mas porque, por exemplo, é economicamente mais favorecida que a outra. A circunstância de uma delas ser hipossuficiente pode fazer com que não consiga demonstrar e provar o direito que efetivamente tem. O processo foi concebido para declarar lato sensu o direito da parte que a ela faz jus e não para dela retirá-lo, dando-o a quem não o possua. Em função desse parâmetro, pois, devem ser concebidas todas as regras do processo, inclusive e principalmente as que dizem respeito ao ônus da prova."7

Ademais, o próprio Código de Processo Civil, em seu art. 130, reconhece ao juiz o poder de determinar a produção de toda prova que entender pertinente á instrução do processo, independentemente da feição inicial do processo ser regida pelo princípio do dispositivo da demanda. Ou seja, ao juiz não é permitido iniciar a ação ou alterar seu objeto, mas conduzir ativamente a instrução probatória é plenamente possível, por orientação expressa do legislador.


O dogma de neutralidade do juiz se mostra cada vez mais obsoleto, ainda mais agora que a igualdade é uma das importantes bússolas do processo. A igualdade substancial no processo consiste em tratar os iguais de forma igual, e os desiguais desigualmente, na medida de suas desigualdades, permitindo, na medida do possível, que partes se apresentem com as mesmas oportunidades e com os mesmos instrumentos processuais capazes de estear seu direito perquirido, ou seja, proporcionar que as partes que venham a juízo em paridade de armas, pois que "o processo não deve ser um jogo em que o mais capaz sai vencedor, mas instrumento de justiça, com o qual se pretende encontrar o verdadeiro titular de um direito"8 . Daí a justificação do aumento dos poderes instrutórios do juiz: equilibrar as partes dentro do processo.

1.6. Modificação do ônus da prova

Normalmente, a maioria dos operadores do direito, neste rol o próprio legislador, empregam o termo inversão do ônus da prova, em vez de modificação do ônus da prova. Embora a expressão já esteja arraigada no mundo jurídico, não podemos deixar de objurgá-la tendo em vista que, na realidade, inversão não ocorre. Pois, se assim fosse, caberia ao réu o ônus da prova dos fatos constitutivos do autor; e, ao autor, a prova dos fatos modificativos, extintivos e impeditivos aduzidos pelo réu em seu desfavor. E não é assim que se sucede. Na verdade, ocorre é uma modificação na regra geral prevista no art. 333, do Código de Processo Civil, quando o juiz se depara com uma instrução processual tímida e fraca, incapaz de convencê-lo. Diante da proibição do "nom liquet", o juiz modifica o encargo de fazer a prova, transferindo-o á parte que tem mais condições de produzi-la no caso concreto visando afastar, de uma vez por todas, a obscuridade dos fatos para, com isso, conseguir formar o seu convencimento.

Frise-se, por oportuno, que a modificação do ônus da prova pelo juiz deve ser sempre pautada pela razoabilidade de tal medida. Se não há possibilidade da outra parte cumpri-lo a contento ou se a modificação da regra de distribuição do ônus da prova lhe implicar uma verdadeira pena, em vez de um ônus, não se justificará a alteração da regra geral. Urge-se, todavia, uma ponderação racional em cada caso particularmente com o fito de certificar que a imposição dessa modificação não violará normas constitucionais e processuais protetivas de ambas as partes. Como cuidadosamente dito por LUIZ GUILHERME MARINONI a modificação do ônus da prova só deve ocorrer quando "ao autor é impossível, ou muito difícil, provar o fato constitutivo, mas ao réu é viável, ou muito mais fácil, provar a sua inexistência."9


1.7. Momento de aplicação das regras de distribuição do ônus da prova

Ultrapassadas todas as tentativas, tanto das partes como do juiz, de fazer com que os fatos trazidos a julgamento fossem comprovados no processo e, ainda assim, persistir a situação de incerteza impeditiva do juiz proferir sua decisão de mérito, não lhe restará outra opção senão distribuir o ônus de ter ficado em estado de dúvida. Usando as regras de distribuição do ônus probatório identificará quem sucumbirá no seu direito justamente por não tê-lo provado conforme seu encargo.

Pertinente á natureza das regras que fixam a distribuição do ônus da prova entre as partes, a doutrina especializada é divergente. Para uma parte dela, as regras em comento são regras de procedimento destinadas ás partes, indicando-lhes como devem ser suas condutas no processo, notadamente fixando-lhes a função de trazer as provas para o processo. Em contraponto, outra corrente doutrinária, da qual perfilhamos, sustenta que estas regras determinadoras do ônus probatório são regras de julgamento, dirigida ao juiz, que as utilizará no momento de sua decisão, onerando a parte a quem caberia a prova do fato e não a fez ou a fez de modo insuficiente ou deficiente. Deduz-se disto que estas regras não são destinadas ás partes, tampouco postas para determinar como elas devem proceder na produção das provas que lhe competem, mas direcionadas ao juiz para influir na forma de seu julgamento quando o mesmo constatar no processo a ausência ou insuficiência de prova dos fatos ventilados no transcurso do processo. Na precisa lição de NELSON NERY JUNIOR e ROSA MARIA DE ANDRADE NERY, "o sistema não determina quem deve fazer a prova, mas sim quem assume o risco caso não se produza."10

Enfim, no que tange o momento de aplicação das regras de repartição do ônus da prova, entendidas como regras de julgamento, SéRGIO CRUZ ARENHART é incisivo ao afirmar que estas

"não incidem no início do processo, de forma a apresentar ás partes como devem comportar-se, senão ao final, quando do julgamento da causa - ou, excepcionalmente, em outro momento processual, por ocasião da análise de alguma liminar requerida - quando exauridas as formas de tentar obter a prova de todos os fatos relevantes ao processo."11

Imperioso se faz, nesta ocasião, fazermos uma distinção merecedora de destaque, qual seja, entre momento de aplicação das regras do ônus probatório e o momento da ciência ás partes que a modificação das regras ocorrerá. Como explanado alhures, o momento de aplicação das regras do ônus probatório se dá quando o juiz está julgando a causa. No que toca ao momento da ciência ás partes da modificação das regras do ônus probatório, em razão de situações peculiares detectadas no processo, há uma flamante polêmica baseada em eventual ofensa ás garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa. Muitos doutrinadores entendem que, para não ferir as garantias aludidas, o juiz deveria proceder tal comunicação ás partes no momento do recebimento da petição inicial, ou por ocasião do despacho saneador, ou até o final da instrução. Quanto á fase processual exata de advertir ás partes da provável mudança das regras do ônus probatório, é outra celeuma doutrinária que não vem ao caso. Com um forte argumento, CARLOS FONSECA MONNERAT ousa divergir de significativa parcela da doutrina defendendo a desnecessidade de aviso prévio da probabilidade de modificação do ônus da prova possivelmente aplicado pelo juiz ao tempo de sua decisão por uma simples razão: a previsão de tal possibilidade está na lei e todos os operadores do direito têm por obrigação conhecê-la. Sintetizando todo o seu raciocínio, conclui que "o juiz não precisa avisar ás partes que, tendo dúvidas no momento da valoração das provas, utilizar-se-á de presunções, de máximas da experiência e, persistindo o impasse, aferirá a distribuição do ônus da prova. Está na lei."12 ARENHART também envereda pelo mesmo caminho, porém, com um pouco mais de cautela, e diz que "este aviso anterior (sobre a modificação do regime do ônus da prova) é conveniente, mas não obrigatório para o juiz."13Outrossim, acrescenta:

"não se pode falar em lesão á ampla defesa e ao contraditório em razão da modificação dos critérios do ônus da prova, sendo a regra, naturalmente, destinada a incidir quando do julgamento da causa. Não há lesão a tais garantias constitucionais simplesmente pelo fato de que as partes não têm disponibilidade sobre as provas que detêm e que são de interesse do processo; é dever das partes apresentar todas as provas que possuem e que possam ter alguma importância para o processo, (...). Não há, por isso mesmo, que se falar em surpresa da parte diante da inversão do ônus da prova em seu prejuízo; se ela não produziu a prova que poderia fazer, faltou com dever processual, não podendo esta omissão ser invocada em seu beneficio."14

2. Teoria Dinâmica de Distribuição do Ônus da Prova

2.1. Origem e definição


A chamada Teoria Dinâmica de Distribuição do Ônus da Prova tem suas raízes fincadas especialmente na Argentina, lá com a denominação de Teoria das Cargas Processuais Dinâmicas. Naquele país e em outros, como Espanha e Uruguai, vem sendo vastamente difundida e muito bem aceita no meio jurídico, sobretudo no campo da responsabilidade profissional. Tem como principal precursor o jurista argentino Jorge W. Peyrano e com seus ensinamentos introduzimos os primeiros delineamentos do que consiste fundamentalmente esta teoria:

"En tren de identificar la categoria de las "cargas probatorias dinamicas", hemos visualizado - entre otras - como formando parte de la misma a aquélla según la cual se incumbe la carga probatoria a quein - por las circunstancias del caso y sin que interese que se desempeñe como actora o demandada - se encuentre en mejores condiciones para producir la probanza respectiva."15

ROLAND ARAZI, outro renomado doutrinador da Teoria da Prova, corroborando com as idéias emanadas do escólio acima transcrito, ensina que:

"Ante la falta de prueba, es importante que el juez valore las circunstacias particulares de cada caso, apreciando quien se encontraba en mejores condiciones para acreditar el hecho controvertido, así como las razones por las cuales quien tenía la carga de la prueba no la produjo, a fin de dar primacía a la verdad jurídica objetiva, de modo que su esclarecimiento no se vea preturbado por um excesivo rigor formal, en palabras de la Corte Suprema de Justicia de la Nación (ver CSJN, 20/08/96, E.D. 171-361)."16

Denota-se que a Teoria Dinâmica de Distribuição do Ônus da Ptrova rompe com as regras rígidas e estáticas da distribuição do "onus probandi" tornando-as mais flexíveis e dinâmicas, adaptáveis a cada caso especificamente. No dizer dessa teoria não importa a posição da parte, se autora ou ré; também não interessa a espécie do fato, se constitutivo, impeditivo, modificativo, ou extintivo; o importante é que o juiz valore, no caso concreto, qual das partes dispõe das melhores condições de suportar o ônus da prova, e imponha o encargo de provar os fatos áquela que possa produzir a prova com menos inconvenientes, despesas, delongas etc., mesmo que os fatos objetos de prova tenham sido alegados pela parte contrária. Com efeito, se a parte que o juiz impôs o ônus da prova não produzir a prova ou a fizer de forma deficitária, as regras do ônus da prova sobre ela recairão em razão de não ter cumprido com o encargo determinado judicialmente. MIGUEL KFOURI NETO sintetiza didaticamente o dinamismo dessa teoria ora estudada: "as regras que determina a posição da parte litigante - autor ou réu - nos processos, quanto á prova, em geral são imutáveis, ao longo da demanda. No entanto, por decisão do juiz, tais posições podem variar - e o sistema deixa de ser pétreo, para se tornar dinâmico."17

é indubitável que, á luz da Teoria Dinâmica de Distribuição do Ônus da Prova, ao juiz é dado uma maior discricionariedade na avaliação da distribuição das regras desse ônus colimando gerar um maior entrosamento e colaboração das partes com o órgão jurisdicional como corolário direto dos princípios da solidariedade, cooperação, boa-fé, dentre outros. Se ao analisar a lide posta ao seu crivo, o juiz identificar que pelos mandamentos da lei o ônus da prova recai sobre a parte mais desprovida, de algum modo, de condições de suportá-lo, a partir deste instante ele deverá mudar as regras de jogo, modificando a distribuição do ônus da prova em benefício daquela parte técnica ou economicamente hipossuficiente.

Vale pinçar que esta discricionariedade do juiz não é igual á discricionariedade do administrador. Por óbvio, toda atuação do juiz de ser emoldurada pelos princípios processuais da legalidade, motivação, igualdade, devido processo legal, contraditório, ampla defesa, cooperação, adequação e efetividade. O juiz poderá modificar a regra geral para ajustá-la ao caso concreto reduzindo, na maior medida do possível, as desigualdades das partes e, com isso, tentar evitar a derrota da parte que possivelmente tem o melhor direito, mas que não está em melhores condições de prová-lo.

ANTONIO JANYR DALL"AGNOL JUNIOR, em obra específica referente ao assunto á baila, pontifica como premissas decorrentes da Teoria da Distribuição Dinâmica dos Ônus Probatórios:

"a) inaceitável o estabelecimento prévio e abstrato do encargo; b) ignorável é a posição da parte no processo; e c) desconsiderável se exibe a distinção já tradicional entre fatos constitutivos, extintivos, etc. Releva, isto sim: a) a caso em sua concretude e b) a "natureza" do fato a provar - imputando-se o encargo áquela das partes que, pelas circunstâncias reais, se encontra em melhor condição de fazê-lo."18

Em apertada síntese, a Teoria Dinâmica de Distribuição do Ônus da Prova consiste em retirar o peso da carga da prova de quem se encontra em evidente debilidade de suportar o ônus da prova, e impondo-o sobre quem se encontra em melhores condições de produzir a prova essencial ao deslinde do litígio.

2.2. Recepcionabilidade da Teoria das Cargas Processuais Dinâmicas no Direito Brasileiro

Talvez, num primeiro momento, sem maiores reflexões, venha á mente como exemplo da recepção desta teoria no Direito Pátrio o art. 6º, VIII, do Código de Defesa do Consumidor, cujo teor prevê a possibilidade de inversão do ônus da prova a fim de facilitar a defesa dos interesses do consumidor, presumidamente hipossuficiente na relação consumerista. Contudo, apesar de ter havido uma flexibilização da distribuição do ônus da prova, a teoria em comento não foi adotada, integralmente, pelo nosso Código de Defesa do Consumidor. Ainda é a regra estática de distribuição do "onus probandi" que rege sobejamente a distribuição do ônus da prova nas relações de consumo. O dispositivo legal citado afirma hialinamente que a inversão do ônus da prova é possível, em favor do consumidor, quando for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente. Ocorrendo qualquer uma dessas previsões legais, assegura MARINONI que "o juiz não precisa inverter o ônus da prova, pois esse ônus já está invertido (ou definido) pela lei."19

A discricionariedade do juiz na sistemática do Direito do Consumidor praticamente não existe e, de contra-partida, o cerne da Teoria Dinâmica da Distribuição do Ônus da Prova está justamente em permitir ao juiz uma maior flexibilização da regras dos ônus probatório de acordo com seu próprio convencimento e conforme seja a situação particular das partes em relação á determinada prova verificada por ele mesmo no processo submetido ao seu crivo, e não só aplicar os critérios anteriormente definidos na lei.

Contudo, de "lege ferenda", o Anteprojeto do Código Brasileiro de Processos Coletivos, no seu art. 10, § 1º, adota puramente o critério dinâmico pelo qual a prova dos fatos cabe a quem estiver mais próximo dela e tiver maior facilidade para produzi-la. Digna, portanto, é a transcrição do aludido artigo dada a importância da inovação que trará ao ordenamento jurídico brasileiro:

"Art. 10 . Provas - São admissíveis em juízo todos os meios de prova, desde que obtidos por meios lícitos, incluindo a prova estatística ou por amostragem.

§ 1º. Sem prejuízo do disposto no artigo 333 do Código de Processo Civil, o ônus da prova incumbe á parte que detiver conhecimentos técnicos ou informações específicas sobre os fatos, ou maior facilidade em sua demonstração." (grifei)

À guisa de ilustração, algo muito próximo da Teoria Dinâmica de Distribuição do Ônus da Prova também vem sendo aplicado no âmbito do Direito do Trabalho. A doutrina moderna de Direito Processual Trabalhista tem hoje mais um princípio norteador de sua atuação que é o da aptidão para prova. Segundo este princípio, deve provar aquele que estiver apto fazê-lo, independentemente de ser autor ou réu. Poder-se-ia então testificar que a essência da teoria dinâmica já está sendo posta em prática no nosso país.

Como visto, já se pode afirmar que a moderna teoria aqui defendida está ganhando corpo na doutrina especializada e receptividade em nossos Tribunais, tanto que a discussão de sua aplicação já chegou ás mais altas Cortes de julgamento do país. Mister fazer referência á inclinação jurisprudencial que concretiza o sopro destes novos ventos:

"RESPONSABILIDADE CIVIL. MéDICO. CLÍNICA. CULPA. PROVA.
1. Não viola regra sobre a prova o acórdão que, além de aceitar implicitamente o princípio da carga dinâmica da prova, examina o conjunto probatório e conclui pela comprovação da culpa dos réus.
2. Legitimidade passiva da clínica, inicialmente procurada pelo paciente.
3. Juntada de textos científicos determinada de ofício pelo juiz. Regularidade.
4. Responsabilização da clínica e do médico que atendeu o paciente submetido a uma operação cirúrgica da qual resultou a secção da medula.
5. Inexistência de ofensa á lei e divergência não demonstrada.
Recurso Especial não conhecido."20 (grifei)

"TRIBUTÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO FISCAL. REDIRECIONAMENTO DA EXECUÇÃO. DISSOLUÇÃO IRREGULAR. POSSIBILIDADE.
(...)
1.Trata-se de agravo de instrumento de decisão que deixou de admitir recurso especial interposto contra acórdão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região que, em executivo fiscal, negou provimento a agravo de instrumento de decisão que indeferiu o redirecionamento do feito ao sócio-gerente, sob o argumento de que (a) os diretores ou gerentes não são responsáveis pelas obrigações que contraírem em nome da empresa em virtude de ato regular de gestão, somente respondendo pelos prejuízos que causarem, com culpa ou dolo, fora de sua atribuição de poderes ou com violação da lei ou estatuto; (b) mesmo na dissolução irregular da sociedade deve ser aplicado o princípio de que a responsabilidade dos sócios não é objetiva, fazendo mister a comprovação de culpa ou dolo; (fls. 83-86) e (c) não houve prova de que o sócio teria agido com excesso de poderes ou com infração á lei. Opostos embargos de declaração, foram acolhidos somente para fins de prequestionamento do art. 338 do Código de Comercial (fls. 94-97). No recurso especial (fls. 99-114), fundado na alínea a do permissivo constitucional, a recorrente aponta ofensa aos seguintes dispositivos: (a) artigo 135, III, do CTN, porquanto o inadimplemento do tributo, a ausência de bens passíveis de penhora e a dissolução irregular da sociedade são situações que ensejam a inclusão do sócio no pólo passivo da execução fiscal, e a petição que requereu o redirecionamento teve por base não só o inadimplemento como também a dissolução irregular da sociedade; (b) artigo 338 do Código Comercial, vez que (i) a averbação do distrato da sociedade no registro do comércio é dever ex lege cujo descumprimento acarreta considerar a sociedade como irregular, respondendo, assim, os sócios solidariamente com a empresa; (ii) em casos de dissolução irregular deve ser aplicado o princípio da carga dinâmica da prova, que estabelece que o ônus probatório deve recair áquele que dispõe dos melhores meios para comprovar determinado fato, independentemente de quem o alegue, e (...) .
4.Diante do exposto, conheço do agravo de instrumento, para, desde logo, dar provimento ao recurso especial, deferindo o pedido de redirecionamento da execução fiscal na forma pleiteada pela recorrente (CPC, arts. 544, § 3º). Intime-se."21 (grifei)

"APELAÇÃO CÍVEL. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. ANÚNCIO INVERÍDICO OFENSIVO À HONRA DA AUTORA VEICULADO NO SITE DA REQUERIDA. RESPONSABILIDADE DO PROVEDOR E DO FORNECEDOR DE SERVIÇOS. APLICAÇÃO DA TEORIA DA CARGA DINÂMICA DO ÔNUS DA PROVA. VALOR DA INDENIZAÇÃO. ATENÇÃO AO CRITéRIO PUNITIVO-PEDAGÓGICO AO OFENSOR E COMPENSATÓRIO À VÍTIMA. INAPLICABILIDADE AO CASO PELO JUÍZO A QUO DO INSTITUTO NORTE-AMERICANO DO PUNITIVE-DAMAGES. 1 - Incontroverso o fato de que o anúncio registrado no site "Almas Gêmeas" pertencente á requerida, foi efetuado por terceiro alheio ao processo. 2 - Atuando a ré como provedora de acesso á Internet e não sendo possível a identificação do real responsável pelo conteúdo ofensivo do anúncio, é seu o dever de indenizar pelos danos á personalidade da autora. Aplicação da Teoria da Carga Dinâmica da Prova, ou seja, incumbe a quem tem mais condições a prova de fato pertinente ao caso. 3 - Não só como provedora de acesso em sentido amplo atuou a ré na relação em análise, como atuou também como prestadora de serviços, mesmo que gratuitamente. Evidencia-se a desmaterialização e despersonalização das relações havidas pelo uso da Internet, não sendo mais possível identificar o objeto e muito menos os sujeitos de tais relações. Assim, sendo a ré empresa que possui site na Internet de relacionamentos deve, a fim de evitar a incomensurável dimensão dos danos oriundos do mau uso de seus serviços, adotar medidas de segurança que diminuam tais riscos. 4- Valor da Indenização que atendeu o caráter punitivo-pedagógico ao ofensor e compensatório á vítima pelo dano sofrido. Ademais, para o arbitramento do dano moral deve-se levar em conta as condições econômicas da vítima e do ofensor. Inaplicabilidade do instituto norte-americano do punitive damages. Aplicação ao caso dos critérios para aferição do quantum a indenizar em consonância com o instituto da responsabilidade civil do direito brasileiro. NEGADO PROVIMENTO AOS APELOS, COM EXPLICITAÇÃO."22 (grifei)

"APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO DE REVISÃO DE CONTRATO GARANTIDO POR ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. AUSÊNCIA DO CONTRATO OBJETO DA PRETENDIDA REVISÃO. Caso em que o contrato objeto da pretensão revisional não veio aos autos, ônus que cabia á instituição financeira, pela observância ao princípio da carga dinâmica da prova. Inteligência, ainda, do artigo 355 do CPC. SENTENÇA DESCONSTITUÍDA DE OFÍCIO."23 (grifei)

"ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA. IMPUGNAÇÃO JULGADA PROCEDENTE. AUSÊNCIA DE PROVA DA HIPOSSUFICIÊNCIA. ALUSÃO À GARANTIA CONSTITUCIONAL. APLICAÇÃO DA TEORIA DA DISTRIBUIÇÃO DINÂMICA DA PROVA. Mantém-se o decreto judicial que acolhe a impugnação á gratuidade judiciária, quando o impugnado deixa de comprovar com suficiência sua impossibilidade em atender os ônus do processo e os elementos colacionados aos autos evidenciam a potencia financeira dos litigantes. A garantia constitucional que assegura o benefício da assistência jurídica integral e gratuita exige, além da simples "afirmação" da pobreza", também a "comprovação" da hipossuficiência de recursos (CF, art. 5º, LXXIV), o que enseja a discricionariedade judicial em sua avaliação. Cabe ao requerente, assim, como parte mais habilitada, cumprir a demonstração, em respeito á "teoria da distribuição dinâmica da prova", fornecendo todos os elementos de convicção que persuadam sobre alegada hipossuficiência. APELO DESPROVIDO."24 (grifei)

"APELAÇÃO CÍVEL. COMERCIAL, CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. PROTESTO INDEVIDO DE DUPLICATAS. CAUSA DEBENDI. INEXISTÊNCIA. ÔINUS DA PROVA. DANO MORAL IN RE IPSA. FACTORING. DIREITO DE REGRESSO. PROTESTO. DESNECESSIDADE. EXISTÊNCIA DE OUTROS PROTESTOS. SENTENÇA ULTRA PETITA. NÃO-CARACTERIZAÇÃO. JUROS. TERMO INICIAL. EXTINÇÃO DA AÇÃO CAUTELAR. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. DESCABIMENTO. Não se pode bloquear justa pretensão de direito material por um simples equívoco processual, quando se sabe que o processo somente se justifica na exata medida em que serve á efetividade e á realização dos direitos materiais das partes e, para o Estado-Juiz, serve á realização da justiça do caso concreto, finalidade última e superior da atividade jurisdicional. Não há óbice a que se conheça um pedido de liminar como antecipação de tutela ou como medida cautelar, pois o que define a natureza jurídica da postulação é a essência da pretensão deduzida em juízo e não o eventual nomem júris que a parte circunstancialmente tenha atribuído em sua petição. Não há a tipicidade de ações no Direito brasileiro. Preliminar de extinção da ação cautelar rejeitada. A duplicata mercantil, como título causal que é, representativa de operação comercial entre sacador e sacado, vincula-se ao negócio jurídico subjacente, podendo ser elidida a presunção de liquidez e certeza inerente aos títulos de crédito mediante a demonstração, por parte do sacado, de que a relação negocial, seja a prestação de serviço, seja a entrega de mercadoria, não se efetivou. Tendo a sacada negado a existência da relação jurídica que teria dado ensejo á emissão das duplicatas protestadas, cabia á apresentante dos títulos a protesto a prova em contrário. Não se poderia exigir da sacada a prova da inexistência da relação jurídica, pois trata-se de prova negativa, conhecida também como prova impossível ou prova diabólica. Caso de aplicação do princípio da carga dinâmica da prova, o qual informa que o ônus da prova cabe á parte que melhores condições tem de produzi-la. A existência de outros protestos em nome da autora é situação que deve ser considerada quando da fixação do quantum indenizatório, não afastando a obrigação de a ré responder pelos prejuízos causados á autora. O endosso do título transmitido ás empresas de factoring não é considerado como endosso cambiário, o qual exige o protesto do título endossado para fins de preservação do direito de regresso. A empresa de factoring cobra deságio das duplicatas que negocia com a faturizada, ocasião em que assume o risco pelo não-pagamento do título pela sacada. Em se tratando de protesto indevido, não é necessária a prova do dano moral, pois trata-se de dano in re ipsa. O cadastramento da autora em órgão de restrição creditícia ocorrido posteriormente á propositura da ação pode e deve ser levado em consideração pelo juízo quando da prolação da sentença. Exegese do art. 462 do CPC. Por óbvio que não poderia a demandante fazer referência na peça inicial da ação ao cadastramento efetuado após o ajuizamento da ação. Sentença ultra petita que não se caracteriza. Os juros nas ações indenizatórias por dano moral devem incidir desde o evento danoso (Súmula 54, STJ) e não a partir da citação. Termo inicial de incidência dos juros que não se altera em face do princípio da impossibilidade de reformatio in pejus. APELO DESPROVIDO."25 (grifei)

3. Conclusão

Ante todo o exposto neste trabalho, espera-se que a Teoria Dinâmica de Distribuição do Ônus da Prova receba proeminente adesão dos estudiosos do direito, mormente dos magistrados. Aquela visão estática que, aprioristicamente, obriga ao autor provar os fatos constitutivos de seu direito invocado; e, ao réu, os fatos obstativos da pretensão contra ele articulada, sem levar em consideração as condições probatórias de cada parte, não condiz com os preceitos da atual sistemática do Processo Civil Brasileiro. Em nome da submissão inconteste á regra advinda do art. 333, do Código de Processo Civil, a prestação jurisdicional, muitas vezes, não produz lídima Justiça á causa submetida á apreciação pelo Poder Judiciário, pois, pela regra geral tradicional, o ônus da prova poderia recair sobre a parte mais fraca do processo, isto é, sobre quem não tem condições de fazer a melhor prova capaz de lhe assegurar o direito por ela invocado e o juiz não faria nada para amenizar essa suposta injustiça, apenas aplicaria a regra do ônus da prova se, ao final, do processo as partes não apresentarem suas alegações devidamente provadas.

Corrigindo grande parte desses disparates provocados pela adoção de um regramento completamente rígido, que fere a tantos princípios constitucionais, consoante demonstrado anteriormente, desponta a moderna teoria, por meio da qual o ônus da prova pode recair tanto no autor como no réu, a depender das circunstâncias do caso e da situação processual de cada uma das partes. Ao magistrado é permitido fazer um juízo de ponderação e, mediante decisão devidamente motivada, respeitando todas as garantias constitucionais asseguradas ás partes, modificar a regra de distribuição do ônus da prova fazendo incidir sobre a parte que tem o controle dos meios de prova e, por isso mesmo, se encontra em melhores condições de produzi-la a contento, ou seja, apta a trazer aos autos a prova capital que descortinaria a verdade dos fatos controvertidos. é logicamente insustentável que se há uma parte em melhores condições de produzir a prova, deixe de fazê-la unicamente pelo apego a formalismos exacerbados, e por que não dizer desarrazoados. O processo moderno não mais coaduna com esse tipo de idéias, pois que seu escopo maior é garantir o direito a quem realmente o titule.

Notas de rodapé convertidas

1 KRIGER FILHO, Domingos Afonso. Inversão do ônus da prova: regra de julgamento ou de procedimento? Revista de Processo, São Paulo: RT, n. 138, p. 278, ago.2006.
2 SILVA, Ovídio Baptista. Curso de Processo Civil, Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 1978, vol. I, p. 288.
3 SCHWARZ, Rodrigo Garcia. Breves considerações sobre as regras de distribuição do ônus da prova no processo do trabalho. Revista Síntese Trabalhista. Porto Alegre: Síntese, n. 202, p. 16, abr.2006.

4 DIDIER JR., Fredie. Direito Processual Civil. 4ª ed. Salvador: JusPODIVM, 2004, vol. I, p. 423.
5 MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Comentários ao Código de Processo Civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, v. V, t. I, p. 192.
6 MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Op. Cit., p. 192.
7 WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. O ônus da prova. Revista Jurídica Consulex, Brasília: Editora Consulex, n. 200, p. 40, mai.2005.
8 BEDAQUE, José dos Santos. Garantias da Amplitude de Produção Probatória in TUCCI, José Rogério Cruz e (Coord). Garantias Constitucionais do Processo Civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 175.
9 MARINONI, Luiz Guilherme. Formação da convicção e inversão do ônus da prova segundo as peculiaridades de caso concreto. Disponível em: http://www.professormarinoni.com.br/artigos.php. Acesso em: 26.01.07.
10 NERY JUNIOR, Nelson; Nery, Rosa Maria de Andrade. Código de Processo Civil comentado e legislação extravagante. 9ª ed. São Paulo: RT, 2006, p. 531.
11 ARENHART, Sérgio Cruz. Ônus da Prova e sua modificação no processo civil brasileiro. Revista Jurídica: Órgão Nacional de Doutrina, Jurisprudência, Legislação e Crítica Judiciária, Porto Alegre: Notadez/Fonte do Direito, n. 343, p. 49, mai.2006.
12 MONNERAT, Carlos Fonseca. Momento da ciência aos sujeitos da relação processual de que a inversão do ônus da prova pode ocorrer. Revista de Processo, São Paulo: RT, n. 113, p. 84, jan/fev.2004.
13 ARENHART, Sérgio Cruz. Op. Cit., p. 31.
14 ARENHART, Sérgio Cruz. Op. Cit., p. 31.
15 PEYRANO, Jorge W., Aspectos procesales de la responsabilidad profesional, in, Lãs Responsabilidades Profesionales - Libro al Dr. Luis O. Andorno, coord. Augusto M. Morello e outros, La Plata: LEP, 1992, p. 263.
16 ARAZI, Roland. La carga probatória. Disponível em: http://www.apdp.com.ar/archivo/teoprueba.htm. Acesso em: 29.01.07.
17 KFOURI NETO, Miguel. Culpa médica e ônus da prova. 4ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p. 137.
18 DALL"AGNOL JUNIOR, Antonio Janyr. Distribuição dinâmica dos ônus probatórios. Revista Jurídica, Porto Alegre: Notadez/Fonte do Direito, n. 280, p. 11, fev.2001.
19 MARINONI, Luiz Guilherme. Op. Cit. Disponível em: http://www.professormarinoni.com.br/artigos.php. Acesso em: 26.01.07.
20 STJ. REsp 69309 / SC; RECURSO ESPECIAL 1995/0033341-4. Rel(a).:Min. Ruy Rosado de Aguiar. Órgão Julgador: T4 - Quarta Turma. Data do Julgamento: 18/06/1996. Data da Publicação/Fonte: DJ 26.08.1996 p. 29688.
21 STJ. Ag 706524. Rel(a).: Min. Teori Albino Zavascki. Data da Publicação: DJ 05.10.2005.
22 Apelação Cível Nº 70013361043, Sexta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Artur Arnildo Ludwig, Julgado em 21/12/2006.
23 Apelação Cível Nº 70017420225, Décima Quarta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Isabel de Borba Lucas, Julgado em 07/12/2006.
24 Apelação Cível Nº 70010284180, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: José Carlos Teixeira Giorgis, Julgado em 16/03/2005.
25 Apelação Cível Nº 70006513477, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Adão Sérgio do Nascimento Cassiano, Julgado em 15/12/2004.

4. Referências bibliográficas

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Autor:

Artigos de Antonio Danilo Moura de Azevedo

danilo_azevedo[arroba]hotmail.com



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