Esta compreensão da medida cautelar parece encontrar o cerne de sua criação e
seu objetivo na seara jurídica brasileira.
A negativa da prestação jurisdicional adequada pode também ser encontrada na
decisão de mérito tardia e, portanto ineficaz. No dizer dos populares o cidadão
"ganha, mas não leva", é esta a situação fática que precisa a todo custo ser
evitada, porque é forma de aviltamento do Poder Judiciário, levando-o à
descrença popular e conseqüente secundarização axiológica na esfera dos três
poderes.
Esse problema também ocorre na seara trabalhista, onde a execução é o principal
entrave para a solução dos litígios, principalmente os resolvidos nas Juntas de
Conciliação e Julgamento.
O Direito Processual Trabalhista não prevê a existência da tutela antecipada,
sendo esta instituto peculiar ao processo civil. Entretanto, aplica-se os
dispositivos processuais civis subsidiariamente ao processo do trabalho, como
forma de suprir as lacunas existentes e dar maior movibilidade ao processo
laboral, garantindo-lhe maior efetividade. Essa aplicação decorre do art. 769
da CLT - Consolidação das Leis do Trabalho,
in verbis:
"
Nos casos omissos, o direito processual comum será fonte subsidiária do
direito processual do trabalho
, exceto naquilo em que for incompatível com as normas deste título". (grifo
nosso)
O perigo na demora no processo do trabalho é real, principalmente diante
inferioridade econômica do trabalhador frente ao empregador, que possui todos
os meios jurídicos e fáticos para suportar a mora processual. Sobre outra
ótica, a experiência prática informa a inferioridade, na maioria dos casos,
cultural e psicológica do empregado, que geralmente vai a juízo na situação de
desempregado, quando não em situação de miserabilidade.
A natureza das contentas trabalhista guarda em seu âmago a urgência, por se
tratarem de lides envolvendo créditos de natureza alimentar. A solução rápida é
o objetivo da Justiça do Trabalho, pautada pela conciliação, informalidade,
celeridade, jus postulandi e oralidade. O prejuízo irreparável pela não
satisfação célere dos direitos trabalhistas é evidenciado pela hipossuficiência
do trabalhador. Neste aspecto, podemos inferir pela ampla aplicabilidade da
tutela antecipada no processo trabalhista, tanto nos dissídios individuais
quanto nos coletivos.
Não há razão para dúvida quanto a aplicabilidade no dissídio coletivo uma vez
que também é forma de processo do trabalho, igualmente ao dissídio individual.
Não tem reflexo o argumento de a decisão do dissídio coletivo ter natureza
normativa, uma vez que não é fator impeditivo de aplicabilidade da tutela
antecipada a discussão da lei em tese.
A legitimidade ativa para requerer a tutela antecipada nos é informada pelo
caput
do art. 273 do CPC,
in verbis:
"O juiz poderá a requerimento da parte, antecipar, total ou parcialmente, os
efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, desde que, existindo prova
inequívoca, se convença da verossimilhança da alegação e [...]". Então,
infere-se que a parte autora da ação é a legítima para peticionar a tutela
antecipada, porque é a parte autora que realiza o pedido inicial. A parte
autora tanto pode ser o empregado, como o empregador. Fica então demonstrado
que o empregados também é parte legítima, desde que figure no pólo de
requerente, para utilizar-se da tutela antecipada.
No processo civil há proibição da aplicação
ex officio
da tutela antecipada pelo princípio da inércia da jurisdição. Porém acreditamos
que no processo laboral, em virtude do
jus postulandi
, o juiz pode conceder de ofício a medida, desde que motive sua decisão e
demonstre onde encontrou fulcro para conceder a medida. O trabalhador é a parte
hipossuficiente, não pode aguardar nem tem preparo processual, próprio dos
advogados para requerer tutela antecipada, devendo o juiz adequar o
procedimento ao
jus postulandi
, tornando possível ao empregado obter os efeitos que necessita no processo trabalhista.
Pode-se afirmar que a tutela antecipada é mais necessária no processo
trabalhista que no civil. Isso ocorre pela plausabilidade do direito pleiteado,
de essencial importância para ficar a espera
ad eternum
do processo ordinário.
Embora no processo do trabalho a audiência seja uma, sabemos que por vezes a
sessão é interrompida e podem haver outras audiências, continuações da primeira
é verdade, mas marcadas am datas posteriores e a depender da pauta, podem durar
até anos. Nesse sentindo, o argumento de que a tutela antecipada não é
necessária cai por terra.
é princípio do Estado Democrático de Direito, instituído pela Carta Magna de
1988, o direito e garantia de ter assegurado a análise do Judiciário a toda
lesão ou ameaça a direito, evidenciado pelo princípio da segurança judiciária
que implica na promoção da prestação jurisdicional efetiva, adequada e
tempestiva.
O legislador deve então empreender formas processuais para garantir a efetiva
dinamização dos princípios elencados explícita e implicitamente, promovendo
instrumentos processuais próprios para tanto. Essas formas processuais seriam,
por via reflexa, as tutelas de urgência.
SILVA (1993, p. 336) nos fornece a significação jurídica de fungibilidade como
"a substituição de uma coisa por outra". A fungibilidade é a possibilidade de
conhecer de um instrumento jurídico proposto erradamente tal qual fosse o
adequado, advindo de permissão legal expressa. Em nosso direito processual, antes
da reforma oriunda da Lei 10.444/2002, nunca houve previsão de fungibilidade
entre as ações. Havia previsões específicas como nas ações possessórias e nos
recursos em geral. Por conseguinte, é inovador esse aspecto da reforma que
instituiu o § 7º no art. 273 do Código de Processo Civil.
A fungibilidade é um princípio processual implícito, decorre do princípio da
instrumentalidade das formas e dos atos processuais, como pode ser observado na
análise do art. 244 do Código de Processo Civil,
in verbis:
"o ato só se considera nulo e sem efeito se, além de inobservância da forma
legal, não tiver alcançado a sua finalidade". A intenção legislativa é
cristalina, no sentido de pugnar pelo objetivo do ato e não pelo ato e si
mesmo.
O princípio da instrumentalidade dos atos e formas processuais apregoa a
informalidade, a flexibilidade quando o ato atingir sua finalidade, tudo
visando a maior celeridade processual, diminuindo os gastos processuais a bem
do Estado. Este princípio parece ser totalmente aplicável no processo do
trabalho, no qual por excelência visa a rapidez na solução dos litígios,
primando pela proteção do trabalhador através de uma satisfação rápida e
eficaz.
Nosso Código de Processo abraçou o sistema da legalidade das formas, como forma
de garantir ao cidadão uma ordem processual evitando a confusão, a incerteza no
curso processual, e é para isso que as formalidades procedimentais servem: para
garantir a ordem no processo. No entanto, o apego extremista ao formalismo
atenta contra a própria segurança, à medida que afronta a eficiência da
prestação jurisdicional, porque ela é o âmago da ordem que se busca garantir.
Diante dessa realidade, o princípio da instrumentalidade das formas e dos atos
processuais conduz o operador do direito à lógica do sistema, à racionalidade a
fim de se evitar que a finalidade do ato seja substituída pela formalidade do
mesmo, o que per si é um desvio de valores. A fungibilidade seria um
desdobramento do princípio da instrumentalidade das formas e dos atos processuais,
porque tem como objetivo manter o ato, que em seu conteúdo, atingiu a
finalidade esperada. Então, podemos concluir pela total aplicabilidade do
princípio implícito da fungibilidade, desde que os requisitos sejam
satisfeitos, no âmbito processual
Porém, não é o princípio da fungibilidade a panacéia para todos os erros
cometidos no curso processual, não sendo prestável para corrigir proposições
absurdas, nem atenuar efeitos preclusivos no processo. Por isso, há limites
para a aplicação do princípio em tela como forma de coibir abusos.
O primeiro limite é a existência de dúvida objetiva acerca da tutela de
urgência aplicável ao caso, e esta dúvida somente ocorre quando a doutrina ou a
jurisprudência divergem sobre qual a tutela emergencial aplicável, e não do
mero "palpite" do jurisdicionado. A análise reserva-se a observar, apenas, se
há reais motivos para dúvida sobre a tutela aplicável ao caso do ponto de vista
doutrinário e jurisprudencial, não devendo ser levado em consideração critérios
subjetivos.
O segundo critério é a inocorrência de erro crasso e a tempestividade da
medida, de modo a se evitar que a má-fé ocorra, prejudicando a parte de boa-fé
no processo.
O terceiro critério é que a lei permita a aplicação da fungibilidade,
prevendo-a e a regulando, de modo a coibir as tentativas de tumulto processual
por pedidos de aplicação da fungibilidade e a proposição de recursos (agravo de
instrumento) sem o menor cabimento para o caso prático.
A regra da infungibilidade prejudica apenas aos jurisdicionados que terão,
através de seus procuradores, que intentar novamente o mesmo pedido, com as
mesmas características e peculiaridades, apenas alterando o
nomen júris
do pleito. O formalismo excessivo nada advém de positivo para a prestação
jurisdicional, tendo como única conseqüência, in casu, a demora na solução dos
litígios.
A orientação para a fungibilidade recursal funda-se na análise, muito complexa,
da possibilidade de haver erro grosseiro ou má-fé. O erro grosseiro era advindo
do aplicador do direito, por desconhecimento ou descuido, a má-fé é
substanciada na intenção de errar o instrumento de maneira intencional com fins
espúrios, almejando tumultuar o processo ou procrastinar.
Portanto, as alterações trazidas pela Lei 10.444/2002 não devem ser entendidas,
tão-somente, como mera faculdade legislativa, mas como efetivação de um direito
constitucionalmente garantido, de natureza cogente. Porque satisfeitas as
características é dever do magistrado aplicar a fungibilidade.
O princípio da fungibilidade já é admitido no direito processual civil
brasileiro nos recursos e nas ações possessórias, sendo agora observado na
hipótese consubstanciada no § 7º, art. 273 do Código de Processo Civil. Esse
parágrafo redimensiona a fungibilidade, colocando-a como característica do
princípio da economia processual e do devido processo legal, de forma a
propiciar um efetivo avanço no âmbito processual. Esta alteração também é
importante para o processo trabalhista, porque permite ao magistrado, no
exercício de suas funções, corrigir o erro no requerimento do trabalhador, de
forma a garantir-lhe uma tutela jurisdicional eficaz para sua situação
jurídica, protegendo-o da mora processual.
FERREIRA (2003, p. 213) analisa a reforma como "representação da
desburocratização dos meios, extensão da instrumentalidade do processo a
serviço de sua efetividade". Seria então possível entender a fungibilidade como
avanço no direito processual, sobretudo na submissão aos princípios
processuais, os quais pugnam pela correta prestação jurisdicional. O autor
ainda pontua a fungibilidade dos meios como forma de não prejudicar o
requerente em casos em que há dúvida
objetiva
sobre a natureza cautelar ou antecipatória do pedido.
A fungibilidade, mais que um princípio jurídico é forma de cidadania e de
acesso efetivo ao Judiciário, tornando realidade o desejo do legislador
originário. Definições acadêmicas são essenciais para o pleno desenvolvimento
da ciência jurídica, porém o apego formalista é a desnaturação do objetivo da
ciência que é, em todos os ramos, o aperfeiçoamento do ser humano, seu bem
estar e por último sua felicidade.
Vejamos o que nos informa o texto legal do art. 273, § 7º do Álbum Processual
Civil que possibilita a aplicação do princípio da fungibilidade na tutela antecipatória:
§ 7º Se o autor, a título de antecipação de tutela, requerer providência de
natureza cautelar, poderá o juiz, quando presentes os respectivos pressupostos,
deferir a medida cautelar em caráter incidental do processo ajuizado.
O primeiro aspecto do parágrafo em comento é o direcionamento literal que o
legislador conferiu ao artigo, exibindo o caso em que permite a fungibilidade,
demarcando a área de atuação do dispositivo legal sem deixar lacunas. O
parágrafo exige que a providência seja requerida a título de antecipação de
tutela, ou seja, inadmitida está à hipótese de requerimento sobre quaisquer
outros títulos, o que nos parece correto, em razão da manutenção da ordem
processual.
O segundo aspecto é que a medida requerida a título de antecipatória de tutela
deve possuir natureza cautelar, ou seja, deve evidenciar que a finalidade do
requerimento é cautelar e, é este aspecto que se embasa o pedido. Cabe
salientar que não basta apenas que o caso em concreto seja de natureza
cautelar, devem estar evidenciados no petitório os requisitos da tutela
cautelar, de forma a embasar seu deferimento. Nesse sentido Ferreira (Op. cit.,
p. 212) afirma:
Obviamente, caso haja a conversão do pedido de tutela antecipada para de
natureza cautelar, a decisão do juiz deverá ser proferida à luz dos requisitos
específicos da medida cautelar (
focos bobine júris e periculum in mora) e
não da tutela antecipada, que são inclusive mais rigorosos quanto à
probabilidade do direito afirmado pelo autor
.(grifo nosso)
A fumaça do bom direito e o perigo na demora são requisitos das medidas
cautelares e visam assegurar a utilidade do provimento final, diferentemente
dos requisitos da tutela antecipatória, mais profundos e de difícil
demonstração, haja vista as exigências legais anteriormente demonstradas.
Podemos afirmar com razoável segurança que é possível identificar os requisitos
necessários para o deferimento de uma medida cautelar em uma petição de
antecipação de tutela, porém o inverso parece-nos forçoso, haja vista a complexidade
superior da verossimilhança e prova inequívoca, sem mencionar os outros
requisitos (alternativos e negativo) exigidos para a concessão da antecipação
de tutela.
O terceiro aspecto é a exigência da satisfação dos requisitos porque aplicar a
fungibilidade, que significa "trocar um instituto pelo outro". Essa troca
significa submissão aos requisitos, ou seja, deve a medida antecipada
erroneamente requerida adequar-se à medida cautelar, cedendo aos seus
requisitos, satisfazendo-os plenamente, tal qual fosse a medida cautelar (a
correta para o caso concreto). A Lição de Figueira Júnior (2003, p. 120) parece
oportuna:
Repousa a configuração, no caso em concreto, dos elementos hábeis à concessão
de proteção de natureza assecurativa e não de caráter satisfativo, pois a
denominação do pedido, formulado erroneamente, em nada influencia o resultado
prático e jurídico pretendidos.
A fungibilidade tem caráter excepcional, prestando-se à correção de distorções
da ordem jurídica. Por ser medida de caráter excepcional a interpretação deve
ser restritiva ou estrita, porque não cabe ao hermeneuta dar mais alcance à
norma de exceção do que o legislador conferiu. Nesse contexto, é imperiosa a
citação de Maximiliano (1998, p. 224):
Estriba-se a regra numa razão geral, a exceção, numa particular; aquela se
baseia mais na justiça, esta, na utilidade social, local, ou particular. As
duas proposições devem abranger coisas da mesma natureza; a que mais abarca, há
de constituir-se a regra; a outra, a exceção.
Após o ensinamento de Maximiliano, fica claro que a fungibilidade é exceção e,
também o é a própria tutela antecipada, dentro do ramo processual, haja vista
que se aplica somente a casos específicos e que o processo ordinário é a regra,
sem o incidente processual da tutela antecipada. Diante disto, só resta
concluir que a tutela antecipada deve ser interpretada restritivamente ou
estritamente, bem como todos os regramentos do artigo 273, por conseqüência
lógica.
Para solidificar ainda mais a tese de excepcionalidade da tutela antecipatória
citamos ainda Maximiliano (Op. cit., p. 225) que esclarece as raízes das normas
de exceção:
O princípio da interpretação estrita das exceções (
Exceptiones sunt strictissimoe interpretationis) entronca
nos institutos jurídicos de Roma, que proibiam estender disposições
excepcionais, e assim denominavam Direito Exorbitante, anormal ou anômalo, isto
é, os preceitos estabelecidos contra a razão de Direito; limitava-lhes o
alcance, por serem um mal, embora mal necessário.
Do ponto de vista jurídico, realmente a tutela antecipada é um "mal necessário"
haja vista as situações que são por ela amparadas. A tutela antecipada encontra
respaldo no brocardo jurídico:
quae propter necessitatem recepta sunt non
debent in argumentum trahi
- o que é admitido sob o império da necessidade, não deve estender-se aos casos
semelhantes, de fato a tutela antecipatória é concedida sob a ocorrência da
extrema necessidade, sob pena de imprestabilidade do provimento final.
Superada a questão da forma de interpretação, fica saliente que não pode haver
hermenêutica tendenciosa que amplie as situações permissivas de aplicação da
fungibilidade, a despeito da vontade legislativa. "A lei é presumidamente
perfeita, contendo todas as palavras que o legislador quis inserir, e estas
devem ser entendidas como escritas adrede para influir no sentido da frase
respectiva", Maximiliano (Op. cit, p. 110). Todavia, cabe a prova em contrário
acerca da perfeição da lei, devendo o intérprete demonstrar a inexatidão e a
causa da mesma, sob pena de ser viciosa a interpretação, como tem sido em
muitos compêndios jurídicos.
"A interpretação deve ser objetiva, desapaixonada, equilibrada, às vezes
audaciosa, porém não revolucionária, aguda, sempre atenta respeitadora da lei",
nos dizeres de Maximiliano (Op. cit., p. 103). O que deve ser evitado, e
parece-nos que muitos incorreram nesse equívoco, é querer em proveito da
sociedade, através de normas processuais mais flexíveis e da sumarização de
procedimentos, incutir no artigo conteúdo diverso ao que o legislador oferece,
hipotetizando sem nenhum amparo hermenêutico ou jurídico. O legislador quis
dizer o que fora escrito no artigo, ou seja, que a medida cautelar proposta
erroneamente, não poderia ensejar acatamento como antecipatória, estando
afastada a hipótese de fungibilidade inversa ou de mão dupla.
Ademais, conceber a aplicação de interpretação que beneficie a sociedade, em
detrimento de regras anteriormente firmadas é campo perigoso, de sorte que todo
tipo de abusos poderiam ocorrer, legitimados pela defesa dos interesses
sociais, instaurando a insegurança jurídica. Dessa sorte, não pode ser acatada
interpretação que vise criar outra norma sobre a já existente. O jurista
Maximiliano (Op. cit., p. 111) cinge-nos com mais um foco de iluminação sobre a
questão:
[...] os escritos têm como objetivo despertar no leitor o mesmo pensamento do
escritor do texto analisado, de forma que se presume que o legislador se
esmerou em escolher expressões claras e precisas, com a preocupação meditada e
firme de ser bem compreendido e fielmente obedecido. Por isso, não havendo
elementos de convicção em sentido diverso, atém-se o interprete à letra do
texto[...].
A regressividade ou mão única é a via possível de aplicação da fungibilidade,
ou seja, só pode haver fungibilidade da medida antecipada para a cautelar e
nunca o inverso. Em que pese grande parte da doutrina afirmar que há
possibilidade de mão dupla, o faz apenas com a afirmação de que esta
interpretação seria benéfica aos jurisdicionados, sanando as dúvidas objetivas
existentes ou então explicitando casos em que a urgência não pode aguardar.
Do mesmo modo, parece-nos que não há como encontrar num pedido cautelar os
pressupostos da tutela antecipada, porque os requisitos são diametralmente
opostos, ou seja, a fumaça do bom direito de uma é diversa da outra, não
havendo espaço para confusão. Poder-se-ia dizer que os requisitos da cautelar
estão contidos na tutela antecipada, porém os requisitos da tutela antecipada
não estão contidos na tutela cautelar.
Oportuno mencionar que a fungibilidade não pode ser de mão dupla porque isto
prejudicaria o réu diretamente, porque a concessão de medida cautelar é mais
simples que a da antecipação de tutela, em razão dos requisitos processuais. A
instauração da desigualdade processual e a ofensa à ampla defesa e ao
contraditório seriam flagrantes. Converter uma medida em outra é fazer suportar
todas as exigências e condicionamentos, o que seria impossível de configuração.
A única conclusão logicamente razoável seria a defesa do réu ser fungível,
podendo ele apresentar defesa para pedido cautelar e pedido antecipatório,
dando ao juiz a faculdade de receber o que melhor convier Porque de outro modo,
não haveria contraditório assegurado, porque para haver defesa é preciso que se
conheça anteriormente as alegações. Acreditamos que essa situação causaria um
tumulto processual de difícil solução, causando embaraço procedimental.
A fungibilidade aplicada de acordo e estritamente com o conteúdo do § 7º, do
art. 273 do CPC não abarca maiores complicações, porque na prática, o
requerimento de tutela antecipada é complexo, de difícil configuração,
possibilitando nele encontrar todos os requisitos que justificariam uma
concessão de medida cautelar, e a defesa do réu seria plenamente útil, vez que
iria além do que é exigido para a defesa da cautelar, explorando ainda mais o
caso trazido a juízo, fornecendo ao magistrado mais elementos para formação de
sua convicção plena.
Já fora demonstrado que a medida cautelar e a tutela antecipada são tutelas de
urgência, porém em muito se diferem, ficando claro quando cada uma delas tem
sua utilidade, e seus requisitos próprios, prestando-se a finalidades diversas.
A tutela antecipatória é instrumento de satisfação, porque antecipa os efeitos
de uma sentença de mérito favorável, exigindo para tanto requisitos rígidos
para fundamentar uma decisão dessa importância. A medida cautelar é instrumento
assecurativo, ou seja, visa acautelar o objeto da lide para que no momento da
sentença de mérito final, a parte vitoriosa possa receber utilmente os
resultados, aproveitando-os. Figueira Júnior (Op. cit, p. 121) aborda o assunto
com esmero, vejamos:
Significa dizer que o novo parágrafo não servirá para igualar, mesclar ou confundir
os dois institutos (tutela acautelatória e tutela antecipatória), pois essa não
é a vontade da lei ou do legislador. Ao contrário, o seu intuito é meramente
pragmático, voltado à resolução de problemas que a prática forense não
raramente se defronta, buscando evitar dano ou perecimento de direito, muitas
vezes decorrentes do apego do juiz ao formalismo excessivo ou por interpretação
diversa dos fatos quando cotejados com a compreensão formulada pelo procurador
do autor, em razão da questão posta encontrar-se em zona limítrofe entre a
cautelaridade e a antecipação dos efeitos da sentença de procedência,
chancelada pela urgência da medida perseguida.
De outro modo, quando o legislador omite-se sobre alguma situação, infere-se
que esta omissão foi proposital, de modo a demonstrar o verdadeiro intento
legislativo. Dessa forma, o intento do legislador foi, tão-somente, tornar
possível a fungibilidade da medida antecipada para a medida cautelar e não o
inverso, porque sobre esta questão teria havido omissão legislativa
intencional, no sentido de vedação implícita.
A aplicação do princípio da fungibilidade em sede de tutelas jurisdicionais
abraça um conjunto de princípios constitucionais, mormente o do acesso à
jurisdição, significando uma adequação do pedido de acordo com a ordem jurídica
justa, haja vista a flexibilização dos requerimentos. Essa flexibilização
permite que o juiz afaste-se um pouco dos rigores processuais e das
formalidades, podendo aproximar-se da finalidade do processo, evidenciada pela
instrumentalidade das formas e atos processuais, pela economia processual e
celeridade.
A antecipação de tutela é um instituto dos mais revolucionários existentes em
nosso sistema processual. A importância da antecipação dos efeitos da tutela
pretendida é essencial para a correta prestação jurisdicional, sob pena de
imprestabilidade do provimento em razão da demora na solução do litígio. Apesar
de algumas referências à antecipação de tutela esparsas na CLT, de há muito o
processo trabalhista necessitava de uma previsão mais genérica, que veio em
1994, quando o legislador inseriu em nosso CPC o art. 273. Após estes 8 anos de experiência, o instituto foi apreciado na prática, de modo que eventuais
falhas estão sendo sanadas com as últimas reformas processuais, inclusive pela
Lei 10.444/2002. Estas reformulações do instituto também aproveitam ao processo
trabalhista, uma vez que dinamizaram o instituto, tornando-o ainda mais
efetivo.
No processo do trabalho o interesse em discussão diz respeito à sobrevivência
do trabalhador, por força de lei considerado hipossuficiente. Neste contexto é
premente a utilização de todas as formas possíveis de agilização da decisão
judicial, porque o obreiro não pode suportar o ônus da mora. A única conclusão
que na prática é possível é a necessidade extrema da tutela antecipada no
processo trabalhista. Se no processo civil, onde na maioria dos casos
discute-se patrimônio, a tutela antecipada é de suma importância, o que se dirá
no processo laboral, onde os interesses são axiologicamente superiores.
A própria Lei de Introdução ao Código Civil imprime no magistrado o dever de
atender aos fins sociais da lei, visando o bem comum. E, é justamente isto que
se espera do magistrado trabalhista quando da apreciação da tutela antecipada,
a finalidade social do seu provimento. Neste diapasão, devemos compreender o
real intento da lei que é fazer justiça. A justiça só é alcançada com uma
prestação jurisdicional útil, prestável.
Por último, deve o magistrado compreender que as normas processuais civis são
aplicadas se forem adequadas à realidade trabalhista. Desse modo, pode o juiz
mitigar sua aplicabilidade, encontrando saídas jurídicas que se coadunem com as
necessidades processuais trabalhistas, suprindo lacunas, interpretando sempre
em favor do obreiro, buscando a finalidade social da norma. E nisto, a
antecipação de tutela mostra-se útil, principalmente no
jus postulandi
do obreiro, desconhecedor das malícias processuais, alvo fácil de um sistema
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Autor:
Dayse Coelho de
Almeida
monfalco[arroba]yahoo.com.br