Conforme estudado no resumo do tema anterior, a jurisdição é uma das formas de expressão da soberania do Estado e, como tal, é una, indivisível. Ocorre, entretanto, que o órgão jurisdicional - o juiz - não tem condições de aplicar o direito objetivo a todos os conflitos interindividuais que surgem, pois é inconteste o número elevado e diversificado de lides que se desenvolvem no país. Percebe-se, assim, a necessidade de se dividir tarefas, ou, numa linguagem mais técnica, de se distribuir os processos entre os diversos órgãos jurisdicionais previstos na Constituição Federal.
Frise-se que a jurisdição não comporta fragmentação, mas seu exercício sim. A divisão do exercício da jurisdição entre os diversos órgãos jurisdicionais é prevista na própria Lei Maior e também em dispositivos infraconstitucionais. Equivale dizer que há determinação legal para que cada juiz exerça sua jurisdição dentro de certos limites, afetos a grupos específicos de litígios.
Eis aí a definição de competência que, nos dizeres de Liebman, é a "quantidade de jurisdição cujo exercício é atribuído a cada órgão ou grupo de órgãos".1 Para Mirabete, é "a medida e o limite da jurisdição, é a delimitação do poder jurisdicional".2 Cintra, Grinover e Dinamarco bem sintetizam o assunto, lecionando que, in verbis:
"A função jurisdicional, que é uma só e atribuída abstratamente a todos os órgãos integrantes do Poder Judiciário, passa por um processo gradativo de concretização, até chegar-se á determinação do juiz competente para determinado processo; através de regras legais que atribuem a cada órgão o exercício da jurisdição com referência a dada categoria de causas (regras de competência), excluem-se os demais órgãos jurisdicionais para que só aquele deva exercê-la ali, em concreto".3
Clara está, portanto, a distinção entre competência e jurisdição.
A distribuição de competência é feita observando-se uma série de disposições, que vão das constantes na Constituição Federal ás previstas em normas das Constituições estaduais, do Código de Processo Penal e das Leis de Organização Judiciária.
Scarance Fernandes esclarece que a doutrina vem tentando agrupar e sistematizar critérios científicos para a fixação da competência.4 O primeiro deles é o que distingue a competência externa ou internacional, consubstanciada em regras que definem as causas que a justiça brasileira deverá conhecer e decidir, da competência interna, que aponta qual o órgão local se incumbirá especificadamente do exercício jurisdicional em cada caso concreto.
Outro critério de determinação da competência é o apresentado por Wach, defendido por Chiovenda e acolhido no Brasil por Moacyr Amaral Santos.5 Segundo este, três são os critérios que devem ser observados: o objetivo (que se funda no valor ou natureza da causa ou, ainda, na qualidade das partes), o funcional (fundado na repartição das atividades jurisdicionais entre os diversos órgãos que devam atuar dentro de um mesmo processo) e o territorial (atribuída aos diversos órgãos jurisdicionais considerando-se a divisão do território nacional em circunscrições judiciárias, regiões, seções ou subseções judiciárias).
Um outro critério, defendido por Carnelutti, estrutura-se sobre o conceito de lide. Consiste em relevar dados referentes á lide e dados referentes ao processo. Nos primeiros, englobam-se aqueles que tangem á relação jurídica (natureza, fato constitutivo e cumprimento da obrigação), ao objeto (natureza, valor e situação) e ás pessoas (qualidade e sede). Nos segundos, compreendem-se os dados alusivos á natureza do processo, á natureza do procedimento e á relação com o processo anterior.6
Para Cintra, Grinover e Dinamarco, que acolhem em parte o critério de Carnelutti, o legislador, para a distribuição da competência, utilizou-se do que chamaram de "três operações lógicas", que são:
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