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Senão vejamos: dois indivíduos munidos de arma de fogo resolvem roubar um banco em concurso de agentes. Ambos realizam as mesmas condutas, rendem o caixa, apontam-lhe a arma, recolhem o dinheiro, dividem-no em partes iguais e saem em fuga.
Durante a instrução criminal as testemunhas afirmam que o primeiro deles é ótimo pai de família, excelente vizinho, bom empregado e que trabalha durante os finais de semana em entidades beneficentes tendo inclusive adotado cinco crianças de rua. O outro acusado porém, tem personalidade e conduta social oposta: bate na esposa, briga constantemente com a vizinhança, chega bêbado no trabalho e há fortes comentários de que trafique drogas.
Não é difícil imaginar que o juiz fixará a pena do primeiro no mínimo legal e aumentará a pena do segundo em cerca de um ano.
Ao proceder desta forma, o magistrado, na prática, estará condenado ambos pelo roubo a banco e suplementarmente estará condenando o segundo a um ano de prisão por bater na esposa, brigar constantemente com a vizinhança, chegar bêbado no trabalho e supostamente traficar drogas.
Trata-se de violação clara de dois princípios constitucionais: legalidade e devido processo legal.
Ao condenar o réu a um ano de prisão com base em alguns fatos absolutamente atípicos sob o argumento de ser uma "conduta social imprópria" ou "personalidade deturpada", nada mais estará fazendo do que desprezar completamente um dos mais tradicionais princípios de Direito Penal.
Ofenderá também o princípio do devido processo legal, pois se o indivíduo foi acusado de roubar um banco, irá defender-se deste fato tão-somente e não de supostas lesões corporais á esposa e tráfico de drogas alegado pelas testemunhas. O aumento da pena com base em supostos crimes que mesmo que provados nos autos não foram objeto de processo para apurá-lo é absolutamente inconstitucional, pois em última análise configura em condenação sem o devido processo legal.
Segue o art. 59 do CP, afirmando que os motivos do crime, suas circunstâncias e conseqüências também deverão ser levados em conta na fixação da pena. Vale frisar que o que se pune aqui não é o motivo, as circunstâncias e conseqüências já previstas pela própria leitura do tipo penal, mas um plus de reprovabilidade. Assim absurdas são as justificativas que muitos juízes alegam para majorar a pena: "o motivo do furto foi muito reprovável pois buscou o ganho fácil, o enriquecimento ilícito, etc.", "as conseqüências do crime de homicídio (ou de latrocínio) foram muito graves, pois resultou na morte da vítima". Afirmações como esta constituem um flagrante bis in eadem, pois o "ganho fácil" é, em última análise, elemento motivacional de todo crime patrimonial e a "morte da vítima" é sempre conseqüência dos homicídios e latrocínios. A motivação que deve ser valorada não é a comum aos crimes da espécie, mas aquela que se diferencia da média dos crimes praticados demonstrando uma maior reprovabilidade da conduta sub judice.
Por fim, deverá o juiz analisar também o comportamento da vítima. Trata-se evidentemente de conduta ativa por parte da vítima que induza o réu á prática do crime. Não justifica a diminuição de pena nos crimes contra os costumes a mera roupa provocante com a qual desfila a moça em local ermo, pois ninguém é obrigado a trajar-se com recato. Por outro lado, a moça que aceita ir a um motel com um rapaz e lá, após as tradicionais preliminares, desiste da cópula no último momento, certamente contribui com seu comportamento para a prática de estupro naquele momento. A clara diferença entre os dois comportamentos das vítimas está na absoluta passividade do primeiro e na atividade do segundo.
2ª fase:
Analisadas as circunstâncias judiciais do art. 59, em seguida serão consideradas as causas agravantes e atenuantes previstas nos arts. 61, 62, 65 e 66 do CP. As agravantes e atenuantes são chamadas causas legais de fixação da pena, pois sua previsão é bastante objetiva na lei penal, não merecendo uma análise subjetiva mais apurada pelo magistrado.
Discute-se na doutrina e na jurisprudência a possibilidade de se reduzir a pena por meio de uma atenuante abaixo do mínimo legal fixado para o crime em análise.
A leitura do art. 65 do CP, por si só esclarece a dúvida: "são circunstâncias que sempre atenuam a pena: (...)". Ora, se o legislador usou o adjunto adverbial "sempre" é porque queria deixar claro que em toda e qualquer hipótese dever-se-á aplicar a atenuante. Caso contrário teria usado a expressão "sempre que possível".
Evidentemente a redução da pena por meio da atenuante não é ilimitada, pois, do contrário, estar-se-ia admitindo que o magistrado poderia fixar uma pena de um dia de prisão.
O limite da redução é fixado em 2/3 (dois terços), por analogia com a maior causa de diminuição de pena do Código Penal (tentativa). Alegar, no entanto, que por não ter o legislador fixado expressamente este limite, simplesmente não se pode diminuir a pena abaixo do piso legal, é negar vigência a lei federal que é expressa ao usar o advérbio "sempre", ferindo diretamente a Constituição Federal no seu princípio de individualização das penas.
Infelizmente a maior parte da jurisprudência tem preferido não reduzir a pena abaixo do mínimo legal em flagrante desrespeito á interpretação literal do art. 65 do Código Penal.
As circunstâncias agravantes são somente aquelas previstas nos arts. 61 e 62 do Código Penal, enquanto as atenuantes são aquelas previstas no art. 65 do mesmo diploma legal, havendo ainda no art. 66 do CP a previsão de uma atenuante genérica.
A circunstância inominada do art. 66 do CP tem conteúdo variável e deverá ser aplicada pelo magistrado quando as circunstâncias do delito indicarem uma menor necessidade de reprovação do crime não prevista pelas atenuantes do art. 65 do CP.
3ª fase:
As causas de aumento e diminuição de pena são os últimos elementos a serem levados em conta na fixação da pena. Apesar de encontrarem-se dispersas no Código (tanto na parte geral - v.g. tentativa, concurso formal, crime continuado - como na parte especial - v.g. art. 157, §2º, do CP), são facilmente identificáveis por virem sempre expressas por uma fração (aumenta-se da metade, diminui-se de um a dois terços, etc).
Primeiramente são aplicadas as causas de aumento de pena e, em seguida, as causas de diminuição de pena.
As principais causas de aumento de pena da parte geral são o concurso formal (art. 70 do CP) e a continuidade delitiva (art. 71 do CP). A fração do aumento da pena deverá ser calculada com base no número de crimes praticados: se apenas dois, 1/6, se três, 1/5, se quatro, 1/4 e assim sucessivamente.
As principais causas de diminuição de pena da parte geral são a tentativa (art. 14, II, do CP), o arrependimento posterior (art. 16 do CP), o erro inevitável sobre a ilicitude do fato (art. 21 do CP) e a participação de menor importância (art. 29, §1º, do CP).
As causas de aumento e diminuição de pena da parte especial estão relacionadas no tipo penal que descreve o crime em análise. Vale ressaltar que não se pode aplicar duas causas de aumento ou diminuição de pena da parte especial para o mesmo crime.
Assim, o roubo praticado em concurso de agentes e com emprego de arma só terá a pena aumentada na terceira fase por uma das circunstâncias: ou pelo concurso de agentes ou pelo emprego de armas. A fração do aumento da pena não será determinada pelo número de circunstâncias, mas pela gravidade de cada uma delas: número de agentes no caso de concurso de pessoas e potencialidade ofensiva da arma no caso de emprego de arma.
Vale lembrar que, em qualquer hipótese, a causa de diminuição de pena em razão da tentativa (art. 14,II, do CP) será sempre a última a ser aplicada.
Após a fixação do quantum da pena definitiva, o regime inicial de cumprimento de pena será definido com base no art. 33 do Código Penal. Não obstante o art. 2º, §1º, da hedionda lei nº 8.072/90 ter disposto que: "a pena por crime previsto neste artigo será cumprida integralmente em regime fechado", trata-se de disposição flagrantemente inconstitucional por ferir não só o princípio da individualização das penas, mas também a vedação constitucional a penas de caráter perpétuo.
A individualização da pena é um processo que se dá em três momentos jurídicos bastante distintos: legislativo, judicial e executório.
Em um primeiro momento o legislador fixa parâmetros para a fixação da pena: de 1 a 2 anos; de 4 a 8 anos; de 12 a 30 anos, etc. Não pode o legislador fixar diretamente a pena, pois a definição do quantum da pena é função do Poder Judiciário.
Num segundo momento, o judiciário fixa o quantum da pena adequado ao caso concreto e em um terceiro momento (executório) são analisados os pedidos de progressão de regime e livramento condicional, também de acordo com o caso concreto e o comportamento do preso.
Ora, se o legislador define que todo condenado por crime hediondo cumprirá sua reprimenda necessariamente em regime fechado, fere o princípio da individualização da pena e até mesmo o da divisão dos poderes, pois a fixação da pena ao caso concreto cabe ao Poder Judiciário e não ao Poder Legislativo. Por outro lado, cabe ao juiz da execução conceder a progressão de regime para aqueles condenados de bom comportamento prisional e negá-lo para os de mau comportamento. O legislador ao tratar igualmente casos concretos desiguais fere visivelmente o princípio constitucional da individualização da pena.
Infelizmente, por razões de política criminal, os tribunais têm entendido que o regime integralmente fechado para os crimes hediondos é constitucional o que só contribui para a superlotação dos presídios brasileiros.
A fixação da pena de multa não obedece ao rito previsto para a pena corporal. Após a fixação da pena privativa de liberdade e do seu regime de cumprimento, passará o magistrado a um novo procedimento que determinará a pena pecuniária do agente (evidentemente que se -e somente se - o tipo penal trouxer a previsão da pena de multa).
A pena de multa será fixada em duas fases distintas. Na primeira fase, não será considerada a situação econômica do réu, devendo ser a multa fixada proporcionalmente a gravidade do tipo de crime praticado e as circunstâncias que foram levadas em conta na fixação da pena corporal.
A pena na primeira fase não será fixada em unidades monetárias, mas em uma unidade denominada dia-multa, cujo valor será estabelecido na segunda fase de fixação da pena pecuniária com base na condição sócio-econômica do réu.
O número de dias-multa (cujo plural, em rigor, seria "dias-multas" já que é um substantivo composto formado por dois substantivos e, portanto, tem sua forma plural formada pela variação dos dois elementos) varia de 10 (dez) a 360 (trezentos e sessenta). O juiz, porém, deve ficar atento, pois isto vale para todo e qualquer crime. Assim crimes de pequeno potencial ofensivo como o furto e o estelionato devem ter suas penas de multa fixadas próxima ao mínimo legal (10 dias-multa) enquanto crimes graves, como o latrocínio, devem ter multas fixadas próximo ao máximo (360 dias-multa).
Fixados na primeira fase o número de dias-multa a serem pagos, caberá ao juiz na segunda fase a fixação de valor unitário de cada um destes dias-multa. Neste momento o juiz deverá levar em conta a capacidade sócio-econômica do agente devendo variar de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo a 5 (cinco) vezes esse salário.
A multa não paga não pode se converter em prisão, pois não há prisão por dívidas no ordenamento jurídico brasileiro salvo nos casos previstos pela Constituição. Assim, a execução da multa não é mais matéria penal e deverá ser realizada pelo Procurador da Fazenda Estadual (ou Federal, nos crimes federais).
A substituição da pena corporal por restritiva de direitos é a última etapa no processo de fixação da pena e deverá observar o disposto no art. 44 do Código Penal.
Os requisitos para a substituição da pena são: 1) crime culposo ou crime doloso com pena inferior a 4 (quatro) anos; 2) o crime não ter sido praticado com violência ou grave ameaça; 3) o réu não ser reincidente no mesmo crime (reincidência específica); 4) as circunstâncias judiciais serem favoráveis.
Obviamente se o juiz considerou na primeira fase da fixação da pena as circunstâncias judiciais favoráveis ao réu para fixar a pena-base, estas circunstâncias também devem ser consideradas favoráveis quando da análise da substituição da pena.
As penas iguais ou inferiores a 1(um) ano serão substituídas por uma prestação pecuniária ou uma restritiva de direitos.
As penas superiores a 1(um) ano serão substituídas por uma prestação pecuniária e uma restritiva de direitos ou por duas restritivas de direitos.
A prestação pecuniária não obedece ao critério de fixação com base em dias-multa, devendo ser determinada uma importância entre 1(um) e 360 (trezentos e sessenta) salários mínimos.
O código se refere a prestação pecuniária e, portanto, não é de boa técnica a fixação de pagamento de cestas básicas, uma vez que não são pecúnia (dinheiro) e podem ter valor variável.
A prestação pecuniária deve ser paga preferencialmente a vítima, mas se por qualquer motivo esta não puder receber o pagamento (vítima de homicídio culposo, por exemplo) o pagamento será feito a seus dependentes. Não havendo vítima nem dependentes ou no caso de não haver uma vítima determinada (crimes contra a saúde pública, por exemplo) a prestação pecuniária será paga a entidades assistenciais.
A prestação de serviços comunitários só pode ser aplicada em penas superiores a 6 (seis) meses e será cumprida á razão de 1 (uma) hora de tarefa por dia de condenação, fixadas de modo a não prejudicar a jornada normal de trabalho, tudo nos termos do art. 46 do CP.
Sursis:
Não sendo possível a substituição da pena, por ter sido o crime praticado com violência ou grave ameaça á pessoa e a pena sendo inferior a dois anos, poderá ser concedida a suspensão condicional da pena (sursis), obedecendo-se ao disposto no art. 77 do Código Penal.
Durante o período em que a pena estiver suspensa - que pode variar de 2 (dois) a 4 (quatro) anos - o condenado fica sujeito ás condições fixada pelo juiz com base no art. 78 do CP.
As penas substitutivas tornaram o sursis um instituto em desuso, mas ainda são efetivos para crimes como tentativa de roubo, em que o crime é praticado com violência, porém a pena não excede a 2 (dois) anos.
Não foi nossa pretensão esgotar os múltiplos aspectos da fixação da pena até porque se trata de tema com inúmeros detalhes a serem analisados em cada caso concreto.
Esperamos, no entanto, ter estabelecido alguns parâmetros que ajudem a estudantes e magistrados nos primeiros passos da importante tarefa de fixação da pena.
Autor:
Túlio Lima Vianna
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