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Da audiência trabalhista e o preposto: inexigibilidade da condição de empregado (página 2)

Carlos Nazareno Pereira de Oliveira

No mesmo diapasão, Valentin Carrion (2005, p. 685) preleciona que "a representação da pessoa jurídica por preposto em audiência, exige (em virtude de interpretação jurisprudencial) que este seja sócio, diretor ou empregado da representada".
Outro não é o posicionamento disposto na obra do renomado Eduardo Gabriel Saad (CLT Comentada), atualizada, revista e ampliada por José Eduardo Gabriel Saad e Ana Maria Saad C. Branco (2006, p. 829), in verbis:

4) Consoante o §1°, do artigo em epígrafe, o empregador tem a faculdade legal de fazer-se representar, na audiência, pelo gerente ou qualquer outro preposto que tenha conhecimento do fato e cujas declarações obrigarão o preponente (empregador). A expressão do artigo sob comentário – "ou qualquer outro preposto" – deu origem a uma polêmica, que ainda não terminou, a propósito do ponto de o preposto ser necessariamente ou não empregado da reclamada.
Acentua-se a tendência jurisprudencial a favor da tese de que o preposto deve ser empregado.

Destarte, sob esta ótica, não sendo o preposto empregado do pólo demandado, tem-se a invalidade da representação patronal em audiência, motivo pelo qual reconhecerá o magistrado a revelia do empregador, desconsiderando, até mesmo, eventual defesa apresentada.

Assim, a contumácia do réu conduz, indubitavelmente, à confissão ficta quanto à matéria de fato, oportunidade em que o julgador presumirá verdadeira a situação narrada pelo autor em sua proemial. Contudo, imperioso ressaltar que a aludida presunção se dará em caráter relativo, devendo o julgador aquilatar, com prudência, equidade e razoabilidade, a celeuma frente a todo o conjunto dos elementos de convicção.

II.2 – ENTENDIMENTO ANTAGÔNICO À SUMULA 377 DO TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO

Como o direito se trata de uma ciência insofismavelmente versátil, há, porém, outra corrente sobre este assunto, onde resta consolidado que, em verdade, não se faz necessária a existência da condição de empregado para que o preposto esteja legitimado a representar a empresa demandada em audiência.
Reputamos que tal entendimento é o correto, a despeito das respeitáveis opiniões antagônicas.
Neste liame, a própria literalidade do disposto no §1° do art. 843 do Diploma Consolidado, preconiza que o empregador poderá "fazer-se substituir pelo gerenteou qualquer outro preposto que tenha conhecimento do fato, e cujas declarações obrigarão o proponente". (O grifo não vem do original).
Ora, a norma é clara em não determinar, na alternativa do "qualquer outro preposto", a prerrogativa de ser o mesmo empregado, com Carteira de Trabalho e Previdência Social devidamente anotada pelo empregador. A única exigência que se impõe, indene de dúvidas, é que o aludido indivíduo "tenha conhecimento do fato".
Ademais, caso o preposto não demonstre sapiência acerca das circunstâncias fáticas aduzidas na exordial, aplicará o magistrado, em detrimento da empresa, a pena de confissão. Observemos, neste espeque, os seguintes julgados:

Brasil. Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região. PREPOSTO – DESCONHECIMENTO DOS FATOS – CONFISSÃO FICTA – Nos termos do parágrafo 1º do artigo 843 da CLT, o preposto tem por obrigação conhecer os fatos da lide. A aplicação da pena de confissão ficta decorre, portanto, do descumprimento de exigência legal. (RO 01382-2004-011 - 01-06-05). (TRT 9ª R. – Proc. 01382-2004-011-09-00-5 – (14283-2005) – Rel. Juiz Arnor Lima Neto – DJPR 14.06.2005) JCLT.843 JCLT.843.1
Brasil. Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região. CONFISSÃO FICTA – PREPOSTO QUE DESCONHECE OS FATOS – APLICABILIDADE – Se o empregador usa da faculdade de se fazer substituir por preposto, este deve conhecer os fatos que deram origem ao dissídio (art. 843, § 1º, CLT); o desconhecimento frusta a finalidade do depoimento pessoal, que é "instituto destinado a provocar a confissão da parte" (MOACYR Amaral Santos), pelo que equivale a recusa em depor. Conseqüentemente o Juiz deve aplicar-lhe a pena de confissão (art. 343, § 2º, CPC, aplicado subsidiariamente). (Juiz Fernando A. V. Damasceno). (TRT 10ª R. – RO 00008-2005-018-10-00-2 – 1ª T. – Rel. Juiz André R. P. V. Damasceno – J. 14.10.2005)
Brasil. Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região. PREPOSTO – FALTA DE CONHECIMENTO DOS FATOS – EXEGESE DO § 1º DO ART. 843 DA CLT – CONFISSÃO FICTA – O desconhecimento dos fatos por parte do preposto caracteriza a confissão ficta do empregador. (TRT 12ª R. – RO-V 00148-2004-018-12-00-9 – (11686/2005) – Florianópolis – 3ª T. – Rel. Juiz Gilmar Cavalheri – J. 13.09.2005) JCLT.843 JCLT.843.1

Não há, portanto, qualquer prejuízo ao empregado e sim a assunção de risco, em certas circunstâncias fáticas, pelo pólo patronal, quando apresenta, em audiência, preposto que não se trata de empregado.
Inexiste, em nosso sentir, razões jurídicas para se impor tal exigência em audiência trabalhista. Qualquer determinação nesta órbita implica no total desrespeito ao próprio teor do §1° do art. 843 da CLT e, ainda, afronta, diretamente, aos princípios constitucionais do devido processo legal, ampla defesa e contraditório, o que, inclusive, poderá dar ensejo, até mesmo, ao futuro manejo de ação rescisória. Outro não é o entendimento de parte da jurisprudência pátria:

Brasil Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região. AÇÃO RESCISÓRIA – Viola a Lei a decisão que exige a condição de empregado ao preposto que comparece para depor. (TRT 5ª R. – AR 00191-2004-000-05-00-4 – (32.497/04) – Redª Juíza Elisa Amado – J. 06.12.2004) (Destaque aditado)
Brasil. Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região. PREPOSTO – NÃO-EMPREGADO – ART. 843, § 1º, CLT – O Texto Legal não obriga que o empregador indique como seu representante em audiência pessoa que a ele se vincule na condição de empregado. Não há este termo no texto de Lei, e nem esta é a intenção do legislador. (TRT 12ª R. – RO-V 01121-2004-033-12-00-6 – (14381/2005) – Florianópolis – 1ª T. – Redª p/o Ac. Juíza Lourdes Dreyer – J. 18.11.2005) JCLT.843 JCLT.843.1
(Grifo proposital)
Brasil. Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região. PREPOSTO NÃO-EMPREGADO-AUSÊNCIA DE CONFISSÃO – A lei apenas exige que o preposto designado tenha conhecimento dos fatos articulados na inicial, atribuindo ao proponente a responsabilidade pelas declarações do preposto (art. 843, § 1º, da CLT). Assim, não há que se falar em aplicação dos efeitos da confissão ficta. Mormente no caso, em que o preposto da ré ora impugnado, compareceu apenas na primeira audiência (inaugural). Recurso do reclamante que se nega provimento, no particular. Vínculo empregatício-não configurado. O que os presentes autos dão conta é que as partes buscam resolver suas querelas, valendo-se de meios inadequados, insistindo em suas teses muito mais por zanga que por amparo a eventual direito, e acabam por tumultuar a já assoberbada função jurisdicional. Da análise das provas, confirmou-se a tese da reclamada, de que o autor foi arrendatário da ré até certo período e, posteriormente, o autor possuía o direito de uso de um horário na programação da reclamada (de 30 minutos diários), com o pagamento pela publicidade dos patrocinadores revertendo exclusivamente ao reclamante. Portanto, não configurada a alegada existência de vínculo empregatício. (TRT 9ª R. – Proc. 00775-2001-023-09-00-9 – (03280-2004) – Rel. Juiz Arnor Lima Neto – DJPR 27.02.2004) JCLT.843 JCLT.843.1 (Negrito proposital)

Posiciona-se, no mesmo liame, o magistrado Sérgio Pinto Martins (2003, p. 250), ao detalhar que:

"A utilização pela lei do termo preposto é que dá margem a sérias controvérsias, pois o gerente não deixa também de ser um preposto. Preposto vem do latim praepostus, de praeponere, que tem o significado de posto adiante, à testa da operação, para conduzi-la ou dirigi-la. Não está escrito no §1° do art. 843 da CLT que o preposto tenha que ser empregado, pois ela emprega a expressão "qualquer outro preposto", não mencionando que deve haver relação de emprego entre essa pessoa e a empresa. O preposto vem a ser um substituto e não é sinônimo de empregado. Analisando-se a origem da palavra preposto, que era encontrada em vários dispositivos do Código Comercial (arts. 74 a 85), verifica-se que aquele não tem que ser necessariamente empregado, mas podem sê-lo os feitores, guarda-livros (contadores, atualmente), caixeiros, como se depreende da leitura daquelas disposições. O requisito básico nesses casos é que o preponente possa ser substituído por outra pessoa, para certos casos. É o que deveria ser observado no processo do trabalho, pois o único requisito que a CLT exige do preposto é de que tenha conhecimento do fato, pois suas declarações obrigarão o preponente. Só o empregador poderá nomear o preposto, em função de ter confiança irrestrita nessa pessoa, arcando, assim, com os atos por ela praticados. Nota-se, dessa forma, que o preposto não precisaria ser empregado, podendo o empregador ser substituído por qualquer outra pessoa, desde que ela tenha conhecimento dos fatos, inclusive por meio de terceiros, não necessitando tê-los presenciado. Assim, o contador autônomo, que faz a folha de pagamento da empresa, poderia substituir o empregador na audiência, como admitimos. Argumenta-se que nesse caso estaria sendo instituída a indústria dos prepostos, mas o que se verifica na prática é que aqueles prepostos de grandes empresas, que sempre vão à Justiça do Trabalho, já o são de maneira profissional, pois sempre comparecem à Vara do Trabalho. Como não se exige patrocínio de advogado para ingressar com ação na Justiça do Trabalho, nada impede que leigos substituam o empregador, exercendo o ius postulandi na audiência para aqueles, desde que tenham conhecimento do fato, não necessitando que sejam empregados."

O conspícuo Wagner D. Giglio (2003, p. 176/177), por sua vez, relativiza o pensamento ora advogado:

"Excepcionalmente, porém, acreditamos deva ser admitido que o empregador, principalmente aquele que dirige pequeno empreendimento, sem departamento pessoal, se faça representar por contador autônomo encarregado da escrituração: nessas condições, inexiste má-fé ou intuito de exercer a advocacia ilegalmente, e a inteligência que demos ao disposto no art. 843, §1°, da CLT permite se considere legítima a representação. Na pior das hipóteses, o empregador teria manifestado o desejo de se defender e não poderia ser considerado revel; assim a audiência teria de ser adiada, para que a empresa regularizasse a representação, nomeando preposto empregado."

Outrossim, muito tem se percebido, ainda, a aplicação da revelia e seus conseqüentes efeitos, sob o pálio dos preceitos contidos na Súmula n° 377 do C. TST, quando o empregador se faz representar, em Juízo, por outra pessoa com procuração específica para tal ato. Ora, não há qualquer motivação plausível para se ratificar tal posicionamento, eis que o procurador, in casu, equipara-se ao próprio empregador, o que torna veementemente inexigível, igualmente, a condição de empregado do mesmo.
Este é o entendimento de nossa jurisprudência em análogas situações, destacando-se o exímio e perspicaz entendimento do doutrinador e magistrado paraibano Wolney de Macedo Cordeiro:

Brasil. Tribunal Regional do Trabalho da 13ª Região. PREPOSTO – PROCURADOR COM AMPLOS PODERES – REGULARIDADE DA REPRESENTAÇÃO – O entendimento de que o preposto deve ser empregado do reclamado não exclui a possibilidade de que este mister seja desempenhado em Juízo por um procurador a quem foram conferidos amplos poderes, inclusive para gerir o empreendimento. Na hipótese, o preposto equipara-se ao próprio empregador. (TRT 13ª R. – RO 00559.2004.001.13.00-7 – Rel. Juiz Wolney de Macedo Cordeiro – DJPB 10.07.2005) (O grifo não vem do original)
Brasil. Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região. PREPOSTO – QUE É PROCURADOR E ADMINISTRADOR DA RECLAMADA – COMPARECIMENTO À AUDIÊNCIA – LEGITIMIDADE – REVELIA AFASTADA – Não obstante tenha a doutrina e a jurisprudência perfilhado o entendimento acerca da necessidade do preposto ser empregado da reclamada, a verdade é que existem situações que comportam exceções, mesmo porque, o disposto no § 1º do art. 843 da CLT, não exige que o preposto seja empregado da reclamada, facultando a indicação daquele "que tenha conhecimento do fato, e cujas declarações obrigarão o proponente". No caso dos autos, embora não haja prova cabal de que o preposto fosse empregado da reclamada, ele era seu procurador e administrador. Basta uma leitura do instrumento de procuração pública dos autos para se constatar que foi nomeado procurador do representante da reclamada tendo-lhe sido conferidos os mais amplos poderes para representá-la em juízo ou fora dele, podendo inclusive admitir e demitir funcionários, assinar contratos de trabalho e carteira de trabalho; receber tudo o que for devido à outorgante; pagar o que dever, passar recibos, dar e aceitar quitações; assumir compromissos e obrigações; nomear prepostos; representar a outorgante perante a justiça do trabalho, em todas as suas instâncias, dentre outros poderes. Afigura-se, pois, incabível a declaração de revelia e confissão ficta decretadas na origem, sob argumento de que o preposto não é empregado da empresa, mormente considerando que a audiência inicial e instrutória transcorreu normalmente, com dispensa do depoimento do representante da reclamada, vista ao reclamante da defesa e documentos, tendo sido encerrada com razões finais remissivas, sem qualquer protesto por parte do autor quanto à regularidade da representação da empresa. Recurso provido. (TRT 15ª R. – ROPS 0019-2005-086-15-00-3 – (46547/05) – 5ª C. – Rel. Juiz Lorival Ferreira dos Santos – DOESP 23.09.2005 – p. 70) JCLT.843 JCLT.843.1

III – CONCLUSÃO

Diante do exposto, a despeito dos respeitáveis posicionamentos antagônicos, conclui-se que resta inteiramente claro que o §1° do art. 843 da Norma Celetista não exige, necessariamente, a condição de empregado ao preposto do pólo patronal, mas tão somente que o mesmo, mediante carta de preposição ou procuração específica, tenha plenos conhecimentos acerca dos fatos narrados na peça vestibular, sob pena de aplicação da confissão quanto à matéria fática.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Organização de Luiz Flávio Gomes. 2. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2000.
BULOS, Uadi Lammêgo. Constituição Federal anotada. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2003.
CARRION, Valentin. Comentários à consolidação das leis do trabalho. 30. ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2005.
DELGADO, Maurício Godinho. Curso de direito do trabalho. 3. ed. São Paulo: Editora LTr, 2004.
GIGLIO, Wagner D. Direito processual do trabalho. 13. ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2003.
MARTINS, Sérgio Pinto. Direito processual do trabalho. 19. ed. São Paulo: Editora Atlas S.A., 2003.
SAAD, Eduardo Gabriel; SAAD, José Eduardo Duarte; BRANCO, Ana Maria Saad C. CLT Comentada. 39. ed. São Paulo: Editora LTr, 2006.

 

Carlos Nazareno Pereira de Oliveira

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