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Imunidade ou incidência nas transações com órgãos do poder público (página 2)

Fernando Lima

 

1.2.11- Igualdade (art. 153, §1o.);

1.2.12- Princípio da legalidade da tributação (art. 153, §§2o. e 29);

1.2.13- Vedação de efeitos confiscatórios (art. 153, §§ 11 e 22).

1.3- Esses princípios disciplinadores da tributação, cuja presença se explica, em grande parte, pelo convívio de três competências fiscais simultâneas sobre o mesmo campo econômico, resultante de nosso federalismo tridimensional, têm sido inscritos em todas as Constituições Brasileiras do período republicano.

1.3.1- Originados, alguns desses princípios tributários, na jurisprudência norte-americana, integraram-se em regras constitucionais, estáveis e eficazes pela rigidez de nossas Constituições e pelo controle jurisdicional de    constitucionalidade das leis e atos administrativos que adotamos, resultando complexa aparelhagem de freios, que limita os excessos acaso detrimentosos à economia e à preservação do Regime e dos direitos individuais.

1.3.2- Deve-se observar a inexistência, no Brasil, do cruciante problema que é, nos Estados Unidos, a competência concorrente. Nossa Constituição, ao realizar a partilha da competência tributária, entre as pessoas jurídicas de direito público interno, evita os conflitos de competência tributária entre União, Estados, Distrito Federal e Municípios, com isso resguardando, ainda, os contribuintes da bitributação.

1.4- A Constituição prevê porém (art. 18,  §1o.) uma Lei Complementar para regular as limitações ao poder fiscal, o que já denota a relevância dessa matéria, pela maioria absoluta exigida para sua aprovação.

1.5- As limitações constitucionais ao poder de tributar estão hoje, assim, genericamente estabelecidas em nossa Lei Fundamental, enumeradas aquelas hipóteses em que União, Estados, Distrito Federal e Municípios não podem instituir nem cobrar impostos.

2. IMUNIDADE, ISENÇÃO E ANISTIA

2.1- Cumpre não confundir as imunidades, estabelecidas na Constituição, com  a isenção ou a anistia, que decorrem de lei.

2.1.1- As imunidades impedem a constituição do crédito tributário, isto é, não ocorre o fato gerador da obrigação tributária. A imunidade tributária exclui o nascimento da obrigação tributária principal, não surgindo, portanto, a figura do sujeito passivo (contribuinte). Imunidade, assim, é "não-incidência", ou seja, é a falta de ocorrência do fato gerador da obrigação tributária, por estar o sujeito passivo fora do alcance da lei.

2.1.2- Tratando-se de isenção ou anistia, o crédito tributário, que já se havia constituído, deixa de existir, em virtude de uma lei. O tributo incide, mas o contribuinte é dispensado de seu pagamento (hoje, a União pode, mesmo, mediante Lei Complementar e atendendo a relevante interesse social ou econômico nacional, conceder isenções de impostos estaduais ou municipais).

2.1.3- São, portanto, a isenção e a anistia, excludentes do crédito tributário, referindo-se a anistia, porém, a infrações da legislação, provocadas por impasses surgidos no sistema empresarial, pelo acúmulo aparentemente inesperado de encargos financeiros decorrentes da cobrança efetiva dos créditos fiscais ou em virtude dos resultados de fiscalizações e conferências mais rigorosas e intensivas, que levam à expedição de leis de anistia e facilidades fiscais (remissão total ou parcial de impostos e multas, pagamento parcelado de débitos fiscais, anistia de crime fiscal, retificação de declaração de rendimentos e bens, possibilidade de retorno de recursos transferidos irregularmente para o exterior, pagamento de débitos fiscais mediante a dação de bens imóveis, etc.)

3. CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL

3.1. As imunidades, estabelecidas, como vimos, na Constituição Federal, são enumeradas no Código Tributário Nacional (Lei 5172, de 25.10.66), em seus artigos 9 a 15, cuja redação já mereceria alguns reparos, por terem regulamentado, embora já alteradas pela Emenda Constitucional no. 18, de 1o. de dezembro de 1965, as normas correspondentes da Constituição de 1946.

3.2.Tratando da exclusão do crédito tributário, o mesmo diploma legal regulamenta, em seus artigos 175 a 182, a isenção e a anistia.

4. IMUNIDADE RECÍPROCA DOS ÓRGÃOS DO PODER PÚBLICO

4.1. A sobrevivência de três órbitas governamentais autônomas, inerentes ao nosso sistema federativo, embora hoje caracterizado como um federalismo financeiro, ou cooperativo, como se denota pela participação dos Estados e Municípios na receita tributária da União e pelas normas referentes a calamidades públicas, levou a Constituição Brasileira a adotar o princípio da imunidade recíproca.

4.1.1- Resultante da jurisprudência norte-americana, com a Teoria dos Poderes Implícitos, que se criou em torno do caso Mc Culloch contra Maryland, é hoje entre nós princípio constitucional a imunidade recíproca das pessoas jurídicas de direito público interno:

         "Art. 19- É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

................................

III- instituir imposto sobre:

a)       o patrimônio, a renda ou os serviços uns dos outros;

................................

§1o. – O disposto na alínea "a" do item III é extensivo às autarquias, no que se refere ao patrimônio, à renda, aos serviços vinculados às suas finalidades essenciais ou delas decorrentes.

4.1.3- Pode-se observar uma norma geral para dimensionamento dessas imunidades: a de somente serem elas reconhecidas na inexistência de exploração econômica desvinculada das finalidades da pessoa jurídica de direito público interno.

4.1.4- Evidentemente, como não existe outro Direito senão aquele que, em dado período, efetivamente vigora, isto é, aquele que os tribunais aplicam segundo a inteligência emprestada ao texto, a maior ou menor extensão dessa imunidade recíproca dependerá da palavra do mais autorizado intérprete da Constituição, que é o Supremo Tribunal Federal.

5. IMPOSTO, TAXA E CONTRIBUIÇÃO DE MELHORIA

5.1. Deveremos, na interpretação dessas normas constitucionais, tentar esclarecer, inicialmente, quanto à extensão da imunidade recíproca dos órgãos do Poder Público, que ela se refere apenas aos impostos, não se incluindo nas vedações que a Constituição faz à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios a cobrança de taxas ou contribuições de melhoria.

5.1.1- Isso é justificado, não apenas pela restrição no próprio texto constitucional, que não se refere a tributos (englobando imposto, taxa e contribuição de melhoria), mas a imposto, utilizada aqui a palavra em seu sentido técnico, como também pela própria natureza de contraprestação por um serviço, efetivamente realizado ou apenas colocado à disposição do contribuinte, que caracteriza taxas e contribuições de melhoria, em oposição aos impostos.

5.2- Imposto, taxa e contribuição de melhoria são espécies do gênero tributo.

5.2.1- Tributo é toda e qualquer prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada (Código Tributário Nacional, art. 3o.)

5.2.2- Imposto é o tributo cuja obrigação tem por fato gerador uma situação independente de qualquer atividade estatal específica, relativa ao contribuinte (Código Tributário Nacional, art. 16)

5.2.3- A taxa é o tributo pago em contraprestação pelos serviços relacionados com o exercício regular do poder de polícia, ou pela utilização efetiva ou potencial de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos à sua disposição  (Constituição Federal, art. 18, I e §2o.; Código Tributário Nacional, arts. 77 a 80).

5.2.4- Contribuição de melhoria é o tributo pago em decorrência da valorização ocorrida em imóveis, como conseqüência da execução de obra pública (Constituição Federal, art. 18, II; C.T.N., arts. 81- 82).

6. IMPOSTOS DIRETOS E IMPOSTOS INDIRETOS

6.1- Mas, referindo-se apenas aos impostos, abrangeriam as imunidades todo e qualquer imposto, em toda e qualquer situação?

6.1.1- Os órgãos do Poder Público, Federal, Estadual, do Distrito Federal, Municipal e suas autarquias, não deveriam pagar, em hipótese nenhuma, qualquer imposto?

6.2- Podemos enquadrar os diversos impostos em cinco grupos:

6.2.1. Impostos sobre o comércio exterior:

6.2.1.1. Imposto de Importação (federal)

6.2.1.2. Imposto de Exportação (federal)

6.2.2. Impostos sobre o patrimônio e a renda:

6.2.2.1. Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural (federal)

6.2.2.2. Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana (municipal)

6.2.2.3. Imposto sobre a Transmissão de Bens Imóveis (estadual)

6.2.2.4. Imposto sobre a Renda (federal)

6.2.3. Impostos sobre a Produção e circulação:

6.2.3.1. Imposto sobre Produtos Industrializados (federal)

6.2.3.2. Imposto sobre Operações relativas à Circulação de Mercadorias (estadual)

6.2.3.3. Imposto sobre Operações de Crédito, Câmbio e Seguro ou relativas a títulos ou valores mobiliários (federal)

6.2.3.4. Imposto sobre Serviços de Transporte e Comunicações (federal)

6.2.3.5. Imposto sobre Serviços de qualquer natureza (municipal).

6.2.4. Impostos Especiais:

6.2.4.1. Imposto sobre Lubrificantes e Combustíveis Líquidos e Gasosos (federal)

6.2.4.2. Imposto sobre Energia Elétrica (federal)

6.2.4.3. Imposto sobre Minerais do País (federal)

6.2.5. Impostos Extraordinários (instituídos de acordo com o artigo 22 da Constituição Federal).

6.3- Adotado o enfoque puramente econômico, podemos considerar a existência de impostos diretos e impostos indiretos.

6.3.1- Nos impostos diretos, o contribuinte "de direito" é o mesmo contribuinte "de fato".

6.3.2- Nos impostos indiretos, o contribuinte "de direito" é um e o contribuinte  "de fato" é outro, porque possibilitam esses impostos a ocorrência do fenômeno da repercussão, pelo qual o valor do imposto é acrescentado ao preço da mercadoria, para ser pago pelo consumidor final.

6.3.2.1- Nos impostos indiretos, como por exemplo o I.C.M., a carga tributária é suportada pelo consumidor final, uma vez que o produtor, industrial, comerciante, cooperativa ou importador funcionam, na qualidade de contribuintes de "direito", como meros emprestadores de capital ao Fisco, pagando o imposto mas acrescentando-o ao preço da mercadoria. Dessa forma, o comprador, como contribuinte "de fato", é quem realmente paga esse tributo.

7. IMPOSTO SOBRE PRODUTOS INDUSTRIALIZADOS

7.1- Ainda na vigência da Constituição de 1.946, houve muita dúvida, sobre se as pessoas de direito público, gozando de imunidade tributária, estariam sujeitas ao pagamento do imposto de consumo.

7.1.1- A tese da não incidência encontrou guarida no Tribunal Federal de Recursos e também em vários Pareceres da Consultoria Geral da República, por visar especificamente ao consumo, e não à produção, o imposto em referência, tanto que a lei mandava incorporá-lo no preço da mercadoria para ser pago pelo consumidor, que assim era o contribuinte "de fato" do referido tributo. Conseqüentemente, passaria a ser indevida sua incidência, nas compras efetuadas por quem gozasse dos favores da imunidade tributária.

7.1.2- Com o advento da Constituição de 1967, modificou-se a situação. O tradicional impôsto de consumo foi abolido e criado novo tributo com a denominação de Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI). A incidência específica do Imposto passou a ser sobre a produção, embora o fato gerador seja a saída da mercadoria.

7.1.3- A situação não continua sendo a mesma do antigo Imposto de Consumo, porque agora já não existe a relação "Fisco – contribuinte de fato", ou "Fisco – consumidor". A aquisição do produto não constitui fato gerador do I.P.I.  Assim sendo, a imunidade tributária somente alcança o I.P.I., quanto a produtos estrangeiros, diretamente importados pelo ente público fiscalmente imune, ou quando este se encontra na situação do industrial – contribuinte, uma vez que, nessas hipóteses, a intributabilidade decorre de limitação constitucional.

7.1.4- Assim, muito embora seja certo que o imposto, pela repercussão, vai incorporar-se ao preço e, conseqüentemente, refletir-se nos últimos lances da linha de circulação da mesma mercadoria, e até onde esta se for absorver ou consumir, essa incidência indireta, meramente econômica, ocorre, porque as repartições fiscais exigem o imposto dos fornecedores das mercadorias e não dos órgãos aos quais se fazem os fornecimentos, uma vez que são os contribuintes "de direito", porquanto o tributo recai sobre a produção, não sendo fato gerador a simples aquisição pelo consumidor, hipótese em que haveria imunidade.

8. IMPOSTO SOBRE OPERAÇÕES RELATIVAS À CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS

8.1. O mesmo ocorre quanto ao I.C.M., cujo fato gerador está definido no Decreto-lei 406, de 31.12.68, que alterou as normas anteriores do Código Tributário Nacional:

         "Art. 1o.- O imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias tem como fato gerador:

I-                   a saída de mercadorias do estabelecimento comercial, industrial ou produtor;

II-               

III-             a entrada, em estabelecimento comercial, industrial ou produtor, de mercadoria importada do exterior pelo titular do estabelecimento;

IV-          

V-              o fornecimento de alimentação, bebidas e outras mercadorias em restaurantes, bares, cafés e estabelecimentos similares"...

9. CONCLUSÃO

9.1- Estabelecido o tratamento da matéria para o I.P.I. e o I.C.M., restaria fazê-lo em relação aos outros impostos: identificar o fato gerador de cada um deles para, estudando cada caso concreto, concluir pela imunidade ou pela incidência em relação a determinada pessoa jurídica de direito público interno.

9.2- A imunidade constitucional de que são titulares a União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e as respectivas autarquias, refere-se, portanto, ao patrimônio, à renda e aos serviços, não abrangendo na área proibida os chamados impostos indiretos, ainda que sua repercussão econômica venha a afetar aquelas entidades de direito público, pois a dispensa do tributo devido somente pode ser invocada nos casos em que o titular do benefício seja o contribuinte "de direito" do imposto dispensado por lei.

9.2.1- Essa orientação deveu-se ao expressivo percentual de aquisições feitas pelos órgãos do Poder Público, que faria com que qualquer outra orientação que se viesse  a adotar na aplicação da lei, por via de interpretação mais liberal, implicasse em desastrosas conseqüências para a arrecadação.

9.3- Atendendo a essas considerações, a Portaria GB-289, do Ministro da Fazenda, assim regulamenta a matéria:

I-                   A imunidade constitucional de que são titulares os órgãos do Poder Público da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, refere-se ao patrimônio, à renda e aos serviços e exclui o nascimento da obrigação tributária principal relativa a esses impostos.

II-                São responsáveis, perante o Fisco, pelo pagamento dos tributos devidos, as pessoas ou entidades que a lei, em cada caso, definir como contribuinte ou responsável.

III-             A isenção, como dispensa do tributo devido, só pode ser invocada nos casos em que seu titular seja o contribuinte do imposto dispensado por lei, ou nas hipóteses por esta expressamente declaradas.

IV-           As pessoas que transacionarem com os órgãos do Poder Público não poderão excluir, nas referidas transações, nos termos dos itens precedentes, as parcelas relativas aos impostos a que estejam obrigados como seus contribuintes e que, de acordo com a legislação vigente, devam constar destacadas na nota fiscal.

 

Fernando Lima

profpito[arroba]yahoo.com



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