Como se sabe, a CF, por seu art. 5º, XLIII, introduziu no ordenamento jurídico
nacional a figura do crime hediondo. A redação do dispositivo
mostrou-se clara desde então, no sentido de que "a lei considerará
crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou
anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes
e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles
respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los,
se omitirem".
O fim almejado pelo constituinte foi que a lei ordinária criasse empecilhos,
impedindo a concessão de benefícios a quem perpetrasse crimes
da espécie ou assemelhados. Além do executor material da infração,
também os partícipes, mesmo que por omissão (CP, art. 13,
§ 2º), ficaram na mira do dispositivo constitucional.
A lei ordinária não tardou. Em 1.990, foi sancionada a Lei 8.072,
trazendo todas as diretrizes penais e processuais. Não conceituou o crime
hediondo, deixando tal missão para a doutrina, o que se mostrou correto,
porquanto o legislador, em regra, comete deslizes em suas conceituações.
No entanto, provocou profunda alteração no universo jurídico
criminal, com o endurecimento sensível nos campos penal e processual.
Pari passu com as vedações processuais e penais amalgamadas
no texto constitucional, o legislador infraconstitucional aumentou penas, criou
o regime integral fechado, vedou a liberdade provisória e a negação
de qualquer instituto despenalizante durante a execução da pena,
ressalvado o livramento condicional após o cumprimento de dois terços
da punição.
Em 23.02.06, o plenário do STF (por 6 votos a favor e 5 contra) ao julgar
o Habeas Corpus 82.959/SP, posicionou-se pela inconstitucionalidade do
§ 1º do art. 2º da Lei n. 8.072/90, declarando que a adoção do
regime integral fechado e a impossibilidade de progressão violavam a
Carta Magna.1
Se de um lado passou a valer a progressão de regime para todo e qualquer
crime, a decisão do STF trouxe um quadro no mínimo esdrúxulo
e um desequilíbrio ímpar, fatalmente desproporcional e inconcebível.
Explica-se. Se os autores de crimes de menor e médio potencial ofensivo
tinham direito à progressão após o cumprimento de um sexto
da pena aplicada (LEP, art. 112), com o decisório os condenados por crimes
hediondos passaram a ter a mesma benesse; não mais seriam obrigados a
cumprir dois terços da pena em clausura. Em outras palavras, um crime
hediondo ou equiparado passou a ter o mesmo peso, quando da fase de execução
da pena, dos demais crimes de potencial ofensivo inferior.
Boa parte dos Juízes das Execuções Penais não aderiu
ao posicionamento do STF, vez que não possui caráter vinculante,
bem como por ter sido deduzida em caso inter-partes (controle difuso) sem efeito
erga omnes.2 Não se olvide, outrossim, que a decisão
foi apertadíssima, seis a cinco. De qualquer modo, o grande mote para
os magistrados reside na desproporcionalidade derivada de tal decisório,
ou seja, equiparou-se um furtador a um estuprador ou homicida; um mero agressor
a um latrocida.
No entanto, em outra ponta, boa parte de magistrados das Execuções
Penais aderiu à decisão do STF, concedendo a progressão
do fechado para o semi-aberto, tão logo cumprido aquele ínfimo
percentual de pena.
A desproporcionalidade reclamada por aqueles magistrados acabou tendo um ponto
final com a edição da Lei 11.464/07, objeto maior deste trabalho.
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