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Realidade, conhecimento e aprendizagem no século
XXI. Três temas de grande importância à ação
dos educadores, dos gestores em educação, dos psicopedagogos institucionais
e clínicos, enfim, temas de relevância quando se trata de cotidiano
escolar.
Faz tempo, dedico meus estudos e escritos sobre a construção do
olhar, tema que é recorrente em minha produção teórica
e minhas reflexões sobre aprendizagem, educação e psicopedagogia
(1).
Aqui, neste artigo iniciado com uma expressão que muito ouvi e vivenciei
nos dois últimos anos pela ação psicopedagógica
e de docência em cidades no sul de Minas Gerais, "Óia Procê
Vê", faço novas reflexões sobre este olhar, objetivado
a compartilhar idéias que possam, talvez, colaborar com a revisão
paradigmática que percebemos tão presente em nosso tempo. A partir
disso, elaboro uma divisão didática para este texto, elencando
algumas anotações sobre realidade, depois sobre conhecimento e
por fim aprendizagem no século XXI, elaborando, a posteriori, um pequeno
conjunto de reflexões como proposta de conclusão.
"Digo: o real não está na saída
nem na chegada:
ele se dispõe para a gente é no meio da travessia"
Guimarães Rosa
Para percebermos a realidade e suas complexidades precisamos ter
nossas consciências ampliadas com a observação critica do
contexto onde, de algum modo, nos inserimos. A análise do real depende
dos olhos de quem vê, ou seja, é sempre a partir de nossas vivências
que buscamos compreender o que está em nosso entorno. São as experiências
que acumulamos através de nossa trajetória aprendente que nos
dão suporte para tal movimento, pois essencial é iniciarmos com
uma busca de reflexão "sobre o onde estamos, o como estamos e com
quem estamos" (2).
Neste sentido, a tarefa de compreensão deste real faz com
que tenhamos que fazer um outro movimento: o da escolha. Ou seja, que instrumentais
usarei para tentar compreende-lo? Este é um primeiro passo necessário,
pois somente a partir dele podemos dar outros passos, como o de intervir, interferir,
sugerir, modificar, propor. Por que afirmo isso? Para olhar, para ver; preciso
sempre escolher as "lentes" com que vejo, ou seja, não se pode
compreender o real sem uma teoria que o justifique. Afinal, aquilo que existe
efetivamente e é real, precisa ser explicado.
À medida que a realidade é
contraditória, inacabada, indeterminada, ela possui inúmeros aspectos
e formas de percepção, porque é plural e diversa. Tentar
compreender o real envolve perceber múltiplos aspectos que o compõem,
diferenciando-os e tenha a noção de que tal "percepção
perpassa por formação de juízo de valores, por escolhas
ideológicas, por modos e formas de ver e compreender o mundo e suas complexas
relações." (3).
O processo interno que desenvolvemos, então, é de
saber que é a nossa inserção com o contexto e meio social
que nos dá a capacidade de agir, interagir, viver enfim: é a diferenciação
que fazemos entre o que nos é possível a fornecedora de nossas
matrizes psicológicas de percepção deste real. A busca
pelo conhecimento só acontece quando desejamos compreender a vida e suas
complexidades a partir desta diferenciação. Se acomodados com
a nossa realidade primeira, nada realizamos e nada fazemos, não seguimos
adiante. A insatisfação com o que está posto sempre foi
o que moveu o mundo, o que possibilitou um número imenso de avanços,
invenções, criações. O humano
se constituiu como tal por interagir com o que era dado como real e, ao assim
fazer, buscar alterá-lo, mudá-lo, transformá-lo enfim,
ou, ao "menos, termos uma maior compreensão de sua dinâmica."
(4).
A dialética existente entre o real e o que se
deseja ser real vincula-se a proposição de compreender tal dinâmica,
sempre presente na vida humana. Na trajetória evolutiva de nosso planeta,
enfim, na evolução da humanidade, sempre existiram os que desejaram
uma outra realidade e inúmeros exemplos históricos poderíamos
aqui relacionar. É interessante, entretanto, perceber que em processo
de transformações paradigmáticas "... o novo é
a superação do velho pela sua incorporação e transformação.
Está contido no velho como germe e como causa mortis. Destrói
o velho, fazendo nascer dele o novo, como a morte da semente faz germinar a
planta e a morte da flor germina o fruto..." (5).
Para conhecer é preciso a investigação
e a descoberta, que são geradoras da alegria de aprender. É a
curiosidade que faz, refaz, constrói e reconstrói o conhecimento
em permanente movimento. A pesquisa, como princípio educativo, fornece
inúmeras possibilidades de formação humana e de aprendências.
O conhecimento, percebido como modo de aquisição de repertório
de saberes codificados é, antes de tudo, o domínio de ferramentas
e instrumentos para a melhoria da qualidade da vida humana, compreendida em
suas múltiplas dimensão, em sua integralidade. Compreender o mundo
que nos é essencial para o viver com dignidade, e ao assim, desenvolver
as nossas inúmeras potencialidades com sujeitos. Conhecer é o
prazer de compreender, de interrogar, questionar.
Uma busca perene é o que deve ser a busca pelo conhecimento
e, por isso, para conhecer mais e cada vez melhor, precisamos sempre estar em
movimento de aprender e aprender, pois novos desafios sempre surgem, fazendo
com que tenhamos que reaprender novos conteúdos e desaprender o que não
é mais de serventia. Os processos do conhecer sempre serão inacabados
e incompletos, em permanente construção: para conhecer é
necessário encontrar prazer na própria procura, é buscar
sempre novos significados para tal ato humano, percebendo que conhecer "significa
penetrar através da superfície, a fim de chegar às raízes
e, por conseguinte, às causas; conhecer significa "ver" a realidade em
sua nudez".(6).
Conhecer, talvez seja nosso modo de buscar alguma lucidez em num mundo tão
complexo e repleto de idiossincrasias, com tantos desafios para que a vida humana
seja valor maior a ser compreendido por todos que exercem alguma forma de poder
e influência. Conhecer também pode ser a ampliação
do sentido da própria vida. E mais uma vez, recorro à poesia,
um trecho de Orides Fontela, para ilustrar este pensar:
"(...) a busca do conhecimento não é para nada"
e sim VIDA, aqui e agora.
E é esta vida que precisa ser resgatada (...)
...na raiz cega deste espanto/ há um cristal (...)
quem o fitar ficará lúcido para sempre".
"Quem ensina aprende ao ensinar,
quem
aprende ensina ao aprender.".
Paulo
Freire
Muito escrevemos e falamos, discutimos e ouvimos sobre aprendizagem, este fantástico
fenômeno humano, onde a vida ganha sentido e faz com que, enquanto espécie,
sigamos adiante. Leituras vinculadas aos novos paradigmas em educação
nos mostram o quanto à vida humana é focada na aprendizagem: somos
animais que aprendem, constantemente, durante toda a nossa vida.
Aprender é, por isso, energia vital e força maior que conduz nossos
atos de sermos e estarmos em interação com os outros, com o mundo
e com a herança histórica de nossa humanidade. Aprender é
fazer parte de, é interagir com a diferença, é olhar para
poder ver, ampliando recursos internos e nossas capacidades de assimilação,
acomodação e estruturação, em movimento dinâmico
e permanente.
Ensinantes e aprendentes comungam visões de mundo, encontram idéias
parecidas e, principalmente, lidam com a diversidade de percepções
do real, da realidade que nos é presente. A mudança essencial
a ser perseguida neste nosso complexo tempo é buscarmos, então,
criarmos novos modos de olharmos para os fenômenos que a vida nos apresenta.
A diversidade que encontramos amplia nossas possibilidades de aprender e, por
isso, ensinar é desafio sempre novo, visto estarmos inseridos num novo
tempo, repleto de estímulos e de veículos agenciadores de informações
e conhecimentos.
Com o advento das novas tecnologias de informação e de conhecimento,
tal revisão é de extrema urgência. A Psicopedagogia, enquanto
campo do conhecimento que surgiu nesta transição paradigmática,
busca em seus pressupostos teóricos e em sua práxis, ser elo entre
este dois movimentos: o de ensinar e o de aprender. (7) Penso que os atos humanos
de ensinar e aprender
"são processos vitais na busca constante da conquista e do encantamento
da autoria do pensamento, presente no universo da relação entre
a magia da vida e a própria vida de cada aprendente, sendo espaçotempo
de desenvolvimento de nossa poética existencial, essencial, pessoal,
única, singular."(8).
A busca pela ampliação de nosso olhar e de nossas matrizes psicopedagógicas
nos auxiliam na revisão de nossas trajetórias de "aprendentes
e ensinantes", nos nossos próprios processos vinculados ao aprender.
Evitar rotinas mecânicas e competitivas e superar o excesso de individualidade
presente no cotidiano das instituições de ensino pode ser de grande
valia nesta reestruturação necessária aos processos de
ensinagem (9), propondo-nos a construção de um cotidiano escolar
de fato inclusivo, facilitador da construção de uma nova sociedade
que seja, realmente, uma sociedade para todos e inclusiva. (10)
Os temas aqui desenvolvidos realidade, conhecimento
e aprendizagem são inesgotáveis, pois representam imensas possibilidades
de reflexão. Um número imenso de idéias pode surgir quando
sobre eles nos detemos, com parcimônia e respeito pela diversidade de
opiniões e teorias que existem em suas próprias fundamentações.
Enquanto sujeito envolvido em todas estas questões e com a experiência
que venho tecendo em minha cotidianidade profissional, instiga-me profundamente
as proposições, ou seja, diante do que está posto, o que
podemos mudar, ou auxiliar a mudar (11). Um pequeno rol de idéias aqui
elenco, com este objetivo da proposição ao nosso pensar e agir:
1-Redimensionar nossa própria vida e criar parcerias para projetos comuns;
2-Estabelecer movimentos de entre - ajuda;
3-Instigar vínculos de cooperação e colaboração
permanentes;
4-Desenvolver novas habilidades a administração de conflitos e
nas situações de problematizações;
5-Lidar com opiniões e pensamentos divergentes com respeito e contra-argumentação;
6-Substituir a competitividade agressiva pela cooperação, para
o enfrentamento das exigências presentes no cotidiano institucional;
7-Gerar novos modos de gestão, tanto do conhecimento como de pessoas;
8-Aprofundar referenciais no campo psicopedagógico;
9-Cuidar das relações interpessoais com respeito à diversidade
de opiniões;
10-Estimular, nos espaços e tempos institucionais, movimentos de formação
de grupo de estudos e de pesquisas sobre temas que são pertinentes as
discussões aqui referendadas.
Propostas de ações que talvez possam de algum modo colaborar.
O desejo sempre expresso é o de compartilhar. E no fazer novos contatos,
possibilidades de interlocução são criadas. Disponibilizo-me,
sempre, para tal movimento, então, após esta leitura, faça
contato e se expresse. E-mail: joaobeauclair[arroba]yahoo.com.br
1- BEAUCLAIR, João. Olhar, ver, tecer: a busca permanente da teoria no campo psicopedagógico. In: PINTO, Silvia Amaral de Mello e SCOZ, Beatriz Judith Lima et al. (orgs.) Psicopedagogia: contribuições para a educação pós-moderna. Editora Vozes, Petrópolis, 2004.
2- BEAUCLAIR, João. Mansidão, afabilidade e doçura nas relações humanas: o resgate necessário a partir das instituições. [2005] Disponível em http://www.psicologia.com.pt/artigos/ver_artigo.php?codigo=A0251&area=d1 Acesso em: 10 nov. 2006.
3- Idem.
4- Idem, ibidem.
5- RODRIGUES, Neidson. 1987, p.17.
6- FROMM, Erich. 1979, p.56.
7- BEAUCLAIR, João. Para Entender Psicopedagogia: perspectivas atuais,
desafios futuros. Editora WAK, Rio de Janeiro, 2006.
8- BEAUCLAIR, João. A coragem essencial: formação pessoal
em Psicopedagogia. Disponível em www.profjoaobeauclair.net
9- Neologismo significando ensino-aprendizagem.
10- Aprofundo esta temática em: BEAUCLAIR, João. Incluir: um verbo
/ação necessário à inclusão: pressupostos
psicopedagógicos. Pulso Editorial, São José dos Campos,
2007 (no prelo).
11- BEAUCLAIR, João. Psicopedagogia: trabalhando competências,
criando habilidades. Coleção Olhar Psicopedagógico, Editora
WAK, Rio de Janeiro, 2004. Segunda edição: 2006.
BEAUCLAIR, João. Incluir: um verbo /ação
necessário à inclusão: pressupostos psicopedagógicos.
Pulso Editorial, São José dos Campos, 2007.
BEAUCLAIR, João. Para Entender Psicopedagogia: perspectivas atuais, desafios
futuros. Editora WAK, Rio de Janeiro, 2006.
BEAUCLAIR, João. Psicopedagogia: trabalhando competências, criando
habilidades. Coleção Olhar Psicopedagógico, Editora WAK,
Rio de Janeiro, 2004. Segunda edição: 2006.
BEAUCLAIR, João. Mansidão, afabilidade e doçura nas relações
humanas: o resgate necessário a partir das instituições.
[2005] Disponível em http://www.psicologia.com.pt/artigos/ver_artigo.php?codigo=A0251&area=d1
Acesso em: 10 nov. 2006.
BEAUCLAIR, João. A coragem essencial: formação pessoal
em Psicopedagogia. Disponível em www.profjoaobeauclair.net
Acesso em: 10 nov. 2006.
BEAUCLAIR, João. Olhar, ver, tecer: a busca permanente da teoria no campo
psicopedagógico. In: PINTO, Silvia Amaral de Mello e SCOZ, Beatriz Judith
Lima et al. (orgs.) Psicopedagogia: contribuições para a educação
pós-moderna. Editora Vozes, Petrópolis, 2004.
FROMM, Erich - Ter ou Ser? . Editora Zahar, Rio de Janeiro, 2ª ed., 1979.
RODRIGUES, Neidson. Por uma Nova Escola: o transitório e o permanente
em Educação. Editora Cortez, São Paulo, 1986.
Prof. João Beauclair
Psicopedagogo, Arte-educador, Mestre em Educação
joaobeauclair[arroba]yahoo.com.br
Homepage: http://www.profjoaobeauclair.net
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