Os medicamentos são considerados a principal ferramenta terapêutica para recuperação ou manutenção das condições de saúde da população. No entanto, o simbolismo de que eles são revestidos e, conseqüentemente, o uso dos mesmos pela sociedade, tem contribuído para o surgimento de muitos eventos adversos, com elevado impacto sobre a saúde e custos dos sistemas. Assim, a promoção do uso racional dos medicamentos é uma ferramenta importante de atuação junto à sociedade, para senão eliminar, minimizar o problema. Neste sentido, o farmacêutico pode contribuir sobremaneira, já que este é assunto pertinente a seu campo de atuação. Sua participação em equipes multidisplinares acrescenta valor aos serviços e contribui para a promoção da saúde. Este artigo trata destas questões e discute as possibilidades desta contribuição.
Palavras-chaves: Uso racional de medicamentos, Farmacêutico, Promoção da saúde, Atenção farmacêutica
How pharmacists can contribute to health promotion
ABSTRACT
Medicines are considered the main therapeutical tool for the treatment or maintenance of public health conditions. However, the symbolism in wich they are cloaked and thus their use by society, has contributed to the emergence of many adverse events with high impact on health and health systems costs. Thus, rational drug use promotion is an important tool to eliminate or minimize the problem. This is where the pharmacists can play an important role because this is a pertinent subject in their field of performance. Their participation in multidisciplinary teams adds value to health services and contributes to health promotion. This article addresses these issues and how pharmacists can contribute to health promotion.
Key words: Rational drug use, Pharmacist, Health promotion, Pharmaceutical care
A prevenção e o tratamento de doenças exigem infra-estrutura adequada, assim como educação apropriada. Após estas medidas, os medicamentos e as vacinas têm o potencial de conferir grandes benefícios à população1. No entanto, o simbolismo de que se revestem os medicamentos na sociedade tem contribuído para a utilização irracional dos mesmos.
Segundo a Sociedade Brasileira de Vigilância de Medicamentos (Sobravime)2: o medicamento como parte do complexo médico-industrial influi na percepção da saúde e da doença, tanto nos profissionais de saúde quanto na sociedade. O medicamento não se apresenta sozinho - como sustância química – mas está acompanhado por um cotejo de publicidade, informação, brindes, estudos etc., que vai configurando uma forma de pensar.
Mais adiante, a Sobravime complementa: a medicalização de um número crescente de problemas da vida não constitui apenas um processo individual em que o futuro consumidor de cuidados médicos se convence de que se encontra na anormalidade. Trata-se também de um fenômeno coletivo próprio das sociedades em crescimento que criam uma raridade do normal, afirmando que este é o melhor.
A medicalização de aspectos da vida chega a ter dimensão tal, que hoje um novo conceito envolvendo medicamentos começa a ser utilizado: "fármacos do estilo de vida" (em inglês, "lifestyle drugs"). Este termo, conforme definição de Flower 3, diz respeito àqueles usados para satisfazer a objetivo não médico ou não relacionado à saúde.
É preocupante esta forma de aceitação dos medicamentos pela sociedade, tendo em vista o volume de produtos farmacêuticos comercializados. Dados da Associação Brasileira de Redes de Farmácias e Drogarias4 referem que, em 2003, estes estabelecimentos venderam aproximadamente 3,6 bilhões de reais em medicamentos (venda nominal), contabilizando o total de 260 mil clientes atendidos e 669 milhões de unidades vendidas. Se houvesse dados de todos os medicamentos dispensados pelo Sistema Único de Saúde (SUS), ter-se-ia como estimar o número de unidades farmacêuticas totais consumidas no país. Só para se ter uma idéia, se considerarmos que somente o Ministério da Saúde5, em 2002, despendeu 1,8 bilhões de reais para a aquisição de medicamentos para uso em unidades ambulatoriais ou repasse de recursos para a compra descentralizada destes, podemos observar que este número de unidades farmacêuticas consumidas aumenta significativamente com a soma da dispensação pública (o valor referido não considera o recurso gasto em medicamentos empregados em ambiente hospitalar). Portanto, estes são valores que chamam a atenção para o volume de medicamentos que está sendo utilizado pela população e preocupam no sentido de que pode haver muita irracionalidade no seu uso, aumentando o risco de surgimento de morbidades relacionadas aos medicamentos e até mesmo da ocorrência de mortes, com elevação dos custos para os sistemas de saúde6 .
Estima-se que nos EUA as reações adversas a medicamentos sejam a quarta ou a sexta causa de morte em hospitais, excedendo as mortes causadas por pneumonia e diabetes7. A morbimortalidade por esta causa é considerada comum e o custo estimado é da ordem de 136 bilhões de dólares ao ano8.
Uma revisão sistemática sobre os atendimentos de emergência relacionados ao uso de medicamentos9 considerou dados de oito ensaios retrospectivos e quatro prospectivos. Os resultados indicaram que 28% de todos os atendimentos de emergência estão relacionados aos medicamentos. Destes atendimentos, 70% diziam respeito a situações evitáveis e 24% deles resultaram em internação hospitalar. Esta mesma pesquisa revela que os problemas mais comuns relacionados aos medicamentos são: as reações adversas, a não aderência ao tratamento e a prescrição inadequada.
Outro estudo10 mostra que os eventos adversos relacionados a medicamentos aumentam em 1,88 o risco de mortalidade e que 27% dos eventos relatados são atribuídos à negligência. Segundo o autor, uma solução viável para o problema é aumentar a colaboração entre médico e farmacêutico.
Desta forma, considerando a importância do tema e a escassez de informações sobre o uso de medicamentos no país, este artigo faz considerações sobre as possibilidades de contribuição do farmacêutico para a melhoria da utilização de medicamentos pela sociedade.
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