Intoxicação por agrotóxicos no Brasil



  1. Resumo
  2. Introdução
  3. Métodos
  4. Fontes oficiais de registro sobre intoxicação por agrotóxicos
  5. Análise dos sistemas oficiais de informação
  6. Banco de dados dos Receituários Agronômicos
  7. Estudos brasileiros dimensionando a freqüência de intoxicações entre trabalhadores rurais
  8. Resultados e discussão
  9. Receituário Agronômico como fonte de informação de exposição
  10. Questões sobre a classificação toxicológica
  11. A confirmação laboratorial: dificuldades em relação a acetilcolinesterase e outros exames
  12. Estudos brasileiros sobre intoxicações por agrotóxicos
  13. Considerações finais
  14. Referências

Os sistemas oficiais de informação e desafios para realização de estudos epidemiológicos

RESUMO

O Brasil é um dos líderes mundiais em consumo de agrotóxicos e os trabalhadores expostos são numerosos e diversificados. As intoxicações agudas são a face mais visível do impacto destes produtos na saúde. A avaliação dos vários sistemas oficiais de informação que notificam os casos de intoxicações concluiu que nenhum deles responde adequadamente ao papel de sistema de vigilância. Na prática, só se registram os casos agudos e mais graves. Uma importante lacuna é a informação de exposição a agrotóxicos: a avaliação da única fonte oficial (os Receituários Agronômicos) revelou muitas limitações. A revisão das publicações brasileiras aponta um crescimento quantitativo e qualitativo dos estudos nesta área, com vários tipos de abordagens. O impacto da intensa carga química e o enorme contingente de trabalhadores expostos são duas importantes razões para o desenvolvimento da pesquisa epidemiológica sobre intoxicações por agrotóxicos, que no Brasil ainda tem um vasto campo para se desenvolver.

Palavras-chave: Pesticidas, Sistemas de informação, Saúde ocupacional

Pesticides poisoning in Brazil:
the official notification system and challenges to conducting epidemiological studies

ABSTRACT

Brazil is one of the world leaders in pesticide consumption and exposed workers are numerous and diversified. Acute poisonings are just the most visible aspect of pesticide impact on human health. An assessment of many official information systems that notify pesticide poisoning concluded that none of them performed appropriately the role of a surveillance system. Only acute and severe cases are notified. One of the main gaps concerns exposure information: the only official source (the Agronomic Prescriptions) has many limitations and is not available for research. A review of published articles in Brazil shows a quantitative and qualitative increase of studies in this area with many different approaches. The impact of such a high chemical burden and the huge numbers of workers exposed are two important reasons for the development of an epidemiological research on pesticide poisoning, an issue that has still a vast field to cover in Brazil.

Key words: Pesticides, Surveillance system, Occupational health

Introdução

O trabalho agrícola é uma das mais perigosas ocupações na atualidade. Dentre os vários riscos ocupacionais, destacam-se os agrotóxicos que são relacionados a intoxicações agudas, doenças crônicas, problemas reprodutivos e danos ambientais1.

As publicações mais recentes da Organização Internacional do Trabalho/ Organização Mundial da Saúde (OIT/OMS) estimam que, entre trabalhadores de países em desenvolvimento, os agrotóxicos causam anualmente 70 mil intoxicações agudas e crônicas que evoluem para óbito. E pelo menos 7 milhões de doenças agudas e crônicas não-fatais, devido aos pesticidas1, 2. Estudos brasileiros e em outros países têm destacado os elevados custos para a saúde humana, ambiental e mesmo perdas econômicas na agricultura, devido ao uso de pesticidas3,5.

No Brasil, o consumo de agrotóxicos cresceu bastante nas últimas décadas, transformando o país em um dos líderes mundiais no consumo de agrotóxicos. Entre 1972 e 1998, a quantidade de ingrediente ativo vendido cresceu 4,3 vezes, passando de 28.043 toneladas para 121.100 toneladas/ano6. A importância econômica deste mercado é evidente: segundo a ABIFINA (Associação Brasileira das Indústrias de Química Fina, Biotecnologia e suas Especialidades), o faturamento do segmento agroquímico saltou de 1,2 bilhão em 2002 para 4,4 bilhões em 2004. Em relação às classes de uso, em 2004, 40% dos produtos vendidos eram herbicidas, 31% fungicidas, 24% inseticidas e 5% outros7.

Embora a pesquisa brasileira sobre o impacto do uso de agrotóxicos sobre a saúde humana também tenha crescido nos últimos anos, ainda é insuficiente para conhecer a extensão da carga química de exposição ocupacional e a dimensão dos danos à saúde, decorrentes do uso intensivo de agrotóxicos. Um dos problemas apontados é a falta de informações sobre o consumo de agrotóxicos e a insuficiência dos dados sobre intoxicações por estes produtos. A relevância do tema é destacada ao se considerar a dimensão e a diversidade dos grupos expostos: os trabalhadores da agropecuária, saúde pública (controle de vetores), empresas desinsetizadoras, indústrias de pesticidas e do transporte e comércio de produtos agropecuários.

Assim, este artigo buscou avaliar os dados sobre intoxicações por agrotóxicos, obtidos em fontes oficiais de registro, dimensionando a freqüência, comparando resultados e discutindo as limitações das várias fontes. Também examinou as informações sobre consumo de agrotóxicos, contidas no Receituário Agronômico, a partir de dados do Rio Grande do Sul. Além disso, a partir de uma revisão de estudos brasileiros, o artigo se propõe a discutir algumas dificuldades metodológicas, tais como questões sobre a classificação toxicológica e a confirmação laboratorial de intoxicação, a serem consideradas em estudos epidemiológicos sobre agrotóxicos.


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