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A UDR é criada em 1985, com o compromisso de defender os interesses de seus associados – o patronato rural. Sua criação começa a tomar corpo durante o Congresso Nacional sobre a Reforma Agrária, no final de junho de 1985, promovido pela Confederação Nacional da Agricultura, em resposta à apresentação da proposta do Plano Nacional de Reforma Agrária, elaborado por um conjunto de técnicos, alguns comprometidos com a reforma agrária e contou com a participação de sindicalistas rurais.
O perfil que a UDR assumiu foi o de uma entidade que dispunha de uma assessoria jurídica bem aparelhada, que orientaria os proprietários de terra no recadastramento de propriedades, nas ações judiciais para obtenção de liminares contra desapropriações etc. Paralelo a isso, a entidade montou um não menos eficiente sistema de divulgação orientando seus associados como se prevenir das desapropriações, considerado "o meio caminho andado rumo ao conflito de terra". Na prática essas orientações são constituídas como rotina. Os latifundiários são mais rápidos em solicitar na justiça um mandado de segurança para que uma força policial despeje os trabalhadores rurais sem-terra que assim tentem se instalar em qualquer pedaço de terra, mesmo considerada devoluta, ou improdutiva. O surgimento da UDR como braço organizativo dos latifundiários, e a oposição que ela passou a fazer ao MST, juntamente com as ações legais e ilegais que desenvolve na defesa da propriedade de terra, evidencia que a luta pela terra se dá no contexto da luta de classes.
A União Democrática Ruralista (UDR), formada em 1985, se auto dissolveu oficialmente no início dos anos 90, entretanto reaparece no cenário político nacional como prática caracterizada pelo enfrentamento aberto e pela violência contra os trabalhadores rurais sem terra, na região do Pontal do Paranapanema, no Estado de São Paulo.
O conflito direto entre MST e UDR tornou-se evidente em 1990, quando cerca de 700 famílias de trabalhadores rurais sem terra ocuparam a fazenda Nova Pontal, no distrito de Rosana, Pontal do Paranapanema. Esta introduziu homens armados na fazenda enquanto esperava pelos soldados da Polícia Militar que expulsaram os "invasores" sob a proteção da justiça. Por outro lado ficou claro como o Estado estava pronto para defender a lei se colocando ao lado dos grandes proprietários de terra.
Aqui, parece se confirmar o papel do Estado, cuja função vai além de máquina política administrativa, revelando sua face de instituição que detém o monopólio da violência sobre um território determinado e, sobre ele exercendo o seu controle. Evidencia-se e estabelece uma diferenciação espacial do território com base na distribuição da violência como um elemento intrínseco à sua instituição e implantação. Paralelamente à ação dessas instituições, o Estado irá também reforçar o movimento de disciplinarização das condutas, sobretudo exercendo um controle das inúmeras ações desencadeadas pelos movimentos populares que são considerados "perigosos", os quais manifestam uma consciência política de classes e por isso são colocados sob vigilância -um enfrentamento entre capital e trabalho, imposições e direitos têm então lugar. A classe dirigente irá desta forma perceber a presença e as reivindicações dos trabalhadores rurais como uma ameaça latente: potencialidade que se efetiva por meio das ocupações, dos acampamentos, assentamentos, etc.
Assim é que o ataque ao projeto camponês do MST dirige-se em particular às novas formas de resistência e luta dos trabalhadores rurais. "A invasão é crime. O acampamento é a miséria nas estradas: é a ilusão dos trabalhadores por terra". (OImparcial, 25/02/92). Esse ataque passa a contar com a ajuda da imprensa, que dá respaldo às ações e reações violentas contra os trabalhadores rurais, quando vemos que a forma de noticiar os fatos não dá margem a um eventual contra discurso, o que é revelador do esforço em concentrar numa única forma de entender o problema dos sem-terra.
Há, além de um conflito manifesto entre MST e latifundiários, um processo de "fabricação" de sujeitos, de constituição de identidades. São práticas rotineiras e comuns, através do discurso jornalístico, as quais vão instituindo, não só identidades, mas também o preconceito contra os trabalhadores rurais. E esse modo de dizer expressa um conflito político e fundamenta o uso de determinadas expressões associadas ao MST de forma recorrente. "Baderna" e "invasão" são algumas delas.
Essas palavras não são monopólio do jornal, os setores mais conservadores da sociedade não perdem tempo ao utilizá-las quando são questionados por movimentos de massa. Quando outras pessoas usam o termo "baderna" ela vem sempre acompanhada da defesa da repressão imediata. Trata-se de um termo com uso claramente político, pois é usado quando se refere a manifestações de reivindicações, dificilmente aplicadas a tumultos de outra natureza. Assim sendo, o discurso do jornal reproduz pensamento comum entre todos os setores da sociedade que defendem o status quo e estabelece limites para a participação popular dentro da esfera das instituições. Tal discurso encontra respaldo em todo o aparato do Estado, entre eles o poder judiciário, como fica claro em várias sentenças proferidas por juízes contra os trabalhadores rurais sem-terra.
A idéia sobre a qual se pretende fundamentar este trabalho é a de que a luta pela terra se articula sobre relações de poder específicas que correspondem a uma forma de dominação e de estruturação de espaço. Assim, para pensarmos as configurações do espaço, suas estratégias, articulações e subordinação às relações de poder, analisaremos a produção e a manifestação do discurso jornalístico nesse espaço, cujos rebatimentos se refletirão na forma de representação do MST pelo público leitor.
Espaço e território são noções ou conceitos geográficos, mas são antes de tudo uma noção jurídico-político, que é controlado por um tipo de poder, cujo domínio se efetua mediante regras e/ou "leis", ou conforme Marx & Engels (1993, p.72) Os indivíduos que constituem a classe dominante possuem, entre outras coisas, também consciência, e, por isso pensam; na medida em que dominam como classe... dominem também como pensadores, como produtores de idéias...". Como quem pode impor sua lei é o grupo dominante, veremos quais são as leis que esse grupo tem posto a seu serviço, as quais são traduzidas por normas para modificar o espaço e para adaptá-lo a seus interesses.
É nesse ponto que buscamos estabelecer a convergência entre o discurso do jornal O Imparcial sobre o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra – MST e aqueles oriundos das práticas, ou formações sociais como Direito, Estado. O jornalismo não representa o real, mas o constrói pela linguagem, obedecendo a uma "gramática de produção" própria do contexto e da instituição na qual o discurso está inserido.
Entendemos condições de produção, primeiro pela tradição marxista que a define como a infra-estrutura econômica na qual as mercadorias são produzidas. A empresa jornalística representa a superestrutura econômica que dá o suporte ideológico para a produção das notícias e lhe solicita retorno como mercadoria. E, condições de produção, quando se tratam dos discursos, abarcam, além da produção, a sua circulação e o seu consumo. Mas condições de produção também significam conforme Pinto (apud Berger, 1998, p.127), "as cristalizações que conduzem as falas de um diálogo verbal a se estruturar, conforme a finalidade que possuem e a eficácia dos efeitos obtidos".
Quando dissemos no início sobre a ambigüidade da imprensa, nos situávamos exatamente nesse aspecto que é o do caráter mercadológico que ela assume. Muitas vezes, aparentando compromisso com a informação verdadeira, a imprensa não deixa de incluir julgamentos nos seus textos, e o faz a partir de sua vinculação com esferas do poder político e do poder econômico. Daí ser difícil desvincular-lhe da idéia de ela compartilha da mesma visão de mundo, que inclui, sobretudo, o compromisso com uma forma determinada de ordem econômica.
Como dizer, porém que o texto na imprensa, tendo ou não informações verdadeiras, é ou não neutro? Ou, como as informações que são submetidas a processos de seleção e de disposição vão produzir um efeito negativo? Diríamos que as estratégias do discurso são resultantes de pistas de uma ação ideológica, que mascara os objetivos e o comprometimento da imprensa, ou enunciante. Há confirmação, então de que o texto da imprensa não é neutro. Mas de que modo isso se confirma ? Ou como são estruturadas as relações de poder através do uso que é feito da linguagem? Segundo Foucault (1987, p.14), a linguagem produziu:
A suspeita de que a linguagem não diz exatamente o que diz. O sentido que se apreende e que se manifesta de forma imediata, não terá porventura realmente um significado menor que protege e encerra; porém, apesar de tudo transmite outro significado; este seria de cada vez o significado mais importante, o significado ‘que está por baixo’.
Como se pode observar os desafios que são postos para explicar a produção do discurso, passa necessariamente pelas questões ligadas às relações do discurso com o poder, à ideologia e, também pelo desafio de tentar localizar as pistas ideológicas na tessitura material do discurso. Isso significa assumir, também, a dimensão de uma prática política, porquanto as complexas relações de linguagem e poder, dentro de uma sociedade em que se verificam diferentes conflitos sociais. Nessa citação, penso que reside um pouco essa dificuldade quando Thompson (apud Voese, 1997, p.27-8 ) diz:
Engajar-se na interpretação da ideologia é uma atividade arriscada e cheia de conflitos. É arriscada porque o significado de uma forma simbólica não é dado de antemão, fixo, determinado; oferecer uma interpretação é projetar um significado possível, um dentre muitos significados possíveis que podem divergir, ou conflitar com outro. Esse conflito potencial toma uma forma diferente no caso da interpretação da ideologia. Pois a interpretação da ideologia envolve não apenas a projeção de um significado possível, mas também a afirmativa de que tal significado serve, em certas circunstâncias, para estabelecer e sustentar relações de dominação.
Aqui assumimos a posição de que o discurso tem uma relação com a ideologia: ele não é neutro nem está desligado de um jogo de poder, ou se constitui livre de qualquer determinação de uma sociedade que abriga em sua formação conflitos entre classes, grupos e indivíduos.
Assumimos também a noção de sistema de referência, entendido como domínios de interpretação, para explicitar, em termos de determinação da condução do processo histórico de uma formação social, que esses têm sua constituição pela divisão da sociedade em grupos e classes, por exemplo, há sistemas de referência que giram em torno de "capital" e "trabalho", de "negros" e "brancos" de "judaísmo" e "catolicismo" etc.
Segundo Voese (1997, p.34) uma formação social não se divide apenas em grupos e classes, a partir de determinações culturais e econômicas: "há também uma divisão social do trabalho que dá lugar a diferentes práticas e que são valoradas diferenciadamente".
Portanto, para se chegar à noção de ideologia, é preciso observar que uma formação social com diferentes sistemas de referência que são constituídas por diferentes representações de sociedade, só pode manter-se se à base do controle permanente do perigo que representa o confronto. O perigo pode, ao menos, ser minimizado por um processo que tenta homogeneizar o heterogêneo. E essa é a função da ideologia, enquanto representação de sociedade e de mundo construída a partir de um sistema de referência ligado a uma determinada classe ou grupo social (Cf. Voese, p. 34). Em outros termos, um sistema de referência possibilita a constituição de uma concepção de sociedade e de mundo, que assume as funções de ideologia precisamente porque há conflitos sociais que precisam ser controlados.
A constituição da ideologia se dá, pois, no conflito social que a divisão de uma sociedade instaura, e que precisa se controlado ou ser reduzido ao nível do suportável: daí as estratégias de busca para manter-se a homogeneização.
Estudar o MST no jornal O Imparcial, possibilita-nos conhecer a "imagem construída" sobre os trabalhadores rurais sem-terra e do MST como uma construção sobre os movimentos políticos que se opõem ao sistema de governo no Brasil.
Buscando dar conta desta compreensão, delimitamos o nosso corpus da seguinte forma: 1) recolhendo recortes de reportagens sobre os sem-terra de 1990 a 1999 para considerar as designações do percurso das ocupações de terra nesse período; 2) verificando as formas do discurso, ou as "modalidades do dizer", numa notícia de rotina. Situamos esse estudo a partir do recorte temporal entre 1990 e 1993, por considerarmos, inicialmente um tempo relativamente longo para observar um número significativo de ocupações em seus enunciados e, assim, constatar os modos de dizê-los no processo de repetição. Escolhemos uma – a da Fazenda São Bento – sabendo que esta contém, na essência, as demais.
A opção por trabalharmos com títulos se justificam, pois eles anunciam, no nosso entendimento, uma intenção de leitura. Para Fausto Neto (apud Berger, 1999, p. 130), "o título é o lugar da nomeação onde se dá início à própria identidade do acontecimento".
No caso do MST, a manchete e o título constituem, para muitos leitores, a única informação, pois os conflitos em torno da posse da terra não dizem respeito, diretamente a quem não é proprietário de terras. O recorte das notícias justifica-se porque a invasão é o primeiro item no critério de noticiabilidade do MST. Esse caráter de notícia rotineira, freqüente e redundante é que se produz a representação do Movimento. Escolhemos aleatoriamente entre as matérias do corpus de pesquisa (1990-1993), a invasão da Fazenda São Bento, ocorrida no dia 24 de março de 1991, cujo desfecho mereceu 18 matérias distribuídas em 20 dias.
Por ocasião dessa ocupação, o jornal não foi nem um pouco compreensivo com o Movimento, e, muito menos tratou de noticiar com isenção dos fatos, optando por denominar a ação dos sem-terra de invasão quando havia, também a possibilidade de designa-la por ocupação. A opção por uma ou outra expressão não é gratuita e se explica pelo sentido que nela está embutido. As palavras carregam um conteúdo implícito. Sobre a questão da manipulação, Baccega (apud Berger, 1999, p.132) considera que os:
[...] pares opositivos invadir e ocupar fixam situações lingüisticamente significativas daquilo que chamamos relação retórica-manipulação. Efetivamente, os lexemas invadir e ocupar promovem conotações diferentes sobre o sentido da ação dos sem-terra. Invadir carrega semas como "tomar aquilo que não nos pertence"; já o lexema ocupar nos indica semas como "estar em lugar devoluto". Assim poderíamos ter de, retoricamente, partir de um mesmo pressuposto, espécie de lexema de anterioridade, determinado por um elemento espacial, a terra e pelos pontos de vista ideológicos sobre ela.
O enunciador ao optar por invadir faz a escolha de um signo que preserva o conceito de propriedade privada, em que o sujeito do enunciado encontra-se na ilegalidade e ao destinatário é oferecida uma pista de leitura em que a transgressão tem permissão para ser punida. Caso ele optasse por ocupar, estaria sustentado pelo conceito de propriedade social da terra e a ilegalidade se encontraria na ação da repressão. Em alguns títulos de reportagens encontramos as seguintes construções:
Invasores seqüestram oficial de justiça (O Imparcial, 16.07.90)
Invasores serão despejados pela Justiça (O Imparcial, 20.07.90)
Fim pacífico da invasão: cumprida a determinação
judicial (O Imparcial, 21.07.90)
Sem-terra acampam na rodovia (O Imparcial, 22.07.90)
Fazenda de ex-prefeito é invadida (O Imparcial, 24.03.91)
Acampados da Fazenda São Bento estão confiantes (O Imparcial,
29.03.91)
Acampados em compasso de espera (O Imparcial, 03.04.91)
Sem-terra desocupam fazenda (O Imparcial 10.04.91)
Acampados retiram-se da fazenda São Bento (O Imparcial, 18.05.91)
Juiz pede apoio policial para retirar invasores da fazenda São Bento
(O Imparcial, 14.06.92)
Presidente da UDR defende uso de armas pelos proprietários rurais (O
Imparcial, 22.08.92)
Governo e sem-terra tentam 1º acordo (O Imparcial, 11.10.92)
Sem-terra invadem fazenda e ferem peão (O Imparcial, 02.03.93)
Quando comparamos os títulos das reportagens das ocupações e desocupações, verificamos que os modos de dizer ou as modalidades do dizer são escolhidos intencionalmente, já que a escolha se deu sempre a partir de lexemas com um forte sentido incriminatório.
Pela análise, ou leitura atenta dos títulos, podemos inferir o confronto das expressões "invasão" x "ocupação". Também podemos inferir pelas leituras dos títulos que o enunciante impede a possibilidade de se concluir a favor da ocupação. Revela uma preocupação em concentrar o seu esforço em impor uma forma única de entender o problema dos sem-terra, ou seja, não considerar a miséria do campo, mas desconstruir as ações do MST. A cada momento, há uma busca de desvalorização do movimento, pois impõe-lhe os traços da ilegalidade e de violência.
A tentativa do enunciante em desqualificar, ou ainda, de "satanizar" a ação do MST fica mais nítida, verificando-se as escolhas feitas em torno da UDR, fazendeiros e governo, pois tende a considerar que os sem-terra são algozes e os fazendeiros e governo as vítimas da intransigência, intolerância e violência do MST.
A violência dos sem-terra é reforçada com as expressões "seqüestram" (T1) já que este é um termo para designar ação de bandidos, e essa ação, quando relacionada ao último título da desocupação (T13), permite uma implicação dos sem-terra como foras da lei, portanto marginais.
A análise feita até aqui levou à conclusão de que, para o enunciante, a questão em torno dos envolvidos – os sem-terra e seus dirigentes, os fazendeiros e governo, tem origem no próprio MST, já que o problema vem dos planos anacrônicos dos líderes e só é grave no que se refere à violência do movimento. A gravidade não reside na situação dos trabalhadores rurais sem-terra, mas nas propostas dos dirigentes do MST.
Essa é uma das leituras possíveis que os títulos permitiram que se fizesse, embora não seja a única, é uma possível. E, se para cada texto há leituras possíveis, há, evidentemente as impossíveis, porque cada escolha lingüística e discursiva, corresponde a uma exclusão de sentidos. Os sentidos "apagados" dizem respeito a diferentes sistemas de referência existentes na diversidade social e que estão em conflito exatamente porque significam.
Dissemos anteriormente, dos vários sentidos implicados nos textos e sobre o que eles não dizem. Apontaremos alguns desses silêncios em que o texto não diz:
1. há luta dos sem-terra é pela vida, ou seja, contra a fome e a miséria;
2. eles (sem-terra) são acossados pela violência dos fazendeiros que, através da Justiça e da Polícia são perseguidos;
3. portanto, a radicalização do MST é conseqüência da ausência do governo e da violência dos fazendeiros.
Cremos não ser difícil caracterizar os títulos analisados como modos de dizer que, associados aos enunciados de recortes de outras reportagens dizem, portanto que "O MST e os trabalhadores rurais sem-terra são marginais". Isso de certa forma exime de culpa aqueles que detêm o poder. Visto que uma das representações do poder se dá através do discurso, os que têm mais acesso aos meios de comunicação têm a possibilidade de não só privilegiar o seu discurso pela produção da notícia, mas também de controlar o discurso dos próprios meios. Daí entendermos a linguagem, também, como uma forma de disputa social.
Nossas investigações, ao perpassar pelas dimensões ligadas ao uso do poder, ideologia dominante e análise dos componentes discursivos na veiculação da notícia, procuraram demonstrar que o jornalismo produz uma percepção peculiar da realidade que propõe retratar. Mais do que retratar os fatos, a imprensa impõe filtros que tornam essa representação dos fatos uma indução e nos indica as maneiras pelas quais o discurso está ligado. Ou seja, está ligado não somente à reprodução de significados, mas também à produção de identidades, tanto sociais quanto individuais. Ou, em outros termos mantendo a concepção de que não há discurso ideologicamente neutro é que se faz necessário uma análise em que a relação entre linguagem e o social sejam trabalhadas com o intuito de se fazer uma "leitura" geográfica ou um modo de ler o espaço, através do qual se possa localizar as pistas do que estamos chamando de determinações sociais do discurso. Aqui retomamos a epígrafe que abre esse trabalho "toda linguagem é politicamente contaminada", e reafirmamos que a linguagem, como questão política que é, realiza um espaço de luta entre diferentes grupos, os quais, policiam suas fronteiras e seus significados. E nessa discussão, o que tentamos mostrar é que a linguagem opera, a partir de uma divisão ideológica e discursiva, policiando fronteiras em que se dá a separação entre os grupos dominantes dos dominados. Ou conforme nos diz Foucault (1979) os discursos são investidos em formas materiais e institucionais e governados por práticas discursivas que referem-se às regras históricas e anônimas que governam o que deve ser dito e o que deve continuar não dito. Mas do que encerrar a discussão, nos propomos entender essas relações, ou os processos de determinações sociais que regulam as práticas sociais e suas formas de organização no espaço e os reordenamentos territoriais que são resultantes dessas relações.
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Aluna do quarto ano do Curso de Graduação em Geografia da FCT/UNESP/Presidente Prudente; Bolsista IC/FAPESP, sob orientação professor Antonio Thomaz Júnior; Membro do Centro de Estudos de Geografia do Trabalho (CEGeT). E-Mail: divinoj[arroba]stetnet.com.br
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Sonia Maria Ribeiro de Souza
Estudante de Geografia - UNESP/Presidente Prudente, Brasil.
Antonio Thomaz Júnior
Professor de Pós-Graduação em Geografia - UNESP/Presidente
Prudente, Brasil.
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