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1.1 Do Pensamento Grego ao Canônico
Entre os gregos a avaliação das teses e das provas era feita pelo Tribunal Popular, que julgavam sem precisar justificar sua decisão, Tourinho Filho (2007, p. 80) trouxe o seguinte comentário a este respeito, in verbis:
Algumas vezes funcionavam, no mesmo julgamento, 100, 500, 1.000 e até mesmo 6.000 Juízes. Era a crença de que tantas cabeças asseguravam melhor justiça, ou talvez a explicação esteja na cupidez dos três óbolos que o Estado destinava a cada um dos Juízes, por crime que julgavam (cf. Faustin Hélie, apud Jorge A. Romeiro, Da ação penal, p. 25). Veja-se, também, Vélez Mariconde, Estudios, cit., v. 1, p. 16.
A cultura grega influenciou os romanos, entre os quais o poder de julgar era concedido principalmente para dirimir os conflitos que envolviam os interesses de Roma, mas quando as lides envolviam assuntos particulares, decidia de acordo com sua íntima convicção (TOURINHO FILHO, 2007, p. 80).
Já dizia Chiovenda (apud ARANHA, 2006, p.80): O juiz de Roma teve por ofício procurar livremente a verdade dos fatos, avaliando as provas; ele pronuncia a decisão que lhe sugere a consciência.
Este sistema aplicado na Grécia e em Roma ficou conhecido como Sistema da Íntima Convicção, orientado pelo Princípio da Certeza Moral do Juiz, também chamado Sistema Sentimental, Sistema da Livre Convicção, apesar de que Capez (2007, p. 314) distingue íntima de livre, para separar este sistema, onde íntimo seria um convencimento adstrito ao interior do Juiz e livre seria uma liberalidade do Juízo, com restrições, isso para se referir ao Sistema da Persuasão Racional.
Aranha (2006, p. 81) definiu este sistema da seguinte forma, in verbis:
O juiz é soberano quando à indagação da verdade e à apreciação das provas. Age apenas pela sua consciência, não só no tocante à admissibilidade das provas quanto à sua avaliação, seus conhecimentos e impressões pessoais, até contra provas colhidas e, por fim, pode deixar de decidir se não formada a convicção.
Atualmente a íntima convicção é permitida pelo Processo Penal Brasileiro aos jurados no Tribunal do Júri, os quais decidem da maneira que quiserem, sem dar justificativa alguma.
Os germânicos foram dominados pelos romanos, mas seu sistema de julgamento, baseado na crença sobrenatural influenciou os romanos, afastando os poucos o Sistema da Íntima Convicção que outrora foi base do pensamento romano.
Este foi o Sistema das Ordálias ou Juízos de Deus, no qual a confissão era o meio mais incentivado para provar o culpado, se houvesse confissão o réu era condenado, caso contrário era submetido a testes de resistência a dor e sofrimento, portanto, o acusado caberia a prova de inocência, Tourinho Filho (2007, p. 83-84), disse in verbis:
As principais provas eram os ordálios, ou Juízos de Deus, e o juramento. O acusado jurava não ter praticado o crime de que era processado, e tal juramento podia ser fortalecido pelos Juízes, os quais declaravam sob juramento que o acusado era incapaz de afirmar uma falsidade. Essa prova do juramento baseava-se "na crença de que Deus, conhecendo o passado, pode castigar aquele que jura falsamente".
Quanto ao Juízo de Deus, que, segundo Manzini, não era propriamente uma prova, mas uma devolução a Deus da decisão sobre a controvérsia, sua prática foi demais generalizada. Conforme as pessoas, realizava-se, como Juízo de Deus, o duelo judicial: se o acusado vencesse, seria absolvido, pois era inocente. Havia outros Juízos de Deus, chamados, posteriormente, purgationes vulgares, como o da "água fria" e o da "água fervente". O primeiro consistia em arremessar o acusado à água: se submergisse, era inocente; se permanecesse à superfície, era culpado. O outro consistia em fazer o réu colocar o braço dentro da água fervente e, se, ao retirá-lo, não houvesse sofrido nenhuma lesão, era inocente... Pelo Juízo de Deus do "ferro em brasa", devia o acusado segurar por algum tempo um ferro incandescente; caso não se queimasse, era inocente...
Aliado ao Sistema das Ordálias foi utilizado o Sistema de Provas Legais, quando da adoção do cristianismo como religião oficial por Roma, Aranha (2006, p. 79) exemplifica as leis que obrigavam o entendimento do Juiz retirando do livro do Deuteronômio:
Pela boca de duas testemunhas, ou de três testemunhas, será morto aquele que houver de morrer; mas pela boca de uma só testemunha não será morto (XVII). Uma só testemunha não poderá levantar-se contra ninguém (XIX). A origem da máxima: testis unus, testis nullus.
É claro que se houvessem várias testemunhas dizendo uma mentira poderiam obter até a morte, e uma só testemunha dizendo a verdade não servia como prova, portanto, a verdade pouco importa para o Sistema de Provas Legais.
No entender de Aranha (2006, p.79), in verbis:
Os sistemas de provas legais têm sua origem nas ordálias e a base no rigorismo e formalismo do pensamento germânico.[...]
[...] Por tal sistema cada prova tinha um valor preestabelecido em lei, inalterável e constante, de sorte que o juiz não era livre a avaliação, agindo bitolado pela eficácia normativa.
Este método de utilizar a prova tarifada é reconhecido atualmente como o Sistema de Prova Legal ou Tarifado, orientado pelo Princípio da Certeza Moral do Legislador, da Verdade Formal ou Verdade Legal. Pela definição de Aranha (2006, p. 80), em tal sistema o juiz manifestava a verdade não de acordo com a convicção resultante das provas, mas sim de conformidade com o valor legal.
Apesar das ordálias terem sido eliminadas do nosso ordenamento, o Sistema de Prova Legal persiste de modo mitigado, em algumas situações, como no parágrafo único do artigo 155 do Código de Processo Penal, devendo o Juiz observar as provas de estado das pessoas, como as certidões de nascimento, casamento, óbito, independente da verdade dos fatos e não pode ser suprida por outro meio de prova.
No mesmo sentido o artigo 158 do Código de Processo Penal que exige o exame de corpo de delito quando a infração deixar vestígios, e proíbe ser suprida por confissão do acusado, mas excepcionalmente permite a prova testemunhal caso os vestígios tiverem desaparecido, pelo artigo 167 do Código de Processo Penal.
1.2 No Pensamento Laico
Com as divisões ocorridas dentro da Igreja Católica, principalmente pela Reforma Protestante, e pelo ressurgimento das idéias iluministas, oriundas da cultura greco-romana, o Sistema das Ordálias foi combatido, e por conseguinte, o Estado se emancipou da Igreja, na Revolução Francesa, liberando para o campo jurídico a aplicação do pensamento laico, mas esta evolução ocorreu aos poucos.
As legislações laicas no sofreram influência dos sistemas utilizados pela igreja, continuando com a utilização de torturas, confissões e denúncias anônimas, de ofício e de forma secreta, resultando apenas na mudança do controle dos bispos, padres e papas, para os agentes do Estado.
Tourinho Filho (2007, p. 85) comenta como era o processo na França:
O Processo Penal de que tratava a Ordennance de Luiz XIV era eminentemente inquisitivo. Era escrito, secreto e não contraditório.
Compunha-se de três fases: a primeira, que era a fase das informações, a segunda, que era a da instrução preparatória, e a última, a do julgamento. A fase das informações, como o próprio nome está a indicar, restringia-se às averiguações, à colheita de provas. Tais averiguações eram realizadas secretamente.
[...] O interrogatório do acusado era realizado secretamente e sempre precedido de juramento. O acusado, até então, desconhecia as provas contra si apuradas. Nesta fase da instrução, o Juiz, se o crime lhe parecesse pouco grave, fazia prosseguir o processo segundo as regras do Processo Civil.[...]
As provas continuaram a ser apreciadas num Sistema Legal, que prefixava o valor de cada prova, sobressaindo sempre o valor da confissão, permitindo-se a sua obtenção até mesmo com a prática de torturas, assim foi na Alemanha, Itália, Espanha, e na França, ou seja, nos principais países da Europa continental.
Tourinho Filho (2007, p. 87) explica que na Inglaterra o IV Concílio de Latrão aboliu os Juízos de Deus, em substituição prevaleceu a instituição do júri popular, e a persecução ficava a cargo de qualquer um do povo, num sistema que lembra o remoto Tribunal Popular do povo grego.
Mesmo no Tribunal Inglês, a confissão era valorizada, se o acusado admitisse a culpa era sumariamente penalizado, se alegasse inocência, era dado prosseguimento ao julgamento. Ali eram analisadas as provas, debatidas as alegações e na conclusão o Juiz fazia um resumo, e os jurados reuniam-se para o veredicto. (TOURINHO FILHO, 2007, p. 87).
Segundo J.H. Baker após a acusação os jurados eram isolados, sem comida, bebida, fogo ou vela, nem podiam convencer com outras pessoas, enquanto estivessem reunidos, tais constrangimentos e desconfortos tinham o objetivo primário de encorajar a unanimidade na decisão. (apud TOURINHO FILHO, 2007, p. 87).
Estes foram os principais sistemas processuais penais após a Idade Média, o inquisitivo na Europa Continental e o Tribunal Popular na Inglaterra, Tourinho Filho (2007, p. 87) leciona que no século XVIII, surge um movimento contra o Sistema Inquisitivo, na França pensadores como Montesquieu, que contestava o uso das torturas para obtenção de provas, e elogiava a instituição do Ministério Público contra o sistema que utilizava os delatores anônimos. Beccaria considerava o direito de punir deve estar dentro dos limites da justiça e da utilidade e também condenou a tortura como obtenção de provas. (TOURINHO FILHO, 2007, p. 89-90).
Como resultado de tais críticas o pensamento laico deu origem ao Sistema da Persuasão Racional do Juiz orientado pelo Princípio do Livre Convencimento Motivado, pelo Princípio da Verdade Real também chamado de Sistema da Convicção Condicionada. Apesar da distinção em que Capez (2007, p. 314) se refere a livre e não íntima para destacar este sistema daquele em que se baseia exclusivamente no convencimento sem restrições do Juiz.
Segundo Aranha (2006, p. 81) este sistema surge ainda na época da antiga Roma, mas é explícito a partir do Código Napoleônico, outorgado por Napoleão Bonaparte em 1804, finalmente edificando a lei de acordo com os pensamentos dos iluministas e codificando os ideais da Revolução Francesa de 1792.
1.3 As Provas no Processo Penal Brasileiro
O Brasil colônia adotou as ordenações do Reino, de 1500 até 1832, Frederico Marques comentou que as Ordenações Afonsinas tiveram: a decisiva influência do direito canônico e de seu procedimento inquisitorial. (apud NOGUEIRA, 1995, p.3).
A última das ordenações aplicadas as Ordenações Filipinas, até 1832, em seu Livro V, sobre o direito penal e processo penal, refletia a barbárie da tortura e penas corporais, sendo a prisão exceção à regra, as penas mais comuns eram as mutilações, desterro e penas de morte das mais variadas formas. (NOGUEIRA, 1995, p.3).
A promulgação do Código Criminal em 1832, no Brasil Imperial, foi adotando práticas menos abusivas, por ter sido influenciado pelos ideais iluministas, expressos no Código Napoleônico de 1804, que já haviam influenciado a Constituição Monárquica Portuguesa, em 1821 pouco antes da independência brasileira em 1822, adotando inclusive o habeas corpus, vigente até os dias atuais. (NOGUEIRA, 1995, p. 4).
O Código Criminal de 1832 representou um marco ao substituir o Sistema Inquisitivo pelo Acusatório, expressando que a confissão deveria ser livre e estar sustentada em outras provas. (BIAZEVIC, 2006).
Mesmo no Brasil Republicano, e com a promulgação da Constituição Republicana em 1891 que mantinham garantias processuais em observância a direitos humanos, a prática de obtenção da confissão por meio da tortura era institucionalizada pelos agentes do governo, e ainda praticada em desconformidade com os preceitos legais até hoje, muitos ainda processados como lesões corporais ou abusos de autoridade. (BIAZEVIC, 2006).
Após a proibição da utilização da tortura como meio de colheita de prova, a Constituição de 1988 expressou a condenação aos meios ilícitos como método para obtenção de prova, seja tortura ou qualquer outro que atente contra as garantias fundamentais, tais como os métodos ditos científicos como o soro da verdade, os detectores de mentira, hipnose e outros.
Lembrando que desde 1832 o Juiz é livre no seu julgamento, mas não é uma liberdade irrestrita, pois está condicionada a ser motivada racionalmente com base em lógica e teses jurídicas orientado pelo Princípio da Livre Convicção Motivada, encontrado no artigo 155, caput do Código de Processo Penal.
A definição contemporânea de prova no Direito Processual Penal Brasileiro possui raízes nos doutrinadores como o italiano Malatesta e o alemão Mittermaier, do século XIX, desde então, no nosso país tem recebido as teses de doutrinadores pátrios como Mirabete, Greco Filho, Nucci, Fernando Capez e Tourinho Filho, além de Messias com raízes nas idéias do argentino Dellepiane.
Pela análise das várias definições dos autores foi buscado uma definição relacionada com a proposta de inserção das provas obtidas pela rede no Processo Penal, apesar de parecer não haver assunto controvertido, isto é um equívoco, porque a doutrina sempre tende a reaver velhas definições e colocar uma nova para que seja de aplicação no direito, neste sentido será analisado a definição de prova penal, trazida por Messias, o qual tece sua definição estrita da prova.
2.1 As Provas no Sentido Amplo
Antes de identificar a definição ampla para este estudo é importante ter uma breve noção jurídica de verdade, pois está relacionada à prova do objeto da prova, o fato, de maneira intrínseca.
Malatesta (apud NUCCI, 2007, p. 335)[1], doutrinador italiano do século XIX considerava que a verdade é a conformidade da noção ideológica com a realidade, e a certeza é a crença nesta conformidade, provocando um estado subjetivo do espírito ligado a um fato, ainda que essa crença não corresponda à verdade objetiva.
Enquanto que o doutrinador Aranha (2006, p. 5) [2]define que prova no sentido vulgar e amplo como tudo aquilo que pode levar ao conhecimento de um fato, de uma qualidade, da existência ou exatidão de uma coisa.
Aranha trouxe uma definição ampla, a qual não atende apenas ao Direito, mas também a outros ramos do conhecimento, Malatesta, por sua vez, faz a primeira diferenciação entre idéia e realidade, e alinha a certeza e crença, distinguindo a certeza e crença como elementos da verdade subjetiva, separando da verdade objetiva.
2.2 As Provas Processuais
Quando Nucci (2007, p. 335) pondera o pensamento de Malatesta começa a tecer uma definição jurídica, e considera que a meta da parte é convencer o magistrado, através do raciocínio, de que a sua noção da realidade é a correta, isto é, de que os fatos se deram no plano real exatamente como está descrito em sua petição. Desta forma vai surgindo uma definição de prova jurídica. Neste sentido jurídico Aranha (2006, p. 5)[3] considera que a prova representa os atos e os meios usados pelas partes e reconhecidos pelo juiz como sendo a verdade dos fatos alegados.
Nucci (2007, p. 335) e Aranha (2006, p. 13), analisaram que a origem da palavra prova provém do latim probatio que significa ensaio, verificação, exame, argumento, razão, etc. Dele deriva o verbo probare, provar que significa ensaiar, verificar, examinar, demonstrar, etc.
Destas duas classes gramaticais pode ser identificados o substantivo e o verbo, que no sentido substantivo a prova é elemento material ou imaterial reduzido a termo nos autos do processo, no verbo, é ação humana, colher e produzir a prova ou considerar provado o fato alegado.
Nucci (2007, p.335) ampliou o duplo significado gramatical em três acepções:
a) ato de provar: é ação pelo qual se verifica a exatidão ou verdade do fato alegado pela parte no curso do processo, por exemplo, fase probatória ou o período de prova da suspensão ou livramento condicional;
b) meio de prova: como o instrumento pelo qual se demonstra a verdade de algo, por exemplo: prova testemunhal, pericial ou documental.
c) resultado da ação de provar: extraído da análise dos instrumentos de prova oferecidos, demonstrando a verdade de um fato, por exemplo, na expressão que o juiz utiliza ao sentenciar: fez-se prova de que o réu é autor do crime.
Destas três formas encontradas dentro do processo jurídico é possível determinar um foco de estudo, que é o uso das provas da rede mundial de computadores como meio de prova.
2.3 A Prova Penal
Uma questão trazida pelos Tovo foi a adoção da definição específica no processo penal de prova, proveniente da definição do doutrinador argentino Dellepiane (apud MESSIAS, 1999, p. 42), in verbis:
A prova, no processo penal condenatório, é precipuamente o conjunto de vestígios materiais e imateriais deixados pelo fato objeto da imputação, ao acontecer, desde suas origens até suas últimas consequências, documentados nos autos do Devido Processo Legal, e que, não raro, nos permitem reconstruir ideacionalmente tal como realmente aconteceu.
Tal conceito aponta para a reunião da matéria criminal e a prova, sob o qual Messias constrói uma tese de prova penal, distinta das demais por sua finalidade, estreitando mais o conceito de prova, Messias (1999, p. 42) define, in verbis:
A prova penal é, pois, a demonstração do conjunto de fatos e circunstâncias que convencem da ocorrência de um fato que interessa ao Direito Penal, no tocante à materialidade e à autoria, bem como da existência de causas que justifiquem a ação ou omissão, excluindo a criminalidade ou intensidade de dolo ou culpa do agente, para a fixação da responsabilidade criminal.
Ao analisar esta definição em sentido contrário é preciso verificar se haveria prova estrita ao processo civil, de acordo com a lei não há, eis que há provas contidas na lei civil que servem ao processo penal, como as provas que indicam o estado das pessoas, conforme o artigo 93 e 155, parágrafo único do Código de Processo Penal.
Estas provas oriundas da lei civil também servem para identificar elementos de autoria e materialidade, de extinção de punibilidade, de maioridade, portanto, usar o termo prova penal carece de um sentido prático.
Da mesma forma as provas reunidas no processo penal podem servir ao processo civil, tal é o exemplo de laudo de corpo de delito, laudo necroscópico, e outros atos como a sentença condenatória irrecorrível para elidir a necessidade de prova de dano e iniciar uma ação civil ex delicto.
Concluindo a prova não é civil nem penal, é instituto processual do Direito como um todo, o que não significa que tenha um só sentido, pois todas definições apresentadas demonstram que prova não é unívoca, ou seja, não possui um sentido apenas, mesmo em sua natureza jurídica há mais de um sentido.
O que interessa a este trabalho é a prova processual no sentido de meio de prova para que seja verificar as formas que a prova obtida pela rede mundial de computadores pode demonstrar os fatos alegados.
Há países que adotam a forma taxativa os meios de prova admitidos, porém, no Brasil foi adotado o rol exemplificativo, quer dizer, o processo não restringe as maneiras pelas quais um fato pode ser provado.
A utilização de um rol meramente exemplificativo, não afastou o legislador de regular de forma específica certos meios de prova, como os encontrados no Código de Processo Penal, o exame de corpo de delito, as perícias, o interrogatório e a confissão do acusado, da oitiva do ofendido e depoimento das testemunhas, do reconhecimento de pessoas e coisas, e da acareação, os documentos, os indícios e da busca de apreensão de pessoas e objetos, nem afastou o jurista de aplicar tais regras às provas que não estão no rol legal.
Existem várias formas de classificação na doutrina, algumas tendem a gerar uma hierarquia de provas, o que não existe no processo penal, como separá-las por valor, por exemplo, em plena e não-plena ou indiciária, se a lei veda a hierarquia de provas, não é o doutrinador que poderá gerá-las, ademais o que pode ter pouco valor para determinado ato processual, pode ser decisivo, ou pela doutrina, tem valor pleno noutro ato do mesmo processo, o Juiz tem livre convicção para analisar.
3.1 As Provas Nominadas
Para o estudo das provas optou-se pela diferenciação topográfica em prova nominada ou inominada. (CAPEZ, 2007, p. 287).
As provas nominadas são provas contidas expressamente no ordenamento jurídico, no Código de Processo Penal estão entre os artigos 158 e 287, nestes artigos podem ser encontradas as regulamentações de alguns meios de prova.
Dentre os meios de prova nominados serão utilizados as perícias, os documentos e os indícios para comparação com as provas obtidas pela rede mundial de computadores.
3.2 As Provas Inominadas
As provas inominadas são as que não estão previstas especificamente no ordenamento jurídico pois a legislação pátria não prevê taxativamente os meios de prova.
Isso não quer dizer que não há normas reguladoras para as provas inominadas, há normas constitucionais e infraconstitucionais gerais, além das aplicáveis especificamente às provas nominadas, que podem ser utilizadas por analogia para as provas inominadas.
Antes de identificar qual o meio de prova que é obtida pela rede é preciso definir o que é a rede mundial de computadores, por meio do método mais utilizado pela doutrina que é da identificação das partes que a constituem.
Um sistema é composto de muitos elementos, mas que isolados não possuem funcionalidade, para a constituição de um sistema informático denominado rede mundial de computadores, deve ser compreendido a existência de sistemas informáticos autônomos, por exemplo, as redes locais ou simplesmente um computador.
4.1 Os Sistemas Informáticos
No conjunto de elementos tecnológicos que compõe a rede mundial de computadores há partes físicas ou hardware e outras chamadas de lógicas ou software.
É pela reunião da parte física com a lógica destinada a interligar tecnologia para processamento de informação que se forma a rede mundial de computadores.
Em relação ao hardware Paesani (1999, p. 23) define que a natureza jurídica [...] considerando em sua unidade, pertence, como produto industrial, à categoria de bens materiais que se submete às normas usuais, sem necessidade de alterações em matéria de venda ou locação. Entendendo o termo bens materiais como advindo das percepções dos sentidos, e como produto industrial, sujeito à lei de patentes.
A parte física ou hardware são identificados com os vários equipamentos que podem se conectar à rede, como notebooks, laptops, desktops, telefones celulares, sendo que de acordo com sua portabilidade, dificultam sua identificação dentro da rede, exigindo uma coleta muito rápida antes que desconecte.
Em relação à parte lógica ou software, se encontra dentro do hardware, lhe dá funcionalidade porque serve como meio intermediário entre um ser humano e as funções do aparelho eletrônico. O próprio software e os dados que manipula, tem existência variável, pois pode ser removido rapidamente, este período de permanência é chamado de volatilidade. É a parte lógica que concede funcionalidade à parte física, neste elemento estão os programas de computadores, sistemas operacionais: Windows, DOS, UNIX, LINUX, Solaris, e outros, linguagens de programação, e muitos outros.
Em relação à natureza jurídica dos softwares a doutrina tem questionado se é produto industrial, protegido pela lei de patentes ou se é direito de autor, neste entendimento tem se alinhado a maioria dos países, inclusive o Brasil, equiparando às obras literárias (PAESANI, 1999, p. 25).
A informação é o terceiro elemento, se assemelha ao software, porém, com ele não se confunde, ambos são voláteis, são bens imateriais, criações da mente (PAESANI, 1999, p. 23), mas diferem quando à funcionalidade, pois os softwares são destinados a fazer com que o ser humano manuseie o hardware, e outras possibilidade, serve para trabalhar com informações, ou dados, os quais dependem do software para serem utilizados, como o software depende do hardware para chegar até nossos sentidos físicos.
Ao conjunto de hardware e software foi denominado por Paesani (1999, p.25) como [...] constituído por computador e periféricos, software de base e aplicativos, suportes magnéticos e componentes de memórias auxiliares, será qualificado como "universalidade de coisas móveis" conclui que chegou a esta conclusão porque é difícil individualizar uma coisa principal e outras acessórias, pois todas são partes complementares entre si e cada uma é integrante de todas.
Um só computador forma um sistema informático, bem como uma rede até a rede mundial de computadores, também são formas de sistemas informáticos.
4.1.1 As Redes de Computadores
Após compreender o elemento essencial ou sistema informático, é preciso estudar sistemas informáticos mais complexos, para compreender como pode ser interligado os sistemas, formando uma de rede de computadores.
Eager (1995, p. 8) explica que uma rede local (LAN de Local Area Network) conecta computadores de outro prédio ou de uma área local, como aqueles computadores dos prédios que formam uma Prefeitura ou de um Fórum, e rede remota (WAN – Wide Area Network) é uma extensão lógica de uma rede local – as LAN´s são interconectadas. Como resultado pode se comunicar com outras cidades ou país, como por exemplo, entre os Juizados e Fórum das mais diversas comarcas do Estado.
Esta interconexão pode ser física, utilizando cabos coaxiais ou de par-trançado, fibras óticas, ou pode ser não-física, por ondas de rádio (wireless) ou infravermelho (por meio de blue tooth), esta forma de interconexão não-física está sendo cada vez mais utilizada e confere uma maior portabilidade do sistema informático para o usuário ingressar na rede de computadores.
É a tecnologia da comunicação, ou telecomunicação unida aos sistemas informáticos que permite a existência de rede de computadores, e como resultado aumenta a capacidade de processamento e volume de informações trabalhadas.
Da junção da telecomunicação com os sistemas informáticos nasce a telemática, termo que foi definido em 1984 por Frosini (apud PAESANI, 1999, p. 21), in verbis:
Telemática corresponde ao procedimento da elaboração das informações à distância e, por conseguinte, ao movimento de circulação automática dos dados informativos, que ocorrem no diálogo com os calculadores eletrônicos, utilizando os terminais inteligentes, capazes de receber e transmitir. [...]
É devido à enorme quantidade de elementos que se reúnem pela telemática que dificulta a identificação do autor de determinado ato jurídico.
4.1.2 A Rede Mundial de Computadores
A rede mundial de computadores é a mais poderosa forma de aplicação da telemática já conseguida até agora, porque reúne todas as redes de computadores que acessem, seja do tipo de rede local (LAN) ou de área (WAN) ou simplesmente um só computador.
O termo internacional para a rede mundial de computadores é internet, sendo utilizado por todos os países que a utilizam, este termo foi definido por uma resolução norte-americana no dia 24 de outubro de 1995, no Federal Networking Council da seguinte forma, in verbis:
Internet se refere ao sistema de informação global que -- (i) é logicamente ligado por um endereço único global baseado no Internet Protocol (IP) ou suas subsequentes extensões; (ii) é capaz de suportar comunicações usando o Transmission Control Protocol/Internet Protocol (TCP/IP) ou suas subsequentes extensões e/ou outros protocolos compatíveis ao IP; e (iii) provê, usa ou torna acessível, tanto publicamente como privadamente, serviços de mais alto nível produzidos na infra-estrutura descrita. (PEREIRA, 2008).
O sistema informático para se conectar à internet deve obedecer certos padrões mínimos: na parte lógica precisa ter um protocolo de comunicação (TCP-IP), o navegador, e na parte física. um processador de dados (computador, celular, etc.) e um modem, que é um aparelho especializado em codificar e decodificar sinais eletrônicos, analógicos e digitais. Além disso é preciso de um ISP (Internet Service Provider), um provedor de acesso.
O provedor é um sistema informático que faz a intermediação entre vários sistemas e a infraestrutura mais básica de comunicação por cabos, satélites, etc. que constituem a espinha dorsal (backbone) da rede mundial de computadores.
É importante usar a nomeclatura correta Internet, pois não deve ser confundida com o termo www que é a sigla para World Wide Web, que é meramente a parte lógica que faz a intermediação gráfica para a visualização das páginas do computador, enquanto a internet é o meio pelo qual as páginas e demais dados circulam, além da intermediação gráfica.
Eager (1995, p. 8) definiu: [...] A Internet é uma associação de centenas de redes particulares, comerciais, acadêmicas e do governo, (...). Sendo assim, podemos dizer que a Internet realmente é uma rede de redes.
Neste sentido já pode-se visualizar a dificuldade em identificar a quem pertence, tamanho o espectro diferenciado de pessoas interligadas, físicas, jurídicas, internacionais, enfim, por qualquer um que preencher os requisitos tecnológicos básicos.
A definição de Eager não tange o sentido jurídico porque sua obra não é de cunho jurídico. As definições jurídicas dos elementos formadores do sistema informático já foram discutidas, agora para a rede mundial de computadores Rosa (2002, p. 33) definiu, in verbis:
[..] como uma rede transnacional de computadores interligados, com a finalidade de trocar informações diversas e na qual o usuário ingressa, por vários meios, mas sempre acaba por realizar fato jurídico, gerando consequências inúmeras nas mais variadas localidades.
Rosa (2002, p. 34) continua analisando a definição encontrando os seguintes elementos característicos:
- Formação de uma rede transnacional de computadores;
- Multiplicidade de objetivos visados;
- Acesso através de linhas telefônicas conectadas, discadas ou a um provedor de acesso ou através de cabeamento de televisão por assinatura, ou via ondas.
Analisando os elementos caracterizados por Rosa, a rede transnacional significa que a rede ultrapassa os limites das nações, exige que o operador do direito faça uso das normas de direito interno, e por vezes, também as normas de direito internacional, de maneira que esta característica é da natureza da rede mundial de computadores, porque dela depende a eficiência no funcionamento, não há um só caminho na transmissão dos dados, os dados são repartidos em várias partes, e podem chegar a outro ponto do mesmo país, ou até passar por outros países e retornar ao mesmo país que originou o pacote.
4.2 A Prova Informática
Devido às peculiaridades das provas oriundas da rede mundial de computadores estão entre as denominadas pela doutrina como provas informáticas.
A prova obtida pela rede mundial de computadores serve para trazer ao Juízo elementos relacionados a fatos alegados para que se convença da realidade e pode ser feitos de várias maneirais, em especialmente pela perícia, documentos eletrônicos e demais indícios.
Trata-se de prova inominada pois não tem regulamentação específica nas normas processuais pátrias sendo preciso utilizar a analogia com alguns meios de prova e utilizar as regras gerais para a utilização da prova obtida nos sistemas informáticos no processo penal.
A prova informática tem como características a portabilidade do hardware e volatilidade do software, os quais são fatores que dificultam a sua colheita e análise.
Estas provas já fazem parte do processo penal brasileiro, mas em razão do nosso formalismo, a forma escrita ainda é fundamental, as audiências são reduzidas a termo, mas já há previsão para que sejam realizadas gravações que devem ser transcritas nos autos, consoante o artigo 475, parágrafo único do Código de Processo Penal.
A colheita de prova testemunhal por meio eletrônico tem o objetivo de dar fidelidade e celeridade aos atos processuais, sendo permitido inclusive videoconferência em algumas situações, de acordo com o artigo 217 do Código de Processo Penal. E aos poucos a forma escrita tem cedido espaço ao meio eletrônico, para a confecção dos autos do processo.
Tais atos processuais registrados por meio eletrônico sugerem que demais provas informática podem chegar a revestir da mesma validade e autenticidade de que estão revestidos com os atos processuais, necessitando apenas normas jurídicas que regulamente a prova informática.
Para incluir a prova informática no processo, pode ser trazida para apreciação direta do Juízo, como num CD (compact disc), de forma indireta, por transcrição anexa ao laudo pericial.
A prova informática pode se equiparar a meios de prova já regulados pelo Código de Processo Penal, como prova pericial, documental ou indiciária, sendo por analogia regida pelas mesmas normas, podendo ser considerada subespécie de meio de prova ou mesmo uma espécie.
A falta de regulamentação de provas oriundas da rede mundial de computadores tem obrigado os Tribunais a uma adequação das normas, e como resultado tem recebido pedidos de trancamento do processo ainda na fase inquisitorial, tamanha a discussão que a ausência de norma tem suscitado, entretanto, os pedidos tem sido indeferidos ou deferidos parcialmente, com fundamento em espécies já estabelecidas de provas.
4.2.1 A Perícia Forense Computacional
De acordo com Aranha (2006, p. 192) a perícia é um meio instrumental, técnico-opinativo e alicerçador da sentença.
Segundo Aranha (2006, p.193) a perícia somente se justifica quando há necessidade da emissão de uma opinião especializada sobre um fato. Neste caso o Supremo Tribunal Federal entende pela obrigatoriedade do laudo pericial, in verbis:
"Crime de Computador": publicação de cena de sexo infanto-juvenil (E.C.A., art. 241), mediante inserção em rede BBS/Internet de computadores, atribuída a menores: tipicidade: prova pericial necessária à demonstração da autoria: HC deferido em parte. (..) 3. Se a solução da controvérsia de fato sobre a autoria da inserção incriminada pende de informações técnicas de telemática que ainda pairam acima do conhecimento do homem comum, impõe-se a realização de prova pericial. (STF, HC 76689/PB, Relator Min. Sepúlveda Pertence, julgado em 22/09/1998, DOU 06-11-1198).
Quem fornece tal prova é um perito, especialista na matéria a ser analisada, e possuidor de curso superior, em princípio é feito por um perito oficial, que é servidor efetivo do Poder Público, ou perito não-oficial, quando é convocado, podendo ainda ser acompanhado por assistente técnico a requerimento das partes, incluindo o Ministério Público e assistente da acusação consoante o artigo 159, §3º do Código de Processo Penal.
Aranha (2006, p. 191) considera a opinião, que é o objeto da perícia, situa-se numa posição intermediária entre os fatos e a decisão. Quer dizer, é mais que uma prova objetiva, a opinião do perito já revela um juízo de valor corroborado por sua autoridade, esta originada de sua capacidade técnica.
Apesar do conhecimento do perito é preciso sopesar os erros sempre inerentes à condição humana, pois a perícia antes de tudo é dependente dos meios materiais que dispõe para confeccionar suas pesquisas, e a ausência dos instrumentos adequados influenciam sobremaneira na probabilidade de erro técnico-instrumental.
O resultado da perícia é o laudo pericial, recebendo denominação específica conforme o tipo: exame de corpo de delito, exame de instrumento ou substância do crime, laudo necroscópico, laudo computacional, laudo do HD (hard disk) e outros.
Em análise das normas, Aranha (2006, p. 194-195) distingue o exame de corpo de delito, encontrado nos artigos 169 ao 175 do Código de Processo Penal, do exame dos instrumentos do crime, do artigo 175 do Código de Processo Penal. Define corpo de delito como: [...] a soma de todos os vestígios e sinais deixados por um delito facta permanentes, como a perícia do disco rígido de computador, para verificar se os dados foram perdidos. Já o exame do instrumento do crime [...] constitui uma análise técnica dos objetos materiais utilizados pelo agente para delinquir e com base nos quais serão apreciadas a natureza e eficiência. Por exemplo: exame da arma de fogo, se realmente funciona, de substância para verificar sua natureza irregular ou se é um veneno.
Aranha ainda identifica que a diferença principal é que o exame de corpo de delito é prova obrigatória nos crimes permanentes e o exame do instrumento não o é, pois a finalidade do primeiro é demonstrar a existência do crime e no segundo avaliar a periculosidade do agente, servindo apara avaliar a quantidade da pena a ser aplicada.
Na impossibilidade do exame de corpo do delito, a prova testemunhal pode suprir-lhe a falta, segundo o artigo 167 do Código de Processo Penal, portanto, analisando na dicção do artigo 158 do Código de Processo Penal, de que todos os crimes permanentes, homicídios, lesões corporais, estupro, dano, incêndio, etc, é obrigatório o corpo de delito, se este não puder ser realizado, a prova testemunhal poderá ser produzida em seu lugar, este é o exame de corpo do delito indireto.
Lembra Aranha (2006, p.200), que nos casos em que o exame de corpo de delito é exigido, a prova é tarifada, e sua ausência importará na absolvição por falta de prova, com fundamento legal no artigo 386, inciso II do Código de Processo Penal. Outros exemplos de obrigatoriedade da perícia são em função de dúvida do estado mental do acusado, no artigo 149 do Código de Processo Penal, ou quando for requerida pelas partes, se pertinente ao caso.
Há regulamentação específica para alguns tipos de laudo, os exames laboratoriais, no artigo 170 do Código de Processo Penal, os laudos necroscópicos são amplamente regulamentados nos artigos 162 a 166 do Código de Processo Penal, porém, carece de regulamentação as provas eletrônicas ou informáticas.
O teor da perícia será composto por vários quesitos, de acordo com Aranha (2006, p.208) poderão ser facultativos quando formulados pela autoridade e pelas partes, pelo artigo 176 do Código de Processo Penal, ou legais se houver norma expressa na lei, são os quesitos obrigatórios, como no caso do artigo 171 e 173 do Código de Processo Penal, que são crimes que há destruição ou rompimento de obstáculo, ou escalada e nos que houverem incêndio. Tais perícias obrigatórias se referem logicamente ao objeto que foi danificado pelo crime, e não sobre uma mensagem que porventura tenha sido feita para incitar ou instruir a realização do crime.
Segundo Aranha (2006, p. 207) a perícia pode ser realizada a qualquer dia e a qualquer hora (art. 161), sendo sempre oportuna, desde que possível. Mas se não for necessária poderá ser rejeitada conforme o artigo 184 do Código de Processo Penal.
Cabe analisar a seguinte construção doutrinária de Aranha, apesar de não houver disposição legal a respeito no Processo Penal, há no Processo Civil, que é acerca da formulação de [...] quesitos oferecidos pelas partes devem ser rejeitados, desde que impertinentes e não exijam conhecimento especializado (2006, p.208) . Quer dizer, quando os quesitos são facultativos, devem ser verificados a pertinência para a inclusão no processo.
É importante ressaltar que o juiz pode rejeitar o laudo pericial, pelo artigo 182 do Código de Processo Penal, porém, mesmo a neste aspecto, Aranha (2006, p. 193) considerou que só poderia em duas hipóteses: por erro ou dolo do perito, isto porque se não for nestes casos, não haveria justificativa para convocar uma perícia.
A obtenção de prova informática por peritos é problemática, em razão da volatilidade dos dados. Farmer e Venema definiram a perícia da prova informática, em 1999, como computação forense da seguinte forma: coleta e análise dos dados de maneira mais livre possível de distorções ou interferências a fim de reconstruir os dados ou o que aconteceu no passado de um sistema. (FARMER & VENEMA, 2006, p. 171).
Apensar da longa distância, da diversidade de estudo e tempo, o conceito dos especialistas em informática Farmer e Venema coincidem em vários aspectos com o conceito jurídico de Aranha (2006, p.259) que define como prova histórica real, pois representa e reproduz um acontecimento passado, gravado num objeto e destinado a fornecer uma convicção atual.
O sistema que Farmer e Venema se referiram é o sistema informático, porém, na prática, ao analisar o postulado de que precisam afastar distorções ou interferências, entenderam que é algo impossível, em função do Princípio da Incerteza de Heisenberg que acarreta imprecisão na perícia, por este motivo os especialistas retiraram a frase: de maneira mais livre possível de distorções ou interferências (FARMER & VENEMA, 2006, p. 172) da definição de computação forense.
A melhor forma de reduzir o Princípio da Incerteza de Heisenberg é seguir o Princípio da Ordem de Volatilidade (OOV – order of volatility) para a coleta das provas de um sistema informático ligado à Internet.
O Princípio da Ordem de Volatilidade, de acordo com Farmer e Venema ( 2006, p. 6), determina que devem ser colhidas as provas mais voláteis e somente posteriormente as menos, com ferramentas adequadas para poder conservar cada uma delas, respeitando uma hierarquia de volatilidade como o ciclo de vida esperado dos dados (ANEXO A).
Farmer e Venema lecionam que a perícia baseada apenas em desligar o computador e copiar o disco rígido compromete de destrói muitas informações necessárias ao laudo pericial, e como pode ser visualizado no ciclo de vida esperado dos dados (ANEXO A) são destruídos quatro tipos de dados ao se desligar o sistema informático, para apenas periciar um disco rígido. (FARMER & VENEMA, 2006, p.5).
Quando o sistema informático está ligado à internet de modo contínuo, o problema da coleta de provas é ainda maior, ficando a dúvida quanto à desconexão em primeiro lugar, pois fazendo isso romperia a hierarquia da volatilidade e seriam perdidas informações importantes para a perícia. Uma opção é a conexão a outro computador da perícia, para monitorar o fluxo de dados do computador periciado, sem desconectar da Internet, nem desligar o computador. (FARMER & VENEMA, 2006, p. 174).
Tais noções são importantes quando da confecção dos laudos periciais, para aplicação na carreira do profissional de direito, e também, poderão servir como orientação para elaborar uma legislação de modo técnico.
Outra possibilidade do laudo computacional é servir para dar valor a provas indiciárias, como no seguinte caso trazido do Supremo Tribunal Federal:
Assente o entendimento do Supremo Tribunal de que apenas a petição em que o advogado tenha firmado originalmente sua assinatura tem validade reconhecida. No caso dos autos, não se trata de certificado digital ou versão impressa de documento digital protegido por certificado digital; trata-se de mera chancela eletrônica sem qualquer regulamentação e cuja originalidade não é possível afirmar sem o auxílio de perícia técnica. A necessidade de regulamentação para a utilização da assinatura digitalizada não é mero formalismo processual, mas, exigência razoável que visa impedir a prática de atos cuja responsabilização não seria possível. (AI 564.765, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, julgamento em 14-2-06, DJ de 17-3-06)
Aqui pode-se verificar outra natureza que a prova informática pode assumir a de um documento, que exige certificado digital, e difere da mera assinatura digitalizada, uma imagem obtida por meio do aparelho conhecido como scanner. Analisando o caso poderia o advogado ter requerido um laudo grafotécnico da assinatura digitalizada, bem como um laudo computacional aferindo que o meio de remessa da petição, correio eletrônico, foi do autor da petição, estes laudos revestidos do juízo de valor dos peritos em muito poderia auxiliar na formação da convicção dos julgadores, e talvez, alterar a decisão acima transcrita.
4.2.2 Os Documentos Eletrônicos
A doutrina trouxe a seguinte definição de Amaral Santos (apud ARANHA, 2006, p. 258): documento é a coisa representativa de um fato e destinada a fixá-lo de modo permanente e idôneo, reproduzindo-o em juízo.
O mesmo não se confunde com monumento, pois este transmite um simbolismo, enquanto que o documento é prova literal (ARANHA, 2006, p.259). Descreve a coisa de forma mais fiel possível pela linguagem humana.
Os documentos eletrônicos são os confeccionados em sistema informático e gravado em meio magnético, ou ótico, ao invés, do papel.
O documento tem várias acepções, é dispositivo, constitutivo ou probatório. É dispositivo quando é necessário para a formação de ato jurídico, como um título de crédito, no sentido constitutivo quando elemento essencial para a formação e validade de ato, como parte do ato, como no caso de escritura pública, etc. (ARANHA, 2006, p. 260).
O documento como prova é função processual, para demonstrar a existência de um fato. Para tanto há que se verificar se está condizente a autenticidade, o meio utilizado e o conteúdo, em relação à alegação realizada. (ARANHA, 2006, p. 260).
O documento é autêntico no caso dos documentos públicos, tendo em vista o caráter a fé que a lei atribui aos servidores, presumindo o que neles conste seja verdadeiro até que se prove o contrário. Os documento particulares não possuem tal eficácia, devendo ser autenticados para terem autenticidade (ARANHA, 2006, p. 262).
Existem contratos eletrônicos, e há cartório judiciais virtuais onde os atos do processo são realizados utilizando a Internet, partindo do uso do correio eletrônico para enviar petições e provas digitalizadas, tais atos tem o mesmo caráter de fé-pública que os documentos em papel, selos e assinaturas.
Para o documento eletrônico cumprir a função processual como prova precisa estar dentro dos parâmetros de autenticidade, meio utilizado e conteúdo conforme a alegação.
Enquanto que no documento em papel a autenticidade era efetuada pela assinatura, há um equivalente nos documentos eletrônicos, a assinatura ou certificação digital. Que é feita com um hardware, em regra um token ou um smart card, que uma vez acoplado a qualquer sistema informático, serve como uma chave física para acesso a determinada página da Internet, garantindo a autenticidade dos atos ali realizados, em consequência seu portador é o responsável por sua guarda, sob pena de responder pelo mau-uso realizado por outras pessoas com sua identidade digital.
Se for contestada a autenticidade do documento pode o Juiz determinar a confecção de laudo pericial, a pedido das partes ou de ofício pelo Juiz. Trata-se de incidente de falsidade, previsto no artigo 145 do Código de Processo Penal. E só pode ser invocado perante uma falsidade instrumental, material ou ideológica se documento público ou falsidade material se documento particular (ARANHA, 2006, p. 264).
A fotografia do documento se refere a qualquer meio de cópia (fotocópia, etc.) tem o mesmo valor do documento, desde que devidamente autenticada, pelo artigo 232, parágrafo único do Código de Processo Penal.
Em relação ao conteúdo, aqui o documento eletrônico deve condizer à alegação, por isso, dependendo do crime, mesmo que o documento seja autêntico, mas o fato alegado diferente, isto reduzirá e até invalidará seu valor como meio de prova.
4.2.3 Os Indícios Eletrônicos
Para Aranha (2006, p. 217) indícios, presunções e circunstâncias têm o mesmo significado, a mesma natureza jurídica, representam o mesmo tipo de prova, apenas usados em campos diversos.
Na definição clássica trazida por Aranha (2006, p. 217) indício é o fato provado que, por sua ligação com o fato probando, autoriza a concluir algo sobre este último.
As provas indiciárias são resultados de raciocínios lógicos, pois sem os mesmos não há valor suficiente no objeto em análise para conectar com o fato, isso não significa que possuem menos valor que outras provas, há que se reforçar a inexistência da hierarquia de provas decorrente da livre apreciação das provas. (CAPEZ, 2007, p. 364).
Vários indícios podem vir a constituir prova robusta o suficiente para servir para fundamentar os argumentos de uma sentença, ainda que não haja prova física a ser apreciada, por exemplo, apenas pelo depoimento de várias testemunhas, ou a riqueza de detalhes de uma só testemunha, são pequenos indícios que isoladamente não reconstroem o fato, mas em conjunto são suficientes para tanto.
Em regra os indícios são suficientes para embasar uma medida cautelar, como o deferimento de prisão preventiva, temporária, medidas assecuratórias, busca e apreensão, interceptação telefônica, etc. mas para fundamentarem o processo o mais indicado é a realização de um laudo pericial para robustecer o indício.
Os indícios são suficientes para dar início a ação penal, neste sentido o Superior Tribuna de Justiça decidiu, in verbis:
PENAL E PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. CRIMES CONTRA A HONRA. TIPICIDADE. INDÍCIOS DE AUTORIA. BIS IN IDEM.
- Registro de mensagens eletrônicas, em tese ofensivas, "atribuíveis" a um autor determinado não traz certeza quanto à materialidade e à autoria, mas é bastante como elemento indiciário que autoriza a instauração da ação penal, sujeitando-se à prova sobre sua autenticidade.
- Se a atipicidade da conduta não é induvidosa, não há como ordenar o trancamento da ação penal por esse motivo.
- Ultrapassa os limites do Habeas Corpus e compete às instâncias ordinárias decidir quanto à ocorrência de bis in idem relativo à imputação, pois o Juízo sentenciante é que dará à conduta a correta classificação penal.
- Ultrapassa os limites do Habeas Corpus a análise de prova controvertida e de matéria sujeita ao crivo da instrução criminal, o que constitui o próprio cerne da ação penal condenatória.
- Ordem denegada.
(HC 37.493/SP, Rel. Ministro PAULO MEDINA, SEXTA TURMA, julgado em 28/09/2004, DJ 06/06/2005 p. 373)
Quanto à prova informática o mesmo ocorre no caso do correio eletrônico (e-mail) que pela sua natureza não pode indicar fielmente que é o autor da mensagem, mas pode dar origem a várias medidas anteriores ao processo penal, dando início à ação penal, porém, este indício pode se tornar uma prova mais robusta quando realizado um laudo computacional, a partir do qual se terá um grande valor para a formação da convicção do Juiz.
Após encerrar a pesquisa muito ainda pode ser acrescentado ao tema, melhorando e aprofundado em novos trabalhos, a limitação ainda repousa sobre a percepção individual do pesquisador, o que deve ser ampliado quanto mais membros da academia redijam novos textos científicos sobre este assunto, utilizando diferenciados meios de abordagem.
É perceptível que a doutrina precisa de trabalhos mais aprofundados pois o que se vê é uma tentativa, muitas vezes vã, de gerar novas teorias sem buscar o fundamento clássico.
As propostas legislativas no assunto são muito importantes, mas que sejam tecnicamente melhor elaboradas, não somente voltadas ao meio jurídico mas também para a aplicação viável perante a sociedade. As reformas nas leis deveriam ser melhor formuladas para amparar os novos meios pelos quais os delitos são realizados.
Espero ter contribuído para o aprimoramento profissional em relação ao assunto, ao fornecer uma perspectiva prática para o exercício do profissional do Direito, com a inclusão de jurisprudências relativas ao tema.
Cada vez mais as provas originadas da Internet fazem parte dos processos penais, em especial quanto aos crimes relativos às fraudes e comunicações, e pelo alcance, estão gerando problemas antigos mas com maior amplitude, forçando a comunidade acadêmica pensar em formas de aplicação do processo, que em sua base teórica continua o mesmo.
Assim é com as provas, suas bases fundamentais são as mesmas, um instrumento que unido à argumentação reconstroem a verdades de fatos alegados pelas partes, incluindo o juízo de valor do perito encerrando na decisão elaborada pelo Juízo de Direito.
ARANHA, Adalberto José Q. T. Camargo. Da Prova no Processo Penal. 7. ed. Ver e atualizada. São Paulo: Saraiva, 2006.
BIAZEVIC, Daniza Maria Haye. A história da tortura. Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n. 1074, 10 jun. 2006. Disponível em:
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: www.planalto.gov.br. Acesso: 18 set. 2008.
BRASIL, Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de Outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: www.planalto.gov.br. Acesso: 18 set. 2008.
BRASIL, Decreto-Lei nº 11.609, de 9 de Junho de 2008. Alteração do Código de Processo Penal. Disponível em: www.planalto.gov.br. Acesso: 18 set. 2008.
BRASIL. Justiça Federal. Disponível em: http://www.justicafederal.jus.br. Acesso: 18 set 2008.
CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 14. ed. Revista e Atualizada. São Paulo: Saraiva, 2007.
EAGER, Bill. Usando a Internet. Rio de Janeiro: Campus, 1995.
FARMER, Dan. VENEMA, Wietse. Perícia Forense Computacional. São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2007.
FRAGOSO. em seu artigo Notas sobre a prova no processo penal, disponível em http://www.fragoso.com.br/cgi-bin/heleno_artigos/arquivo61.pdf , com acesso no dia 10-08-2008, p. 1,
GRECO FILHO, Vicente. Manual de Processo Penal. 4. ed. Ampliada e Atualizada. São Paulo: Saraiva, 1997.
MESSIAS, Irajá Pereira. Da Prova Penal. Campinas: Ed. Bookseller, 1999.
NOGUEIRA, Paulo Lúcio. Curso Completo de Processo Penal. 9ª ed. rev. ampl. e atual. São Paulo: Saraiva, 1995.
NUCCI, Guilherme de Souza. Código de Processo Penal Comentado. 6ª ed. Revista e Atualizada. São Paulo: Editora RT (Revista dos Tribunais), 2007. p. 335.
PAESANI, Liliana Minardi. Direito de Informática: comercialização e desenvolvimento internacional do Software. 2. ed. São Paulo: Atlas, 1999.
PEREIRA, Aísa. História da Internet. Disponível em: http://www.aisa.com.br/oquee.html. Acesso em: 17 set. 2008.
ROSA, Fabrízio. Crimes de Informática. 1ª ed. Campinas: Bookseller, 2002.
STF. A Constituição Federal e o Supremo. Disponível em: http://www.stf.jus.br. Acesso: 18 set 2008.
STF. Supremo Tribunal Federal. Disponível em: http://www.stf.jus.br. Acesso: 18 set 2008.
STJ. Superior Tribunal de Justiça. Disponível em: http://www.stj.jus.br. Acesso: 18 set 2008.
TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo Penal - Vol. 1. 29. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2007.
ANEXO A – O Ciclo de Vida Esperado dos Dados
Tipos de dados |
Tempo de Vida |
Registradores, memória periférica, caches, etc. |
Nanossegundos |
Memória Principal |
Dez nanossegundos |
Estado da Rede |
Milissegundos |
Processos em execução |
Segundos |
Disco |
Minutos |
Disquetes, mídia de backup, etc. |
Anos |
CD-ROMs, impressões, etc. |
Dezenas de anos |
Autor:
Ralph Cafure Bolssonaro
[1] Fragoso (2008) citou o doutrinador italiano Sabatini, quem comentou sobre a certeza, ao escrever: [...] estar certo significa formar idéia clara de um objeto e considerá-la conforme a este. Enquanto a verdade é um real objetivo, a certeza está em nós, como persuasão de que a idéia corresponde ao objeto.
[2] Greco Filho (1997, p. 196) disse em sentido amplo que: a prova é todo elemento que pode levar o conhecimento de um fato a alguém.
[3] Greco Filho (1997, p. 196) chega a sua definição de prova no processo ao afirmar que: [...] no processo, a prova é todo meio destinado a convencer o juiz a respeito da verdade de uma situação de fato.
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