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Um programa institucionalista para o desenvolvimiento de países latinos (página 2)

Miguel S. Albergaria

A questãŁo teórica será entãŁo a de formular o modo como se propãµem quaisquer inovaçãµes, e como se seleccionam as que sãŁo implementadas.

  • Uma opçãŁo, a da teoria ortodoxa clássica (Smith, Ricardo…), é a do "modelo racional" de tomada de decisãŁo – cada agente é suposto ponderar a relaçãŁo custo/benefício das suas alternativas. No entanto diversos estudos sugerem que frequentemente esta fórmula nãŁo será válida (v. Simãµes, 2001). Assim a teoria da "racionalidade limitada" começa por negar que, na maioria dos casos, os decisores disponham de toda a informaçãŁo necessária. Tal como nãŁo teremos a capacidade mental, nem muitas vezes os recursos necessários ao processamento de muita informaçãŁo. As abordagens descritivas ao processo de tomada de decisãŁo mostram aliás que nãŁo tomamos as nossas decisãµes mediante uma ponderaçãŁo equitativa de todas as alternativas, mas antes ao longo de análises sequenciais de cada uma das alternativas que seleccionamos à partida por nos parecerem mais relevantes (algumas podem ser logo desconsideradas sem qualquer justificaçãŁo), escolhendo a primeira a que atribuamos uma aceitabilidade razoável. Além disso as nossasponderaçãµes nãŁo sãŁo neutras: tendemos a sobrevalorizar probabilidades baixas (como a de contrairmos cancro) e a subvalorizar probabilidades altas (como a de morrermos de velhice); e a maioria das pessoas presta mais atençãŁo ao risco duma perda que a idãŞntico risco dum ganho proporcional, por exemplo num negócio – o que conduz a decisãµes diferentes consoante a percepçãŁo deste último enfatizar a primeira ou o segundo.

Explorando esses enviesamentos à racionalidade, a teoria do "comportamento de decisãŁo" expãµe ainda uma série de processos mentais que nos facilitam a decisãŁo ao arrepio de quaisquer ponderaçãµes objectivas dos custos/benefícios. É o caso da avaliaçãŁo de uma situaçãŁo a partir da memória das consequãŞncias de outra semelhante; quando no entanto a facilidade de recordaçãŁo destas últimas é condicionada por conotaçãµes emocionais suas, de forma que aquela primeira situaçãŁo pode ser avaliada nãŁo segundo a que lhe é objectivamente mais semelhante, mas segundo outra que tenha sido muito agradável ou muito dolorosa ao decisor (gato escaldado de água fria tem medo). É também o caso da avaliaçãŁo da situaçãŁo a partir de algum estereótipo; quando estes últimos, por exemplo por se formarem a partir dum número reduzido de observaçãµes, podem ser totalmente falsos. É ainda o caso da avaliaçãŁo da situaçãŁo em funçãŁo duma determinada referãŞncia, chamada "ã˘ncora", por exemplo a expectativa de vendas de um destino turístico a partir das suas vendas no ano anterior; quando a escolha da ã˘ncora muitas vezes ignora factores relevantes, como uma escalada no preço do petróleo, um ataque terrorista próximo daquele destino, etc.

Ao nível colectivo, entãŁo, os condicionamentos extra-racionais à tomada de decisãŁo sãŁo a tal ponto reconhecíveis que, como diz o outro, um camelo é um cavalo desenhado por uma comissãŁo. Desde logo os estudos revelam uma disponibilidade para o mínimo esforço cognitivo da parte do grupo, de modo que os seus membros tendem a mal considerar informaçãµes novas a que poucas pessoas tenham ainda acesso, decidindo normalmente com base nas suas (daqueles membros) opiniãµes prévias, as quais por sua vez estruturam-se segundo as informaçãµes que sãŁo do conhecimento geral. Em segundo lugar, a coesãŁo dos grupos, em particular naqueles cujos membros se considerarem protegidos e moralmente correctos, costuma gerar um encadeamento de enviesamentos – o "pensamento de grupo" – que se caracteriza pelo silenciamento da divergãŞncia por força daquela coesãŁo, e pela fácil utilizaçãŁo de estereótipos falsos e de ã˘ncoras desadequadas. As consequãŞncias sãŁo conhecidas: pobreza da informaçãŁo recolhida, avaliaçãŁo incompleta das alternativas, análise deficiente das escolhas, descuramento de planos de segurança. E em terceiro lugar o "paradoxo de Abilene": em grupos como estes últimos, cada um dos seus membros decide por vezes em conformidade à sua expectativa da decisãŁo que merecerá o consenso dos restantes, de modo que o grupo acaba por decidir tacitamente a partir de expectativas sobre hipóteses que nunca chegam a ser propriamente analisadas.

  • Em alternativa ao modelo racional de tomada de decisãŁo surge entãŁo o conceito de "instituiçãŁo". Esse conceito designa i) num nível inferior, as regras, tanto formais quanto informais, que as comunidades implementam para orientarem as interacçãµes entre os respectivos membros; ii) num nível superior, os fundamentos dessas regras – as chamadas "representaçãµes do mundo", nas quais se incluem a determinaçãŁo da temporalidade, a concepçãŁo de homem, etc. –; e ainda iii) as estruturas de reforço, em alguns casos de formalizaçãŁo, dessas representaçãµes e regras, como as Igrejas, o Estado… – às quais aliás na linguagem corrente frequentemente se restringe a aplicaçãŁo do conceito (Amable, 2005: 49-53).

Podemos assim orientar a investigaçãŁo sobre as nossas tomadas de decisãŁo em ordem a uma produçãŁo inovadora para as regras informais da nossa sociedade que nos levam, por exemplo, a constituir estereótipos relevantes para aquelas decisãµes, para as regras que chegamos a formalizar constituindo todos os regulamentos e legislaçãŁo que nos enquadra; para o modo de funcionamento das estruturas que precisamente as formalizam e implementam; e para a representaçãŁo do mundo que tudo isso afinal implica – nestas linhas nãŁo avançarei porém para esta última instituiçãŁo, reconhecendo embora a sua fundamentalidade.

O "sistema social de inovaçãŁo e produçãŁo"

2.1. As instituiçãµes articulam-se dinã˘mica, hierárquica, e complementarmente (v. Amable, 2005: Chap. 2). Em relaçãŁo à primeira destas trãŞs características, uma vez aceite que a concepçãŁo das instituiçãµes como regras dadas num nível inferior remete para outro nível superior, no qual elas nãŁo radicam em qualquer natureza ou verdade revelada mas antes representam equilíbrios de poder – nem que seja o poder de uns fazerem os outros aceitar aquela revelaçãŁo – o seu estabelecimento torna-se dinã˘mico e multíplice visto que estes equilíbrios nãŁo sãŁo eternos nem únicos. Além disso, a economia institucional reconhece a heterogeneidade dos agentes, nomeadamente nas suas faculdades, interesses, conhecimentos, valores… substituindo o pressuposto do modelo racional da tomada de decisãŁo por um outro, mais abrangente, segundo o qual os agentes tãŞm faculdades (racionais e nãŁo só) para agirem estrategicamente em funçãŁo dos respectivos objectivos. Desta forma, a partir do momento em que alguns agentes desenvolvem estratégias que lhes facultam o poder de representar o mundo, a implementaçãŁo e desdobramento dessa representaçãŁo em todas as outras instituiçãµes vai-se processando numa tensãŁo entre parceiros que agem estrategicamente em funçãŁo de objectivos muitas vezes diferentes, sendo essas instituiçãµes ao mesmo tempo aceites como regras, e questionadas no seio de permanentes reequilíbrios de poder.

As instituiçãµes constituem-se assim de forma sistemática, e sãŁo desenvolvidas por sociedades que se organizam precisamente na medida em que as implementam. Desses sistemas sociais importa-nos ressalvar duas notas: por um lado, as instituiçãµes articulam-se hierarquicamente segundo os referidos níveis superior e inferior, sendo elas complementares entre si, isto é, o estabelecimento e exercício duma instituiçãŁo particular sugere o estabelecimento, e torna mais eficazes, certas outras instituiçãµes particulares – estas sãŁo as (já mencionadas) segunda e terceira características da articulaçãŁo institucional. Por outro lado, as instituiçãµes derivadas nãŁo radicam todas por igual numa mesma instituiçãŁo fundamental, antes remetem muitas vezes para aspectos diferentes desta, ou até para representaçãµes do mundo algo diferentes – o que incrementa o dinamismo já referido.

Ainda sobre economia e sistematicidade vem a propósito um terceiro apontamento, que retomaremos ao falarmos de educaçãŁo: Os agentes económicos sãŁo aqueles que escolhem por entre recursos limitados em prol de algum objectivo. Quaisquer escolhas fazem-se em funçãŁo de valores. Os quais se podem agrupar "em fundamentais (objectivos desejáveis de alcançar por cada um durante a sua existãŞncia, como, por exemplo, prosperidade, paz, igualdade, harmonia, auto-estima, reconhecimento social, etc.), e instrumentais (modos desejáveis de comportamento, como, ambiçãŁo, competãŞncia, coragem, responsabilidade, independãŞncia, etc.)." (Neves, J., 2001: 260). Assim, independentemente até da discussãŁo nuclear sobre quais sejam os valores fundamentais, importa adequar os valores instrumentais àqueles outros. Por exemplo, pode-se valorizar, fundamentalmente, a prosperidade – valorizaçãŁo talvez indiciada por um elevado número de telemóveis per capita, uma crescente procura de férias no estrangeiro, etc. E pode-se valorizar, instrumentalmente, mais a socializaçãŁo do que a produçãŁo – o que será indiciado por um elevado número de centros comerciais, cafés, até por uma elevada taxa de emprego, mas com uma produtividade reduzida. Cada um desses valores é possível. A sua reuniãŁo, porém, é que a médio prazo só poderá ter um resultado: frustraçãŁo.

2.2. Posto isto, é útil à análise económica identificar os domínios em que as instituiçãµes mais condicionam a inovaçãŁo e produçãŁo. Para isso seguimos aqui Bruno Amable (2005: 116, 124), desde o esquema do desenvolvimento baseado na inovaçãŁo até à identificaçãŁo daqueles domínios – saltaremos a discussãŁo teórica desta ilaçãŁo por julgarmo-la demasiado técnica para o ã˘mbito do nosso trabalho. Como o esquema da fig. 1 ilustra, o desenvolvimento, por um lado, resulta da competitividade industrial, que por sua vez resulta da inovaçãŁo, que por fim resulta da interacçãŁo entre a ciãŞncia, a tecnologia, e as competãŞncias profissionais. Por outro lado, o desenvolvimento condiciona uma interacçãŁo entre o mercado de trabalho, o sistema financeiro, e o sistema educativo, que condicionam respectivamente os momentos anteriores.

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Identificando mais concretamente os domínios institucionais assim relevantes, temos desde logo i) a educaçãŁo escolar, do ensino pré-primário ao superior mais a formaçãŁo profissional; ii) a intermediaçãŁo financeira e o sistema de controlo das empresas (corporate governance) que lhe está relacionado; e iii) a concorrãŞncia no mercado de trabalho e as relaçãµes salariais. Os autores distinguem ainda iv) a protecçãŁo social que acompanha esse terceiro mercado, e v) a concorrãŞncia no mercado de produtos que condiciona directamente a competitividade industrial.

Chama-se entãŁo "sistema social de inovaçãŁo e produçãŁo" (SSIP) ao complexo dinã˘mico, complementar, e hierarquizado das instituiçãµes que enquadram as interacçãµes dos agentes económicos nesses cinco domínios. De modo que serãŁo enfim estes SSIP que fazem funcionar os factores gerais que os manuais de economia mais costumam apontar ao desenvolvimento económico, a saber: o investimento (que supãµe uma acumulaçãŁo de capital); a deslocaçãŁo de recursos para os sectores mais rentáveis; a qualificaçãŁo da força de trabalho, e eficácia organizacional; o desenvolvimento tecnológico (cf. Samuelson e Nordhaus, 1996; Stiglitz, 1993).

O desafio do desenvolvimento e uma classificaçãŁo do capitalismo – o caso latino

Fosse logo pela comparaçãŁo entre as histórias económicas dos EUA e da Suíça, fosse depois pela fundamentalidade atribuída às representaçãµes do mundo – as quais sãŁo obviamente plurais – ficou já introduzida a ideia de que pode haver mais do que um SSIP com sucesso no mesmo período histórico. Com efeito distinguem-se hoje cinco modelos de capitalismo em correspondãŞncia a outros tantos SSIP. Assinalo que nas classificaçãµes sintetizadas por Amable (2005: Chap. 3) ainda nãŁo se consideram as estruturas produtivas chinesa e indiana, no entanto para o nosso propósito isso nãŁo é relevante. Nos próximos parágrafos começarei por explicitar as condiçãµes a que qualquer desses sistemas deverá corresponder em vista a um desenvolvimento económico. Depois apresentarei aquelas sínteses de quatro desses modelos, desenvolvendo à parte uma síntese do modelo que os autores atribuem aos países latinos.

3.1. Vivemos hoje o que se tem chamado "III RevoluçãŁo Industrial", "mundializaçãŁo", "economia do conhecimento"… Período que se costuma caracterizar pela importã˘ncia das tecnologias de informaçãŁo e computaçãŁo (TIC), da robótica, e pela emergãŞncia – embora ainda mais uma promessa que já realidade generalizada – das biotecnologias, nanotecnologias… Além disso a iminãŞncia do esgotamento dos combustíveis fósseis obriga a encarar com seriedade a substituiçãŁo das principais fontes de energia do séc. XX, e a consequente adaptaçãŁo sócio-económica.

O esquema da fig. 1 assinala a importã˘ncia da tecnologia, e portanto também da ciãŞncia. Entretanto, e ao contrário do que muitas pessoas temeram e algumas ainda temem, a competitividade industrial nãŁo se tem consignado à exploraçãŁo do trabalho – nomeadamente por uma deslocalizaçãŁo da produçãŁo para regiãµes onde a mãŁo de obra seja barata. Como o recente estudo de Suzanne Berger (2006) veio mostrar, neste aspecto a estratégia empresarial divide-se hoje em trãŞs modelos: i) a fragmentaçãŁo segundo critérios de custo mas também de qualidade, de capacidade de satisfaçãŁo das encomendas, etc., como a produçãŁo internacional de componentes de hardware depois reunidos num único PC; ii) a integraçãŁo vertical, que concentra sectores desde o design à distribuiçãŁo perto da respectiva sede de modo a controlar a qualidade dos produtos com a rapidez que o fornecimento das suas lojas requer; e iii) a constituiçãŁo de redes empresariais em pequenas zonas (ex. Silicon Valley).

Mas qualquer dessas estratégias implementa a chamada "teoria O-Ring do desenvolvimento económico" (v. Cohen, 1997). "O-Ring" era o nome da simples junta cujo mau funcionamento causou a explosãŁo da nave Challenger, exemplificando a possibilidade de todo um processo produtivo se perder pela menor qualidade de um único elemento. Assim o trabalho deve ser dividido estratificadamente, de tal modo que os factores ou elementos mais decisivos sejam reunidos num nível, os intermédios em outros, e os mais dispensáveis noutro ainda. Como é evidente, a distribuiçãŁo do rendimento será proporcional à relevã˘ncia e indispensabilidade de cada factor para o processo produtivo, e ao valor do sucesso ou fracasso deste último. O desafio económico de cada comunidade (ou indivíduo) será portanto o de participar de processos de elevado valor, desempenhando aí as funçãµes mais relevantes e indispensáveis.

Ainda segundo autores como Daniel Cohen, na economia do conhecimento essas funçãµes sãŁo basicamente as de "produçãŁo de símbolos" ou ideias. Uma "ideia" é um bem que pode ser utilizado por muitos consumidores ao mesmo tempo – como um produto de software, ao contrário dos de hardware – alcançando assim uma grande rendibilidade (desde que os direitos de autor sejam salvaguardados). Além de que constitui o primeiro passo de qualquer inovaçãŁo. Em conformidade, nos dias que correm, os SSIP que melhor facultem a produçãŁo de símbolos serãŁo os que permitam um maior desenvolvimento económico às respectivas comunidades.

O mesmo é dizer: as comunidades que nãŁo se estejam a desenvolver e que procurem melhorar este seu desempenho devem ajustar os respectivos SSIP à especificidade da economia do conhecimento, ou mesmo, mais drasticamente, tentar evoluir para um outro SSIP mais produtivo.

3.2. A tabela da fig. 2 apresenta algumas características de quatro modelos de capitalismo nos domínios que distinguimos no parágrafo 2.2. Como modelos que sãŁo, deve-se ter em conta que os diversos países apenas se aproximarãŁo mais de um ou de outro, podendo inclusivamente verificar características de mais que um modelo.

Modelo

Domínio

Liberal

Social-democrata

Europeu continental

Asiático

ConcorrãŞncia no mercado de produtos

Grande importã˘ncia da concorrãŞncia de preços; os quais constituem os sinais de coordenaçãŁo económica; neutralidade do Estado; abertura à concorrãŞncia e investimento estrangeiros.

Grande importã˘ncia da concorrãŞncia pela qualidade; intervençãŁo do Estado; forte coordenaçãŁo por outros mecanismos além dos preços; abertura à concorrãŞncia e investimento estrangeiros.

Importã˘ncia moderada da concorrãŞncia pelos preços, maior importã˘ncia da concorrãŞncia pela qualidade; intervençãŁo do Estado; alguma coordenaçãŁo por outros mecanismos além dos preços; protecçãŁo fraca contra concorrãŞncia e investimento estrangeiros.

Importã˘ncia da concorrãŞncia pelos preços e pela qualidade; importã˘ncia das grandes empresas; intervençãŁo do Estado; forte coordenaçãŁo por outros mecanismos além dos preços; forte protecçãŁo contra concorrãŞncia e investimento estrangeiros.

ProtecçãŁo social

Fraca protecçãŁo social, com pequena participaçãŁo do Estado; apenas apoio à pobreza; prestaçãµes condicionadas pelos recursos; sistemas de reforma por capitalizaçãŁo.

Forte protecçãŁo social, com grande participaçãŁo do Estado; grande importã˘ncia da protecçãŁo social para a sociedade.

Forte protecçãŁo social, fundada sobre o emprego, com envolvimento do Estado; financiamento por cotizaçãµes; sistemas de reforma por repartiçãŁo; grande importã˘ncia da protecçãŁo social para a sociedade.

Fraca protecçãŁo social; despesas dirigidas para o apoio à pobreza; pequena fracçãŁo das despesas públicas em protecçãŁo social.

ConcorrãŞncia no mercado do trabalho e relaçãµes salariais

Fraca protecçãŁo do emprego; contrataçãŁo e despedimento fácil, flexibilidade externa fácil, recurso ao trabalho temporário; ausãŞncia de política activa de emprego; descentralizaçãŁo das negociaçãµes salariais.

Moderada protecçãŁo do emprego; políticas de emprego activas; negociaçãŁo salarial coordenada ou centralizada, com sindicatos fortes; relaçãµes laborais cooperativas.

Forte protecçãŁo do emprego; limitada flexibilidade externa; política de emprego activa; coordenaçãŁo da negociaçãŁo salarial, com sindicatos relativamente fortes.

ProtecçãŁo do emprego nas grandes empresas; limitada flexibilidade externa; política salarial baseada na antiguidade; ausãŞncia de política de emprego; descentralizaçãŁo das negociaçãµes salariais; relaçãµes laborais cooperativas.

IntermediaçãŁo financeira

Forte protecçãŁo dos accionistas minoritários; fraca concentraçãŁo da propriedade; grande importã˘ncia dos investidores institucionais; mercado activo para aquisiçãŁo, fusãŁo... das empresas; forte sofisticaçãŁo dos mercados financeiros; desenvolvimento do capital de risco.

Forte concentraçãŁo da propriedade; importã˘ncia dos investidores institucionais; ausãŞncia de mercado para aquisiçãŁo... das empresas; fraca sofisticaçãŁo dos mercados financeiros; grande concentraçãŁo bancária.

Fraca protecçãŁo dos accionistas externos; forte concentraçãŁo da propriedade; ausãŞncia de mercado activo para aquisiçãŁo...das empresas; fraca sofisticaçãŁo dos mercados financeiros; desenvolvimento moderado do capital de risco; forte concentraçãŁo bancária; importã˘ncia dos bancos no financiamento das empresas.

Fraca protecçãŁo dos accionistas externos; forte concentraçãŁo da propriedade; ausãŞncia de mercado activo para aquisiçãŁo... das empresas; nenhuma sofisticaçãŁo dos mercados financeiros; desenvolvimento limitado do capital de risco; forte concentraçãŁo bancária; participaçãŁo dos bancos na gestãŁo das empresas.

Subsistemas educativos

Baixas despesas públicas; sistema de ensino superior muito competitivo; educaçãŁo secundária nãŁo homogeneizada; pouca formaçãŁo profissional de base, com ãŞnfase nas competãŞncias gerais; formaçãŁo ao longo da vida.

Grande investimento público; elevadas taxas de escolarizaçãŁo; ãŞnfase sobre a qualidade na educaçãŁo primária e secundária; importã˘ncia da formaçãŁo profissional de base, com ãŞnfase nas competãŞncias específicas, e importã˘ncia da formaçãŁo permanente.

Grande investimento público; elevada taxa de escolarizaçãŁo no ensino secundário; homogeneizaçãŁo do secundário; desenvolvimento da formaçãŁo profissional de base, com ãŞnfase nas competãŞncias específicas.

Fraco nível das despesas públicas; elevadas taxas de escolarizaçãŁo; ãŞnfase da qualidade do ensino secundário; formaçãŁo profissional interna no seio das empresas, ãŞnfase nas competãŞncias específicas, e importã˘ncia da educaçãŁo técnica.

Exemplos aproximados

Países anglo-saxónicos.

Escandinávia.

Alemanha, a França em parte.

JapãŁo, Coreia do Sul.

Fig. 2

Como foi dito atrás, as instituiçãµes de cada modelo de capitalismo sãŁo complementares (ainda que nãŁo constituindo sistemas acabados). Por exemplo, uma grande concorrãŞncia no mercado de produtos, dada a imprevisibilidade e velocidade das mudanças que lhe sãŁo próprias, reforça e é reforçada por instituiçãµes que facultem a flexibilidade no financiamento das empresas e no mercado de trabalho, assim como a estas últimas corresponde uma formaçãŁo generalista de base, para depois a formaçãŁo específica ser feita ao longo da vida em adequaçãŁo a cada funçãŁo profissional que se exerce. Na medida porém em que a coordenaçãŁo laboral alcance uma partilha da gestãŁo empresarial por parte dos trabalhadores em troca da moderaçãŁo salarial – Amable (2005: Ch. 6) aponta esta condiçãŁo para um sucesso do SSIP europeu continental – tornam-se possíveis, e porventura desejáveis, planeamentos de mais longo prazo, logo com financiamentos ajustados por intermédio da banca, com instituiçãµes laborais que defendam os empregos previstos, e com formaçãŁo profissional orientada para os conhecimentos e competãŞncias específicas para tais funçãµes. Por consequãŞncia a correspondãŞncia à produçãŁo O-Ring nãŁo deve ser casuística – ex. uma adopçãŁo de instituiçãµes escolares próprias ao modelo liberal, e de instituiçãµes laborais, financeiras… próprias ao capitalismo europeu continental, nãŁo teria outro resultado que o mútuo bloqueamento dessas instituiçãµes. É todo o SSIP de cada comunidade que deve corresponder àquela produçãŁo, ou essas comunidades simplesmente fracassarãŁo o desafio da III RevoluçãŁo Industrial.

3.3. Exacerbando algumas características do SSIP europeu continental, como este por sua vez exacerba características social-democratas, os países do sul da Europa mais os que em outros continentes se lhes assemelhem tãŞm desenvolvido um quinto modelo de capitalismo, por isso chamado "mediterrã˘nico". Por comparaçãŁo àqueles dois modelos, no domínio do mercado de produtos este sistema caracteriza-se em geral por uma menor concorrãŞncia, mais orientada pelos preços que pela qualidade. Esse mercado é em boa parte constituído por pequenas empresas, e sofre alguma intervençãŁo do Estado, nomeadamente com uma moderada protecçãŁo contra o investimento e empresas estrangeiras. A negociaçãŁo salarial é centralizada. Verifica-se uma elevada protecçãŁo do emprego, particularmente nas grandes empresas, mas com uma franja de trabalho provisório ou a tempo parcial. Em conformidade nãŁo se desenvolvem políticas activas de emprego. O nível de protecçãŁo social é moderado, com forte intervençãŁo do Estado, e com ãŞnfase no apoio à pobreza e nas reformas. Estas últimas visam aliás conservar o estatuto sócio-económico adquirido durante a carreira, e nãŁo tanto facultar condiçãµes ditas "dignas" ao conjunto da populaçãŁo. No domínio financeiro verifica-se uma reduzida protecçãŁo dos accionistas externos, e uma forte concentraçãŁo da propriedade. O controlo das empresas é condicionado pela banca, concentrada, e com produtos pouco sofisticados. O desenvolvimento do capital de risco é limitado. Finalmente as despesas públicas em educaçãŁo tendem a ser baixas, a taxa de escolarizaçãŁo superior é reduzida, o sistema universitário é fraco, assim como a formaçãŁo profissional, que nãŁo é permanente, e que enfatiza as competãŞncias gerais.

Essas instituiçãµes tendem a complementar-se como se indica na tabela da fig. 3 (v. Amable, 2005: 148) – seguindo o condicionamento dos domínios indicados à esquerda sobre cada um dos indicados ao alto:

Mercado

produtos

ProtecçãŁo social

Mercado

trabalho

Subsistema financeiro

Subsistema educativo

Mercado

produtos

ConcorrãŞncia fraca permite estabilidade do emprego (empresas grandes).

ConcorrãŞncia fraca permite relaçãµes estáveis entre finança e indústria.

EspecializaçãŁo e estrutura industrial (das pequenas empresas) nãŁo exige mãŁo de obra muito qualificada.

ProtecçãŁo social

Despesas reduzidas implicam pequenas distorçãµes fiscais do mercado de produtos.

Despesas reduzidas aumentam a procura da diversificaçãŁo individual do risco.

Fraca protecçãŁo dissuade o investimento em competãŞncias específicas.

Mercado

trabalho

ProtecçãŁo formal impede reestruturaçãµes rápidas (das empresas grandes).

Estabilidade do emprego reduz procura da protecçãŁo social.

Estabilidade do emprego exige ausãŞncia de contratos de curto prazo.

Estabilidade do emprego nãŁo exige modernizaçãŁo constante das competãŞncias da mãŁo de obra.

Subsistema financeiro

Mercados subdesenvolvidos e relaçãµes banca-indústria estáveis atrasam reformas estruturais

Pouca diversificaçãŁo individual do risco implica alto nível de protecçãŁo social

AusãŞncia de contratos de curto prazo permite estabilidade do emprego

Subsistema educativo

Nível de competãŞncias da mãŁo de obra impede o desenvolvimento de alta tecnologia

Investimentos específicos fracos atenuam a procura de protecçãŁo social

O subsistema nãŁo fornece mãŁo de obra fortemente qualificada

ConclusãŁo

Em síntese, creio que qualquer teoria considerará que uma condiçãŁo do desenvolvimento económico de qualquer comunidade contemporã˘nea é a correspondãŞncia às exigãŞncias da economia do conhecimento.

Uma vez que se adopte a teoria institucionalista, essa correspondãŞncia terá por condiçãŁo uma sistematicidade que articula as instituiçãµes de vários domínios, destacando-se as relativas à educaçãŁo, todas elas na base de uma outra instituiçãŁo, a representaçãŁo do mundo, mais as instituiçãµes que as implementam (Igrejas, Estado...).

A análise das condiçãµes de desenvolvimento de cada comunidade deverá assim:

  • A. começar por uma recolha de elementos dos domínios sociais de inovaçãŁo e produçãŁo;

  • B. em seguida caber-lhe-á aferir o grau de complementaridade, ou sistematicidade desses domínios; uma vez que esta se verifique em alguma medida, será possível

  • C. classificar tal SSIP, e estimar a sua correspondãŞncia às exigãŞncias da III RevoluçãŁo Industrial;

  • D. para enfim, e se porventura o juízo nãŁo for positivo – o modelo mediterrã˘nico é o que pior estará correspondendo àquelas exigãŞncias… além de que uma falta de complementaridade institucional também dificilmente permitirá essa correspondãŞncia – se abrir a discussãŁo política, a saber:

  • E. entre uma evoluçãŁo para o segundo modelo mais próximo – que do mediterrã˘nico é o europeu continental... cujo desempenho porém nãŁo está sendo brilhante (mas atenda-se à pista sobre uma concertaçãŁo social entre patronato e sindicatos) – e uma revoluçãŁo em ordem a algum dos modelos com melhor desempenho, seja o liberal seja o social-democrata – mas numa "revoluçãŁo" que só o será se começar na representaçãŁo, cultural, do mundo.

O que coloca a questãŁo do modo de se influenciar a maioria da comunidade em ordem a essas alteraçãµes culturais.

[AdaptaçãŁo da primeira parte e conclusãŁo de "Os Açores e o desenvolvimento económico – Alguns elementos do sistema social de inovaçãŁo e produçãŁo açoriano", in: Atlã˘ntida, Instituto Açoriano de Cultura, vol. LI (2006): 249-269]

ReferãŞncias bibliográficas

Amable, Bruno (2005), Les Cinq Capitalismes – Diversité des Systèmes Économiques et Sociaux dans la Mondialisation, Paris: Seuil.

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Stiglitz, Joseph E. (1993), Economics, New York, London: W.W. Norton & Company.

 

 

 

Autor:

Miguel S. Albergaria

miguel.albergaria[arroba]hotmail.com

03-07-2009



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