Poemas Contemporaneos



1

Neste modesto sobrado do Bairro Alto

Fiz meu forte

Saio pouco

O mundo não é lugar ameno

Para se sair sem bons motivos

Os amigos me telefonam

Mas evitam fazê-lo demais

Trago todavia a porta sempre aberta

Se entrares farei para nós café com conhaque

E misturaremos poetas piratas e monges em longa trela

Se passares ao largo e na madrugada

E vires uma sacada acesa onde um homem fuma absorto

Saiba que sou eu e que vou bem

2

O que bem sei

Está em meus músculos

O resto ignoro

Ou talvez esqueça

3

Ele morreu

Porque a vida dos homens

Importara-lhe mais que a sua

Porque o mundo o arrebatava

E parecia-lhe crucial que as manhãs

Pertencessem para sempre às aves e ao orvalho

Às mulheres que amassavam cedo o pão

Antes que seus maridos fossem pescar

Ele morreu como tantos

Entre tentações e amores

Entre amigos fiéis e infiéis

Amava o vinho e o perfume

A solidão dos bosques e o incomensurável das estrelas

E como nós possuía braços e pernas

E uma barba que crescia todos os dias

E as aflições próprias do mundo

Mas não como nós

Possuía a si próprio

Que ... nos proibimos

4

Amávamos o conhaque e os cigarros sem filtro

As noites inteiras no bilhar

As conversas sem fim ouvindo jazz

Saudosos de um tempo que já não era o nosso

Éramos viris naturais

Amávamos os corpos na praia

E o cheiro do lodo nos canais

Seríamos pugilistas ou marinheiros

Menos aquilo em que nos transformamos

5

A pessoa que eu mais amei na minha vida

Foi minha mãe

Para mim, mãe só tem uma

Se me perguntassem o que eu mais gostaria

De estar fazendo agora

Responderia sem piscar:

Puxando fumo no colo da minha mãe

6

Você deixa as coisas pela metade

Meia xícara de café tomado

Abraço no ar desenhado

Beijo de batom no guardanapo

Tenho medo de ser seu por um momento

E herdar imprecisão e esquecimento

7

Compreender o alcance de suas próprias palavras

É melhor do que compreender o grego

Entender seu vizinho é mais importante

Que entender Platão

Conhecer um bom lugar para tomar banho

No rio de sua cidade

É melhor que desejar banhar-se

No G... ou no Jordão

8

As palavras me reduzem

Percorro-as na ponta do olhar

Escuto

Escrevo

Falo

E no que dizem

Ou lhes escapa

Sou seu prisioneiro

9

Você é legal garoto

Com essas calças vermelhas

De amante de Lady Chatterley

Você transa bem

Embora às vezes

Precise ir mais devagar

E ouve um puta som pesado

Nesse carro velho do seu irmão

Só tem uma coisa cara

Você está quase sempre duro

Peça uma grana pro papai


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