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Pitágoras (página 2)

Elnora Gondim

3ª- a terra se encontra no centro dos corpos celestes;

4. A Alma

A alma é prisioneira do corpo. Ela, no Cosmos, vai tomando distintos corpos em todas as coisas. A sua forma mais alta da alma são os astros: a alma é eterna por ser semelhante aos astros e tem com eles sua verdadeira morada. Ela, por sua vez, pode eleger em que corpo vai se introduzir como, por exemplo, o corpo de um animal, de uma planta, de um homem, etc. Por este motivo, há um parentesco entre todos os seres vivos.

Em se tratando do homem, ele é composto de corpo e alma. As almas são partículas despreendidas da pneuma infinita que vagam ate se encontrarem nos corpos, nos quais entram por respiração. A alma é um número que move a si mesma. Ela é um princípio motor relacionado com a respiração cósmica que é, também, um meio de conhecer a harmonia universal onde a música tem um papel fundamental nisto, pois através dela as paixões se acalmam e se eleva o espírito a perceber a harmonia em todas as coisas.

5. Discípulos Pitagóricos

Nos discípulos pitagóricos há a seguinte divisão:

1º- acusmáticos ou ouvintes- são aqueles que poderiam ver o mestre, porém só poderiam escutá-lo.

2º- matemáticos- aqueles que poderiam ver o mestre e questioná-lo.

6. Referências a Pitágoras

Não se reconhece nenhum livro de autoria de Pitágoras, porém muitas histórias são atribuídas a ele.

Há um grande número de referências a Pitágoras e seus seguidores. Estas têm três elementos principais:

1º- duvidosa reputação do sábio, tal qual mostra o texto seguinte:

" ... Hermipo [3]narra um outro episódio da vida de Pitágoras. Chegando à Itália, construiu para si um abrigo subterrâneo e pediu à sua mãe que anotasse numa plaqueta, com indicações quanto ao momento de sua ocorrência, e mandasse as notas para seu esconderijo subterrâneo até seu reaparecimento. Sua mãe seguiu suas instruções. Passado algum tempo, Pitágoras voltou tão magro que parecia um esqueleto. Entretanto, no recinto de assembléia, declarou que estava no Hades, e leu para os presentes tudo que ocorrera durante sua ausência. Os participantes da assembléia, perturbados com suas palavras, choravam e gemiam, acreditando que Pitágoras fosse uma divindade,indo ao extremo de lê confiarem para prenderem algumas de suas doutrinas..."[4] .

2º- ensinamentos sobre a psique como diz o texto:

"... Dizem que Pitágoras foi o primeiro a revelar o que a psique, de acordo com o ciclo imposto pelo destino, liga-se ora a um ser vivo, ora a outro..." .[5]

Desta maneira, Pitágoras foi o primeiro sábio a pensar a psique, trazendo-a para o campo da filosofia.

3º- impregnação com o mito de Orfeu como o texto afirma:

"... Os pitagóricos, disse Aristóxeno, recorriam à medicina para purificar o corpo e a música para purificar a psique..."[6]

Neste sentido, a música, para Pitágoras, é sinônimo de harmonia e está relacionado ao mito de Orfeu.

Orfeu era um poeta, casado com Eurídice. Ele sendo atacado por um cidadão, quem morre é ela.Orfeu inconformado toca sua lira, a qual tem um poder formidável. Com isto, ele vai ao mundo dos mortos e consegue encontrar os deuses dos mortos, fazendo com que Eurídice o acompanhe. Porém, embora ele tenha conseguido este feito, isto tem uma restrição: ele não pode olhar para Eurídice. Ao fazer isto, quando ele volta para a terra, Orfeu não quer saber de nenhuma mulher. As memphis não suportam ser descartadas e cortam a cabeça de Orfeu, porém sua boca continua cantando.

Deste modo, Pitágoras era impregnado pelo mito de Orfeu no sentido de afirmar que a preocupação com a morte é um cegar para o poder pensar e como, também, acreditar que há uma negação do olhar para se filosofar.

Neste sentido, Pitágoras fala em uma vida incluída na morte, onde no momento que o sopro acaba, acaba tudo.

Assim, ele tem uma indignação em relação ao pensamento mítico, criticando, assim, os poetas míticos, punindo-os no mundo dos mortos como se vê no texto abaixo:

"... Jerônimo diz que Pitágoras, descendo ao hades, viu a psique de Hesíodo presa a uma coluna de bronze e gritando e a de Homero pendente de uma árvore cercada de serpentes, pelo que esses poetas haviam dito dos deuses, e viu punidos também aqueles que não se queriam unir-se às suas mulheres..."[7].

Assim, Pitágoras é contra o pensamento mítico dentro de uma linguagem metafórica, mas ele não é contra a poesia, pois esta tem um caráter matemático, ela é calculável.

Lendas milagrosas

Dentre as lendas milagrosas sobre Pitágoras, a que Aristóteles diz é que:

"...Pitágoras foi visto o mesmo dia e a mesma hora

em Metaponto e em Crotona...[8]"

Neste sentido, está claro que o êxito de Pitágoras não foi o de um simples mago ou ocultista que só chamava a atenção de pessoas inseguras, mas, como segue a citação acima, ele poderia ser alguém que possuía um poder psíquico não muito comum. Desta maneira, ele foi comparado com diversos personagens visionários da idade arcaica tardia, tais como Aristeas, Abaris e Epiménides, a quem se acreditava possuidor de um número de fatos espirituais que incluíam profecias, exibições de poder sobre o mal, desaparições e aparições misteriosas.

Estas afirmações se devem ao fato de que Pitágoras acreditava que todos os conhecimentos que os gregos possuíam, nada mais eram do que fragmentos da grande sabedoria que se encontrava nos templos egípcios.

Com isto, a fim de saber mais acerca dos mistérios da vida e do universo, era necessário que se deslocasse para o Oriente, aos lugares em que esses conhecimentos ainda permaneciam vivos. Assim, escolhendo Esparta como partida, Pitágoras inicia uma grande viagem através das maiores cidades e templos do mundo antigo que se prolongou por 40 anos.

Esta viagem levou-o a encontrar com as maiores personalidades do seu tempo. Em Mileto, encontrou Tales e Anaximandro. Em Saís, encontrou o faraó Ã,masis que, reconhecendo as suas enormes capacidades, permitiu a sua admissão nos templos iniciáticos do Egito, como afirma o texto seguinte:

"... Mais tarde Pitágoras foi para o Egito, levando uma carta de Polícrates que o recomendava a Ã,masis; aprendeu a língua egípcia, como diz Antífon na obra Dos Homens que se distinguem em excelência, e também esteve entre os caldeus e os magos. Posteriormente, enquanto visitava Creta, penetrou na caverna do Ida com Epimenides, mas ainda no Egito entrara nos santuários e aprendera os ensinamentos secretos da teologia egípcia..."[9].

Logo, foi no Egito, onde permaneceu em torno de 25 anos, que o filósofo de Samos extraiu os conhecimentos que fundamentariam seu ensinamento futuro.

Existem ainda indícios de que teria sido discípulo de Zoroastro. Contudo, uma coisa parece evidente, ele estudou com os maiores mestres daquela época.

Acusmáticos

Vários autores expõem máximas como partes da doutrina de Pitágoras. Não há dúvida de que estas foram transmitidas verbalmente. Aos iniciados, Pitágoras exigia, provavelmente, que as memorizassem. Portanto, podemos, em certo sentido, mas não com certeza, ter um certo crédito nos escritos atribuídos a Pitágoras.

Dentro dos ensinamentos aos seus seguidores, podemos citar as regras da abstinência. Algumas destas regras parecem precauções rituais preescritas aos iniciados, como é citado no texto seguinte:

...seus preceitos eram as seguintes: não atiçar o fogo com a faca, não forçar a balança, não sentar sobre a medida de grãos, não comer o coração, ajudar a depor a carga e não agravá-la, ter sempre as cobertas enroladas juntas, não pôr a imagem de um deus na placa de um anel, não deixar a marca das panelas nas cinzas, não esfregar um vaso com uma tocha, não urinar voltado para o sol, não caminhar por fora das estradas, não apertar mãos com facilidade, não ter andorinhas sob o próprio teto, não criar animais com artelhos aduncos, não urinar nem pisar sobre unhas e cabelos cortados, não voltar atrás na fronteira quando sair da pátria[10]

Não acreditamos que Pitágoras jamais teve a intenção de ser interpretado na íntegra. Estes dados refletem as preocupações pitagóricas que, possivelmente, nos diz que as máximas assim expostas têm, em sua origem, um sentido mais amplo tal como nos informa Diógenes Laércio:

...com o preceito não atiçar o fogo com uma faca, Pitágoras queria dizer: não se deve provocar a ira ou o orgulho inflado dos poderosos; com não forçar a balança, não atentar contra a eqüidade e a justiça; com não sentar sobre a medida de grãos, cuidar também do futuro, pois a medida de grãos é ração para um dia; com não comer o coração, queria significar não consumir a psique com aflições e penas; com não voltar atrás na fronteira quando sair da pátria, advertia todos os que partem da vida, a não se deixarem deter pelo desejo de viver nem se deixarem atrair pelos prazeres desta vida. Poderíamos explicar também os outros preceitos, mas isto nos levaria muito longe...[11]

Além das regras acima citadas, nós podemos constatar que, nas informações que foram repassadas sobre o ensinamento de Pitágoras, há muita coisa que foi divulgada e que não eram dele. Um exemplo nós podemos constatar na seguinte passagem de Xenófanes:

...agora passo a outro tema e mostrarei o caminho. (...) Dizem que, ao passar em uma ocasião junto a um cachorro que estava sendo espancado, sentiu compaixão e disse: - Pára, pois a psique que reconheci ouvindo-lhe a voz é a de um amigo...[12]

Porém, neste texto não é citado o nome de Pitágoras, onde a observação de Xenófanes pode ter sido algo criado por ele, pelo fato de Pitágoras ser um transmigracionista. Por este motivo, é apenas provável o fato de que Pitágoras acreditava em uma reencarnação, fazendo, assim, surgir amplas interpretações e criações a respeito da sua doutrina.

Conclusão

Pitágoras dividia em duas modalidades os tipos de alunos que ele tinha, tal como Porfírio nos mostrou no texto seguinte:

...alguns de seus seguidores recebiam o título de matemáticos, outros eram conhecidos como ouvintes (acusmáticos). Os matemáticos depois de assimilarem o discurso do saber, aprofundavam os estudos em busca de rigor. Os acusmáticos contentavam-se com síntese de assuntos tratados, desinteressados de exposições avançadas...[13]

Dentro deste contexto, uma das inferências que podemos fazer quanto à questão da divulgação do pensamento pitagórico, é a de que ela seria feita por acusmáticos, ou seja, ouvintes que não tinham o direito de fazer perguntas ao mestre e que o entendiam na íntegra sem uma preocupação maior com a interpretação daquilo que eles ouviam. Logo, os acusmáticos eram pessoas que só ouviam, mas não pensavam, porque isto era atribuído aos matemáticos.

Um outro aspecto é quanto à quantidade de pessoas que ouviam as preleções de Pitágoras. Segundo Diógenes Laércio, embora isto possa parecer exagero, não menos de seiscentas pessoas participavam e escreviam a seus familiares contando o que ouviram. Então, isto já configura em um dado bastante relevante para considerarmos que muitas destas pessoas poderiam ter se equivocado quanto àquilo que ouviram, como também poderiam ter aumentado nas cartas a seus familiares daquilo que presenciaram.

Pitágoras, nós acreditamos, foi um cientista e um filósofo antes de ser um místico. Ele fundou uma escola filosófica e nela eram desenvolvidos temas importantes para a humanidade como:

1º. A realidade é matemática da natureza em seus níveis mais profundos;

2º. A filosofia pode ser utilizada para purificação espiritual;

3º. Colocação do problema entre unidade e a multiplicidade;

4º. Conceito de cosmos;

5º. Conceito de Psique;

6º. Teoria heliocêntrica;

7º. Pensamento como iluminação do homem;

8º. Música como harmonia para o pensar;

9º. Respeito às mulheres;

10º. Criador da palavra filósofo.

Em suma, Pitágoras não poderia ser classificado apenas como místico e não como sábio. Acima de tudo, ele foi um filósofo e isto fica evidente quando são mostrados os temas relevantes que ele refletiu.

Também isto é contatado no seguinte texto:

Na sucessão dos filósofos, Sosícrates diz que Pitágoras, quando Leon, tirano de Fliús, lhe perguntou quem era ele, respondeu: "- Um filósofo." Como comparava a vida ao aglomerado humano nos jogos: uns correm para competir, outros para comercializar, os melhores vêm, entretanto, para observar; assim é na vida, uns comportam-se como escravos, são os caçadores de glória e luxo; os filósofos, ao contrário, procuram a verdade.[14]

Logo, alguém que procura a verdade como um filósofo, não pode ser jamais ser considerado como um místico em detrimento do sábio, como também alguém que faz apologia às matemáticas como sinônimo de perfeição, também, assim não pode ser designado.

 

 

 

 

Elnora Gondim

elnoragondim[arroba]yahoo.com.br


[1] THESLEFF, H. The Pythagorean Texts of the Hellenistic Period. Cabo, 1965.

[2] PLATÃfO. Górgias. p.454-455

[3] Hermipo era um cusmático

[4] ( Diógenes Laércio;41 )

[5] ( Diógenes Laércio;14 )

[6] ( Jamblico, V.P.10 )

[7] ( Diógenes Laércio; 21 )

[8] ARISTÃ"TELES. Fr.191. Rose; Elio, V.H.II, 26 (DK 14,7)

[9] ( Diógenes Laércio; 3 )

[10] (Diógenes Laércio, 17)

[11] (Diógenes Laércio, 18)

[12] (Diógenes Laércio, 36)

[13] (Porfírio, V.P. 37)

[14] (Diógenes Laércio, 8)



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