Página anterior | Voltar ao início do trabalho | Página seguinte |
2.1 Conceito e Classificação
O Conceito de droga, palavra que vem de droog (holandês antigo, que significa folha seca), é "qualquer substância que é capaz de modificar a função dos organismos vivos, resultando em mudanças fisiológicas ou de comportamento" (Unifesp¹). Sendo ainda dividida em piscotrópica: "é aquela que atua sobre o cérebro, alterando de alguma forma o psiquismo"; medicamento ou fármaco: "é a droga que atuando em organismos vivos, provoca efeitos benéficos ou úteis"¹; e tóxico: "é a droga que administrada em organismos vivos produz efeitos nocivos"¹, podendo também ser agrupadas em categorias ou famílias de substancias conforme os efeitos que provocam e as matérias primas de que são feitas (tabela 1).
Fora a divisão sob a perspectiva médica, temos também o fracionamento jurídico em licita e ilícita. Sendo licita "aquela que o uso e comércio são permitidos por lei" e ilícita que "é a de uso e comercialização ilegal".
Existem varias formas de abordar as drogas. A medicina o trata como uma enfermidade; a psicologia o reduz à farmacodependência; a antropologia o considera como uma distorção dos ritos tradicionais e a sociologia o qualifica como anomalia, desvio ou subcultura marginal (GOMEZ JARA E MORA HERNANDEZ, 1988).
Tabela 1 – Tipos de Drogas
FAMÍLIAS |
PRODUTO |
ORIGEM |
DATA |
||
ESTIMULANTES |
Tabaco Nicotina Café Cafeína Coca (Eythroxylon coca) Cocaína Crack Anfetaminas (inibidores de apetite) |
América Europa África Europa América Alemanha EUA Alemanha |
?A.C. século XVI ? A.C. 1829 c. 2500 A.C. 1858 1980"s 1912 |
||
DEPRESSIVOS |
Álcool Barbitúricos (calmantes) |
Eurásia/América Alemanha |
? A.C. 1903 |
||
ALUCINÓGENOS |
LSD (Claviceps purpureus) Peyote Mescalina PCP(fenciclidina) |
Suiça América Central EUA |
1938 c. 1000 A.C. 1880"S 1959 |
||
CANNABIS SATIVA |
Maconha/Marijuana Haxixe |
Índia Ásia |
c. 4000 A.C. ? |
||
NARCÓTICOS |
Ópio (Papaver somniferum) Morfina Heroína |
Índia, Sumeria Alemanha Alemanha |
c. 3000 A.C. 1828 1874 |
||
INALANTES |
Éter (líquido) Acetona Cola de sapateiro Alcalóide Efedrina |
Alemanha Alemanha China |
1730 1839 c. 3000 A.C. |
||
DESIGNER DRUGS |
MDMA (Ecstasy) Ice China white |
Alemanha Japão |
1914 1980"s |
Fontes diversas.
Organização: AUTOR
2.2 Breve Histórico
O uso de drogas possui uma presença constante ao longo da história do homem, presença esta associada não apenas a medicina ou ciência, mas também a magia, religião, cultura, festa e deleite
Começaremos nossa analise pelo cânhamo, originário da Cannabis Sativa, que segundo Toscano Jr. (2001) teve seus primeiros registros encontrados na China datando de 4000 a.C. tendo sido utilizado na antiguidade por sacerdotes indianos em cerimônias. Há cerca de 2000 anos a cannabis era utilizada na medicina chinesa como analgésico e na medicina indiana como hipnótico, analgésico e espamolítico. No Brasil as evidencias indicam que a maconha teria sido trazida pelos escravos africanos se expandindo por quase todo território nacional.
O ópio, de acordo com registros sumerianos, era usado em 3000 a.C. para uso medicinal sendo citada pelo próprio Homero como algo "que faz esquecer o sofrimento" em sua Odisséia. Toscano Jr. (2001) explica que:
"no Brasil o ópio e seus derivados atualmente considerados substâncias ilegais já foram utilizados em várias medicações como em xaropes para tosse ou mesmo para "acalmar as criancinhas", sendo vendido nas farmácias até o início do século XX"
A descoberta da América se tornou em uma fonte inesgotável de recursos botânicos, nela revelaram-se a coca e o tabaco. Os povos andinos tinham por habito mascar folhas de coca para suportar o trabalho em altitude e a dieta inadequada. No século XIX foi isolada a cocaína, alcalóide obtido da folha de coca, que inicialmente era utilizada como antídoto dos depressores do sistema nervoso e no tratamento do alcoolismo, da morfinomania e também como anestésico local em cirurgias oftalmológicas.
No caso do Brasil, a cocaína esteve presente também em medicamentos para problemas respiratórios até o inicio do século XX, não tendo apresentado problemas relativos ao abuso. Foi a partir de 1910-20 que se inicia a preocupação do uso não médico da cocaína, principalmente em São Paulo e Rio de Janeiro.
As anfetaminas, que inicialmente eram usadas para substituir a cocaína, tornaram-se comuns entre estudantes, esportistas, militares e homens de negócios, sendo amplamente utilizadas na Segunda Guerra Mundial pelas forças armadas de vários países.
Com a guerra do Vietnã veio movimento hippie e com ele uma forte critica a sociedade de então. Autoridades como a família e o Estado foram contestadas em um movimento que valorizava o erotismo assumido e exaltava a liberdade sexual. Segundo a tese de mestrado da Prof. Débora de Souza Silva, "de maneira geral estimulava se o uso comunitário de drogas e no Brasil destacaram-se a maconha e o LSD," diz também que "aqui, grande parte dos jovens engajados politicamente, usaram, com freqüência diversificada, certos tipo de drogas, principalmente a maconha".
A partir de 1990 o crack (mistura de cocaína e bicarbonato de sódio, fumada na forma de pedra) aparece e se expande de forma violenta, principalmente entre jovens de classes sociais mais baixas. No Brasil o auto potencial de dependência e seu baixo custo facilitam muito seu aumento de consumo, conseguindo uma boa penetração em São Paulo, aonde se formou a cracolândia. No Rio de Janeiro os próprios traficantes bloquearam sua entrada por não possuir interesse comercial. Prejudicaria o "movimento" e por ser altamente nocivo afetaria a permanência da "clientela".
2.3 Consumo ou Demanda por Drogas
As informações disponiveis sobre consumo de drogas ilícitas, que não de fácil acesso, são, em sua maioria, estimativas tiradas de pesquisas sobre consumo ou dados de apreensões da policia federal. Dados insuficientes para analises com bom grau de precisão e que, de uma forma ou de outra, acabam balizando as políticas públicas.
Segundo o Perfil do País apresentado pela UNODC, braço das Nações Unidas para lidar com drogas e crime, que através de pesquisa intitulada "A Voz dos Adolescentes" que entrevistou 5.280 adolescentes brasileiros (idades entre 12 e 17 anos), 14,2% usavam ou já haviam usado algum tipo de droga ilícita, sendo que se dividirmos essa amostra por classes sociais teremos a seguinte configuração:
Tabela 2 – Consumo de drogas por Adolescentes por classe social (%) |
||||||||
Classe A |
Classe B |
Classe C |
Classe D |
Não respondeu |
||||
Usa ou já usou alguma vez |
21,6 |
20,5 |
11,4 |
16,5 |
17,7 |
|||
Nunca usou |
78,4 |
78 |
86,9 |
83,3 |
80,6 |
|||
Não respondeu |
0 |
1,5 |
1,7 |
0,2 |
1,7 |
Fonte: Perfil do País, Regional do UNODC no Brasil
Outro estudo apresentado pela Confederação Nacional dos trabalhadores em Educação (CNTE), intitulado "Retrato da Escola", que coletou dados de 2.351 escolas públicas e privadas do país, concluiu que em relação ao consumo 68% nunca consumiram, 27,8 consomem ocasionalmente e 4,2 sempre consomem. Aqui cabe uma ressalva, até onde os jovens são honestos quanto a freqüência em que consomem drogas?
Outro ponto importante é que as pesquisas quase não abordam os usuários que já saíram do período de formação de caráter, que é compreendido antes e durante a puberdade, e aqueles que mesmo após engajados na sociedade ainda consomem alguma substância de natureza psicotrópica.
As apreensões também nos trazem informações difusas, como podemos verificar na tabela 3 abaixo.
Fonte: Departamento de Polícia Federal – Coordenação Geral de Prevenção e Repressão a Entorpecentes – CGPRE, antiga Divisão de Repressão a Entorpecentes - DRE, 2005.
¹ Pasta de coca produzida no Brasil
² A abreviação MDMA foi usada neste documento para designar o ecstasy, uma vez que está é a droga anfetamínica mais comum apreendida no Brasil.
* Valores indisponíveis
As oscilações nas apreensões são inconstantes e pouco dizem a respeito das variações na oferta ou demanda de drogas no país. Servem apenas, e talvez, como medida do trabalho da Policia Federal de barrar o transito de drogas entre o Brasil e o mundo.
O II Levantamento Domiciliar Sobre o Uso de Drogas Psicotrópicas realizada pelo Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas Psicotrópicas – CEBRID, da Unifesp, que levantou informações em 108 cidades com mais de 200 mil habitantes conseguiu levantar uma primeira amostra do uso de drogas no país.
Segundo os dados da pesquisa 22,8% dos brasileiros já usaram qualquer droga ilícita (exceto Álcool e Tabaco) ao menos uma vez na vida, sendo a maconha e a heroína a primeira e ultima, respectivamente, na distribuição de prevalências (figura 1). Se consideramos isoladamente as drogas licitas veremos que dos entrevistados 74,6% fizeram uso de álcool ao menos uma vez na vida, 49,8% usaram no ultimo ano e 38,3% no mês da consulta, com o tabaco os resultados são de 44, 19,2 e 18,4% respectivamente (conforme ilustrado na tabela 4).
Tabela 4 – Distribuição de Drogas por Tipos de Uso
Fonte: II Levantamento Domicilias – CEBRID, 2005
Gráfico 1 – Prevalência de Uso na vida de diferentes Drogas Psicotrópicas
Fonte: II Levantamento Domicilias – CEBRID, 2005
A pesquisa avaliou também a percepção da população quanto à facilidade de conseguir drogar ilícitas. Dos entrevistado 65,1% consideram muito fácil conseguir maconha, 51,1% cocaína, 43,9% crack. Essa informação representa a capacidade de oferta em um mercado legalmente proibido e demonstrando como os incentivos ao não uso dessas substâncias são, em muitas vezes, o único fator de inibição ao usuário potencial.
Neste ponto, o II Levantamento Domiciliar merece uma ponderação. A pesquisa levanta uma média muito representativa da população brasileira, considerando fatores como distribuição socioeconômica, estado civil, sexo, grupo étnico, escolaridade e religião. Porém, ao buscar uma média nacional não atinge de forma expressiva grupos de risco específicos que, em função de variáveis não mensuradas como influência local do tráfico, participação efetiva do estado e outras, ficaram de fora.
Este destaque de forma alguma busca desqualificar o trabalho, mas sim apenas pontuar que os grupos que sofrem maior influência do Mercado Mundial de Drogas não são destacados na mesma, cabendo para isso um trabalho em especial.
Caracterizar com precisão a indústria da droga torna-se tarefa árdua e complexa, pois estamos lidando com uma indústria de produtos diversificados, com produção e distribuição mundial, oligopolizada em sua produção, de alto grau de planejamento industrial no atacado, porém, pouco complexa no varejo, que apresenta barreiras à entrada e saída além de atender a várias classes de consumidores. Isso tudo, claro, sem considerarmos o fato que essa indústria lida com produtos que são proibidos e perseguidos em todo globo o que gera "custos" extras de produção e principalmente transporte.
A distribuição das apreensões deixa claro que a maconha é a principal droga comercializada no mundo (possuído cerca de 65% do mercado), seguida pelas Opiáceas (14%) e derivadas de Coca (9%).
Gráfico 2 – Relação das Apreensões por Substância (2006)
Fonte: World Drug Report – UNODC, 2008
Outra consideração importante é que a maioria das drogas que, no momento do consumo, são consideradas males sociais, na ponta de produção são sinônimos de trabalho e renda para inúmeras famílias servindo de mantenedor econômico, para alguns países o principal. Nos países andinos, por exemplo, além de fazer parte da cultura local, o cultivo da folha de coca sustenta regiões inteiras que de modo geral são totalmente dependentes dessa produção vinculada a máfias internacionais.
3.1 Complexos produtores de drogas pelo mundo
O Relatório Mundial de Drogas (Word Drugs Report, UNODC) apresenta poucas informações sobre a produção de drogas, essa mensuração é sempre estimada a partir do volume de apreensões. Em 2006, por exemplo, foram apreendidas 4.543 toneladas, com exceção da maconha. Esta última, sozinha, apresentou uma produção estimada de 41.400 toneladas no mesmo ano.
Essa produção divide-se pelo mundo apresentando "complexos industriais" especializados e com logística de distribuição que apresenta características variadas.
Gráfico 3 – Produção mundial de maconha estimada (1988-2006)
Fonte: World Drug Report – UNODC, 2008
Gráfico 4 – Apreensão mundial de Drogas, excluindo a maconha (2006)
Fonte: World Drug Report – UNODC, 2008
3.1.1 Complexo do Ópio/Heroína
A produção mundial de ópio é centralizada no Afeganistão, que detém cerca de 92% da produção (dado de 2007). Essa concentração foi resultado de um considerável ganho de mercado entre os países produtores de papoula asiáticos, principalmente os do sudeste da Ásia, o que resultou numa redução 31,43% no cultivo da papoula dessa região.
O cultivo da papoula tem apresentado uma redução pela media dos paises produtores, o que não significou uma redução da produção de ópio que teve em 2006 uma produção recorde de 6610 toneladas, apresentando um crescimento de 43% em comparação a 2005.
Gráfico 5 – Cultivo mundial de papoula (Hectares)
Fonte: World Drug Report – UNODC, 2008
Gráfico 6 – Produção mundial de Ópio (1996-2007)
Fonte: World Drug Report – UNODC, 2008
Com uma situação desta, em que a oferta de ópio apresenta robusto crescimento e uma demanda estabilizada, era de se esperar que os preços locais caíssem de forma consistente, o que não aconteceu da forma esperada. Mesmo com aumentos de 49% (2006) e 34% (2007) na produção, os preços caíram apenas 17% e 21% respectivamente na região produtora. Este pequeno impacto no preço pode sugerir duas coisas: 1) que ocorre estocagem de ópio; 2) que o preço é pouco sensível ao poder de mercado do produtor (ampliação do Markup).
O mercado de heroína foi dividido em 3 sub-mercados, uma parte correspondendo ao Afeganistão , que fornece os países vizinhos, a Europa, o Oriente Médio e a África. O segundo bloco é representado pelos países do Sudeste Asiático. Este, além de atender a sua vizinhança, supre a demanda da China e Oceania. E por último, temos a produção da América Latina que atende exclusivamente os EUA.
3.1.2 Complexo da Coca/Cocaína
O mercado mundial de cocaína apresenta comportamento estável, tanto do lado da oferta quanto da demanda, sendo que em 2007 apresentou ínfimo crescimento de 1,02%. O cultivo de coca se dá, quase que em sua totalidade, na América Latina, mais especificamente nos países Andinos. Estatisticamente falando Colômbia, Bolívia e Peru dividem praticamente toda a produção de coca mundial, e que totalizava em 2007 cerca de 181.600 hectares, desses, 55% em território colombiano.
A área cultivada apresentou uma queda de 29% entre 2000-2006, e estabilizou-se no final do período (2005-2006). Porém, entre 2006 e 2007 houve um considerável aumento, de 16%, que foi decorrente de um aumento do cultivo nos 3 países, sendo de 5,1% na Bolívia, 4,5% no Peru e 26,9% na Colômbia.
Um elemento que merece atenção são os ganhos de produtividade que essa "indústria" tem conseguido. Mesmo historicamente sofrendo com a redução de áreas cultivadas a produção de cocaína tem se mantido estável, provavelmente, em função de adubos e pesticidas mais modernos e novas técnicas de produção, melhorando assim os rendimentos decorrentes desse mercado.
Gráfico 7 – Cultivo Mundial de Coca, 1990-2007
Fonte: World Drug Report – UNODC, 2008
Gráfico 8 – Produção Mundial de Cocaína, 1990-2007
Fonte: World Drug Report – UNODC, 2008
Levando em consideração as plantações de coca de cada pais com o seu potencial de produção de cocaína verificamos que a Colômbia, mesmo tendo suas plantações reduzias anualmente entre 1999 e 2006, consegue ter um relativa estabilidade da sua produção de cocaína.
Gráfico 9 – Colômbia: Potencial de produção de cocaína (em ton.)
Fonte: World Drug Report – UNODC, 2008
3.1.3 Complexo da Cannabis (maconha e haxixe)
A indústria da cannabis é, de longe, a maior de todas, com aproximadamente 165 milhões de consumidores. O grande diferencial se deve ao fato de não haver um pólo concentrador, salvo a resina da maconha que tem certa concentração no norte da África, mais especificamente no Marrocos, e Oriente Médio (Paquistão e Afeganistão).
A Quantificação da produção é muito dificultosa pela grande distribuição da produção. Estima-se que a produção esta distribuída entre pelo menos 172 países, sendo que desses, 70 comunicaram explicitamente a existência do cultivo e 150 relatarão apreensões da planta. Um dos fatores que dificultam essa quantificação é a variedade de cultivos a exemplo do cultivo indoor que abastece (em alguma medida) o consumo local.
Gráfico 10 – Distribuição da produção mundial de cannabis em 2004 e 2006
Fonte: World Drug Report – UNODC, 2008
As apreensões são principalmente concentradas na América do Norte, representado 66% do total destas em 2005, seguida pela África com 16%. O volume de apreensões apresentou forte aumento entre 2000 e 2004, o que poderia indicar um aumento da produção. Em 2005 as apreensões voltaram a cair a níveis de 2000, sendo que em 2006 fica ainda mais abaixo, sem que se conseguisse identificar claramente os fatores dessa queda.
Gráfico 11 – Apreensões Globais de cannabis, 1985-2006
Fonte: World Drug Report – UNODC, 2008
Quando olhamos para a distribuição das apreensões por país percebemos a causa de sua concentração na América do Norte. Os EUA e México somados detém 62% das apreensões de erva de cannabis.
A produção de resina de cannabis, conhecida como haxixe, cuja produção se concentra principalmente em Marrocos, tem seus principais mercados no Norte da África e o Oeste Europeu, sendo este ultimo o maior mercado consumidor de haxixe do mundo com aproximadamente 70% do total mundial. Convém destacar a Espanha que sozinha concentra 51% das apreensões mundiais sendo seguida pelo Paquistão e Marrocos com 7% cada.
Gráfico 12 – Apreensões de erva de cannabis em % do total mundial (kg)
Fonte: World Drug Report – UNODC, 2007
3.2 Relação entre IDH e o Consumo de Drogas
Segundo Moraes (2005) em sua tese de doutoramento, o consumo de drogas não é determinante das condições socioeconômicas das sociedades. Seu trabalho demonstra que "o consumo relativamente mais elevado de drogas tende a coexistir com longevidade, renda e educação elevadas", claro que também pode ocorrer em sociedades com precárias condições socioeconômicas.
Fazendo uso do IDH e dados de consumo de drogas de 98 países Moraes conseguiu consolidar um volume de dados referentes ao consumo de maconha e cocaína que sustentam a afirmação anterior, conforme gráficos abaixo:
Gráfico 13 – IDH e uso de maconha no ano em 59 países da África, Ásia e Oriente Médio
Fonte: UNODC, 2003 e FJP-IPEA-PNUD, 2003
Organização: MORAES, 2005
Gráfico 14 – IDH e uso de cocaína no ano em 18 países da África, Ásia e Oriente Médio
Fonte: UNODC, 2003 e FJP-IPEA-PNUD, 2003
Organização: MORAES, 2005
O caso dos países africanos, asiáticos e pertencentes ao oriente médio nos fazem acreditar que os altos consumos de drogas se não levarmos em consideração a participação mundial no consumo de deste conjunto, porém se levarmos em consideração que para o consumo de cocaína este conjunto de paises representa apenas 9% do total mundial e que, por serem grandes produtores mundiais de maconha, é natural que consumam 56%.
Quando observamos dados percebemos que quanto maior a média do IDH dos países mais perceptível se torna a relação entre IDH e consumo. Observemos o caso das Américas, Austrália e Nova Zelândia.
Gráfico 15 – IDH e uso de maconha no ano em 23 países da América, Austrália e Nova Zelândia
Fonte: UNODC, 2003 e FJP-IPEA-PNUD, 2003
Organização: MORAES, 2005
Gráfico 16 – IDH e uso de cocaína no ano em 31 países da América, Austrália e N. Zelândia
Fonte: UNODC, 2003 e FJP-IPEA-PNUD, 2003
Organização: MORAES, 2005
Se já percebemos uma maior relação entre o consumo e IDH nos países das Américas, Austrália e Nova Zelândia, quando observamos os dados referentes a Europa a relação positiva entre IDH e consumo de drogas fia ainda muito mais nítida.
Gráfico 17 – IDH e uso de maconha no ano em 32 países da Europa
Fonte: UNODC, 2003 e FJP-IPEA-PNUD, 2003
Organização: MORAES, 2005
Gráfico 18 – IDH e uso de cocaína no ano em 33 países da Europa
Fonte: UNODC, 2003 e FJP-IPEA-PNUD, 2003
Organização: MORAES, 2005
Valer ressaltar que em função da Europa possuir os dados mais confiáveis pela periodicidade, precisão na coleta e homogeneidade socioeconômica, a relação existente entre consumo e IDH se torna mais consistente.
Os dados levantados apenas ilustram que "o consumo compulsivo e o consumo recreacional ou comedido de drogas não determina as condições socioeconômicas das sociedades" (MORAES:2005). Desta forma percebemos que outra das bases de sustentação das políticas repressivas é frágil no que tange aos dados empíricos.
3.3 O Caso Brasileiro
O Brasil não é considerado um pólo produtor de drogas que, quando muito, produz para abastecimento interno. Porém, aparece no mapa da droga como um estratégico ponto de transito e escoamento para grandes mercados internacionais.
Os traficantes Brasileiros fazem o papel de "aviõezinhos" do trafico internacional, principalmente para a cocaína, do qual somos os principais responsáveis pela entrada da droga nos EUA e um parcela das entradas no continente africano.
3.3.1 Produção e Tráfico
O Brasil por não ser grande produtor de drogas, existe uma produção de cannabis concentrada no norte e nordeste do país, na área conhecida como "Polígono da Maconha", voltada inteiramente para o consumo interno e regional. O consumo do sul e sudeste normalmente é abastecido via importação do Paraguai.
Foram descobertas pequenas plantações de epadu (variação da coca com baixa concentração de alcalóide) na região norte, fronteira com a Venezuela sendo estas quase que exclusivamente para o consumo tradicional das folhas por comunidades indígenas e algumas seitas religiosas. Porém possuímos laboratórios de refino da folha de coca e somos um grande, se não o maior, fornecedor de produtos necessários para a produção de cocaína a países vizinhos.
Não a registros do plantio da papoula ou processamento da mesma em território nacional. O que vem preocupando as autoridades repressoras no país é o possível uso da posição geográfica privilegiada para transportá-la.
O Brasil é apontado pelo Relatório Sobre Estratégia Internacional de Controle de Narcóticos, produzido pelo Departamento de Estado dos EUA, como a principal rota de trafico de cocaína para os Estados Unidos. Os traficantes brasileiros fazem o papel de transportador nessa indústria e enriquecem garantindo a entrega das mercadorias nos seus principais mercados consumidores, EUA e Europa, ou levando-as até a África e Ásia para serem redistribuídas.
A droga entra por áreas de difícil acesso em fronteiras da Amazônia com países vizinhos. Uma tendência que vem se comprovando é a de que quanto mais acima entra a cocaína (Pará, Roraima, Amazonas, Acre e Rondônia), maior à probabilidade que seu destino seja o exterior. Se a porta de entrada for o Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Paraná, provavelmente essa droga abastecera o mercado local, mais especificamente o sudeste e o sul do país.
3.3.2 Articulação entre Narcotráfico e Poder Público
Uma informação que às vezes passa despercebida é que a criação de rotas de trafico não dependem apenas das "grandes habilidades" do narcotráfico em se esconder e muito menos da capacidade de formularem estratégias para despistar a policia federal. O elemento mais importante na criação destas rotas é a capacidade de corromper agentes públicos que o tráfico detém.
Um exemplo gritante desta realidade seria o Acre da década de 90 que, segundo o MP na época, as acusações focavam ex-governadores, juízes, parlamentares, policiais e autoridades de todas as espécies.
Em 1999 foi a segunda CPI do Narcotráfico na Câmara, que foi aberta de forma discreta e com ceticismo em virtude dos pífios resultados da Comissão idêntica ocorrida em 1992. Só não se esperava os resultados que se seguiram. Com apenas 6 dias da CPI, oficiais da Aeronáutica foram flagrados com 33 quilos de cocaína em uma aeronave a caminho do exterior.
A CPI apresentou entre investigados e acusados "cinco deputados federais (dois do Rio, um do Acre, um de Alagoas e um do Amazonas), um Senador (de Roraima) e deputados estaduais de oito estados" (Magalhães: 2000). Vale ressaltar que em pouco mais de um ano de funcionamento da CPI o juiz Leopoldino do Amaral foi morto quando investiga o envolvimento de desembargadores do Mato Grosso com o narcotráfico, uma testemunha de roubo de cargas foi morta e um detetive de Campinas também morreu antes de depor, sedo que, o laudo médico atestou suicídio.
4.1 Uma verdade Inconveniente
Os dados expostos nos capítulos anteriores objetivam permitir uma analise menos restritiva e mais realista do que representa efetivamente o mercado da droga no Brasil e no mundo, permitindo assim uma analise com bases relativamente sólidas das políticas públicas que tentam, pela força, acabar com o fenômeno da drogadição, ou melhor, acabar com este fenômeno para algumas drogas que não são socialmente aceitas, o que as torna ilegais.
Primeiramente devemos retomar o histórico de que as drogas (e a drogadição a ela extrínseca) estão presentes em todas as sociedades e em quase todos os momentos da história humana à que se tem registro. Depois devemos defrontar o horizonte de eventos que derivam das políticas públicas de repressão.
Vivemos um período aonde o poder econômico é sinônimo de poder político e, cada vez mais percebemos o narcotráfico ganhando força em áreas de pouca ou nenhuma presença do estado, quando não, se infiltrando nele. Este raciocínio levado ao extremo nos remete ao caso dos países tradicionalmente produtores de drogas que, em função do grande volume financeiro controlado pelo narcotráfico, associado a fragilidade interna dos mesmos, sofrem constantes ataques a democracia e soberania estatal.
Ficamos estarrecidos ao vermos morros no Rio de Janeiro se tornarem espaços privados sob comando de forças extremamente armadas que, aos poucos, buscam aceitação da população local que antes era antes imposta pela força e hoje passa a ser conquistada através da prestação de serviços básicos a uma população extremamente carente.
Fora o poder visível que o Narcotráfico ganha diariamente, temos a realidade dos fatos que bate às nossas portas. O uso de drogas que tentamos tanto maquiar esta se tornando uma ferida à mostra na sociedade moderna. A drogadição deixou de ser um problema periférico passando a ser uma constante de nossas classes média e alta. Hoje não é possível freqüentarmos uma festa em espaços ditos "privilegiados" (apesar da carga de preconceito de classes incluso nesta concepção) sem vermos claramente o uso de drogas, neste caso principalmente drogas sintéticas (extasy, LSD, e cocaína).
Entendo que o exposto não apresenta o reflexo de formulações acadêmicas, metodologicamente levantadas e sistematizadas, porém a observação de nosso cotidiano muitas vezes nos permite perceber detalhes desta difusão das drogas, sem controle e com pouquíssima informação a acerca, de formas que nenhuma análise estatística possibilitaria.
4.2 A Luta Contra a Oferta: Políticas Repressivas
As políticas repressivas visão atacar a oferta de drogas acreditando que assim reduziram o consumo. Este raciocínio possui dois equívocos básicos: 1) considerar preço uma variável de impacto para o consumidor e 2) acreditar que é a oferta de drogas que gera sua demanda.
Aparentemente as políticas focadas em atacar a oferta desconsideram que a formação de preços em um mercado tão especifico leva em consideração os custos agregados de todo o processo produtivo e de distribuição. Neste caso me refiro não apenas aos custos monetários de formação das rotas de trafico ou das corrupções ativas envolvidas na mesma, mas também aos custos impostos aos usuários através da dificuldade de acesso e/ou castigos penais impostos ao mesmo. Lembrando que essa analise de custos também incide sobre o traficante que corre riscos penais ainda maiores na maioria dos mercados.
Mankiw (2004) ao apresentar algumas aplicações para elasticidade mostrou o comportamento do mercado de drogas a um aumento da pressão policial à oferta de drogas. Em sua demonstração fica claro o comportamento da curva de oferta ao aperto do policiamento que se desloca para a esquerda de O para O" fazendo o preço da droga em questão aumentar de P0 para P1 e a quantidade ofertada sofrer uma leve redução de Q0 para Q1 conforme o gráfico abaixo.
O impasse encontra-se ao avaliar a redução na oferta quando confrontada com o aumento de preço. Em função da inelasticidade de demanda a preço (BECKER, MURPHY E GROSSMAN: 2004), o consumidor irá comprar drogas independente do aumento nos preços, fazendo com que o aumento da receita gerada, mesmo havendo uma redução da quantidade, tenha um impacto social negativo. Claro que quando olhamos para os consumidores de renda reduzida conseguimos perceber certo impacto no consumo, que na ânsia de consumir vai buscar outras fontes de renda, nem sempre de formas legais.
É fácil demonstrar como a inelasticidade das drogas num quadro repressivo como o exposto leva a duas agravações aparentemente bem claras: uma quando cria as condições necessárias para um aumento da criminalidade relacionada à demanda (aquela que acontece causada pela necessidade de consumo e a dificuldade de conseguir meios materiais para efetuar o mesmo). Este seria o caso do usuário que comete os mais variados atos ou delitos e violências para garantir seu consumo. Outra seria o fortalecimento monetário de uma estrutura de violência por excelência, o narcotráfico.
O aumento da receita do comercio de drogas, mesmo com a redução das quantidades vendidas, se torna um atrativo a entrada de ofertantes que, por sua vez, terão que competir com outros já pré-existentes. Essa competição normalmente não se dá na simples disputa de mercado por parte dos ofertantes, não ocorre uma guerra de preços. O que acontece é uma guerra de fato por regiões/territórios entre facções no qual o custo acaba sendo "socializado" com a população do entorno.
As políticas de repressão se tornam paradoxais, pois mesmo tendo sido feitas para enfraquecer o narcotráfico e o mercado de drogas terminam, dada as características especificas deste mercado, gerando um fortalecimento do mesmo e os meios para resistir ao combate direto via policiamento, visto que o aumento da receita permite um melhor aparelhamento das defesas do narcotráfico.
As afirmações acima se tornam mais explicitas ainda quando pegamos como referencial um país que é pólo produtor de drogas. Neste fica "impossível negar a grande influência do tráfico de drogas nos países produtores. Os "narcodólares" pesam sobre a economia, as estruturas políticas, os costumes e as ralações internacionais." (Walker, 1993).
4.3 Externalidades
Como uma Legislação afeta o mercado de drogas? Como uma leitura menos ortodoxa pode influir na demanda por drogas? Na busca destas respostas e de posse das informações expostas faremos um exercício dedutivo para buscar a resposta fazendo uso de uma modelagem econômica.
Partindo de um momento antes de uma alteração de legislação e uma situação de equilíbrio inercial, onde as forças produtivas se mantém constantes no curto prazo e a capacidade de oferta possui expansão limitada pela ilegalidade dos produtos comercializados, o mercado de drogas apresentaria um gráfico de oferta e demanda conforme a figura abaixo:
Não por acaso a inclinação das curvas já sugerem a inelasticidade da demanda e da oferta a preço (BECKER, MURPHY E GROSSMAN: 2004), que, caso fossemos criteriosos, as curvas deveriam apresentar um aspecto mais verticalizado para demanda e um pouco menos para oferta.
Em 10 de outubro de 2006 entrou em vigor a Nova Lei de Drogas que, numa visão mais heterodoxa, elimina medidas de cerceamento da liberdade ao usuário se autuado portando drogas ilícitas, passando este, a sofrer penas que variam entre advertência verbal, prestação de serviços comunitários e medidas sócio-educativas. Política que consiste em um avanço quando pegamos como referencial um sistema prisional debilitado como o brasileiro, mas que convém uma analise do seu impacto numa estrutura de oferta ilegal.
Considerando que com a nova legislação o usuário se sentiria mais a vontade para consumir, teríamos configurada uma externalidade positiva de demanda, dado a manutenção das demais condições e a rigidez da oferta no curto prazo. O resultado seria um deslocamento da curva de demanda para a direita de d para d", o resultado pode ser ilustrado no gráfico abaixo:
O impacto seria um aumento do preço e da quantidade de drogas no mercado. A diferença entre P0 e P1 multiplicada pela diferença entre Q0 e Q1 será o acréscimo de lucros na indústria nacional de drogas. Se levarmos em consideração as ramificações negativas do ponto de vista social do aumento da, já considerável, receita do tráfico teremos um quadro assustador. Seria leviano afirmar que a lei contribui para o tráfico, como afirmam os partidários das políticas repressivas, apenas por levar a uma tendência de aumento do consumo. Os dados expostos no capitulo anterior puderam demonstrar que o mercado de drogas não tem comportamento irregular e oscilam de forma desassociada ao aumento da repressão, visto que essa, de modo geral, tem apresentado crescimento ao longo do tempo.
O problema não se encontra na legislação que ameniza as penas ou usuário, pois como já demonstrado, o uso de drogas constitui uma constante histórica, mas concentra-se no fato de que os governos não arrecadam nada com esse mercado e ainda gasta volumes cada vez maiores em uma guerra urbana aonde a força policial é pouco aparelhada, carece de recursos e treinamento apropriado, enquanto o tráfico continua recebendo volumes de recursos crescentes.
4.4 Política de Alternativas
4.4.1 Combate a Demanda
Dentre as políticas ditas alternativas, a menos incomum delas é a de combate a demanda. Esta política é bastante utilizada em mercados legais quando o estado, normalmente com a intenção de reduzir gastos com saúde publica, cria instrumentos de regulação duros a produtos nocivos a saúde. O como o tabaco e o álcool.
O controle ao comércio do tabaco foi se tornando mais forte com o passar dos anos e as políticas visando reduzir o consumo acabaram caminhando em duas direções: uma buscando uma redução da demanda global (deslocamento da curva para a esquerda) e outra tentando reduzir o consumo via aumento de preços.
As medidas mais comuns praticadas quando o objetivo é reduzir a demanda global são: publicidade contra o tabagismo, obrigação de afixar rótulos de advertência nos maços, proibição de anúncios de televisão, dentre outras. Estas medidas desestimulam o consumo sem alterar preço. Conforme imagem abaixo.
Como apresentado, estas políticas desestimulam o consumo sem afetar preço fazendo com que a curva de demanda d se desloque para d" reduzindo a quantidade consumida de Q0 para Q1. A duvida que nos resta é: esta política poderia gerar resultados em mercados ilegais? Segundo Morais (2003) a experiência Norte Americana acerca desse método foi pouco frutífera e relativamente muito custosa, conseguiu uma redução entre 2% e 11% no consumo de cocaína e entre 5% e 14% de maconha. Tendo apresentado um alto custo, "para reduzir o consumo de 26kg seria necessário um milhão de dólares.
Outra Política bastante comum em mercados de drogas legais é a de preços. O poder público pode aumentar os tributos sobre produção e distribuição de cigarros, este aumento seria repassado aos consumidores via elevação de preços. O resultado seria um movimento dos preços ao longo da curva de demanda, de P0 e P1 acarretando assim em uma redução da quantidade consumida de Q0 para Q1 (imagem abaixo).
Outro exemplo de política que tem funcionado efetivamente é a de restringir o consumo a áreas especificas (no caso para fumantes). A Holanda, no intuito de reduzir o número de usuários de heroína, criou o coffe shop onde os usuários de cannabis poderiam comprar e consumir sem ter contato com o traficante e por conseqüência, à heroína. Jack Cole, diretor-executivo da Força da Lei Contra a Proibição (Leap, na sigla em inglês), uma rede internacional de juizes, promotores públicos, delegados e policiais que defendem políticas alternativas, afirma que "a cannabis – maconha e haxixe – não é exatamente liberada, o que existe é uma tolerância. Há regras rígidas e um dos estabelecimentos mais fiscalizados é o coffe shop, que tem que seguir à risca as normas de funcionamento".
Os resultados da experiência Holandesa foi um sucesso no que diz respeito à heroína, sendo hoje um dos 10 paises europeus com o menos consumo da droga. Quanto à cannabis, segundo pesquisa realizada no país, a parcela de usuários é menor que nos Estados Unidos, onde há grande repressão, sendo de 28% e 41% respectivamente.
As políticas aplicadas ao consumo de álcool normalmente tem um caráter mais punitivo, provavelmente em função dos riscos e custos sociais que lhe são atribuídos. No Brasil a ultima medida foi à aprovação da Lei 11.705 em junho de 2008 que prevê multas severas a quem for pego dirigindo após consumir pouca quantidade da droga. Os resultados foram praticamente imediatos, segundo matéria publicada no site Folha Online no dia 10 de novembro de 2008, "a quantidade de homicídios culposos (sem intenção) por acidente de trânsito na capital paulista caiu 15,7% em relação ao mesmo período de 2007".
4.4.2 Redução de Danos
As políticas de redução de danos partem de um pré-suposto, já abordado neste trabalho, de que "consumir psicoativos faz parte de qualquer cultura, é habito sempre presente na história humana e que não pode ser suprimido" (Rodrigues: 2003). A partir daí, as políticas de redução de danos tentam fazer com que o consumo destas sustâncias produzam o menor prejuízo possível ao usuário e à sociedade em que esta inserido. Segundo Rodrigues (2003):
"O consumo dessas substâncias é percebido como "inevitável", o que não significa "desejável". Além do esforço para se distinguir dos defensores de transformações mais radicais da situação legal dos psicoativos, a perspectiva das políticas de redução de danos se dá a partir de um ponto de vista negativo: a preocupação está em minimizar prejuízos dada a impossibilidade de um mundo abstêmico.".
Quanto às conseqüências do uso de drogas, a abordagem da redução de danos pouco se diferencia das políticas repressivas, pois ambas admitem que este uso traz conseqüências negativas tanto para o individuo (físicas, financeiras e nas relações interpessoais) quanto para a sociedade (perda de um ente produtivo ou, em casos extremos, um agente instabilizador da ordem). A divergência entre os dois modelos de políticas centra-se na forma da aplicação dos recursos destinados à políticas públicas de drogas, em que as repressivas visam abolir o uso (utopia da abstinência), enquanto a redução de danos busca eliminar o "mau uso".
O entendimento contemporâneo da redução de danos tem inicio nos anos 1980, com o agravamento dos casos de AIDS entre usuários de drogas injetáveis. De fronte ao fato de que seria improvável que estes usuários abandonassem seus hábitos em função da AIDS, começam a surgir estudos e propostas visando tornar a injeção de opiáceos menos arriscada. Em 1984, na cidade holandesa de Roterdã, começa a funcionar um programa de troca de seringas, levado à cabo pelo Serviço Municipal de Saúde. Em pouco tempo o programa se desenvolve passando a avaliar o grau de pureza da droga para os usuários e fazer prescrições de metadona (opiáceo sintético utilizado em tratamentos de desintoxicação para heroína).
Como os defensores da redução de danos assumem que é impossível suprimir universalmente o consumo de psicoativos, buscam uma "meta intermediária" visando à eliminação dos problemas decorrentes da falta de assistência dos usuários marginalizados sob o regime proibicionista. Nesta óptica e, principalmente, no caso da heroína, políticas de checagem da pureza da droga e troca regulares de seringas são essenciais para evitar overdoses e a propagação da AIDS. Países como Espanha, Alemanha e Austrália, preocupados com os riscos à vida dos usuários de heroína, criaram ambientes seguros para seu uso (chamadas "salas de uso controlado"), onde enfermeiros e para-médicos ficam de prontidão caso haja uma emergência, além de haver a possibilidade de substituir a heroína injetável por modalidades fumáveis ou de uso oral. Estes ambientes oferecem suporte psicológico, médico e até auxílios para conseguir emprego. Caso o usuário demonstre interesse, as equipes de saúde fazem seu encaminhamento à clínicas de desintoxicação.
Outro fator colaborador à redução de danos e de questionamento as políticas repressivas são os custos. Segundo estudos, o custo gerado pelo consumo de drogas é ao menos 4 vezes menor que o custo para deter policialmente o seu uso (SAFFER E CHALOUPKA: 1999). Em artigo publicado em 2006, Moraes aponta os valores dos custos sociais da repressão confrontados com os do tratamento:
"Em 1991, nos Estados Unidos, o custo social de um usuário seria de $897 dólares, enquanto o valor necessário para deter o seu uso de drogas seria de $4.170 dólares. O custo social do usuário de maconha seria mais reduzido em relação aos usuários de outras drogas, pois os danos fisiológicos derivados desse uso seriam relativamente mais baixos".
Estes valores que representam as médias dos custos de tratamento e repressão de várias drogas, são um poderoso indicativo do quão onerosas são as políticas repressivas quando contrapostas as suas alternativas. No Brasil, há ainda uma carência de um estudo detalhado acerca da questão dos custos sociais da repressão e do tratamento do uso de drogas ilícitas.
Vivemos um impasse histórico que caminha em dois rumos distintos: o primeiro é o de continuísmo de um modelo de políticas publicas com resultados questionáveis; o segundo busca o novo, o inusitado, a alternativa ao que está dado. E por isso mesmo gera dúvidas e descrenças.
Este impasse começa a ganhar corpo, através de trabalhos como este, e busca fazer uma ruptura de concepções, muitas delas morais, acerca de como lidar com o advento das drogas. Já pudemos expor que as drogas fazem parte de nossas vidas e que será muito improvável (se não impossível) que nos livremos delas apenas por concordarmos que podem gerar problemas, sejam individuais ou sociais. Portanto a pergunta incômoda é: O que fazer?
Esta pergunta pode ter inúmeras respostas, mas não acredito que devemos ser levianos ao ponto de tentar respondê-la. Porém, por este trabalho se tratar de uma conclusão do curso de economia deveríamos, ao menos, buscar melhores alternativas econômicas para este dilema.
Dentro da lógica capitalista, tudo o que pode ser consumido tende a se tornar uma mercadoria e não poderíamos esperar um comportamento diferente no mercado de drogas. Esta mercadoria inserida em uma realidade repressiva buscou formas de constituir um mercado marginal que ao longo dos anos foi se estruturando para configurar o que temos hoje. Esta configuração envolveu a criação de uma complexa cadeia produtiva, cujos elos "podres" se mesclam com nossa realidade cotidiana, gerando, como subprodutos deste mercado, corrupção, violência e marginalização de seres humanos.
Pudemos entender como as políticas públicas buscam lidar com o problema e percebemos que, dada as características especificas deste mercado, muito poucos são os resultados alcançados, sendo que, algumas dessas medidas acabam contribuindo com os ganhos dessa indústria.
Apresentamos também, formas de reduzir os "prejuízos sociais" impostos por este mercado, mas precisamos ter clareza dos limites que esta redução de impactos encontra dado ao complexo conjunto de relações sociais e econômicas em que elas se inserem.
Aparentemente, o mercado de drogas não deixará de injetar recursos em um submundo composto de narcotraficantes, políticos corruptos e criminosos, até que ele se mova para a legalidade. O que, porém, parece estar muito distante em virtude do preconceito, da falta de informação e do moralismo equivocado de nossa sociedade organizada. O Brasil pode ser colocado como exemplo do exposto: país de maioria cristã e valores morais relativamente conservadores (com relação ao tema) que, mesmo não sendo um grande produtor mundial de drogas, possui um narcotráfico extremamente organizado e tenta combatê-lo de formas tradicionais e aceitas como corretas pela maior parte da população. Mesmo sem gerar resultados.
Mesmo se as condições políticas sejam favoráveis dentro de nosso país, a implementação de políticas alternativas à questão das drogas encontraria serias restrições internacionais em virtude das imposições de cooperação estadunidenses ao tema. A política externa dos EUA impôs à questão um quadro binário, em que de um lado estão os países produtores tidos como agressores, e de outro os países consumidores tidos, dentro desta lógica restrita, como vitimas. Partindo desta análise fica fácil declarar guerra já que os "inimigos" ficam claros.
O fato é que caso não retomemos o debate acerca da questão das drogas sem preconceitos, com um maior volume de informações e livres de equívocos morais, não conseguiremos soluções. Até lá, continuaremos como Dom Quixote, combatendo moinhos de vento.
BECKER, G. S., GROSSMAN, M. AND MURPHY, K. M, Rational Addiction and the Effect of Price on Consumption, Working Paper, Center for the Study of the Economy and the State, University of Chicago. 1991. Disponível em:
GABEIRA, Fernando. A Maconha. São Paulo: Publifolha, 2000.
LEVITT, Steven D.; Dubner, Stephen J. Freakonomics: O Lado Oculto e Inesperado de Tudo que nos Afeta. Rio de Janeiro: Elsevier, 2005.
MAGALHAES, Mario. O Narcotráfico. São Paulo: Publifolha, 2000.
MASSAD, Anselmo. A guerra que não deu certo. Revista Fórum, São Paulo, v. 67, p. 14-18, out/2008.
MINAYO, M. C., DESLANDES, S. F. A complexidade das relações entre drogas, álcool e violência. Rio de Janeiro. 1998. Disponível em:
MORAIS, P. C. C. Drogas e Políticas Públicas. 2005. Tese (Doutorado em Sociologia) – Faculdade de Filosofia e Ciências, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte.
RODRIGUES, Thiago. Políticas de drogas e a lógica dos danos. Revista Verve. São Paulo, Nu-Sol, n. 03. 2003.
SAFFER, H., CHALOUPKA, F. Demographic Differentials in the Demand for Alcohol and Illicit Drugs, National Bureau of Economic Research, NBER Working Paper Series, Working Paper 6432. 1998. Disponível em:
STEIMAN, Rebeca. O Mapa da Droga. Rio de Janeiro, 1995. Disponível em:
TOSCANO JR., A. "Um breve histórico sobre o uso de drogas". In: SEIBEL, S. D. e TOSCANO JR. (orgs). Dependência de drogas. Ed: Atheneu, 2001.
UNODC, United Nations Office on Drugs and Crime. World Drug Report 2008. Disponível em:
_______, United Nations Office on Drugs and Crime. Perfil do País. 2005. Disponível em:
LISTA DE ABREVIATURAS
UNODC – United Nations Office on Drugs and Crime
ONU – Organização das Nações Unidas
IPEA – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
CPI – Comissão Parlamentar de Inquérito
IDH – Índice de Desenvolvimento Humano
FJP – Fundação João Pinheiro
PNUD – Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento
AGRADECIMENTOS
Minha formação foi o resultado do esforço coletivo de minha família, pois sem ela nunca teria conseguido sair de Nova Granada. Principalmente o núcleo que deu forma ao que sou hoje, minha Avó, meu Avô, meu tio Didio e minha Mãe, sempre com o apoio de todos os meus tios e tias que foram meus outros pais e mães.
Minhas concepções dependeram também de meus amigos, das que sempre estiveram comigo nos bons e maus momentos. Vou destacar o quase irmão que me acolheu em Campinas quando não tinha para onde ir, Rodrigo Munhoz (vulgo Batata), e o maior colaborador deste trabalho, meu parceiro de profissão, Renan Cazonato, pois sem um não teria permanecido para concluir e sem o outro ainda estaria "patinando" neste trabalho. Não posso me estender mais na lista de amigos que foram fundamentais para que chegasse até aqui, pois acreditem, este trabalho seria pequeno para isso.
Devo muito também aos grandes mestres que tive contato na PUC Campinas, Prof. Lineu Mafezzoli, Prof. Antonio Carlos de Azevedo Lobão, Prof. Marcio Tangerino e muitos outros, mas principalmente à meu orientador, Prof. Almendra, que sempre confiou em mim independente de meus tropeços ao longo desses três semestres.
Por fim, mesmo consciente de que já agradeci ao meu Avô, não teria como terminar esse agradecimento sem um recado meu pra ele esteja aonde estiver: "Vô, eu consegui..."
DEDICATÓRIA
Ao meu Avô, Adelino Cavasana,
minha Avó, Catarina Cavasana,
meu Tio Didio e minha mãe.
Que juntos moldaram meu caráter.
Autor:
Bruno Henrique Cavasana
Monografia apresentada à Faculdade de Economia da Pontifícia Universidade Católica de Campinas como requisito para a conclusão do curso de Ciências Econômicas, sob a orientação do Professor Doutor Carlos Alberto da C. Almendra.
Pontifícia Universidade Católica de Campinas
Centro de Economia e Administração
Faculdade de Economia
Campinas, São Paulo
Dezembro de 2008
Página anterior | Voltar ao início do trabalho | Página seguinte |
|
|