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2.3 Teoria do Direito Abstrato à Tutela Jurisdicional
A teoria abstrata do direito de ação se contrapõe à teoria concretista defendida por Wach, eis que esta concepção marcou o desligamento dos planos material e processual, de modo que a ação existe per se.
Sob forte influência de Degenkolb e Plosz, a teoria abstrata defendia que a ação é um direito público, subjetivo e abstrato, cuja manifestação se dá quando o autor formula sua pretensão perante o Estado, garantindo-lhe, consequentemente, o direito a uma sentença qualquer do Estado-juiz.
Assim, conforme preleciona esta teoria o "direito de ação é o direito de composição do litígio pelo Estado, que, por isso, não depende da efetiva existência do direito material da parte que provoca a atuação do Poder Judiciário."
2.4 Teoria Eclética
A teoria eclética criou uma categoria jurídica que estabeleceu um elo entre os planos do direito material e o processual.
Tendo na pessoa de Liebman seu maior precursor, a concepção eclética assegura que não há ação nem exercício da função jurisdicional quando não estejam presentes as condições da ação.
Assim, na visão do mestre italiano, ação seria o direito público, subjetivo, de provocar, a atuação da jurisdição para que se possa obter um pronunciamento sobre o mérito da questão, como dito, desde que preenchidas as condições da ação.
Consoante a Teoria Liebmaniana, esses requisitos representariam a ponte entre uma hipótese completamente abstrata e uma hipótese concreta realmente existente.
As condições da ação, conforme ensina a doutrina liebmaniana, materializada no Código de Processo Civil em seu artigo 267, VI, são a legitimidade para a causa, a possibilidade jurídica do pedido e o interesse de agir.
Neste sentido, como questões prévias e preliminares, a decisão que extingue o processo não se reveste pela coisa julgada material quando inexistentes quaisquer uma dessas exigências.
Seguindo essa linha de raciocínio, "a existência da ação depende de alguns requisitos constitutivos intitulados de condições da ação, cuja ausência de qualquer um deles, leva à ‘carência de ação’."
Todavia, diante do nosso ordenamento, que consagra o acesso à justiça em sede constitucional, será que é possível falarmos em exercício irregular do direito de ação ou de nenhum direito de ação?
A resposta a esse questionamento reside no fato de que, havendo extinção do processo sem julgamento do mérito, haverá exercício do direito de ação assim como jurisdição, "pois se aplica o direito ao caso concreto, ainda que para dizer que o autor não preencheu determinadas condições ou requisitos impostos pela lei processual (também direito) para que o processo prossiga regularmente."
2.1 Possibilidade Jurídica do Pedido
Inicialmente, é precioso frisar que na última edição do Manual de Direito Processual Civil, Liebman não mais enumera a possibilidade jurídica do pedido como condição da ação.
Entretanto, não obstante o próprio criador tenha revisto a sua teoria, o nosso Código Adjetivo a adotou pelo fato de alguns juristas acreditarem que às vezes, "determinado pedido não tem a menor condição de ser apreciado pelo Poder Judiciário, porque já excluído a priori pelo ordenamento jurídico sem qualquer consideração das peculiaridades do caso concreto."
Inspirados na doutrina de Enrico Tullio Liebman, alguns doutrinadores afirmam que "a impossibilidade jurídica diz respeito ao fato de não se encontrar o pedido previsto no ordenamento jurídico ou de constar no ordenamento norma proibitiva do seu deferimento."
Todavia, os partidários da teoria que se contrapõe à contemplada pelo nosso legislador defendem que não existe pedido juridicamente impossível. O que pode existir é uma pretensão deduzida em juízo que não encontra guarida no ordenamento jurídico vigente, "uma vez que o fato de o juiz declarar, por sentença, que não pode acolher a pretensão do autor, por ser esta vedada pelo ordenamento jurídico ou por não haver previsão a seu respeito, representa a própria apreciação do mérito da ação."
Neste diapasão, tem-se que a sentença que reconhece a impossibilidade jurídica do pedido é sentença definitiva, eis que analisa o mérito da demanda e, por esse motivo, deve formar coisa julgada material.
2.2 Legitimidade das Partes
O art. 6º do Código de Processo Civil conceitua o que vem a ser a legitimidade para a causa ao dispor que "ninguém poderá pleitear, em nome próprio, direito alheio, salvo quando autorizado por lei."
A princípio, para o fim de caracterizar esse requisito, é indispensável que as partes estejam ligadas pelo direito material pretendido por uma delas, uma no pólo ativo e a outra no pólo passivo da demanda.
Ou seja, consoante a linha adotada pelo nosso Código de Ritos, "somente tem legitimidade para a causa na qualidade de autor, aquele que se diz titular do direito material, podendo ser réu apenas aquele que, no plano do direito material, tem a obrigação correspondente ao direito afirmado na petição inicial."
Excepcionalmente, entretanto, o nosso ordenamento jurídico permite que a parte demande em nome próprio, mas na defesa de interesse alheio. É o caso, como doutrinariamente se denomina, da ‘substituição processual’.
Afora às exceções expressamente autorizadas, deve-se seguir a orientação dada pelo artigo 6º do Código de Processo Civil.
Vê-se que a análise acerca da natureza da referida condição da ação, no tocante à legitimidade da parte, é de fundamental importância, sobretudo no que diz respeito à formação da coisa julgada, tendo em vista o irrefutável fato de que quando "o juiz afirma que o autor não tem legitimidade para a causa porque não é o titular do direito material, ele está afirmando que o autor não tem direito material a ser postulado."
Contudo, a linha da Teoria Eclética que afirma ser a legitimidade da parte uma das condições da ação, a decisão que reconhece a sua ausência e extingue o processo sem exame do mérito por carência de ação, produz apenas coisa julgada formal.
Ao passo que, entendendo a legitimidade da parte como uma questão de mérito, o decisum que declarasse a ilegitimidade da parte, analisaria, sim, o mérito da demanda e, consequentemente, produziria coisa julgada material.
2.3 Interesse de Agir
O entendimento doutrinário dominante em nosso ordenamento jurídico preleciona que o interesse de agir está intimamente ligado ao binômio necessidade/adequação.
O interesse-necessidade decorre da vedação da autotutela. Dessa forma, para que se verifique a necessidade de se recorrer ao Estado-juiz para satisfazer uma pretensão, basta a impossibilidade do autor fazer valer seu interesse através do emprego de meios próprios.
O interesse-adequação, por sua vez, é a utilização do método processual adequado à tutela jurisdicional almejada.
Porém, esse não é o cerne da questão, uma vez que, assim como as demais condições da ação, o interesse de agir também constitui uma questão de mérito.
Não sobejam dúvidas de que para ser averiguado o interesse de agir, o juiz deverá adentrar no mérito da causa.
Mais adequado que extinguir o processo sem analisar o mérito, seria compreender a falta de interesse de agir como ausência de necessidade, sujeita a uma sentença de improcedência ‘prima facie’, já que, para alguns doutrinadores de vanguarda, "o interesse de agir se trata de um pressuposto processual extrínseco."
Assim, a análise realizada pelo juiz no tocante ao interesse de agir nada mais é do que uma análise puramente processual, que em nada diz com o pedido, por esse motivo não pode ser alçada à categoria de condicionadora da existência do direito de ação.
As condições da ação, da maneira que foram concebidas pelo nosso legislador, restringem o conceito de jurisdição na medida em que o mesmo é a função que o Estado exerce, por intermédio dos juízes, para compor uma lide, mediante o devido processual legal.
Entretanto, dúvidas inexistem de que a função indelegável do juiz de ‘jus dicere’ não está condicionada a simplesmente dizer o direito material, eis que se o ato que inadimite exame do mérito não é jurisdicional, dificilmente poderá ser classificado como próprio de outra função do Estado.
Isto porque, ainda que a jurisdição não seja provocada pela ação condicionada, mas sim pela ação incondicionada, obviamente que, a partir da instauração do processo, o juiz passa a desenvolver atividade substitutiva para atuar a vontade do direito.
Diante dessa seara, não se pode negar a existência de uma confusão, no campo doutrinário, quanto à conceituação, ou identificação, ou delimitação exata das noções acerca das condições da ação.
Todavia, é inegável que, em havendo a extinção do processo sem julgamento do mérito, haverá exercício do direito de ação assim como jurisdição, pois para dizer que o autor não preencheu determinadas condições ou requisitos impostos pela lei processual para que o processo prossiga regularmente, o juiz, induvidosamente, terá que adentrar na análise do mérito da causa.
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Autora:
Márcia Barroso Gondim Coutinho
mabcoutinho[arroba]hotmail.com
Assessora Jurídica da Secretaria de Finanças do Município de João Pessoa Advogada pela Universidade Católica de Pernambuco. Pós-Graduanda em Direito Processual Civil pelo Centro Universitário de João Pessoa.
País: Brasil
Cidade: João Pessoa - PB
Trabalho realizado no Brasil, julho de 2007.
Categoria: Direito
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