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Aspectos gerais sobre a responsabilidade civil no direito brasileiro (página 2)


Para que ocorra a responsabilidade civil é necessária a configuração de alguns elementos, quais sejam, (a) o fato lesivo causado pelo agente por culpa em sentido amplo, a qual abrange o dolo e a culpa em sentido estrito, que engloba a negligência, a imprudência ou a imperícia; (b) a ocorrência de um dano patrimonial ou moral; e (c) o nexo de causalidade entre o dano e o comportamento do agente.

Desse modo, é necessário que o dano haja efetivamente ocorrido, direta ou indiretamente, da ação ou omissão indevida do agente, e que tenha causado um dano patrimonial ou moral ao lesado, surgindo para esse o direito à reparação dos prejuízos, ou seja, à indenização.

O Estado, por sua vez, como pessoa jurídica, não pode agir senão por meio de seus agentes, podendo somente causar danos a seus administrados através daqueles, cujas vontades são atribuídas ao Estado, ou seja, cabe a esse a responsabilidade civil por danos causados por aqueles que manifestam sua vontade no mundo jurídico.

 Por conseguinte, no que concerne ao direito público, temos a responsabilidade civil do Estado como a obrigação que esse tem de indenizar os danos patrimoniais ou morais que seus agentes, por estarem agindo em seu nome, na qualidade de agentes públicos, causarem à esfera juridicamente tutelada dos particulares.

Nesse caso, referimo-nos à responsabilidade extracontratual, diferenciando-a da responsabilidade contratual, pois essa pressupõe a existência de um contrato administrativo, enquanto aquela é derivada de ilícito extracontratual, nela o agente infringe um dever legal, ou seja, deriva de um dever de conduta.

Diferentemente do direito privado, no direito administrativo a responsabilidade civil não exige a ocorrência sempre de um ato ilícito para sua configuração, visto que há atos que, mesmo lícitos, causam a determinadas pessoas encargos maiores do que a outras.

Podemos inferir então que três são os sujeitos que configuram essa relação jurídica, o Estado, o agente público e o particular lesado, onde o Estado responde civilmente por danos causados aos particulares provenientes de comportamentos comissivos ou omissivos, materiais ou jurídicos, lícitos ou ilícitos, imputáveis aos agentes públicos.

Por fim, não há que se confundir a responsabilidade civil com as responsabilidades administrativa e penal, o que varia de acordo com a natureza da norma jurídica que contempla o fato causador da responsabilidade.

A responsabilidade penal resulta da prática de crimes ou contravenções tipificadas em lei previamente ao ato. A responsabilidade administrativa, por sua vez, provém de infrações por agentes públicos, das leis e regulamentos que regem seus atos e condutas.

Nada obsta, porém, que a mesma conduta viole simultaneamente normas de natureza diversa. Percebendo-se assim que existe a possibilidade da cumulação das responsabilidades de maneira independente, posto que "a responsabilidade civil independe da criminal e da administrativa, com as quais pode coexistir sem, todavia, se confundir. 

EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA RESPONSABILIDADE EXTRACONTRATUAL DO ESTADO

A responsabilidade civil do Estado – ainda que não haja conformidade de entendimento doutrinário pátrio quanto a teoria a ser aplicada em cada caso específico - sofreu, de tempos em tempos, inúmeras modificações e sustentações teóricas que variavam de acordo com os referenciais políticos, históricos e jurídicos para que viesse a se apresentar com a roupagem que hoje lhe é conferida pelo Direito Administrativo.

Para que se trace uma evolução histórica desta espécie de responsabilidade, mister que se perfilhe pelas várias teorias elaboradas ao longo dos anos, sobretudo por aquelas desenvolvidas pela doutrina e Conselho de Estado franceses, atendo-se pois, ao denominado sistema europeu-continental, uma vez que o sistema anglo-saxão não exerce influência direta no direito brasileiro.

Em assim sendo, pode-se dividir as teorias sobre a Responsabilidade Extracontratual do Estado da seguinte forma:

a) Teoria da irresponsabilidade;

b) Teorias civilistas;

-Teoria dos Atos de Império e de Gestão;

- Teoria da Culpa Civil;

c) Teorias publicistas;

- Teoria da Culpa Administrativa ou da Responsabilidade Subjetiva;

-Teoria da Responsabilidade Objetiva e suas divisões.

Passa-se então a abordar estas teorias sob uma perspectiva histórico-jurídica com o intuito de se concluir por qual delas optou o legislador pátrio ao promulgar a Carta Republicana de 1988 para, enfim, abordar o tema da Responsabilidade do Estado Legislador e seus desdobramentos.

TEORIA DA IRRESPONSABILIDADE

Outrora, quando os Estados eram governados sob o regime absolutista, prevalecia a tese da irresponsabilidade do mesmo pelos atos praticados pelos agentes estatais ou seus delegados que viessem a violar direitos de particulares.

Esta tese fundamentava-se na idéia de soberania do Estado, ou seja, era inconcebível que o próprio Estado, criador e tutelador das regras jurídicas, as violassem. Não obstante a isso, entendia-se que o Estado gozava de "autoridade incontestável perante o súdito". Daí surgirem as máximas: "The king can do no wrong" como dito na Inglaterra, ou seu equivalente na língua francesa: "Le roi ne peut mal faire".

Note-se que a teoria da irresponsabilidade do Estado não era de todo irrefutável e não compreendia "completa desproteção dos administrados perante comportamentos unilaterais do Estado." Chega-se a este entendimento pois o Estado, ainda que irresponsável por atos oriundos de sua gestão, deveria arcar com os ônus resultantes de seus atos danosos ao patrimônio de particulares se estes tivessem expressa previsão legal ou ainda quando o dano fosse resultado da intervenção no domínio particular por parte do próprio Estado.

Havia também flexibilização ao princípio da irresponsabilidade do Estado quando o agente público ou pessoa delegada a executar serviço público agisse, dolosa ou culposamente, no mister de funções públicas e, deste ato, resultasse em violação a direito de particulares. Assim, ainda que o agente público respondesse individualmente pelos atos danosos por ele provocados ao exercer atividades públicas, estaria o particular possibilitado de ver-se ressarcido dos prejuízos por ele sofridos.

Pela flagrante injustiça proporcionada pela teoria da irresponsabilidade do Estado que elevava o mesmo a um estado de intangibilidade jurídica quando da prática de atos lesivos a terceiros, logo esta teoria passou a ser combatida pelos cidadãos que a ela se submetiam. Entendia-se, como ainda hoje se entende, que o Estado, pessoa jurídica de direito público que é, não poderia se furtar de responder pelos atos lesivos que praticara uma vez que toda pessoa jurídica era - e ainda o é - titular de direitos e obrigações. E mais: sendo ele o incumbido de tutelar o direito, jamais poderia deixar de responder por ações ou omissões causadoras de danos a terceiros.

Destarte, o princípio da Responsabilidade Extracontratual do Estado passou a ser condição necessária para a boa estruturação do Estado Democrático de Direito e, com isso, tornou-se preceito fundamental em todos os países ocidentais, possuindo de país para país, peculiaridades e diferenças que não afetam em si o dever de indenizar o particular pelos danos causados por agentes públicos.

TEORIAS CIVILISTAS

Num primeiro momento, restou superada a tese da irresponsabilidade do poder público para, enfim, dar-se o primeiro passo rumo às teorias que preceituavam a responsabilidade estatal.

Dá-se a estas teorias o nome de civilistas uma vez que se apoiavam nos ensinamentos trazidos pelo Direito Civil que, por toda sorte, baseia-se na idéia de culpa do agente causador do dano.

TEORIA DOS ATOS DE IMPÉRIO E DE GESTÃO

A doutrina civilista que baseava para fins de responsabilidade estatal a distinção entre a natureza dos atos de império e dos atos de gestão estabelecia que apenas os de gestão, praticados pelo poder público, seriam passiveis de controle da responsabilidade jurídica.

Maria Sylvia Zanella Di Pietro assim distingue os atos de império dos atos de gestão: "Os primeiros seriam os praticados pela Administração com todas as prerrogativas e privilégios de autoridade e impostos unilateral e coercitivamente ao particular independentemente de autorização judicial, sendo regidos por um direito especial, exorbitante do direito comum, porque os particulares não podem praticar atos semelhante; os segundos seriam praticados pela Administração em situação de igualdade com os particulares, para a conservação e desenvolvimento do patrimônio público e para a gestão de seus serviços." Como neste último caso não haveria distinção entre o comportamento estatal e o do particular, uma vez que ambos se encontram em situação de igualdade, estaria pois passível de responsabilidade o poder público, desde que averiguada a culpa - latu sensu – do agente deflagrador do dano.

Modernamente, porém, a possibilidade de se distinguir os atos de império dos atos de gestão da Administração Pública, perdeu por completo sua sustentabilidade quer por ser impossível dividir a personalidade do Estado – caso contrário estaríamos diante de uma dualidade de vontades partindo da mesma entidade jurídica -, quer pela dificuldade de se enquadrar como atos de gestão todos aqueles promovidos pelo Estado com a finalidade de administrar o patrimônio público ou quando estiver a prestar serviços.

Assim, encerrado o debate acerca da possibilidade de distinção entre a natureza dos atos de império da dos atos de gestão, restou impossível se falar em responsabilidade estatal, ainda que haja culpa do agente, com fundamento nestes discrímens doutrinários.

TEORIA DA CULPA CIVIL

Esta teoria versa sobre a necessidade de se enquadrar a Responsabilidade Extracontratual do Estado sob o prisma puramente civilista da questão. Assim, para que fosse imputa responsabilidade pelos atos da pessoa política bastava a mera noção de culpa – latu sensu – no atuar da Administração através de seus agentes ou prepostos.

Neste ponto, interessante assinalar as palavras de Di Pietro que assim elucida a questão: "Embora abandonada a distinção entre atos de império e de gestão, muitos autores continuaram apegados à doutrina civilista, aceitando a responsabilidade do Estado desde que demonstrada a culpa. Procurava-se equiparar a responsabilidade do Estado à do patrão, ou comitente, pelos atos de empregados ou prepostos."

Note-se que por força da doutrina civilista da responsabilidade estatal é que foi editada a norma contida no art.15 do Código Civil Brasileiro de 1916, consagrando entre nós a teoria da culpa civil.

Vale neste ponto enfatizar as palavras de Themistocles Cavalcanti com o intuito de criticar a idealização do legislador pátrio no sentido de inserir no bojo do Direito Civil a questão da responsabilidade estatal: "Efetivamente, o problema da responsabilidade civil do Estado, em seu conteúdo jurídico e em suas dificuldades e sutilezas técnicas exige um sistema legislativo próprio e pressupões, para a sua boa aplicação, uma maleabilidade que não se pode encontrar na regra rígida do Código Civil".

Como era de se esperar, até mesmo por força do Regime Jurídico-Administrativo, a doutrina civilista foi cedendo espaço às normas e princípios de Direito Público que, por sua vez, passaram a atuar nas diversas relações existentes entre o próprio Estado – como pessoa política que é – e seus administrados regendo, como conseqüência lógica deste acontecimento, a questão da Responsabilidade Extracontratual do Estado.

TEORIAS PUBLICISTAS.

O completo afastamento das regras e princípios de Direito Privado para se apurar a Responsabilidade do Estado deu-se, como já de muito é conhecida, pelo famoso Arrêt Blanco. A partir daqui deu-se início a um processo de atrelamento da questão da Responsabilidade Estatal aos chamados princípios de Direito Público.

Destarte, afasta-se a aplicabilidade das normas de Direito Civil para que estas dêem lugar aos princípios, regras e peculiaridades próprias do Direito Público e Administrativo.

Neste sentido, a evolução destas teorias passaram pelas idéias de responsabilidade subjetiva – baseada na culpa – para atingir a denominada responsabilidade objetiva – baseada, grosso modo, na mera relação de causa e efeito entre o ato estatal e o evento danoso.

TEORIA DA RESPONSABILIDADE SUBJETIVA

A responsabilidade subjetiva quer significar o dever imposto a alguém de indenizar outrem, por ter agido, o primeiro, de modo a confrontar o ordenamento jurídico – agir este que pode ser doloso ou culposo – causando, ao segundo, um dano material ou jurídico, tendo em vista a prática de um ato comissivo ou omissivo.

Para Oswaldo Aranha Bandeira de Mello, estar-se-á diante da teoria da responsabilidade subjetiva do Estado quando "em atuando o agente público com culpa ou dolo responde o Estado pelos seus atos culposos ou dolosos, se no exercício das atividades que lhe são próprias, e causando dano a terceiros, por lhe serem imputados." Atente-se aqui para o fato de que a responsabilidade do Estado limita-se a abarcar os atos oriundos do serviço a ser prestado, não podendo este responder pelos atos de natureza estritamente pessoal do agente.

Pois bem, para a teoria da responsabilidade subjetiva do Estado e, atentando para os princípios de Direito Público que regem esta espécie jurídica, não se faz necessária a individualização do agente que agiu culposamente para a deflagração do dever de indenizar pelo Estado, basta a idéia trazida pela doutrina francesa de faute du service, ou seja, "culpa do serviço".

Sobre este ponto vale novamente citar as palavras do insigne mestre Bandeira de Mello: "Não se trata de culpa individual do agente público, causador do dano. Ao contrário, diz respeito a culpa do serviço diluída na sua organização, assumindo feição anônima, em certas circunstâncias, quando não é possível individualizá-la, e, então, considera-se como causador do dano só a pessoa coletiva ou jurídica."

A noção, então, desvincula-se da idéia de culpa do agente ou delegado de serviços públicos – noção esta eminentemente de natureza privada – para passar a significar falta, culpa do serviço, ou seja, o serviço público deixa de funcionar, funciona incorretamente ou indevidamente ou, ainda, funciona tardiamente. É dizer: a consecução do serviço público que encerre uma das hipóteses da denominada tríplice modalidade – omissão, funcionou defeituosa ou tardiamente -, é motivo suficiente para que se faculte ao administrado o pleiteio, perante os órgãos competentes, a reparação do dano daí decorrente.

Porém, em que pese estarmos falando da responsabilidade pela faute du service, e a estarmos abordando no campo da teoria subjetiva, alguns autores a colocam como uma ramificação da responsabilidade objetiva. Neste sentido e acompanhando o raciocínio de Oswaldo Aranha Bandeira de Mello está Celso Antônio Bandeira de Mello .

Chega-se a esta conclusão primeiramente porque, para que se atue no campo da responsabilidade subjetiva do Estado, não basta haver a mera relação causal entre o ato relacionado ao serviço estatal e o dano produzido ao administrado. Mister que haja, inevitavelmente, o elemento subjetivo da culpa – latu sensu – pois é por este que se verificará o dever de indenizar, ou não, incumbido ao Estado.

Outro ponto que merece destaque para se firmar o entendimento de que a teoria da culpa do serviço é subjetiva, e não objetiva, é justamente aquele que toca a questão da presunção da culpa.

Ora, ocorre que, por vezes, restará impossível ou ainda extremamente dificultosa a prova, por parte do administrado ofendido, da má consecução do serviço pelo Estado. Assim, o ofendido pela má execução do serviço fica isento de comprovar a culpa do Estado socorrendo-se da noção de culpa presumida.

O que se quer com isso comprovar é que, ainda que a culpa seja presumida, ou seja, bastando a mera relação de causalidade entre o dano e o ato lesivo – responsabilidade objetiva do Estado – para legitimar a vítima a pleitear indenização perante o Poder Público, não destitui o caráter subjetivo da teoria. Isto se dá, pois, comprovando o Estado que no seu agir, o fez diligentemente, estará este isento da obrigação de reparar o dano o que, em caso de objetividade da conduta, restaria impossível.

Por isso é que entende Celso Antônio Bandeira de Mello haver responsabilidade subjetiva quando "a conduta geradora de dano revele deliberação na prática do comportamento proibido ou desatendimento indesejado dos padrões de empenho, atenção ou habilidade normais (culpa) legalmente exigíveis, de tal sorte que o direito em uma ou outra hipótese resulta transgredido."

Diante destes argumentos parece irrefutável a noção de que a teoria da faute du service enquadre-se perfeitamente na chamada responsabilidade subjetiva do Estado.

TEORIA DA RESPONSABILIDADE OBJETIVA

Toda a dogmática que serve como substrato para a teoria da responsabilidade objetiva do Estado baseia-se, nos dizeres do magistério da professora Di Pietro "no princípio da igualdade dos ônus e encargos sociais". Desta sorte, assim como são – ao menos em tese – repartidos entre toda a coletividade os benefícios oriundos da prestação de serviços públicos por parte do Estado, o mesmo deve ocorrer quando a situação se inverte, ou seja, havendo por parte de um (ou alguns) o sofrimento de um ônus maior do que aquele que lhe era lícito suportar face aos demais, rompe-se o equilíbrio pretendido pela ordem social devendo o Estado, para que as coisas retroajam ao status quo, indenizar o prejudicado utilizando-se, para tal, recursos da Fazenda Pública.

A teoria objetiva da responsabilidade do Estado subtrai, para fins de averiguação da procedência, ou não, da responsabilização estatal, a necessidade do elemento subjetivo (culpa ou dolo). Assim, para a presente teoria, basta que haja relação de causalidade entre o comportamento comissivo ou omissivo do Estado – seja este lícito ou ilícito – e a efetiva lesão na esfera juridicamente protegida do administrado.

Themistocles Cavalcanti, recorrendo-se aos ensinamentos e expressões de Gabba, salienta que para se verificar a responsabilidade da pessoa política é necessário apenas "o nexo causal entre a pessoa e o dano, sem atender à imputabilidade baseada na culpa, no procedimento, nas circunstâncias que ocasionaram o dano."

Consoante demonstrado, temos então para a configuração da teoria objetiva da responsabilidade os seguintes elementos:

a)uma ação ou omissão do Estado lícita ou ilícita;

b)dano à esfera juridicamente protegida de outrem;

c)nexo de causalidade entre o comportamento do Estado e o dano.

Assim como na teoria da responsabilidade subjetiva do Estado tem-se a idéia da culpa do serviço que lhe serve de substrato, a responsabilidade objetiva possui, como fundamento, as chamadas teoria do risco e teoria do risco integral.

TEORIA DO RISCO ADMINISTRATIVO

Para a concretização do dever jurídico de indenizar o administrado com fundamento na teoria do risco administrativo, basta que do ato injusto do Estado sobrevenha dano ao particular.

A teoria do risco baseia-se fundamentalmente no risco natural decorrente das mais variadas atividades desenvolvidas pelo Estado no cumprimento de proporcionar os serviços públicos ao mesmo incumbidos.

Por esta idéia central, qual seja, que a atividade estatal promove um risco de dano, esta teoria faz incidir sobre o Estado a responsabilidade deste como se se tratasse de uma pessoa jurídica de direito privado que atuasse no ramo de seguros em que os segurados seriam os contribuintes – administrados – que, ao pagar os tributos devidos, contribuem para a formação de um fundo patrimonial coletivo.

Saliente-se, todavia, que a teoria do risco administrativo, embora dispense a prova de culpa do Estado pelo dano causado ao administrado, permite que aquele demonstre, para fins de se eximir ou de atenuar o dever de indenizar, a culpa ou concorrência da própria vítima. É dizer: por esta teoria, basta a demonstração do nexo causal, ficando, o administrado, eximido de provar a culpa o que, de toda sorte, não garante que em todo e qualquer caso deverá o Poder Público indenizar o particular pelos danos sofridos em virtude da atuação estatal.

TEORIA DO RISCO INTEGRAL

Segundo o magistério de Hely Lopes Meirelles há ainda, no bojo da responsabilidade objetiva do Estado, a chamada teoria do risco integral que se diferencia da teoria do risco administrativo justamente por obrigar o Poder Público a indenizar o particular por todo ato que atente contra a esfera jurídica protegida do mesmo, ainda que para o surgimento do dano concorra ou dê causa a vítima.

Assim, teríamos como principal elemento diferenciador das teorias do risco e do risco integral, a admissibilidade pela primeira das causas excludentes de responsabilidade, enquanto na teoria do risco integral estas causas jamais poderiam servir como fundamento para eximir o dever jurídico de indenizar incumbido ao Estado.

Pelo caráter extremo, abusivo e injusto da teoria do risco integral, a mesma vem sofrendo fortes criticas, restando a ela poucos cultuadores, e tendo ainda reduzida sua aplicabilidade, porquanto, caso o fosse, geraria graves conseqüências aos postulados e princípios não só do Direito Público, mas sim do ordenamento jurídico como um todo.

ESPÉCIES DE RESPONSABILIDADE CIVIL

Dependendo da perspectiva analisada, a responsabilidade civil pode apresentar-se sob várias espécies. Quanto ao seu fato gerador, poderá ser responsabilidade contratual (aquela proveniente de conduta violadora de norma contratual) ou responsabilidade extracontratual ou aquiliana (resultante da violação de um dever geral de respeito aos direitos alheios e legalmente previstos). Quanto ao agente, poderá ser responsabilidade direta (proveniente de ato do próprio responsável) e responsabilidade indireta (provém de ato de terceiro, vinculado ao agente ou de fato de animal ou coisa inanimada sob sua guarda). Quanto ao seu fundamento, poderá ser responsabilidade subjetiva (presente sempre o pressuposto culpa ou dolo, devendo coexistir, para sua caracterização, a conduta, o dano, a culpa e o nexo de causalidade entre a conduta e o dano) e responsabilidade objetiva (não há a necessidade da prova da culpa, bastando a existência do dano, da conduta e do nexo causal entre o prejuízo sofrido e a ação do agente).[1]

Responsabilidade subjetiva (Teoria da culpa)

O dever de reparar aquele a quem porventura se causou algum dano tornou-se bem claro na legislação brasileira a partir da promulgação do Código Civil de 1916 que, em seu artigo 159 consagrava tal princípio, definindo que "aquele que por ação ou omissão voluntária, negligência, ou imprudência, violar direito, ou causar prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar o dano.[2] O Código Civil de 2002 manteve a culpa como fundamento da responsabilidade civil, tendo substituído o enunciado prejuízo por dano, cuja etimologia é similar, além de ampliar direitos, ao estender o dano moral como ato ilícito no texto do artigo 186 e, muito embora o legislador tenha reparado o equívoco do Código de 1.916, onde violar direito ou causar dano, sabiamente foi redigido violar direito e causar dano, teria cometido uma redundância, mesmo porque violar direito já se constitui em ato ilícito, independente da ocorrência do dano. Na redação dada ao Código Civil brasileiro encontram-se identificados os pressupostos dos elementos essenciais da responsabilidade civil (ação ou omissão alusiva ao comportamento humano, a culpa ou dolo do agente, a relação de causalidade entre ação e dano e o dano propriamente dito).

Para Diniz:

A responsabilidade mostra-se como a imposição a uma pessoa para reparar o dano causado a outrem, seja em decorrência da responsabilidade objetiva, seja em decorrência da responsabilidade subjetiva. Portanto, os seus elementos basilares dependem do ponto de vista a ser analisado: culpa presumida ou circunstância meramente objetiva.[3]

Responsabilidade objetiva (Teoria do risco)

A responsabilidade objetiva é parte das exceções criadas pelo legislador, com finalidade caracterizadamente protetiva, considerando não mais invocar o dolo ou culpa do agente, passando a ocorrer responsabilidade pela reparação de algum dano quando presentes a conduta, o dano e o nexo de causalidade.

Como o princípio da responsabilidade civil fundou-se, desde o Código Civil de 1916, na doutrina da culpa, esta foi mantida como um dos pressupostos fundamentais no Código Civil atual, em seu artigo 186, onde prescreve que "aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito." Entretanto, a insatisfação com a teoria subjetiva, tornando-se cada vez maior, levou o legislador a analisar aspectos do cotidiano que deduziram sua incompatibilidade com o impulso do desenvolvimento, levando em conta principalmente a multiplicação das oportunidades e das causas de danos, que "evidenciaram que a responsabilidade subjetiva mostrou-se inadequada para cobrir todos os casos de reparação."

A evolução que a teoria objetiva provocou se deu pelo fato da facilitação da ação da vítima em concreto na reparação do dano, gerando aos infratores a obrigação de indenizar por acidentes provenientes de suas atividades, em detrimento da teoria subjetiva, para a qual o agente precisa salientar a culpa dentro da idéia de desvio de conduta. A prova acaba sendo de difícil constatação, criando grandes óbices à vítima, que quase sempre acabava arcando com os respectivos ônus. Com a técnica da presunção de culpa, impõe-se a inversão do ônus da prova, em razão da condição menos favorável da vítima.

Uma das teorias que procuram justificar a responsabilidade objetiva é a teoria do risco, tida para vários autores como a substitutiva da teoria da culpa, para eles insatisfatória e superada.

Segundo ensinamento de Gonçalves:

Para esta teoria, toda pessoa que exerce alguma atividade, cria um risco de dano para terceiros. E deve ser obrigada a repará-lo, ainda que sua conduta seja isenta de culpa. A responsabilidade civil desloca-se da noção de culpa para a idéia de risco, ora encarada como risco-proveito, que se funda no princípio segundo o qual é reparávelo dano causado a outrem em conseqüência de uma atividade realizada em benefício do responsável (ubi emolumentum, ibi ônus); ora, mais genericamente como risco criado, a que se subordina todo aquele que, sem indagação de culpa, expuser alguém a suportá-lo[4]

A doutrina e a jurisprudência comprovam que a responsabilidade civil fundada apenas na culpa tradicional não tem apresentado resultados para a solução de considerável número de casos, haja vista que a exigência de que a vítima prove o erro cometido pelo agente tem deixado muitos lesados sem reparação dos danos sofridos. Como afirma Lima, "a responsabilidade, segundo a corrente objetivista, deve surgir exclusivamente do fato."[5]

"A teoria do risco é também repelida por alguns autores, os quais mantêm estrita fidelidade à teoria da responsabilidade subjetiva e, dentre esses, destacam-se Mazeaud et. al. como compeões na luta contra a doutrina do risco."[6]

Stocco e Pereira estão entre os autores que comungam a mesma idéia a respeito da teoria do risco, quando apontam como eclética a convivência entre esta e a teoria da culpa. Enquanto a culpa exprimiria a noção básica e o princípio geral definidor da responsabilidade, a doutrina do risco seria aplicada nos casos especialmente previstos ou quando a lesão provém de situação criada por aquele que explora profissão ou atividade que expôs o lesado ao risco do dano que sofreu.

ELEMENTOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL

Ação ou omissão do agente

A conduta é requisito essencial para que haja a responsabilidade civil, quer seja objetiva ou subjetiva. Diniz conceitua a conduta como sendo um "ato humano, comissivo ou omissivo, ilícito ou lícito, voluntário e objetivamente imputável, do próprio agente ou de terceiro, ou o fato de animal ou coisa inanimada, que cause dano a outrem, gerando o dever de satisfazer os direitos do lesado".[7]

No caso da ação ou omissão do agente, o prejuízo causado deve ser produzido pelo comportamento humano omisso resultante de ato próprio, de terceiro que esteja sob sua responsabilidade ou até mesmo por animais que estejam sob sua responsabilidade. A violação do direito pode ocorrer sob a ótica do contrato (descumprimento da obrigação contratual), legal (conduta adversa a mandamento legal) ou social (a conduta do agente não chega a infringir a lei, mas foge á finalidade social a qual se destina, como nos atos praticados com abuso de direito). O comportamento omissivo enseja a presença do dever do indivíduo praticar determinado fato, cujo descumprimento deste advenha o dano, configurando, destarte, o nexo de causalidade. Por sua vez, o dever de agir pode ser decorrente e lei, de convenção ou até mesmo da própria criação de alguma situação de perigo, mesmo porque, ao ser este criado, estará gerando a obrigação do seu gerador em afastá-lo.

Como fato gerador da responsabilidade, a ação pode ainda ser lícita ou ilícita. Para Diniz "a responsabilidade decorrente do ato ilícito baseia-se na idéia de culpa, e a responsabilidade sem culpa funda-se no risco, que se vem impondo na atualidade, principalmente ante a insuficiência da culpa para solucionar todos os danos". Assim sendo, o comportamento do agente está condicionado ao ato de praticar um ato indevido e a não observar como deveria agir em determinada situação, com o intuito de evitar a ocorrência do dano. "A omissão é, em regra, mais freqüente no âmbito da inexecução das obrigações contratuais".

Rodrigues já é discordante de Diniz, ao considerar como pressuposto da responsabilidade a ocorrência de um ato ilícito, contanto que Diniz abarca em seu conceito também os atos lícitos. Para ele, seria pressuposto a ação ou omissão do agente, que "decorre sempre de uma atitude, quer ativa, quer passiva, e que vai causar dano a terceiro. A atitude ativa consiste em geral no ato doloso ou imprudente, enquanto a passiva, via de regra, se retrata através da negligência. [...] A omissão só ocorre quando o agente, tendo o dever de agir de determinada maneira, deixa de fazê-lo"

Culpa ou dolo

A culpa ou o dolo se constituem em elementos essenciais à caracterização da responsabilidade civil subjetiva, haja vista que sua caracterização não se configura sem que seja cometido algum ato diverso ao direito. Comentando sobre o conceito de culpa in comitendo da definição de responsabilidade civil dada pelo Código Civil de 1916, Sampaio afirma que:

Culpa latu senso, podendo adotar a forma stricto sensu ou dolo. O agente procede com dolo quando causa o dano deliberadamente, isto é, quis o resultado. A culpa stricto senso amoda-se ao critério do homem médio, quando esse não se ateve ao cuidado que lhe era exigido, seja pela falta de vigilância ou pela escolha errada. Ainda, a culpa (stricto sensu) abarca os conceitos de imperícia, imprudência e negligência.[8]

Stocco assevera que "a culpa stricto sensu, é o agir inadequado, equivocado, por força de comportamento negligente, imprudente ou imperito, embora o agente não tenha querido o resultado lesivo, desde que inescusável. Aliás, geralmente o seu objetivo é lícito, ausente a intenção de prejudicar". A imprudência se caracteriza pela falta de cautela, em que o indivíduo age precipitadamente, de forma a causar dano a alguém; a negligência é caracterizada pelo descaso, pela falta de atenção e pela indolência, ou seja, pelo deixar de fazer aquilo que estava sob sua responsabilidade; a imperícia se caracteriza pela demonstração de inabilidade por parte de qualquer profissional no exercício da sua profissão. Enfim, ela se configura a partir do momento em que se registra a violação de um dever previamente estabelecido por força contratual, cuja violação é passível de causar dano a terceiros. Já o desrespeito aos bens alheios e às pessoas gera a culpa chamada extracontratual ou aquiliana, em que o indivíduo, agindo de forma imperita, negligente ou mesmo imprudente, causa danos (um motorista que, dirigindo em alta velocidade e atropela alguém, é levado a reparar a vítima ou seus familiares pelos danos causados). A responsabilidade extracontratual se escora no princípio da culpa, prevista nos artigos 159 e 160 do Código Civil de 1.916 (artigos 18653 e 18754 do Código Civil de 2002). "O termo extracontratual é utilizado por não derivar de um contrato, e sim de um ato ilícito. Assim, em razão do agente causador do dano agir com culpa em sentido estrito ou dolo, deverá repará-lo".

As responsabilidades contratual e extracontratual quanto à obrigação de indenizar o dano causado pode surgir do inadimplemento de obrigação negocial ou ex lege (responsabilidade contratual) e da lesão de direito subjetivo, sem que entre o ofensor e a vítima preexista qualquer relação jurídica (responsabilidade extracontratual). Nos dois casos a lei impõe ao autor do dano uma obrigação, cujo objetivo é a prestação da indenização. Embora tal obrigação seja a mesma, diferem as duas espécies de responsabilidade, notadamente quanto ao fundamento, à razão de ser e ao ônus da prova.[9]

Resumidamente, o elemento que dá origem, tanto para a responsabilidade aquiliana, quanto para a responsabilidade contratual, é o ato ilícito e a comprovação da culpa. Os graus de culpa estão previstos no atual Código Civil, inversamente ao que ocorria no de 1.916. O parágrafo único do artigo 944 estabelece que "se houver excessiva desproporção entre a gravidade da culpa e o dano, poderá o juiz reduzir, equitativamente, a indenização".

A obrigação de indenizar, advinda da culpa, deixa claro que não é bastante ao indivíduo agir apenas com licitude no sentido de respeitar seus semelhantes e seus patrimônios, mas também precaver-se para não lhes causar quaisquer danos, considerando que a responsabilidade objetiva não considera fundamental a culpa para admitir qualquer prejuízo causado e, sendo assim, a teoria de risco elimina essa idéia do conceito de responsabilidade civil. Assim é que o Código Civil Brasileiro, no parágrafo único do artigo 927 estabelece que "haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem".

Stolze e Pamplona colocam a culpa como elemento acidental (e não essencial) da responsabilidade civil, quando citam como pressupostos desta, a conduta humana, o dano e o nexo causal. A legislação brasileira ainda não definiu e nem conceituou claramente a culpa até agora.

Dano

O dano representa uma circunstância elementar ou essencial da responsabilidade civil e configura-se quando um direito é lesionado em seu conjunto de valores protegidos, relacionando-se a sua própria pessoa (moral ou física) aos seus bens e direitos.

Stocco ensina que "o dano é elemento essencial e indispensável à responsabilização do agente, seja essa obrigação originada de ato lícito, nas hipóteses expressamente previstas; de ato ilícito, ou de inadimplemento contratual, independente, ainda, de se tratar de responsabilidade objetiva ou subjetiva".

O dano passível de ressarcimento é o dano injusto, afastando-se daí o dano autorizado pelo direito e para que seja passível de indenização, urge a necessidade de apuração da atualidade, certeza e subsistência. O dano atual é aquele que efetivamente já ocorreu e o certo é aquele fundado em um fato certo, e não o calcado em hipóteses. O dano também poderá ser patrimonial ou moral. Ele é considerado patrimonial quando afeta o patrimônio do ofendido e moral quando corresponde à lesão dos bens denominados de bens da personalidade (honra, imagem, etc.), conforme o artigo 402 do Código Civil de 2002, que normatiza: "Salvo as exceções expressamente previstas em lei, as perdas e danos devidas ao credor abrangem, além do que ele efetivamente perdeu, o que razoavelmente deixou de lucrar.

É indubitável que o dano é o elemento de maior relevância na responsabilidade civil, haja vista ser ele o responsável pelo ensejo da obrigação de reparar prejuízos por ele causados. Como ensina Stocco, "o elemento primário de todo ato ilícito é uma conduta humana e voluntária do mundo exterior. Esse ilícito, como atentado a um bem jurídico protegido, interessa à ordem normativa do Direito justamente porque produz um dano. Não há responsabilidade sem um resultado danoso".

Para Diniz, o dano é um elemento de suma importância para sua reparação, ao ensinar que "para que haja o pagamento da indenização pleiteada, é necessário comprovar a ocorrência de um dano patrimonial ou moral, fundados, não na índole dos direitos subjetivos afetados, mas nos efeitos da lesão jurídica".

Reparar danos, particularmente os morais, não significa beneficiar o lesado, no sentido de que este passe a possuir situação econômica melhor do que se encontrava anteriormente ao fato delituoso. Nesse sentido, Stocco complementa, afirmando que "no nosso sistema jurídico a indenização do dano deve obedecer à glosa lucratos non sit, de modo que a reparação do dano não pode converter-se em fonte de enriquecimento da vítima e ruína de quem dá". Já em relação aos danos materiais, é aplicada a regra constante no artigo 944 do Código Civil brasileiro, em que "A indenização mede-se pela extensão do dano."

Nexo de causalidade

O nexo de causalidade "representa a relação de causa e efeito entre a ação ou omissão e o dano". Gonçalves conceitua nexo de causalidade como sendo:

[...] a relação de causa e feito entre a ação ou omissão do agente e o dano verificado. Vem expressa no verbo "causar", utilizado no art. 159. Sem ela, não existe a obrigação de indenizar. Se houve o dano, mas a sua causa não está relacionada com o comportamento do agente, inexiste a relação de causalidade e também a obrigação de indenizar.

Na concepção de Gomes, é necessário que haja uma relação entre causa e efeito para que o ato ilícito venha a se constituir em obrigação de indenizar, mesmo porque, conforme afirma

Demongue, "é preciso estar certo que, sem este fato o dano não teria ocorrido". Sem que seja estabelecida a relação da causalidade entre o dano e a ação que o provocou, aquele só estará gerando responsabilidade quando tiver por casa uma falta cometida ou então um risco legalmente confirmado.

Venosa afirma que "o conceito de nexo causal ou relação de causalidade deriva de leis naturais. É o liame que une a conduta do agente ao dano. É por meio do exame da relação causal que concluímos quem foi o causador do dano". Mesmo a responsabilidade objetiva dispensando a culpa,nunca o fará com relação ao nexo causal, Isso significa que não há como indenizar uma vítima de dano, se esta não experimentou o mesmo.

O nexo de causalidade se faz necessário para relacionar a conduta e o dano à possibilidade de responsabilização em um determinado caso concreto. "O nexo causal se torna indispensável, sendo fundamental que o dano tenha sido causado pela culpa do sujeito". Nem sempre é tarefa fácil buscar a origem do dano, haja vista o surgimento das causas concomitantes ou sucessivas que direcionam a solução da questão com fulcro no artigo 942 do Código Civil Brasileiro, o qual estipula que "Os bens do responsável pela ofensa ou violação do direito de outrem ficam sujeitos à reparação do dano causado; e, se a ofensa tiver mais de um autor, todos responderão solidariamente pela reparação".

A culpa exclusiva da vítima, a culpa de terceiro, o caso fortuito ou a força maior, a cláusula de não indenizar, as excludentes de ilicitude, o estado de necessidade e a legítima defesa retiram o nexo causal. A coincidência não implica causalidade.

No direito brasileiro, seja a responsabilidade objetiva ou subjetiva, o dever de reparar depende do nexo de causalidade entre o ato culposo ou a atividade objetivamente considerada e o dano a ser demonstrado, em princípio, por quem o alega. É o princípio jurídico onus probandi incumbit ei qui dicit, non qui netat. As exceções são encontradas nas hipóteses de inversão do ônus da provaprevistas expressamente na lei para situações específicas. "O nexo de causalidade é de grande relevância nas freqüentes hipóteses de causalidade múltipla (concausas). No comum dos casos, na complexidade da vida social, associa-se um determinado evento danoso a múltiplas fontes possíveis, sendo indispensável estabelecer a relação de causa e efeito entre o menos uma delas e o dano, para que surja o dever de reparar.

O artigo 1.060 do Código Civil brasileiro bem define a teoria da causalidade em matéria de responsabilidade extracontratual, até porque o Supremo Tribunal Federal adota a teoria da causalidade direta ou imediata, também conhecida como teoria da interrupção do nexo causal, entendimento amplamente consagrado na Constituição federal de 1967 e na de 1988. O artigo 1.060 do Código Civil de 1.916 e o artigo 403 do Código Civil de 2002 rezam que: "Ainda que a inexecução resulte de dolo do devedor, as perdas e danos só incluem os prejuízos efetivos e os lucros cessantes por efeito dela direto e imediato, sem prejuízo do disposto na lei processual."

A RESPONSABILIDADE NO ESTADO BRASILEIRO

É indubitável o entendimento que a legislação brasileira admite a possibilidade do Estado causar prejuízos à sociedade mediante a prática de comportamento lícitos ou ilícitos, comissivos ou omissivos, que porventura venham a resultar em obrigação de recomposição dos danos. A responsabilidade do Estado obedece a um regime próprio, compatível com sua situação jurídica, pois potencialmente tem a faculdade de proporcionar prejuízos consideráveis. A sociedade não tem poderes para diminuir a atuação do Estado, no âmbito de seus direitos individuais. Para Mello, "a responsabilidade do Estado está implícita na noção do Estado de Direito, não havendo necessidade de regra expressa para firmar-se isso, porquanto no Estado de Direito todas as pessoas, de Direito Público ou Privado, encontram-se sujeitas à obediência das regras de seu ordenamento jurídico" [10]

Não há que ser descartado também o dever de responder pelos comportamentos violadores do direito de alguém. Meireles se vale do termo responsabilidade da administração, pois entende que o dever de indenizar se impõe à Fazenda Pública[11]

A propósito do termo responsabilidade da administração, cumpre esclarecer o sentido das teorias de Meirelles sobre as causas concomitantes sucessivas:

a) teoria da culpa administrativa: a obrigação do Estado indenizar decorre da ausência objetiva do serviço público em si. Não se trata de culpa do agente público, mas de culpa especial do Poder Público, caracterizada pela falta de serviço público. b) teoria do risco administrativo: a responsabilidade civil do Estado por atos comissivos ou omissivos de seus agentes é de natureza objetiva, ou seja, dispensa a comprovação de culpa. c) Teoria do risco integral: a Administração responde invariavelmente pelo dano suportado por terceiro, ainda que decorrente de culpa exclusiva deste, ou até mesmo de dolo.

Para Meirelles, "esta é a teoria adotada pelo nosso ordenamento jurídico, prevista no art. 1.060 do antigo Código Civil, bem como no art. 403 do novo Código. Portanto, será causa do dano aquela que está mais próxima deste, imediatamente (sem intervalo) e diretamente (sem intermediário).

A responsabilidade do Estado na Constituição federal de 1988

O exame do tema relativo à responsabilidade do Estado em indenizar danos causados por suas atividades a terceiros não deixa de ser complexo, conquanto todo o avanço alcançado pela ciência jurídica, em razão de vários aspectos controversos que ainda não se apresentaram solucionados e, dentre eles, mesmo não apresentando muita relevância, está relacionada a denominação utilizada para tal obrigação. "Para uma corrente de juristas, destacando-se, entre eles, Amaro Cavalcanti, Gilberti Messina, João Sento Sé e Yussef Said Cahali, não há incorreção no tratamento do tema como Responsabilidade civil do Estado".

Silva encabeça os defensores de uma segunda corrente que entende ser a denominação correta "responsabilidade do Estado, por ter como pleonástica a enunciação "responsabilidade civil do Estado", tendo em vista que, no tocante ao Estado, por ser pessoa jurídica, só há de se cogitar de responsabilidade civil, nunca da penal"[12].

"Uma terceira corrente é defendida pelos doutrinadores Renato Alessi, A. Torrente e Franceso Garri e aplica, ao mesmo fenômeno obrigacional, a nomenclatura de Responsabilidade Pública da Administração ou Responsabilidade da Administração". A crítica lançada aos que assim compreendem o título da matéria é que determina uma visão estreita da responsabilidade apreciada, por possibilitar a visualização de que se está tratando, apenas, dos atos praticados pelo Poder Executivo, cuja função precípua é a de administrar.

Quer parecer que a nomenclatura mais adequada seja, efetivamente, responsabilidade do Estado, senão vejamos a conclusão a que chegou Silva, após ter analisado as diversas modalidades de ser chamada essa responsabilidade do Poder Público, tendo chegado à conclusão que:

De onde se conclui ser preferível continuar empregando a expressão Responsabilidade do Estado. Nessa, o único defeito que notamos é certa ambigüidade entre o conceito genérico de Estado, supradefinido, e o específico, respeitante aos entes que integram a Federação Brasileira: desse ângulo restrito, tal locução seria imprópria, por não abranger a União, o Distrito Federal e os Municípios. Dogmaticamente, porém, a confrontação não procede. Não há ciência senão do geral, e por conseguinte inexiste razão para modificar essa expressão, que resulta de longa tradição histórica, apenas porque o legislador brasileiro, na esteira dos constituintes norte- americanos, designou com o nome de Estados as antigas Províncias do Império[13]

O preceito que regula a responsabilidade estatal localiza-se, na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, em capítulo que versa sobre a Administração Pública em geral e diz respeito à administração direita e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, estando acolhida no parágrafo 6º. do artigo 37, nos seguintes termos: "As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa".

O Código Civil de 2002, diferentemente do Código de 1.916, refere-se ao direito regressivo contra causadores do dano, na hipótese de ocorrência de dolo ou culpa. O artigo 43 prevê que: "As pessoas jurídicas de direito público interno são civilmente responsáveis por atos de seus agentes que nessa qualidade causam danos a terceiros, ressalvado o direito regressivo contra os causadores do dano, se houver, por parte destes, culpa ou dolo". O legislador contempla, mais uma vez, a responsabilidade objetiva do Estado, "embora já não fosse necessário fazê-lo"[14], permitindo perscrutar sobre a presença do elemento subjetivo (culpa ou dolo) tão-somente na ação regressiva (do Estado) em face do agente (causador do dano).

Há que se considerar que os efeitos da Teoria do Risco Administrativo são extensivos às pessoas jurídicas de direito privado, empresas públicas, sociedades de economia mista, empresas permissionárias e concessionárias de serviços públicos.

Outro aspecto digno de observação no parágrafo 6º. da Constituição federal de 1988 reside no emprego do verbo causar (causarem), o que remete ao comportamento comissivo do Estado, isto é, somente a atuação positiva pode gerar efeitos, sendo a responsabilidade nele contida objetiva. Sendo o contrário, a responsabilidade seria subjetiva, dependendo de procedimento doloso ou culposo, não significando que as condutas omissivas devem ficar impunes, cabendo à via administrativa disciplinar as providências cabíveis.

O evento danoso "deve corresponder a uma lesão jurídica, pouco importando sua natureza de dolo ou de culpa. Para a caracterização do dano indenizável, não basta corresponder a mero decréscimo patrimonial; deve haver proteção jurídica no sistema normativo, reconhecendo-o como um direito administrativo".

Segundo a teoria do risco administrativo, os requisitos ou pressupostos para que se configure a responsabilidade civil do Estado são: a) a ocorrência do dano; b) a ação ou omissão administrativa; c) a existência de nexo de causalidade entre o dano e a ação ou omissão administrativa e; d) ausência de causa excludente da responsabilidade estatal134. Nesses casos não importa a natureza dolosa ou culposa, mas sim o dano a terceiros, pois, ocorrendo somente a ilegalidade ou irregularidade em qualquer ato do Estado, pode não estar sendo produzida nenhuma responsabilidade, mas apenas a sua invalidade, se for o caso, ressalvando-se a aplicabilidade dessas regras apenas para o Estado ou quaisquer outras empresas, quer sejam públicas ou privadas, desde que submetidas à regra constitucional "desde que prestem serviços públicos. Desta forma, se as entidades da Administração indireta executarem atividades econômicas de natureza privada, a responsabilidade será disciplinada pelas normas de direito comum".

Meirelles refere-se à teoria do risco administrativo como teoria da culpa administrativa, esclarecendo que: "a teoria da culpa administrativa representa o primeiro estágio da transição entre a doutrina subjetiva da culpa civil e a tese objetiva do risco administrativo, pois leva em conta a falta do serviço para dela inferir a culpa da Administração. É o estabelecimento do binômio falta do serviço - culpa da Administração"[15]. Nesse caso não se está inquirindo a culpa subjetiva do agente administrativo e sim a falta do serviço em si mesmo, como gerador da obrigação de indenizar o dano causado a terceiro. Exige-se uma culpa especial da Administração, a que se convencionou chamar culpa administrativa.

A omissão como causa de responsabilidade do Estado

A evolução da teoria da responsabilidade civilista passou para a fase da publicidade da culpa administrativa, como sendo criação do Conselho de Estado francês, tratando-se de uma teoria que inova profundamente, pois passa-se para a responsabilidade do Estado, independentemente da falta do agente público, quando originária da Administração, pelo mau funcionamento do serviço público ou pela sua inexistência, cuja decorrência deve ser concretamente avaliada e analisada. Esta fase marca a transição para a atual fase da responsabilidade objetiva do Estado. O fato que materializou esta nova concepção foi o julgamento do caso Blanco, em 1873, na França, onde somente as regras de direito público foram aceitas para a solução do caso, porquanto o Estado aparecia como causador de dano a administrado. Nesse tipo de responsabilidade, a idéia de culpa é substituída pela de nexo de causalidade entre o funcionamento do serviço público e o prejuízo sofrido pelo administrado. É indiferente que o serviço público tenha funcionado bem ou mal, de forma regular ou irregular. Neste tipo de responsabilidade não há necessidade de apreciação do dolo ou culpa. É a chamada teoria do risco, porquanto tem como pressuposto de que a atuação do poder público envolve um risco de dano, que lhe é inato.

Como informa Tôrres, "pela teoria do risco objetivo figura o entendimento de que ao lesado não interessa conhecer o responsável pelo dano, ele almeja o ressarcimento, desde que estabelecido o nexo causal entre ele e o Estado"[16].

Di Pietro afirma que:

Essa culpa do serviço público ocorre quando o serviço público não funcionou (omissão), funcionou atrasado ou funcionou mal. Em qualquer dessas três hipóteses, ocorre a culpa (faute) do serviço ou acidente administrativo, incidindo a responsabilidade do Estado, independentemente de qualquer apreciação de culpa do funcionário.

A teoria da faute du service tem ampla aplicação no direito brasileiro, mesmo porque a legislação pertinente é clara ao afirmar que o Estado responderá pela sua inércia, omissão ou falha na prestação de serviço público essencial, desde que devidamente caracterizadas,.

É conveniente ressaltar que a responsabilidade do Estado não se dá somente por atos ou omissões de agentes devidamente identificados, mas também nas hipóteses de danos provenientes de agentes não identificados ou de falhas em máquinas, aparelhos e equipamentos, sem possibilidade de atribuição pessoal. "Ainda assim a Administração arca com o ressarcimento do dano; por exemplo: granada esquecida em campo de manobra que explode e fere transeunte"

Na concepção de Cretella Júnior, a omissão configura a culpa in omitendo e a culpa in vigilando, ou seja:

São casos de inércia, casos de não-atos. Se cruza os braços ou se não vigia, quando deveria agir, o agente público omite-se, empenhando a responsabilidade do Estado por inércia do agente. Devendo agir, não agiu. Nem como o bonus pater familiae, nem como o bonus administrator145. Foi negligente. Às vezes imprudente e até imperito. Negligente, se a solércia o dominou; imprudente, se confiou na sorte; imperito, se não previu as possibilidades da concretização do evento. Em todos os casos, culpa, ligada à idéia de inação física ou mental.[17]

Fagundes anota que "quando a inércia da Administração acarreta prejuízo ponderável para o administrado, dá lugar à reparação". Mello resume a questão, afirmando que:

A responsabilidade por omissão é responsabilidade por comportamento ilícito. E é responsabilidade subjetiva, porquanto supõe dolo ou culpa em suas modalidades de negligência, imperícia ou imprudência, embora possa tratar-se de uma culpa não individualizável na pessoa de tal ou qual funcionário, mas atribuída ao serviço estatal genericamente. É a culpa anônima ou por falta de serviço. É dispensável localizar-se, no Estado, quem especificamente descumpriu o dever de agir, omitindo-se propositadamente ou apenas por incúria, por imprudência, ao negligenciar a obrigação e atuar tempestivamente. Cumpre tão-só que o Estado estivesse obrigado a certa prestação e faltasse a ela, por descaso, por imperícia ou por desatenção no cumprir seus deveres, para que desponte a responsabilidade pública em caso de omissão[18]

Há que se observar que, quando a conduta do Estado for omissa, cumpre discernir se esta se constitui, ou não, fato gerador de responsabilidade do Estado, porquanto "nem toda conduta omissiva retrata um desleixo do Estado em cumprir um dever legal; se assim for, não se configurará a responsabilidade estatal". O Estado será obrigado a reparar os prejuízos somente quando ficar configurada sua omissão diante do dever legal de impedir a ocorrência do dano, o que "só se desenhará quando presentes estiverem os elementos que caracterizam a culpa", originada do descumprimento do dever legal atribuído ao Poder Público, de impedir que o dano se consume.

O entendimento de que a responsabilidade do Estado nos atos omissos dependa da apuração de culpa parte também de Hely Lopes Meirelles, além de Celso Antônio Bandeira de Mello. Quem também entende que a responsabilidade só poderá ser atribuída se houver prova de culpa ou dolo do funcionário é Figueiredo, ao afirmar que "ainda que o texto constitucional consagre a responsabilidade objetiva, não há como se verificar a adequabilidade da imputação ao Estado na hipótese de omissão, a não ser pela teoria subjetiva. E só é dessa forma, porque, nesses casos, deve-se observar se era de esperar a atuação do Estado, e se este omitiu-se, há de se verificar se havia o dever de agir".

Stocco comenta que:

Esse entendimento é afirmado mesmo após o advento do Código Civil de 2002, pois se é certo que o seu art. 43 responsabiliza as pessoas jurídicas de direito público interno objetivamente, não menos certo que o faz desde que por atos dos seus agentes que, nessa qualidade, causem danos a terceiros, ou seja, através de um agir, de uma ação, ou seja, de um facere. O verbo "agir" é verbo de movimento, significando "ação". [...] quando o Código Civil pretendeu referir-se à conduta ativa (por ação) ou conduta passiva (por omissão), fê-lo expressamente como se verifica do dispositivo que sustenta o fundamento e o pressuposto da responsabilidade civil, ou seja, o art. 186 do CC, que dispõe: "Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito". O art. 43 do CC aparta-se dessa redação para utilizar-se da expressão "atos dos seus agentes", ou seja, "ação" dos seus agentes. Ora, a omissão é a antítese da ação. É o non facere que sempre assume o anonimato[19]

EXCLUDENTES DA RESPONSABILIDADE DO ESTADO

Corolário dos princípios republicano e da legalidade, o Estado sempre responderá por atos ou omissões, lícitas ou ilícitas, que atinjam a esfera de direitos tutelados dos indivíduos, conforme se tem afirmado e demonstrado até o presente momento.

Porém, casos há em que o Estado se exime do dever de indenizar o particular, tendo em vista a atuação de uma das figuras chamadas causas excludentes da responsabilidade do Estado. Destarte, ocorrendo no bojo da situação fática qualquer destas espécies jurídicas, a Fazenda Pública fica isenta de reparar o dano sofrido pelo administrado.

Estando diante da teoria objetiva da responsabilidade do Estado, restará este isento de indenizar o dano sofrido pelo particular, bastando a comprovação da inexistência do nexo de causalidade entre o comportamento comissivo e o dano gerado. Ora, se é de se aplicar a teoria objetiva em face de comportamentos comissivos da pessoa política, quer sejam lícitos ou ilícitos, não havendo o nexo de causalidade entre o ato estatal e o dano suportado pelo(s) particular(es), não há que se falar em responsabilização do Poder Público.

Quanto se nos apresentar a responsabilidade do Estado por comportamentos omissivos ilícitos e, portanto, respaldado na teoria subjetiva da responsabilidade, ficará afastada a mesma caso não tenha havido negligência, imprudência ou imperícia, tampouco dolo na omissão estatal. Assim, agindo o Estado dentro daquilo que impunha os ditames legais, ou das "possibilidades reais médias dentro do ambiente em que se produziu o fato danoso" , não há se falar em responsabilização estatal.

A doutrina vem ainda utilizando-se de outras duas causas excludentes da responsabilidade do Estado, quais sejam, a culpa da vítima e a força maior.

Por culpa da vítima, entende-se o evento em que aquele que sofreu o prejuízo pelo agir estatal atuou exclusivamente para a ocorrência do fato danoso. Assim, quando que deu causa ao dano suportado foi a própria vítima, por ato exclusivo seu, não caberá, por óbvio, indagação acerca da responsabilidade do Estado. Note-se neste ponto que se a vítima agiu concorrentemente com o Estado para a produção do evento danos, ainda sim restará o dever de ressarcimento por parte daquele, porém, neste caso, de forma atenuada.

Já a força maior – ocorrência imprevisível e inevitável da natureza, absolutamente independente das vontades das partes - somente poderá ser invocada para excluir a responsabilidade do Estado caso, aliada a ela, ocorrer omissão do Poder Público na realização de um serviço público que lhe era legalmente imposto. Porém, havendo o dever de agir e não o fazendo o Estado, somente se eximirá da culpa caso não haja ocorrência de quaisquer dos elementos caracterizadores da culpa na teoria da faute du service.

O DIREITO DE REGRESSO

Consoante o disposto na parte final do artigo 37, § 6º da Constituição Federal é, à pessoa jurídica de direito público ou de direito privado prestadora de serviço público, "assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa". Assim, o citado diploma confere ao Estado – ou a quem faça suas vezes no mister de executar serviços públicos – agir regressivamente contra o causador do dano a terceiro, desde que este tenha agido com dolo ou culpa, para fins de ser ressarcido pelos prejuízos oriundos da conduta do agente público.

Assim, nos encontramos diante de duas relações jurídicas diferentes e com regimes jurídicos distintos, quais sejam, a relação entre o Estado e a vítima e a relação entre o agente público causador do dano e o próprio Estado. Na primeira, por se tratar de ato comissivo, é de se usar a teoria da responsabilidade objetiva, já na segunda, por expressa disposição constitucional, utilizar-se-á a teoria subjetiva da responsabilidade.

Torna-se pertinente neste ponto a indagação acerca da obrigatoriedade, ou não, da denunciação da lide pelo Estado conforme disposto no inciso III, do artigo 70 do Código de Processo Civil, que assim dispõe: "A denunciação da lide é obrigatória àquele que estiver obrigado, pela lei ou pelo contrato, a indenizar, em ação regressiva, o prejuízo do que perder a demanda."

Chama-se à colação os ensinamentos de Lucia Valle Figueiredo sobre este ponto em específico: "Não pode lei menor empecer a grandeza do instituto. A pretexto de discutível economia processual, não se pode deixar instaurar, no bojo da lide, outra lide – a do Estado e do funcionário -, ocasionando graves percalços ao lesado."

CONCLUSÃO

A consagração da responsabilidade civil do Estado constitui-se em imprescindível mecanismo de defesa do indivíduo face ao Poder Público. Mediante a possibilidade de responsabilização, o cidadão tem assegurado a certeza de que todo dano a direito seu ocasionado pela ação de qualquer funcionário público no desempenho de suas atividades será prontamente ressarcido pelo Estado.

Em uma segunda visão, há que se analisar que responsabilidade civil significa a obrigação de reparar danos patrimoniais, que se exaurem com a indenização. Dentro deste contexto, Hely Lopes Meirelles dispôs a responsabilidade civil da Administração Pública como sendo a obrigação da Fazenda Pública em reparar o dano causado a terceiros por agentes públicos, no desempenho de suas atribuições ou a pretexto de exercê-las .

As Teorias que merecem maior destaque são as Publicistas, que se desdobram em situações que a culpa pode manifestar-se no serviço ou sobre o risco, sendo ainda, esta última, por alguns autores, propagadas em teoria do risco administrativo e teoria do risco integral, vejamos:

Teoria da Culpa no Serviço: Maria Sylvia leciona que esta teoria "ocorre quando o serviço público não funcionou (omissão), funcionou atrasado ou funcionou mal. Nessa teoria, a idéia de culpa é substituída pela de nexo de causalidade entre o funcionamento do serviço público e o prejuízo sofrido pelo administrado. É indiferente que o serviço público tenha funcionado bem ou mal, de forma regular ou irregular".

Teoria do Risco Administrativo: Alexandre de Moraes, em sua obra Direito Constitucional, feito diversas e relevantes considerações, que comporta transcrição, como segue:

"Assim, a responsabilidade civil das pessoas jurídicas de direito público e das pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviço público baseia-se no risco administrativo, sendo objetiva. Essa responsabilidade objetiva exige a ocorrência dos seguintes requisitos: ocorrência do dano; ação ou omissão administrativa; existência de nexo causal entre o dano e a ação ou omissão administrativa e ausência de causa excludente da responsabilidade estatal".

Teoria do Risco Integral: Segundo Hely Lopes Meirelles , esta teoria "é a modalidade extremada da doutrina do risco administrativo, abandonada na prática, por conduzir ao abuso e à iniqüidade social". Essa teoria previa que a Administração estaria obrigada a indenizar todo e qualquer dano suportado por terceiros, ainda que resultante de culpa ou dolo da vítima.

Assim, imprescindível se faz, neste momento, frisar que o ordenamento jurídico pátrio consagra a responsabilidade objetiva do Estado pelo ato do administrador, com base na teoria do risco administrativo. Por fim, conforme Maria Sylvia Di Pietro , cabe-me estampar a regra da responsabilidade objetiva, segundo o referido artigo:

1. que se trate de pessoa jurídica de direito público ou de direito privado prestadora de serviços públicos;

2. que essas entidades prestem serviços públicos, o que exclui as entidades da administração indireta que executem atividade econômica de natureza privada;

3. que haja dano causado a terceiros em decorrência da prestação de serviço público;

4. que o dano seja causado por agente das aludidas pessoas jurídicas, o que abrange todas as categorias, de agente políticos, administrativos ou particulares em colaboração com a Administração, sem interessar o título sob o qual prestam o serviço;

5. que o agente, ao causar o dano, aja nessa qualidade.

Portanto, o instituto da Responsabilidade Civil Pública do Estado visa um Estado que dispõem de atos condizentes com a atual sociedade, atos que resguardam o respeito e dignidade de seus agentes ao aplicá-los a terceiros. Responsabilidade essa que tem por fim proteger a Administração Pública e os seus serviços.

 

 

Autor:

Daniel Regis Rahal

Enviado por:

Juan Marcelino Gonzalez

dr.juanmarcelinogonzalez[arroba]hotmail.com

Pedro Juan Caballero, Agosto de 2010.

UNIVERSIDAD POLITÉCNICA Y ARTÍSTICA DEL PARAGUAI

Trabalho apresentado na aula de Direito Administrativo do Curso de Direito Internacional Público pela Universidade Politécnica e Artística de Pedro Juan Caballero – Paraguai.

Professor: Juan Marcelino Gonzales

Pedro Juan Caballero, Agosto de 2010.


[1] GANDINI, João Agnaldo Donizeti; SALOMÃO, Diana Paola da Silva. A responsabilidade civil do Estado

por conduta omissiva. Revista CEJ. Brasília, n. 23, out. - dez. 2003. p. 45.

[2] Ibidem.

[3] DINIZ, Maria Helena. Op. cit. p. 34.

[4] GONÇALVES, Carlos Roberto. Op. cit. p. 18

[5] LIMA, Alvino. Apud STOCCO, Rui. Op, cit. (1999) p. 78

[6] MAZEAUD, P. et. al. Apud STOCCO, Rui. Op. cit. (1999). p. 78.

[7] DINIZ, Maria Helena. Op. cit. p. 37.

[8] SAMPAIO, Rogério Morrone de Castro. Direito Civil: Responsabilidade Civil. Atlas, São Paulo: 2000. p. 70.

[9] GOMES, Orlando. Obrigações. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1995. p. 278.

[10] MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 13. ed. São Paulo: Malheiros, 2001. p. 623.

[11] MEIRELLES, Helly Lopes de. Direito administrativo brasileiro. 23. ed. atual. São Paulo: Malheiros, 1998. p.530.

[12] SILVA, Juracy C. A responsabilidade do Estado por atos judiciários e legislativos. São Paulo: Saraiva, 1985.p. 72.

[13] SILVA, Juracy C. p. 74.

[14] SILVA, Augusto Vinicius Fonseca e. Op. cit. p. 7.

[15] MEIRELLES, Hely Lopes de. Op. cit. p. 554.

[16] TÔRRES, Heleno Taveira. O princípio da responsabiidade objetiva do Estado e a teoria do risco administrativo. Revista de Informação Legislativa. Brasília, v. 32, n. 126, abr. - jun. 1995. p. 231.

[17] CRETELLA JÚNIOR. Apud STOCCO, Rui. Op. cit. (1999). p. 573.

[18] MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Apud. STOCCO, Rui. Op. cit. (1999). p. 573.

[19] STOCCO, Rui. Op. cit. (2005). p. 15.



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