O uso de medicamentos em puérpuras interfere nas recomendações quanto ao aleitamento materno?

Enviado por Joel A. Lamounier


1. Resumo

Objetivo: estudar a freqüência do uso de medicamentos no pós-parto imediato e verificar possíveis interferências nas recomendações quanto à amamentação.

Métodos: foi realizado um estudo transversal em quatro maternidades de Belo Horizonte, no período de julho de 1998 a julho de 1999, incluindo 2.173 parturientes. A amostra foi calculada com base em dados da Secretaria Municipal de Saúde sobre o número de partos ocorridos nessas instituições, no ano de 1995, ou seja, em torno de 5% do total em um ano. A distribuição da amostra foi aleatória, utilizando o calendário de semanas epidemiológicas. Através de entrevistas junto às mães, usando um questionário próprio, e da coleta de dados obtidos de prontuários médicos da mãe e do recém-nascido, foi avaliada a freqüência do uso de medicamentos no pós-parto imediato. Os medicamentos foram agrupados em categorias quanto à compatibilidade com amamentação, à incompatibilidade, ao uso criterioso em monitorar e observar o recém-nascido para possíveis efeitos indesejáveis.

Resultados: de um total de 2.173 mulheres, em 2.090 (96,2%) foram prescritos medicamentos no pós-parto imediato. Dos medicamentos utilizados, 2.054 (98,3%) foram de drogas sem contra-indicação à amamentação natural; 338 (16,2%) foram de drogas sem informações seguras, e 3 (0,14%) de drogas contra-indicadas à amamentação.

Conclusões: observou-se um amplo uso de medicamentos pelas mães nas maternidades de Belo Horizonte, no pós-parto imediato. A maioria das drogas é compatível com a amamentação, o que parece não influenciar negativamente a prática do aleitamento materno.

aleitamento materno, leite humano, medicamentos, efeitos adversos

2. Abstract

Objective: to study the frequency of medication use in the immediate postpartum period and to evaluate possible effects on breastfeeding.

Methods: a cross-sectional study was carried out with 2,173 women that gave birth in four hospitals in Belo Horizonte, a city in the southeast of Brazil, between July 1998 and July 1999. The sample was calculated by means of the data obtained from the City's Health Department according to the number of labors made in these four hospitals in 1995, which amounts to approximately 5% of the total number that usually occurs within a year. Women were randomized according to the calendar of epidemiological weeks. The interviews consisted of a questionnaire through which information about breastfeeding and sociodemographic data were obtained. In addition, the data were collected from mothers' and newborns' medical records. The drugs were classified according to their compatibility and incompatibility with breastfeeding, and were monitored as to the possible adverse effects on newborn infants.

Results: 2,090 (96.2%) of 2,173 women received drug therapy in the immediate postpartum period. Among the drugs used, 2,054 (98.3%) were not contraindicated for breastfeeding; 338 (16.2%) did not contain safe information, and 3 (0.14%) were contraindicated.

Conclusions: although drug therapy was widespread among the mothers followed up at these four hospitals, there seems to be no influence on breastfeeding. Fortunately, most prescribed drugs did not interfere with mothers' and infants' health.

breast feeding, human milk, drugs, adverse effects

3. Introdução

O aleitamento materno é o mais apropriado para o lactente, devido a suas vantagens nutricionais, imunológicas e psicoafetivas(1-9). Porém, apesar de todas essas vantagens, alguns estudos revelam reduzidas taxas de amamentação materna em nosso meio e em outros países(4,7). Dentre os fatores relacionados com a suspensão do aleitamento materno, pode ser importante a exposição dos lactentes à medicação materna(1,2,4,5,7,9).

A nutriz pode usar medicamentos por diversas razões e sob várias formas. A presença e a concentração do medicamento no leite humano dependem principalmente de três fatores. São eles: os ligados à mãe (metabolismo da droga, forma de prescrição, interação com outros medicamentos); os ligados à droga em si (características bioquímicas, vida média, biodisponibilidade, forma de prescrição, excreção, etc); e aqueles ligados ao recém-nascido (imaturidade de alguns sistemas dificultando a metabolização e excreção da droga)(2,4-6,9,10).

Embora existam textos de referência sobre drogas e leite materno, muitos profissionais de saúde, em especial médicos, talvez por desinformação ou até por desinteresse, preferem interromper a amamentação, ao invés de se esforçarem para compatibilizar com a terapêutica materna(1,2,4,5,7,8). A partir disso, surge a necessidade da divulgação de informações atualizadas sobre o uso de drogas na lactação(11,12).

Portanto, face ao já exposto acima e à carência na literatura nacional de trabalhos com enfoque semelhante ao do nosso estudo, o conhecimento sobre os medicamentos utilizados nas rotinas de maternidades brasileiras ganha muita importância. Isso ocorre quando consideramos a possibilidade desses medicamentos estarem influenciando negativamente a prática da amamentação em nosso país. O objetivo do presente estudo foi conhecer a freqüência do uso de medicamentos no pós-parto imediato e verificar possíveis interferências quanto à amamentação.

4. Métodos

Foram contatadas inicialmente cinco maternidades públicas e filantrópicas de Belo Horizonte, sendo obtido consentimento para realização deste estudo em quatro delas: a Maternidade Hilda Brandão, da Santa Casa de Misericórdia de Belo Horizonte; o Hospital das Clínicas da UFMG; o Hospital Governador Israel Pinheiro /IPSEMG e o Hospital Municipal Odilon Behrens, da Prefeitura de Belo Horizonte. Portanto, são três instituições públicas e uma filantrópica, com programas de residência médica, e conveniadas para estágios de acadêmicos de medicina. O estudo foi realizado no período de julho de 1998 a julho de 1999, incluindo uma amostra representativa da população destes hospitais referente a mães no pós-parto imediato.

Para o cálculo de amostra, foram inicialmente obtidos dados junto à Secretaria Municipal de Saúde de Belo Horizonte referentes aos partos ocorridos nessas quatro maternidades, no ano de 1995. Tomou-se como base o valor de 5% do total de partos ocorridos no ano, sendo suficiente para análises estatísticas. Para distribuição da amostra, foi usada uma tabela de números aleatórios, de acordo com o calendário de semanas epidemiológicas para o período de um ano (52 semanas). Durante o período de uma semana, todas as parturientes no pós-parto imediato (refere-se ao período de até 48 horas após o nascimento da criança) eram incluídas no estudo, não existindo critérios de exclusão. Cada instituição foi visitada em média durante 23 semanas, no período de um ano, sendo a Maternidade Hilda Brandão da Santa Casa de Misericórdia de Belo Horizonte visitada durante 24 semanas, o Hospital das Clínicas da UFMG, durante 23 semanas, o Hospital Governador Israel Pinheiro /IPSEMG, durante 21 semanas, e o Hospital Municipal Odilon Behrens, durante 24 semanas.

O instrumento usado para coleta de dados consistiu de um questionário estruturado de modo a gerar as informações necessárias sobre aleitamento materno, obtidas em entrevistas com as mães, mediante assinatura do termo de consentimento (esclarecido e informado). Após abordagem inicial pelo pesquisador, as mães eram então convidadas a participarem do estudo, autorizando sua inclusão via termo de consentimento. Dados complementares foram obtidos através da análise das prescrições médicas e dos prontuários da mãe e da criança. Para testar a viabilidade da pesquisa, foi realizado um estudo piloto envolvendo 54 nutrizes do Hospital das Clínicas da UFMG, durante o mês de agosto de 1996.


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