O objetivo deste artigo é refletir sobre a fortificação alimentar como estratégia preventiva no combate a anemia, uma vez que o alimento escolhido pode atingir diretamente o público-alvo e não depende da colaboração da população escolhida. Os autores citam diversas pesquisas que obtiveram excelentes resultados, demonstrando a eficácia dos alimentos enriquecidos com ferro, fazendo parte do hábito alimentar da criança e com ótima aceitação.
As necessidades nutricionais das crianças são influenciadas por idade, peso, velocidade de crescimento, metabolismo, atividade física e processos infecciosos agudos.
O esquema alimentar recomendado, de acordo com as faixas etárias, permite o suprimento de todos os nutrientes necessários ao crescimento e desenvolvimento da criança. Entretanto, várias situações podem impedir que esse objetivo seja alcançado, como os erros alimentares, o mau aproveitamento dos nutrientes, a hiperatividade, o metabolismo individual e a depleção de reservas. Devemos considerar que a alimentação é fundamental para a prevenção das deficiências nutricionais, mas, quando estas se fazem presentes, é necessário a utilização de suplementos nutricionais, por meio dos próprios alimentos fortificados ou por meio de medicamentos.
A fortificação alimentar pode ser considerada uma alternativa de intervenção no combate a carências de micronutrientes, entre elas a de ferro. Esta medida é descrita como uma estratégia adotada em países desenvolvidos ou mesmo em desenvolvimento. Segundo Torres et al. (2000), trata-se de uma medida capaz de atingir vários extratos populacionais sem exigir cooperação do beneficiário, além de ser de baixo custo e efetiva a curto, médio e longo prazos.
A deficiência de ferro é a mais freqüente das carências nutricionais. Estima-se em dois bilhões o número de pessoas com anemia e em 3,6 bilhões o número de deficientes em ferro em todo o mundo (WHO, 1998). Mesmo em países desenvolvidos como os Estados Unidos, a anemia é, atualmente, o segundo problema nutricional superado apenas pela obesidade (Fairbanks, 1999).
Constitui um flagelo alimentar em praticamente todos os países, principalmente da América Latina, alcançando números bem significativos e está entre os maiores desafios para os países em desenvolvimento.
Atualmente, no Brasil, sabe-se que a prevalência de anemia ainda é alta, principalmente entre crianças lactentes, pré-escolares e escolares.
Em levantamento bibliográfico realizado na base de dados LILACS (Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde) foram encontradas prevalências elevadas de anemia em crianças menores de cinco anos no Brasil, variando de 25% a 68% e, em estudo realizado em dez capitais brasileiras ficou demonstrado uma prevalência nacional de anemia em torno de 54%, com dados de maior incidência na região Sudeste (53,7%), seguidos da região Sul (52,7%), Nordeste (44,5%) e Norte (34,3%), demonstrando o grave problema de saúde pública que representa (Fisberg, 2001). Portanto, a anemia na infância é um grave problema de saúde pública, disseminado por todo o Brasil.
Anemia é a redução da taxa de hemoglobina circulante atribuída a condições patológicas, dentre as quais a deficiência de ferro é a mais comum (Unicef/UNU/WHO/MI, 1999). É o resultado de uma insuficiência de hemoglobina na circulação, provocando diminuição da habilidade de transporte de oxigênio para os tecidos (Sigulem et al., 1985).
A carência ocorre quando existe um desequilíbrio entre a absorção e as necessidades orgânicas do mineral. Esse desequilíbrio pode ser devido à ingestão inadequada de ferro na alimentação, à sua biodisponibilidade reduzida na dieta, às necessidades aumentadas em grupos específicos, perdas crônicas de sangue, má absorção, que acarretam uma diminuição da taxa de hemoglobina, caracterizando a anemia (Demaeyer et al., 1989).
As manifestações da carência de ferro repercutem em vários sistemas orgânicos. O diagnóstico clínico baseado na observação de palidez cutâneo-mucosa, bem como sopros cardíacos, taquicardia, menor resistência ao frio, diminuição de algumas funções imunes, atraso do crescimento, entre outros, é realizado apenas quando a criança já está em etapa avançada da deficiência do mineral. Entretanto, dentre as conseqüências a longo prazo, as alterações no desenvolvimento cognitivo, comportamental e na coordenação motora vêm despertando maior atenção não só pelo menor índice de suspeita, como também pela dificuldade diagnóstica, gravidade e apresentação tardia. Além do mais, o período de maior crescimento cerebral e formação de novas conexões neuronais coincide com o período de maior prevalência da anemia ferropriva (Lozoff et al., 1987).
Os fatores que predispõem a maior vulnerabilidade à anemia ferropriva são: a prematuridade; o baixo peso ao nascer; a interrupção precoce do aleitamento materno nos lactentes (quando o aleitamento é artificial, com uso de leite de vaca in natura, o risco da deficiência é maior, já que neste a quantidade de ferro também é baixa e a biodisponibilidade é ruim, além disso, o leite de vaca pode provocar microemorragias no trato digestivo, comprometendo o estado nutricional de ferro da criança); os fatores socioeconômicos, que levam a uma baixa ingestão de alimentos com boa disponibilidade de ferro entre a população de baixa renda; consumo alimentar insuficiente em ferro em crianças menores de seis anos de idade, tanto qualitativa como quantitativamente; aumento do requerimento de ferro, devido às necessidades do crescimento acelerado no primeiro ano de vida; o período da adolescência; os períodos de gestação e lactação; o período da senilidade.
Muitas metodologias estão sendo avaliadas quanto à sua eficácia e funcionalidade como medida preventiva e curativa da anemia ferropriva, como o incentivo ao aleitamento materno exclusivo até o sexto mês de vida, profilaxia com doses diárias de sais de ferro até 24 meses e a fortificação de alimentos que são habitualmente consumidos pelas crianças.
A fortificação de alimentos com ferro é a estratégia indicada pelas instituições que atuam na área da saúde como a mais eficiente para o combate à anemia por deficiência de ferro. O tema vem sendo muito pesquisado e já se conhecem as potencialidades de diversos sais de ferro como agentes de ferro biodisponível na fortificação de alimentos.
Em países como Estados Unidos, Canadá, Reino Unido e Suíça o desaparecimento das deficiências de minerais e vitaminas tem sido decorrente do enriquecimento de alimentos. Países como o Chile, Venezuela, Guatemala e El Salvador utilizam alimentos enriquecidos com ferro por várias décadas e, dessa forma, vem conseguindo diminuir significativamente a prevalência da anemia ferropriva.
No Brasil o enriquecimento de alimentos vem sendo objeto de concentração de esforços, decorrentes do agravamento das condições da saúde pública pelas deficiências de micronutrientes, das políticas governamentais e de fatores inerentes ao mercado de produtos alimentícios.
O processo de fortificação/enriquecimento, ou simplesmente de adição, é aquele no qual se acresce ao alimento, de acordo com parâmetros legais, um ou mais nutrientes, contidos ou não naturalmente no mesmo, com o objetivo de reforçar seu valor nutritivo, inclusive aquele eventualmente perdido no processamento industrial, e prevenir ou corrigir alguma deficiência em um ou mais nutrientes na alimentação da população em geral ou de seus grupos de risco.
Após este processo, o alimento é dito fortificado/enriquecido, ou simplesmente adicionado de nutrientes, conforme o teor de nutrientes acrescido. Logo, deve ficar claro que alimento fortificado/enriquecido é diferente de alimento adicionado.
De acordo com as Portarias 27 e 31, de 13 de janeiro de 1998, do Ministério da Saúde - Secretaria de Vigilância Sanitária, o alimento pronto para consumo que, em 100 ml ou 100 g fornecer em relação à IDR (Ingestão Diária Recomendada) de referência:
· Mínimo 15%, no caso de líquidos e 30% no caso de sólidos nutrientes é considerado fortificado/enriquecido e pode declarar no rótulo o dizer: "alto teor" ou "rico" (conforme o Regulamento Técnico de Informação Nutricional Complementar);
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