Magnitude, duração e especificidade da resposta sorológica em bovinos vacinados contra o vírus da diarréia viral bovina (BVDV)

Enviado por Rudi Weiblen


1. Resumo

A resposta sorológica induzida por três vacinas comerciais inativadas contra o vírus da Diarréia Viral Bovina (BVDV) foi avaliada em bovinos imunizados três vezes (dias 0, 30 e 180) e testados a diferentes intervalos após a vacinação. Trinta dias após a segunda vacinação, 74,5% (70/94) dos animais apresentavam anticorpos neutralizantes contra o BVDV-1 e 52,1% (49/94) contra o BVDV-2. Os títulos médios (GMT) e o número de animais reagentes contra o BVDV-1 eram de 109,3(32/36); 54,6(22/28) e 25,5(16/30) para as vacinas A, B e C, respectivamente; e de 19(27/36), 42,3(12/28) e 18,4(10/30) contra o BVDV-2. Os títulos reduziram-se aos 180 dias, sendo que 31,9%(30/94) dos animais já não apresentavam atividade neutralizante frente ao BVDV-1 e 63,8%(60/94) frente ao BVDV-2. Nesta data, os títulos médios e o número de animais positivos frente ao BVDV-1 eram de 28,3 (30/36), 28,3(20/28) e 16,1(14/30) e frente ao BVDV-2 de 16,8(18/36), 21,6(10/28) e 28,3(6/30) para as vacinas A, B e C, respectivamente. Após o reforço (dia 180), os títulos médios contra o BVDV-1 aumentaram significativamente nos três grupos vacinais e contra o BVDV-2 apenas no grupo A. Trinta dias após, os títulos médios e o número de reagentes contra o BVDV-1 eram de 104,8(23/24), 50,3(24/26) e 43,7(24/28) e contra o BVDV-2 de 33,4(23/24), 23,3(22/26) e 15,7(22/28) para as vacinas A, B e C. Os títulos contra o BVDV-1 no dia 210 foram estatisticamente superiores aos títulos contra o BVDV-2 nos três grupos vacinais. O soro de alguns animais positivos de cada grupo foi testado frente a quatro amostras brasileiras de BVDV-1 e duas de BVDV-2. Além dos títulos baixos a moderados, os testes de neutralização cruzada revelaram variações marcantes na atividade neutralizante frente a isolados de campo antigenicamente diferentes. Esses resultados demonstram que a vacinação não induziu uma resposta sorológica de magnitude e duração adequadas na maioria dos animais, principalmente frente à grande diversidade antigênica das amostras de BVDV.

Palavras-chave: vírus da Diarréia Viral Bovina, BVDV, vacinas, diversidade antigênica.

2. Summary

The serological response induced by three inactivated commercial vaccines against bovine viral diarrhea virus (BVDV) was evaluated in calves immunized three times (days 0, 30 and 180) and examined at different intervals after vaccination. Thirty days after the second vaccination, 74.5% (70/94) of the calves had developed neutralizing antibodies titers against BVDV-1 and 52.1% (49/94) against BVDV-2. The geometric mean titers (GMT) and the number of animals with antibodies to BVDV-1 were 109.3(32/36); 54.6(22/28) and 25.5(16/30) for vaccines A, B e C, respectively and 19(27/36), 42.3(12/28) and 18.4(10/30) to BVDV-2. The antibody titers decreased by day 180, when 31.9%(30/94) of the calves showed no neutralizing activity against BVDV-1 and 63.8%(60/94) to BVDV-2. At that time, the GMTs and the number of animals seropositive to BVDV-1 were 28.3 (30/36), 28.3(20/28) and 16.1(14/30); and to BVDV-2 were 16.8(18/36), 21.6(10/28) and 28.3(6/30) for vaccines A, B and C, respectively. After the third dosis (day 180), the antibody titers to BVDV-1 increased significantly in all groups whereas a significant increase in BVDV-2 titers was observed only for vaccine A. At day 210, GMTs and the number of positive animals to BVDV-1 were 104.8(23/24), 50.3(24/26) and 43.7(24/28) and to BVDV-2 were 33.4(23/24), 23.3(22/26) and 15.7(22/28) for vaccines A, B and C. The neutralizing activity against BVDV-1 was higher than to BVDV-2 in all groups at day 210. Sera from five seropositive animals of each vaccine group were tested against four Brazilian BVDV-1 and two BVDV-2 isolates. In addition to the low and moderate titers, the cross-neutralization assays revealed a highly variable neutralizing activity against the Brazilian field isolates. These results demonstrated that the vaccination did not induce an adequate serological response in most animals, mainly due to the high antigenic variability of BVDV.

Key words: bovine viral diarrhea virus, BVDV, vaccines, antigenic diversity.

3. Introdução

O vírus da Diarréia Viral Bovina (BVDV) é um dos principais patógenos de bovinos. A infecção possui distribuição mundial e causa perdas significativas à pecuária bovina (BAKER, 1995). O BVDV é um vírus com envelope, que possui como genoma uma molécula de RNA de cadeia simples, polaridade positiva, com aproximadamente 12,5 quilobases. O BVDV pertence à família Flaviviridae, gênero Pestivirus, juntamente com o vírus da Doença da Fronteira de ovinos (BDV) e o vírus da Peste Suína Clássica (CSFV) (FRANCKI et al., 1991).

A infecção pelo BVDV pode resultar em uma variedade de manifestações que incluem infecções subclínicas, doença gastroentérica aguda ou crônica (Diarréia Viral Bovina, BVD), doença respiratória e BVD aguda e hemorrágica (BAKER, 1995). A infecção de fêmeas soronegativas com amostras não-citopáticas (ncp) geralmente resulta em transmissão transplacentária do vírus para o feto, podendo causar perdas embrionárias ou fetais, malformações, natimortalidade e o nascimento de terneiros fracos e inviáveis. A infecção de fêmeas entre os dias 40 e 120 de gestação pode resultar em imunotolerância fetal e no nascimento de animais persistentemente infectados (PI) (BROWNLIE, 1990; MOENNIG & LIESS, 1995). Os animais PI eliminam o vírus em secreções e excreções e constituem-se na principal fonte de disseminação e perpetuação do vírus na população bovina (BRONWLIE, 1990).

Os isolados de campo do BVDV apresentam uma grande variabilidade antigênica, sendo que dois grupos genética e antigenicamente distintos já foram identificados, BVDV-1 e BVDV-2 (PELLERIN et al., 1994). Amostras de BVDV-2 são antigenicamente distintas das de BVDV-1, sobretudo na região da glicoproteína E2/gp53 (PELLERIN et al., 1994; VAN RIJN et al., 1997). A E2/gp53 é a principal glicoproteína do vírion e está envolvida na indução de anticorpos neutralizantes e proteção (DONIS, 1995). Por isso, a reatividade sorológica e proteção cruzada entre BVDV-1 e BVDV-2 é geralmente muito baixa (PELLERIN et al., 1994; FLORES et al., 2000).

Após o reconhecimento da importância da infecção pelo BVDV para a pecuária bovina, vacinas atenuadas e inativadas foram desenvolvidas e passaram a ser utilizadas para reduzir a gravidade da doença clínica e as perdas econômicas. No entanto, a grande variabilidade antigênica dos isolados de campo sempre representou um obstáculo para a obtenção de proteção cruzada contra o amplo espectro dos isolados (DUBOVI, 1992; VAN OIRSCHOT et al., 1999). O surgimento de amostras antigenicamente diferentes e altamente virulentas de BVDV no final da década de 80 (PELLERIN et al., 1994), denominadas de BVDV-2, reacendeu a discussão sobre a eficácia das vacinas (VAN OIRSCHOT et al., 1999; FULTON & BURGE, 2000).

A infecção pelo BVDV está amplamente disseminada no rebanho bovino do Brasil (BOTTON et al., 1998; PITUCO & DEL FAVA, 1998) e as amostras brasileiras de BVDV apresentam uma grande variabilidade antigênica (BOTTON et al., 1998). Análise filogenética e antigênica de isolados brasileiros revelou a presença de vírus dos dois genótipos (BVDV-1 e BVDV-2) no rebanho brasileiro (FLORES et al., 2000). Como a grande maioria das vacinas contra o BVDV, incluindo as comercializadas no país, contém apenas cepas de BVDV-1, é pertinente questionar-se sobre o grau de reatividade sorológica entre as cepas vacinais e as amostras de campo brasileiras.

Os objetivos desse experimento foram quantificar e determinar a duração e especificidade da resposta sorológica induzida em bovinos por três vacinas comerciais contra o BVDV.


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