Artigo original : "R. Bras. Zootec., Dez 2003, vol.32, no.6, suppl.2, p.2032-2039. ISSN 1516-3598"
O selênio e a vitamina E são antioxidantes importantes na defesa de células e tecidos e atuam diretamente na manutenção da saúde do úbere, influenciando na contagem de células somáticas, indicador da mastite. O presente trabalho teve como objetivo avaliar o efeito do selênio e da vitamina E sobre a contagem de células somáticas no leite de vacas da raça holandesa. Oitenta e quatro animais foram distribuídos em quatro tratamentos: controle; suplementação com 5 mg Se/dia; suplementação com 1000 UI vit. E/dia e suplementação com 5 mg Se + 1000 UI vit. E/dia. A suplementação foi iniciada 30 dias antes da provável data de parição, prolongando-se até o parto. Amostras do volumoso e do concentrado foram colhidas, quinzenalmente, para análise bromatológica completa e levantamento dos níveis de Se e vit. E. O sangue foi colhido antes do início da suplementação, no parto, 30 e 60 dias após o parto, para determinação dos níveis de Se no soro sangüíneo das vacas. O leite foi colhido semanalmente, para determinação da contagem de células somáticas (CCS). O período de coleta iniciou-se logo após o período colostral, prolongando-se até a décima segunda semana de lactação. Um mês após a suplementação, as vacas que receberam selênio apresentaram níveis séricos superiores ao grupo controle. O selênio diminuiu significativamente a CCS nas oito primeiras semanas de lactação, porém, não foi encontrado efeito da vitamina E e interação entre os dois elementos. A suplementação com selênio no pré-parto aumentou o nível sérico do mineral nas vacas e reduziu a CCS nas oito primeiras semanas de lactação, desempenhando importante papel na resposta imune da glândula mamária de bovinos leiteiros.
Palavras-chave: antioxidantes, mastite subclínica, pré-parto, qualidade do leite
Selenium and vitamin E are important antioxidants for cells and tissues protection acting directly as a support for the udder health. This experiment was designed to evaluate the influence of prepartum selenium and vitamin E supplementation on milk somatic cell counts of Holstein cows. Eighty four animals were allocated into four treatments: control; supplementation with 5 mg Se/day; supplementation with 1000 UI vitamin E/day and supplementation with 5 mg Se/day + 1000 UI vitamin E/day. The supplementation started thirty days prior to probable parturition date until parturition. Forage and concentrate samples were taken every fifteen days for chemical, selenium and vitamin E analyses. Blood samples were taken before starting supplementation, right after parturition, thirty and sixty days after it to determine the selenium serum levels. Milk samples were taken to determine SCC. Selenium supplemented cows had higher serum selenium concentration compared with control group. The selenium decreased SCC up to 8th week of lactation playing an important role on immune response of bovine mamary gland.
Key words: antioxidants, milk quality, prepartum, subclinical mastitis
Os efeitos favoráveis do selênio (Se), da vitamina (vit.E) e de outros antioxidantes nos mecanismos de defesa da glândula mamária vêm sendo estudados nos últimos anos, porém existem poucos trabalhos desenvolvidos no Brasil. A vit. E é o mais importante antioxidante lipossolúvel. Está inserida nas membranas lipídicas e as protege contra o ataque de radicais superóxido (Combs & Combs, 1986). O selênio é um micronutriente essencial presente nos tecidos do corpo. É parte integrante da enzima glutationa peroxidase que atua no citosol celular convertendo peróxido de hidrogênio em compostos atóxicos (Combs & Combs, 1986).
Um problema de fundamental importância, diz respeito à influência do selênio e da vit. E na incidência de mastite, processo inflamatório que resulta em grandes perdas para a pecuária leiteira. As mastites constituem-se na principal afecção dos animais destinados à produção leiteira; caracterizam-se por alterações físicas, químicas e bacteriológicas do leite, bem como do tecido glandular mamário (Langoni, 2000).
As mastites são causadas por inúmeros microrganismos, havendo citação na literatura de 137 agentes envolvidos em sua etiologia (Watts, 1998), incluindo-se bactérias, fungos, algas e vírus; entretanto, as mastites de origem bacteriana são as mais freqüentes (Costa et al., 1995; Langoni et al., 1998). No Brasil, a sua incidência é alarmante, acometendo 71% das vacas em rebanhos de Minas Gerais e São Paulo (Costa et al., 1995a; Costa et al., 1999). A mastite pode ser clínica ou subclínica. A mastite clínica apresenta sintomatologia evidente de processo inflamatório (edema, sensibilidade, hipertermia, hiperemia) e alterações das características da secreção. A mastite subclínica caracteriza-se pela diminuição da produção de leite sem sintomatologia evidente da infecção. Pode ser detectada através do "California Mastitis Test" (Schalm & Noorlander, 1957), CCS, "Wisconsin Mastitis Test", condutividade elétrica, entre outros (Radostitis et al., 1994).
A CCS é uma ferramenta valiosa na avaliação da incidência de mastite subclínica, na estimativa de perdas de produção de leite e como indicativo da qualidade do leite produzido na fazenda (Fonseca & Santos, 2000).
A CCS do leite originado de animais sadios é normalmente menor que 300.000 células/mL de leite. Entretanto, quando há invasão do úbere por bactérias, ocorre resposta inflamatória que causa grande aumento das células somáticas presentes no leite (Fonseca & Santos, 2000).
O primeiro estudo feito sobre o efeito do Se e vit. E na incidência de mastite clínica foi reportado por Smith et al. (1984) onde encontraram diminuição de 37% na incidência de mastite clínica em vacas recebendo suplementação de 740 UI de vit. E por dia, durante o período seco. Injeção de selênio, 21 dias antes do parto, não teve efeito significativo sobre incidência de mastite, no entanto, vacas suplementadas com selênio e vitamina E tiveram diminuição dos sintomas clínicos de mastite comparadas com aquelas que não receberam nenhum tipo de suplementação.
Resultados bastante satisfatórios foram obtidos quando se estudou o efeito da suplementação de Se (0,3 ppm Se/dia) e vit. E (1000 UI/dia) em novilhas. Iniciou-se a suplementação 60 dias antes do parto, prosseguindo durante toda a lactação. Houve diminuição nos casos de mastite clínica e diminuição na contagem de células somáticas (CCS), quando comparadas com aquelas não suplementadas (Smith et al., 1985).
Alguns trabalhos foram realizados utilizando níveis crescentes de selênio suplementar (Maus et al., 1978). Monitoramento realizado em nove fazendas no Estado de Ohio, durante um ano, avaliou a relação entre altas contagens de células somáticas (CCS) no leite e consumo de selênio e vitamina E. Verificou-se que o consumo de Se variou de 1 a 16 mg/dia e de vit. E de 100 a 900 mg/dia. A suplementação de Se em níveis crescentes (sendo ideal até 5 mg/ dia) aumentou a concentração de Se no sangue e diminuiu a incidência de mastite clínica e CCS, significativamente. Do mesmo modo, a suplementação com vit. E em níveis crescentes, aumentou a concentração de alfa tocoferol no sangue (mais significativo em vacas secas) e diminuiu a incidência de mastite clínica (Weiss et al., 1990).
No mesmo ano, Weiss et al. (1990a) analisaram a duração do efeito da suplementação de Se e vit. E no pré e pós-parto, através de experimentos de curta e longa duração. As vacas foram inicialmente divididas em dois grupos: controle e suplementadas com 0,2 ppm de Se + 70 UI de vit. E/kg de matéria seca (MS), durante o pré-parto. Após a parição, as vacas inicialmente suplementadas, passaram a receber 0,3 ppm de Se e 40 UI vit. E/kg de matéria seca e assim permaneceram até o final do experimento. Vinte e um dias após o parto, 18 vacas do grupo controle, foram distribuídas em três tratamentos recebendo: 0,3 ppm Se/kg de matéria seca; 40 UI vit.E/kg de matéria seca e associação dos dois tratamentos, mantendo-se por mais 32 dias. A concentração de Se no plasma do grupo suplementado foi superior ao tratamento controle, não havendo diferença estatística entre o grupo suplementado desde o pré-parto e o grupo suplementado 21 dias pós-parto. Do mesmo modo ocorreu com a concentração de alfa tocoferol no sangue. Com relação à atividade da glutationa peroxidase, o tratamento de longa duração mostrou-se superior ao de curta duração e este, por sua vez, superior ao controle.
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