Página anterior Voltar ao início do trabalhoPágina seguinte 

 

4. Material e métodos

O experimento foi conduzido na Faculdade de Zootecnia e Engenharia de Alimentos da Universidade de São Paulo, no Campus Administrativo de Pirassununga. Foram utilizados 28 bezerros da raça holandesa (PC), machos, após terem ingerido exclusivamente o colostro durante três dias na fazenda de origem. Após a fase de colostro, ou seja, a partir do quarto dia de vida, os bezerros passaram a receber os concentrados experimentais mais quatro litros de leite integral diariamente, em duas refeições; após 30 dias, passaram a receber três litros de leite em uma única refeição. Água fresca esteve sempre à disposição dos bezerros, fornecida uma hora após a amamentação. Portanto, a partir do quarto dia de vida, os bezerros foram submetidos aos seguintes tratamentos, durante 70 dias de controle efetivo, ao final dos quais foram abatidos: A) leite integral + 0% de polpa cítrica no concentrado em substituição ao milho; B) leite integral + 15% de polpa cítrica no concentrado em substituição ao milho; C) leite integral + 30% de polpa cítrica no concentrado em substituição ao milho e D) leite integral + 45% de polpa cítrica no concentrado em substituição ao milho. A composição e análise bromatológica dos concentrados encontram-se nas Tabelas 1 e 2. Os bezerros apresentaram média de peso vivo inicial de 37,4 kg. Foram alojados em casinhas individuais de madeira com área de 1,55 m2, tendo como cama areia grossa, com comedouro e encaixe para baldes de água. O leite foi fornecido por meio de mamadeiras de plástico de dois litros. A polpa cítrica utilizada foi obtida sob a forma de péletes, sendo, então, triturada e incorporada na mistura, que por sua vez foi peletizada.

Foram registrados peso, altura na cernelha e perímetro torácico semanalmente, antes do fornecimento do leite. A altura na cernelha e o perímetro torácico foram tomados pela média de três mensurações consecutivas com o bezerro em posição de quadrilátero, sempre do lado esquerdo, com emprego de uma bengala hipométrica e de uma fita graduada em centímetros. Diariamente, foram fornecidos os concentrados, de acordo com os tratamentos estabelecidos e o consumo dos animais. As sobras foram retiradas a cada dois dias e pesadas. A conversão alimentar foi calculada pelo consumo de ração (kg) dividido pelo ganho de peso (kg) no período. O consumo de MS por kg de peso vivo foi calculado pela divisão do total de MS da ração (kg) consumido no período pelo peso vivo médio do animal no experimento (70 dias), e o consumo de ração por kg de peso vivo metabólico foi calculado pelo total de MS da ração (kg) consumido no período, dividido pelo peso vivo médio do animal e elevado à potência de 0,75 (PV075). Desconsiderou-se a ingestão de leite no cálculo da ingestão de MS, já que foi igual para todos os animais.

Ao abate, foram tomadas medidas de capacidade ruminal com base no volume e nos pesos cheios e vazios dos compartimentos gástricos (rúmen-retículo, omaso-abomaso), no desenvolvimento papilar, na contagem de protozoários e determinação de pH. Observou-se, ainda, visualmente e de modo empírico, o padrão de papilas da mucosa do rúmen, quanto à coloração e densidade, além de aspectos relacionados à maceração e coloração do alimento. A altura das papilas foi tomada pela média de três leituras consecutivas e ao acaso de um corte de 10 cm2 de tecido com auxílio de um paquímetro, feito no mesmo local anatômico, segundo STOBO et al. (1966). A concentração de protozoários ciliados do conteúdo ruminal foi determinada segundo técnica descrita por NOGUEIRA FILHO (1981). O pH ruminal foi tomado imediatamente após o abate dos animais, esvaziando-se o conteúdo ruminal em um balde plástico, homogeneizando-se o material, coletando-se uma amostra e, em seguida, fazendo a leitura com peagômetro digital. A incidência de diarréias foi determinada a partir da porcentagem de dias com fezes anormais no período. As fezes foram avaliadas diariamente, pela aparência física (LUCCI, 1989).

O delineamento experimental adotado foi em blocos ao acaso (PIMENTEL GOMES, 1985), com sete repetições por tratamento, sendo cada animal considerado uma unidade experimental e os blocos formados de acordo com a ordem de chegada dos bezerros. Para análise de variância utilizou-se o procedimento GLM do pacote estatístico SAS (SAS Institute Inc., Cary, NC, 1988), tendo como covariável o peso inicial. Para análise de regressão, empregou-se o método dos polinômios ortogonais.

5. Resultados e discussão

As médias apresentadas na Tabela 3 não diferiram estatisticamente (P>0,05) para todas as variáveis estudadas, mesmo substituindo 100% do milho pela polpa cítrica (Tabela 1). Estes resultados discordam dos trabalhos de HARRIS JR. e STAPLES (1989) e VAN HORN (1975), que recomendaram limites no uso da polpa cítrica, em substituição ao milho na dieta inicial de bezerros. CARVALHO (1995), em uma revisão, citou que a polpa cítrica para bezerros até 60 dias tem resultados questionáveis, em razão da baixa palatabilidade para esta categoria. VAN HORN (1975) mencionou que ocorreram alguns problemas de consumo e adaptação com bezerros com menos de 60 dias, apesar de a palatabilidade ter aumentado gradativamente; as dietas continham 0, 15, 30 e 40% de polpa cítrica, valores próximos aos empregados neste experimento. No presente trabalho não foram observados problemas de palatabilidade, talvez minimizados com a adição de 5% de leite em pó desnatado, uma vez que não houve diferença significativa entre tratamentos (P>0,05) quanto ao consumo de MS, e observou-se que os animais aproveitaram com a mesma eficiência das rações com níveis de substituição do milho moído pela polpa cítrica de até 100%, o que se comprova pelo fato de os bezerros terem ganhado, em média, 0,450 kg, considerado viável para desmama precoce (GOMES, 1983; NATIONAL RESEARCH COUNCIL - NRC, 1989).

Os resultados do acréscimo da altura na cernelha e acréscimo do perímetro torácico, apresentados na Tabela 3, estão normais para essa faixa de idade, quando confrontados com os dados observados por BRISOLA (1995), que verificou acréscimo da altura na cernelha de até 7,25 cm para animais na mesma faixa de idade, porém para um período de 42 dias e com sistema de desaleitamento diferenciado (aos 35 dias de vida).

WAINMAN e DEWEY (1988), trabalhando com ovinos, verificaram restrições severas de consumo, quando a polpa cítrica peletizada passou de 30% na MS total da dieta à base de feno de gramínea. Os autores afirmaram ter sido necessária a retirada de vários animais do experimento, face à recusa ao alimento, o que não ocorreu no presente trabalho, embora com até 45% de inclusão de polpa na MS total na dieta.

Não houve diferença significativa entre tratamentos, quanto ao volume R-R (rúmen-retículo) e O-Ab (omaso-abomaso) e também aos pesos cheios e vazios do R-R e O-Ab (dados não apresentados). Com relação ao tamanho das papilas ruminais, também não houve diferença significativa entre tratamentos, por outro lado, LUCCI (1976) relatou não haver relação aparente da altura das papilas com o consumo de concentrado, mas sim com a ingestão de matéria seca, que nesta pesquisa, também não diferiu significativamente. Foi observada ocorrência de escurecimento das papilas e da mucosa da parede ruminal, de acordo com o aumento da quantidade de polpa cítrica na ração, nada interferindo nos resultados. MORISSE et al. (1992) evidenciaram que a característica "pigmentação-queratinização" foi uma adaptação ao regime alimentar hiper-energético. Não foi observada a formação de placas de paraqueratose, significando que a fibra contida nas rações peletizadas, mesmo com alta inclusão de polpa cítrica, propiciou parede da mucosa do rúmen mais limpa e saudável, concordando com o trabalho de BEM-GHEDALIA et al. (1989).

Tradicionalmente, as dietas iniciais de bezerros têm sido formuladas tendo como base energética grãos de cereais. Se houver o fornecimento de volumosos com cereais, na forma de ração total peletizada, o consumo de alimento pelo bezerro pode ser reduzido, devido à baixa qualidade da fibra. Segundo alguns pesquisadores, o pH ruminal ocasionado pela fermentação dos cereais é o parâmetro mais relacionado a esta redução de consumo, uma vez que provoca a diminuição na degradação da fibra oriunda da forragem. Considerando-se como normal o pH entre 6 e 6,5, no presente estudo não foi notada qualquer inibição de consumo ou mesmo acúmulo de gases nos compartimentos (observação visual) durante os 70 dias de experimento, sendo que o pH ruminal médio nos tratamentos foram A: 6,02, B: 6,17, C: 6,12 e D: 6,15. De acordo com VAN SOEST (1987), a substituição de produtos com alto teor de amido por alimentos com alto teor de pectina gera efeito "especial" em dietas de vacas em lactação. Conforme o estudo, isto ocorre basicamente pela redução do pH ruminal, devido à fermentação acética em substituição à fermentação láctica, e pela capacidade de tamponamento ruminal por causa da pectina presente na polpa cítrica.

Não foi verificada incidência de diarréias, contudo, a pectina, por ser de natureza hidrofílica, faz com que o trânsito intestinal se torne mais rápido e os animais apresentem fezes moles, parecidas com diarréias, mas não infecciosas. A mesma observação foi feita com bovinos de corte (GOHL, 1973) e vacas em lactação (GIARDINI, 1993). NEAL et al. (1935) já haviam observado este fato, presumindo ser a pectina responsável pelas fezes mais soltas. Diante de trabalhos revisados e observações realizadas no experimento, talvez fossem obtidos melhores desempenhos dos animais consumindo polpa cítrica em maior quantidade, se a água fosse parcialmente restringida e, para essa verificação, novas pesquisas devem ser feitas. Não foi observado qualquer outro problema sanitário importante durante o experimento, e nem a presença de protozoários no rúmen.

6. Conclusões

A polpa cítrica pode substituir até 100% do milho, em concentrados peletizados com adição de 5% de leite em pó desnatado, para bezerros durante a fase de aleitamento.

7. Referências bibliográficas

BEN-GHEDALIA, D., YOUSEF, E., MIRON, J. et al. 1989.The effects of starch-and-pectin rich diets on quantitative aspects of digestion in sheep. Anim. Feed Sci. Technol., 24(3-4):289-298.

BHATTACHARYA, A.N., HARB, M. 1973. Dried citrus pulp as a grain replacement for awasi lamb. J. Anim Sci., 36(6):1175-1180.

BRANCO, A.F., ZEOULA, L.M., PRADO, I.M. et al. 1994. Valor nutritivo da polpa de citrus in natura para ruminantes. Rev. UNIMAR, 16:37-48 (Suplemento).

BRISOLA, M.L. Estudo do uso da soja integral extrusada na mistura iniciadora e de "dieta seca" no desaleitamento precoce de bezerros. Pirassununga, SP. FMVZ, 1995. 80p. Dissertação (Mestrado) - Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia/Universidade de São Paulo, 1995.

CARVALHO, M.P. Citrus. In: SIMPÓSIO SOBRE NUTRIÇÃO DE BOVINOS, 6, 1995, Piracicaba. Anais. Piracicaba: FEALQ, 1995. p.171-214.

FEGEROS, K., ZERVAS, G., STAMOULI, S. et al. 1995. Nutritive value of dried citrus pulp and its effect on milk yield and milk composition of lactating ewes. J. Dairy Sci., 78:1116-1121. www.bireme.br

GIARDINI, W. 1993. Polpa de citros: o que é. Revista Batavo. Encarte técnico, 23:4.

GOHL, B.I. 1973. Citrus by-products for animal feed. World Anim. Rev., 6:24-27.

GOMES, I. Desaleitamento precoce de terneiros usando-se como critério o consumo diário de concentrado. In: REUNIÃO DA SOCIEDADE BRASILEIRA DE ZOOTECNIA, 22, Pelotas, 1983. Anais... Pelotas: SBZ, 1983. p.98.

HARRIS JR., B., STAPLES, C.R. 1989. Feeding by products feedstuffs to dairy cattle. Florida Cooperative Extension Service/IFAS/University of Florida, DS20.

HENTGES JR., J.F., MORE, J.E., PALMER, A.Z. et al. 1966. Replacement value of dried citrus meal for corn meal in beef cattle diets. Fla. Agr. Exp. Sta. Bull., n.708.

KEENER, H.H., COLOVOS, N.F., ECKBERG, R.B. 1957. The nutritive value of dried citrus pulp for dairy cattle. University of New Hamps. Agr. Exp. Sta. Bull., n.438.

KIRK,W.G., KOGER, M. 1970. Citrus products in cattle finishing rations: a review of research at range cattle station (1946-60). Ext. Bull. Fla. Agric. Exp. Sin., n.739.

LANZA, A. 1984. Dried citrus pulp in animal feeding. In: Developments in food science, food industries and the environment. Amsterdam: Elsevier Scientific Pub. Co. p.189-198.

LUCCI, C.S. 1989. Bovinos leiteiros jovens. São Paulo: Nobel. 371p.

LUCCI, C.S. 1976. Desaleitamento precoce de bezerros. I- Níveis de energia e proteína nas rações iniciais. Rev. Fac. Med. Vet. Zootec. USP, 13(2):317-325.

LUCCI, C.S.,VELLOSO, L., MASOTTI, N. et al. 1975. Polpa seca de laranja versus milho desintegrado, em misturas concentradas para vacas em lactação. Rev. Fac. Med. Vet. Zoot. da USP, 12:163-168.

MORISSE, J.P., HUONNIC, D., COTTE, J.P. 1992. Alterations de Lamuqueuse du rumen chez le taurillon en élevage intensif: méthode d'appreciation rapide et conséquences zootechniques. Rec. Méd. Vét., 168(1):17-24.

NEAL, W.M., BECKER, R.B., ARNOLD, P.T.D. 1935. The feeding value and nutritive properties of citrus by-products. 1. The digestible nutrients of dried grapefruit refuse for growing heifers. Fla. Agr. Exp. Sta. Bull., v.275.

NOGUEIRA FILHO, J.C.M. 1981. Contribuição ao estudo sobre protozoários em rúmen de bezerros de rebanhos leiteiros. São Paulo, 1981. 70p. Dissertação (Mestrado) - Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia/Universidade de São Paulo, 1981.

NATIONAL RESEARCH COUNCIL - NRC. 1989. Nutrient requirements of dairy cattle. 6.ed. Washington, D.C.: National Academy Press. 157p.

ORSKOV, E.R. 1987. The feeding of ruminants: principles and practice. Marlow: Chalcombe Publications. 92p.

PIMENTEL GOMES, F.C. 1985. Curso de estatística experimental. 11.ed. Piracicaba: Nobel. 464p.

RANDEL, P.F., VAN HORN, H.H., WILCOX, C.J. et al. 1975. Supplemental nitrogen by the metabolizable protein concept. J. Dairy Sci., 58:1109.

SAS. Sas User's Guide. 1988. 8.ed. Cary. N.C., Sas Institute Inc.

SNIFFEN, C.J. Balancing rations for carbohydrates for dairy cattle. In: FEED DEALER SEMINARS, 1988, Cornell, Proceedings... Cornell: Cornell Cooperative Extension, 1988. v.112, p.9-19.

STOBO, J.H.B. 1966. Rumen development in calf 1- The effect of diet containing different proportions of concentrates to hay on rumen development. Brit. J. Nut., 20:171-191.

VAN HORN, H.H., MARSHALL, S.P., WILCOX, J.C. et al. 1975. Complete rations for dairy cattle. III. Evaluation of protein percent and quality and citrus pulp: corn substitutions. J. Dairy Sci., 58:1101.

VAN SOEST, P.J., ROBERTSON, J.B., LEWIS, B.A. 1991. Methods for dietary fiber, neutral detergent fiber, and nonstarch polysaccharides in relation to animal nutrition. J. Dairy Sci., 74:3583-3596. www.bireme.br

VAN SOEST, P.J. 1987. Soluble carbohydrates and the non-fiber components of feeds. Large Anim. Vet., 42:44.

VELLOSO, L., MASOTTI, N., BECKER, M. et al. 1974. Polpa cítrica peletizada para bovinos em confinamento. Rev. Fac. Med. Vet. Zoot. da USP, 11:21-25.

WAINMAN, F.W., DEWEY, J.S. 1988. Feedingstuffs evaluation unit: fifth report. S.l.: Rowett Research Institute. 132p.

Fernando José Schalch1, Edison Schalch2, Marcus Antonio Zanetti3, Marcelo Landim Brisola4 - mzanetti[arroba]usp.br

1 Médico Veterinário do Campus da USP de Pirassununga - SP. E.mail: schalch.f[arroba]bol.com.br

2 Professor Doutor do Departamento de Zootecnia - FZEA - USP - Pirassununga - SP. E.mail: eschalch[arroba]usp.br

3 Professor Titular do Departamento de Zootecnia - FZEA - USP - Pirassununga - SP. E.mail: mzanetti[arroba]usp.br

4 Professor Doutor da Fac. de Medicina Veterinária da PUC - Minas - Poços de Caldas. E.mail: mabrisola[arroba]usp.br



 Página anterior Voltar ao início do trabalhoPágina seguinte 



As opiniões expressas em todos os documentos publicados aqui neste site são de responsabilidade exclusiva dos autores e não de Monografias.com. O objetivo de Monografias.com é disponibilizar o conhecimento para toda a sua comunidade. É de responsabilidade de cada leitor o eventual uso que venha a fazer desta informação. Em qualquer caso é obrigatória a citação bibliográfica completa, incluindo o autor e o site Monografias.com.