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4 – Prestação de contas dos resultados para a comunidade.
Deveria existir uma prática constante de relatar para a comunidade os resultados das medidas implementadas, o que pode tornar o apoio popular mais sólido.
A seguir serão expostos algumas áreas que poderiam ser exploradas quanto a mudanças legislativas com potencial de melhora dos problemas relacionados ao consumo de álcool na cidade de São Paulo.
Existem três pressupostos básicos para se regular a venda e disponibilidade do álcool:
1 - Alto consumo de álcool resulta em altos níveis de problemas relacionados com o álcool;
2 – Se o consumo do álcool é permitido de se desenvolver sem a interferência da sociedade e do governo os níveis de consumo serão estimulados pela própria indústria de bebidas, trazendo níveis de problemas inaceitáveis numa sociedade moderna;
3 – Restrições na oferta do álcool altera a demanda por álcool, reduzindo os níveis de consumo e de problemas.
A disponibilidade física do álcool pode ser limitada através de legislação controlando (3):
1 – As formas pelas quais o álcool possa ser vendido.
Tradicionalmente as bebidas alcoólicas são vendidas na forma de cerveja, vinho e destilados. Mas recentemente, especialmente nos países desenvolvidos, outras formas de bebidas alcoólicas tem sido colocadas no mercado visando essencialmente o público mais jovem. O governo deve intervir nessa situação e tentar limitar a ampliação do mercado de bebidas na população mais jovem.
2 – Os tipos, número, densidades e localização dos pontos de venda.
Esse tipo de controle legislativo deve ser o mais importante de ser pensado na cidade de São Paulo. Inúmeros estudos internacionais tem mostrado que quanto maior o número de pontos de vendas de álcool maior o consumo, maior a violência e um maior número de problemas relacionados com o álcool. Num livro recente publicado pela OMS (4) esse fator, junto com o preço das bebidas é considerado como um dos mais importantes em reduzir o consumo de álcool.
No nosso meio um estudo recente mostrou que na região do Jardim Ângela, na periferia da zona sul, existe um bar para cada 10 moradias, o que representa uma das maiores concentrações de pontos de vendas de álcool já registrada na literatura internacional. A maioria desses pontos de venda não tem licença de funcionamento.
Uma das possibilidades de mudança legislativa seria de regular essa situação de descontrole no ponto final de venda de álcool. Poderíamos criar tipos de licença diferenciada de acordo com o local e o tipo de bebida. Vários países desenvolvidos utilizam desse tipo de legislação para controlar a densidade dos pontos de venda, diminuir acidentes e violência em determinadas regiões das cidades e além disso arrecadar dinheiro que seria utilizado no tratamento do alcoolismo.
3 – As horas e dias da semana que a venda possa ser efetuada.
Temos pouca tradição no controle do álcool e pode parecer absurdo propor regulamentação de horários de venda, mas se tivermos regulamentação formal através de fiscalização e controle por meio de tipos de licenças esse tipo de controle pode ser implementado. Por exemplo, um estabelecimento pode ter uma licença de vender álcool somente nos finais de semana, e o custo dessa licença pode ser maior ou menor, de acordo com o interesse da autoridade de saúde.
4 – A idade mínima que o álcool possa ser consumido.
Temos leis que estabelece limites de idade em relação ao consumo de álcool. O próprio estatudo da criança e do adolescente propõem algo nesse sentido. No entanto essa prática não é vigiada e raramente um estabelecimento é autuado por infligir essa lei. Deveríamos estabelecer formas de controles locais com relação a essa prática, inclusive nos locais de venda a varejo como supermercados, postos de gasolina, etc.
5 – A responsabilidade de quem vende bebidas alcoólicas.
Vários países tem buscado responsabilizar os problemas imediatos do beber, como violência local, acidentes de trânsito, etc aos vendedores de bebidas. Penalidades severas são implementadas aos vendedores que continuam vendendo bebidas quando o freguês está intoxicado.
Uma das melhores e mais eficientes formas de controlar a disponibilidade do álcool é através do preço (4). Essa é a medida de efeito mais imediato e duradouro se houver uma política consistente ao longo do tempo. É especialmente eficiente entre os adolescente que são dos grupos sociais o que tem menor poder econômico e portanto ficaria mais sensível ao aumento do preço. Todas evidências mostram que a medida que aumentamos o preço das bebidas ocorre uma diminuição do consumo. O preço pode ser aumentado de várias formas: como taxação específica, como aumento do preço das licenças para vender bebidas alcoólicas, como taxação diferenciada para os produtores e distribuidores de bebidas, etc.
Na cidade de São Paulo tudo leva a crer que ainda temos venda de bebidas alcoólicas de origem desconhecida. Alguns acidentes onde houve intoxicação por metanol mostra que essa ainda pode ser uma prática comum em alguns locais da cidade. Se houvesse uma política de aumento de preços essa prática deveria ser especialmente monitorada.
B – Informação ao público e propaganda
Existe uma maior chance de uma política em relação ao álcool de dar certo se existir um maior e melhor nível de entendimento do problema. Para isso é necessário uma série de ações que visem melhorar a informação das pessoas em relação ao álcool.
Muito já se escreveu sobre a importância da educação em saúde nas escolas, mas pouco se sabe sobre a melhor forma de informar as crianças sobre esse assunto. Ainda necessitamos de pesquisas que possam nos orientar sobre o melhor estilo de transmitir informações para essa população.
2 – Informação pública sobre os limites seguros do beber
Apesar da maioria das pessoas consumirem bebidas alcoólicas o nível de conhecimento do conteúdo dessas bebidas e dos níveis aceitáveis sobre o consumo são muito pobres. Deveríamos fazer um programa de educação em saúde que informasse de uma forma clara e objetiva dos limites seguros do beber. Além disso todas as bebidas deveriam ter no seu rótulo os níveis de álcool presentes.
As evidências mostram que propaganda estimula consumo. A maioria dos países desenvolvidos já adotaram essas medidas, proibindo a maioria das propagandas de álcool, mesmo e principalmente nos eventos esportivos. Outdoors e demais veículos visuais que dependam da legalização da prefeitura seriam as ações mais fáceis de serem regulamentadas.
C – Sanções Legais da intoxicação
Uma das maiores causas de mortalidade entre os jovens é devido a acidentes automobilísticos. E dentre as principais causas desses acidentes está o consumo de álcool. Já existe o Código de Trânsito que tem limites legais sobre o beber e dirigir e as devidas sanções legais. No entanto esse controle não é exercido com a devida energia e estrutura. As possibilidades de melhorias seriam: a) estabelecer número de testes de bafômetros a serem executados por dia na cidade; b) exames a serem feitos nos locais de maior consumo de álcool (região dos bares da cidade, eventos com alto consumo, etc); c) disponibilidade de recursos para implementar essas ações.
2 – Responsabilidade do vendedor
Como já mencionado vários países estabeleceram sanções legais ao vendedor de bebidas alcoólicas que continuem vendendo para consumidores alcoolizados.
Existem evidências de que uma pessoa intoxicada pelo álcool nas ruas é um risco para si própria e para os outros. Deveríamos criar condições para cuidar dessas pessoas, não com a prisão, mas para um local onde ela pudesse ser cuidada. Essas pessoas acabam indo parar nos pronto socorros que são locais inadequados para cuidar dessa situação. Poderíamos criar dentro dos hospitais públicos o ambiente adequado para que seja oferecido o cuidado devido para essa pessoa.
A oferta de tratamento para os problemas do álcool é uma das formas de se diminuir o custo social dessa doença. Infelizmente o sistema público de saúde não adotou as medidas necessárias nos últimos anos e temos pagado um alto preço por essa omissão. Na cidade de São Paulo temos poucas possibilidades de tratamento para os problemas do álcool. Deveríamos criar um sistema de serviços integrado com várias possibilidades de tratamento, onde a facilidade de acesso ao sistema deveria ser um dos objetivos principais. Cada região da cidade deveria ter uma UCAD (Unidade Comunitária de Álcool e Drogas), que visa essencialmente organizar as ações locais relacionadas com a prevenção e tratamento dos problemas com álcool e drogas. Uma lei determinando esses serviços, bem como os recursos necessários seria bem vinda.
1 – Leanne Riley and Mac Marshall (1999). Alcohol and Public Health in 8 Developing Countries. World Health Organization.
2 – Raistrick, D. & Hodgson R & Ritson B (2000) Tacling Alcohol Together. The evidence base for a UK alcohol policy. Free Association Books.
3 – Holder, H. (1998). Alcohol and the Community. Cambridge University Press.
4 – Edwards G. (1994). Alcohol policy and the Public Good. Oxford University Press, 2001.
Prof. Dr. Ronaldo Laranjeira (*)
laranjeira[arroba]uniad.org.br
(*) Professor Adjunto do Departamento de Psiquiatria da Escola Paulista de Medicina
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