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Mesmo com os atuais resultados promissores obtidos nas condições climáticas subtropicais paulistas, acredita-se que com a seleção de novos cultivares mais precoces (ciclos de 70 a 80 dias da florada à maturação), os tratos culturais sejam ainda mais facilitados e o sistema definitivamente viabilizado. Além da maior precocidade, os cultivares devem apresentar rusticidade em seus hábitos vegetativos e reprodutivos, assim como completa adaptação ao clima de características subtropical-tropicais.
A arquitetura da planta nesse sistema constitui outro fator relevante na seleção de genótipos; assim, quanto menor o ângulo dos ramos vegetativos, maior poderá ser o aproveitamento de energia radiante disponível (FERRAZ, 1985). O auto-sombreamento completo da parte inferior da copa não é interessante para o pessegueiro, a exemplo do que ocorre a maioria dos cultivos perenes. Apesar das adaptações fotocromáticas das folhas sombreadas (MAGALHÃES, 1979), o pessegueiro se enfraquece, diminuindo o número de ramos internos de produção. Dessa forma, a maioria dos órgãos intracopa torna-se bastante dependente dos fotossintetizados das partes mais externas da planta. Outras características para melhor adaptação ao sistema devem ser também consideradas: maior capacidade e eficiência na absorção e aproveitamento de água e nutrientes do solo, e maior resistência varietal a pragas e doenças
Em relação ao efeito negativo do auto-sombreamento. TOMBESI & BELLEGGIA (1986) relatam que pessegueiros ‘Flavorcrest’, cultivados no espaçamento de 4,5 x 3,5m (635 plantas/hectare), sob a condução de líder central, apresentaram comportamento distinto quando submetidos ou não a podas de verão. Nas plantas assim conduzidas, dotadas de copas menos compactadas, houve maior diferenciação floral e os frutos produzidos foram maiores e de melhor colorido e sabor. As copas adensadas mostraram-se bastante ineficientes e irregulares na formação de gemas de flores, em razão da deficiente penetração de luz.
O sistema de pessegais compactos, com conseqüente emprego da poda drástica para renovação da copa, parece ter sérias limitações em muitas regiões do globo, onde o outono e o inverno são estações impeditivas do desenvolvimento vegetativo. Um experimento conduzido em área central de Oklahoma, EUA, mostrou que plantas de ‘Redhaven’ adensadas diferenciaram um mínimo de gemas florais, aos insignificantes níveis de 5 a 10%. Além desse fato, essas gemas em desenvolvimento apresentaram atraso de aproximadamente dois meses em relação à sua época normal de diferenciação. Esse mesmo cultivar, quando mantido em densidade e tratos culturais convencionais, produziu normalmente elevado número de flores e frutos por ramo (WARRINER et al., 1985).
O excessivo vigor vegetativo dos pessegueiros, submetidos à poda drástica, constitui outro fator que pode dificultar, em certos casos, o estabelecimento de pomares em ultra-alta densidade. Esse crescimento vigoroso dos ramos pode acarretar uma competição intensa e indesejável entre os frutos por água, carboidratos, minerais e reguladores de crescimento, o que conseqüentemente causa uma produção de baixa qualidade. Para solucionar esse problema, pode-se lançar mão de porta-enxertos ananicantes ou mesmo de produtos químicos, como certos reguladores de crescimento, que bloqueiam de certo modo a síntese do ácido giberélico (GA3) e do ácido indolacético (AIA). Esses dois métodos paliativos fazem com que as plantas fiquem menores e mais compactas e, assim, mais compatíveis ao maior adensamento (HANSCHE et al., 1979; EREZ, 1986).
Os retardados de crescimento como SADH, CCC, Ethephon, Paclobutrazol (pp 333) e Flurprimidol podem ser aplicados via foliar (por pulverização) ou radicular (por irrigação). O Paclobutrazol, o mais efetivo, proporciona melhores resultados quando aplicado ao solo e, principalmente, na primavera, na concentração entre 12,5 a 125mg/planta. Ao ser aplicado via foliar, é menos efetivo devido à baixa penetração e à menor translocação do princípio ativo na folha. Esse retardador de crescimento, além de controlar o vigor da planta a cerca de 1/3 de seu potencial, faz também com que se aumente o peso individual, a coloração, a firmeza e os sólidos solúveis totais dos frutos (MARINI & WEFELMEYER, 1985; EREZ, 1986).
Outro fator importante a se considerar no sistema de ultra-alta densidade, consiste na necessidade de utilização de maior número de mudas por unidade de área. Pelo método tradicional de formação de mudas de pêssego, necessita-se da utilização de porta-enxertos e a posterior realização de enxertias com os cultivares copas desejados. Para facilitar a multiplicação em larga escala, o método de enraizamento de estacas lenhosas ou semilenhosas, ou mesmo a micropropagação, em condições especiais, podem ser adotados com vantagem.
No caso de formação de mudas, por estacas, essas são colhidas preferencialmente no outono e induzidas ao enraizamento pelo tratamento com o ácido indolbultírico (IBA). As estacas enraizadas poderiam, assim, ser mantidas em viveiros por período determinado ou ser plantadas diretamente no campo. Essa metodologia reduziria a mão-de-obra, o tempo necessário à propagação, bem como o custo final das mudas. Além disso, sugere-se que os pessegueiros provenientes de estacas auto-enraizadas possam aproveitar mais eficientemente os nutrientes minerais do solo. Análises realizadas mostram que, à exceção do zinco, todos os nutrientes essenciais apresentaram-se em doses superiores ou similares às plantas propagadas por enxertia (COUVILLON, 1982).
Os pessegueiros e nectarineiras como ‘maravilha’, ‘Sunlite’, ‘Desert Gold’, ‘Earligrande’ (EREZ & YABLOWITZ, 1981), ‘Redhaven’, ‘Sungold’ (COUVILLON & EREZ, 1980), ‘Diamante’ (FACHINELLO et al., 1982) e ‘Sunred’ (BELLINI et al., 1984) têm sido propagados com relativo sucesso sob o processo de auto-enraizamento e a maioria deles cultivados em escala comercial.
Entretanto, certas desvantagens, a exemplo da presença de nematóides causadores de galhas em raízes, podem, em alguns casos, tornar-se mais acentuadas com o auto-enraizamento, o que inviabilizaria esse processo de multiplicação.
Com o aumento da densidade de plantio e a conseqüente mudança nas dimensões da planta, não devem ser desprezados os efeitos do regime e da quantidade de luz incidente no pessegal (JACKSON, 1980; AVIDAN & EREZ, 1986). Como a quantidade de fotossintetizados obtidos pela planta é influenciada, em última análise, pela intensidade e qualidade da luz incidente (HALL & RAO, 1980), a disposição, a direção de plantio e o manejo da copa devem constituir fundamentos essenciais à implantação da ultra-alta densidade.
Para adequada interceptação e distribuição da radiação luminosa pela copa, ela deve estar livremente exposta a várias direções. Ao que parece, o sentido de plantio Norte-Sul é o que proporciona o melhor padrão de interceptação da luz. Sob essa orientação, são obtidas maiores produções e frutos de melhor qualidade. Para determinadas densidades, as plantas se desenvolvem melhor quando dispostas em renque duplo ou em triangulação (JACKSON, 1980), pela sua melhor disposição no espaço útil.
As práticas culturais, como certas podas de verão (MILLER, 1987), irrigação controlada (CHALMERS et al., 1981) e mesmo o desfolhamento parcial das plantas, normalmente tornam a copa bem mais eficiente na utilização da luz, durante o período de maior compactação foliar.
A técnica da alta densidade de plantio em pessegueiro, desenvolvida no IAC, vem sendo aos poucos adotada por fruticultores mais entusiastas; cada qual porém, a seu critério, introduz modificações de ordem cultural-prática.
Em Limeira, SP, a APIJÚNIOR Produtora de Mel e frutas introduziu o plantio do pessegueiro sob alta densidade, em consociação com o feijoeiro. A Seção de Fruticultura de Clima Temperado do IAC teve a oportunidade de colaborar no acompanhamento experimental. Os procedimentos fitotécnicos e os resultados parciais obtidos são descritos a seguir.
O pomar foi instalado no espaçamento de 6 x 1m (1.667 plantas/hectare), em área de 0,5 hectare. O terreno foi devidamente arado, gradeado e corrigido com calcário dolomítico na quantidade de 5t/ha.
Utilizaram-se para formação das mudas sementes do porta-enxerto ‘Okinawa’ (colhidas na safra de dezembro/86) que, após permanecerem 40 dias sob estratificação em ambiente frio e úmido, em geladeira (5-10ºC) (BARBOSA et al., 1987), foram semeadas individualmente, em saquinhos do tipo para café. Cerca de 60 dias da emergência (março/87), as plântulas foram transplantadas ao campo, em sulcos previamente estercados e adubados. Os porta-enxertos receberam tratos culturais rotineiros como capinas, desbrotas, adubação, irrigação e pulverização fitossanitária (OJIMA et al., 1987), sendo enxertados nos mês de julho de 1987. A enxertia, por borbulha de "chapinha", foi realizada a 10cm do sol, empregando-se, sempre, duas borbulhas em cada porta-enxerto..
Foram utilizados três novos cultivares de pêssegos: Flordaprince (OJIMA et al., 1984), Tropical e Aurora (BARBOSA, 1985, e um de nectarina: Centenária (OJIMA et AL., 1988), com ciclos aproximados de florada à maturação dos frutos de 80, 80, 110 e 1110 dias, respectivamente.
Transcorridos 30 dias da execução da enxertia, efetuou-se a desponta da porção superior dos porta-enxertos, logo acima da gema-copa, possibilitando crescimento vegetativo normal da borbulha enxertada. Nos meses subseqüentes, as jovens plantas receberam os tratos culturais rotineiros (OJIMA et al., 1987); um rápido e exuberante desenvolvimento das plantas foi verificado a partir do mês de julho.
Em agosto de 1987, efetuou-se o plantio intercalar com o feijoeiro. Utilizou-se o cultivar de feijão IAC Carioca-80 (POMPEU, 1982), semeando no espaçamento de 50cm entre linhas e quinze sementes por metro linear. Em seus tratos culturais de rotina, como as adubações de plantio e de cobertura, pulverização, irrigação e outros, seguiram-se as recomendações técnicas de BULISANI & ALMEIDA (1987).
Durante o período de vegetação, as plantas do ‘Carioca-80’ apresentaram uma folhagem vigorosa e sadia (Figura 1A), culminando com uma floração abundante e uniforme.
A colheita do feijão foi realizada no início do mês de novembro/87, cerca de 90 dias após a emergência das plântulas. Foi obtida naquela área (0,5ha), uma produção de 900kg de feijão (15 sacos de 60kg), correspondente a 1.800 kg/ha, considerada muito boa, em se tratando de cultura intercalar, mesmo irrigada.
No ano seguinte, em maio de 1988, os pessegueiros já fisiologicamente maduros (com cerca de 2,0 a 3,0m de altura), receberam o tratamento (químico) desfolhante e indutor de floração. Essa prática é necessária em regiões de clima subtropical-tropical, a exemplo de Limeira (22,5ºS), pois, nessas condições, as plantas desfolham-se muito lentamente, prejudicando a uniformidade de floração e de frutificação. É também utilizada para eliminar eventuais focos de reciclagem das doenças fúngicas (BARBOSA et al., 1989).
O tratamento constitui uma mistura de úreia a 20%, cobre a 5% e óleo mineral a 5%, a qual foi aplicada nas plantas sob pulverização. Esse tratamento, ainda experimental, objetiva substituir aquele baseado no Dinoseb, que não é mais comercializado.
Quinze dias após o tratamento, realizou-se a poda de inverno simplificada, que consistiu na retirada somente dos ramos ponteiros e centrais, cerca de 1 a 3 por planta. A altura das plantas após a poda variou de 2,0 a 2,6m.
Os cultivares Flordaprince e Tropical, de portes menores, praticamente paralisam o crescimento, no final de abril e início de maio; ‘Aurora’ e ‘Centenária’, pouco mais vigorosos, continuaram a vegetação, principalmente nos ponteiros, até a época da poda.
A incidência de doenças, como a ferrugem (Tranzschelia spp.), foi notória para todos os cultivares, porém, com menos intensidade no ‘Flordaprince’, que apresentou grande número de gemas vigorosas por ramo.
Cerca de 30 dias do tratamento químico, chamado de "quebra de endodormência", as plantas dos quatro cultivares floresceram e vegetarem abundantemente (Figura 1B). A florada perdurou até o início da segunda década de julho; foi verificada, principalmente no período da manhã, intensa movimentação de abelhas (Apis mellifera), provenientes do apiário situado a 300m do pomar, polinizando as flores dos pessegueiros (Figura 1C).
No início de agosto, realizou-se o trabalho de raleio manual, deixando-se por planta um número variável entre 100 e 200 frutos, dependendo do cultivar. Em razão de intensa frutificação efetiva (mais de 800 frutinhos por planta), gastaram-se para o desbaste de 20 a 30 minutos.
No período final e da pós-florada, as plantas foram pulverizadas com enxofre molhável e Captan, a 0,3%, para o combate das doenças fúngicas, como a sarna-dos-frutos (Cladosporium carpophilim Thum.) e a ferrugem. Após o raleio, introduziu-se nas pulverizações o inseticida Lebaycid para controle das moscas que atacam os frutos em crescimento, principalmente Anastrepha fraterculus. Não foram verificados ataques severos de pulgões e ácaros.
As adubações de pós-florada e pós-raleio foram nas quantidades de 20g de N, P2O5 e K2O/planta.
Em meados de setembro (cerca de 75 dias após a florada) deu-se início à colheita de produção de ‘Flordaprince’ e de ‘Tropical’, que apresentaram frutos bastante coloridos de vermelho e com polpas amarelas bem sucosas . O peso médio dos frutos de ‘Flordaprince’ e ‘Tropical’ aproximou-se a 85 gramas, com uma produção na faixa de 6 a 8kg/planta, equivalente de 11 a 13t/ha. Os cultivares Aurora e Centenária amadureceram seus frutos em início de outubro (cerca de 95 dias da florada); apresentaram frutos firmes e graúdos, com pesos médios de 95 e 85 gramas, com produções no 1º ano de 14 e 6kg/planta, correspondendo a 23 e 10t/ha, respectivamente. As altas temperaturas devem ter acelerado o processo de crescimento dos frutos.
Os frutos dos quatro cultivares foram comercializados em caixas de papelão e a granel na CEASA-CAMPINAS, e no próprio local do cultivo. Devido às suas excelentes qualidade organolépticas, obtiveram enorme aceitação por parte dos comerciantes e consumidores; com certeza deverá aumentar o fomento desse tipo de fruta muito comum na região. A rentabilidade do pequeno pessegal aproximou-se a 350 OTNs/0,5/ano.
Os pessegueiros, após a colheita, estavam aptos a serem podados drasticamente para outro ciclo vegetativo e novamente serem consociados com mais um plantio de feijão das águas. Ressalte-se que esse consórcio não prejudica a realização dos tratos culturais da rotina do pessegal, pois essa cultura secundária possibilita a movimentação de máquinas e dos demais equipamentos necessários.
Com base nos apontamentos feitos pelo produtor no decorrer deste trabalho elaborou-se o quadro 3, que trata da estimativa do número de horas-homem por trimestre, necessária ao cultivo de um hectare de pessegueiros precoces sob alta densidade (6 x 1m); não inclui, porém, o consócio de culturas anuais secundárias.
QUADRO 3.
Estimativa do número de horas-homem por trimestre, para o cultivo anual de um hectare de pessegueiros precoces sob alta densidade (6 x 1m)
e em fase produtiva (1)
Serviços |
|||||||||
Trimestre |
Máquinas (2) |
Capina e desbrota |
Adubação |
Irrigação |
Podas(3) |
Raleio |
Colheita |
Embalagem |
Total |
I |
4 |
25 |
5 |
0 |
0 |
0 |
0 |
0 |
34 |
II |
3 |
0 |
0 |
24 |
16 |
0 |
0 |
0 |
43 |
II |
6 |
20 |
10 |
48 |
0 |
500 |
0 |
0 |
584 |
IV |
5 |
30 |
5 |
0 |
40 |
0 |
200 |
200 |
480 |
Total |
18 |
75 |
20 |
72 |
56 |
500 |
200 |
200 |
1.141 |
(1) Baseada no pessegal conduzido na região de Limeira, no ano de 1988.
(2) Serviços tratoráveis como os de gradagens e pulverizações.
(3) Inclui a desponta apical de inverno e a poda drástica das plantas pós-colheita.
Wilson Barbosa; Fernando Antonio Campo Dall’orto; Mario Ojima
wbarbosa[arroba]iac.sp.gov.br
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