A loucura real e visionária de Dom Sebastião em Mensagem



Resumo:

A presença de uma figura mítica e louca como Dom Sebastião na obra Mensagem, de Fernando Pessoa mostra-se como uma forma de resistência e estímulo ao levante nacional pretendido em uma época de desânimo e desesperança. A loucura, vista pelo ponto de vista da Antipsiquiatria, pode ser compreendida como uma voz inaudita de resistência às regras opressivas da sociedade, sendo a loucura de Dom Sebastião como um sopro de esperança, uma possibilidade de ruptura com a morte e a estagnação de um povo que conheceu a glória e a depressão.

Palavras chaves: Fernando Pessoa, Mensagem, loucura.

 

Na poesia portuguesa dos séculos XIX e XX transparece a decepção e a nostalgia da grandeza perdida, uma ferida que não deixou de sangrar. Muitos choraram a decadência pondo-a em contraste com o antigo esplendor. Jacinto do Prado Coelho cita alguns autores como Antônio Nobre, em O Desejado, que exclama:

"Que pátria grande! Como está pequena!". O Doido de Junqueiro, em Pátria, tem queixas semelhantes ao dizer "Tive castelos, fortalezas pelo mundo... / Não tenho casa, não tenho pão!...".(COELHO 1983:129). Após as turbulências da Primeira República, em que se ouviram vozes alternantes de energia e desânimo, transparece na poesia portuguesa a imagem embaçada de uma nação doente, estagnada, subtraída ao tempo. É esse o povo português que Pessoa descreve em Mensagem. Um povo envolto em nevoeiro e incerteza (COELHO 1983: 130).

Muitos dos textos escritos nessa época eram lidos com emoção e tensão, admirados como atos de coragem frente à ditadura salazarista. A emigração em massa era sintoma do abatimento nacional sob o jugo salazarista. O exílio político também era motivo de separação e saudade. Portugal torna-se ausência e os poetas passam a concebê-lo como o país que poderia ter sido, como pura virtualidade, promessa não cumprida. Vivem pela memória do passado, inspiram-se na mitologia coletiva, exaltam os feitos ancestrais, invocam D. Sebastião, profetizam o regresso do salvador animados pela esperança de um renascimento (COELHO 1983: 131).

Perante o sentido da História portuguesa divergem, naturalmente, os poetas. Neste sentido Lima aponta para a não implicação da literatura com a verdade objetiva na medida em que o poeta não documenta suas convicções ou valores ao falar "das saudades por um marinheiro ou a tomar um criminoso, um asceta ou um marginal como seu herói" (LIMA 1986: 193). O discurso literário, portanto, não se apresenta como prova, documento, testemunho do que houve pois está mesclado com o que poderia ter havido, com o desejo do que tivesse acontecido. Dessa forma, percebemos que a interpretação tradicional atribui os eventos e os atos sublimes dos heróis a um plano de Deus, como em Mensagem de Fernando Pessoa. Outros poetas, no entanto, não consideram o Império motivo de orgulho, mas de vergonha e responsabilizam os homens pelos seus crimes. Essa divergência de sentidos se alimenta de experiências vividas ou possivelmente vividas, mas não as documenta.

Em nosso artigo, no entanto, nos deteremos a abordar a visão de Fernando Pessoa em Mensagem em sua evocação de uma figura mítica e louca como forma de resistência e estímulo ao levante nacional pretendido em uma época de desânimo e desesperança.

 


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